Os cartazes que enfeitavam as ruas de Roma, em 2011, por ocasião da beatificação de João Paulo II, diziam, na sua maioria, as seguintes palavras: “ Damose da fa, semo romani". A frase fazia referência a uma alocução do falecido papa, na Sala Paulo VI, em que ele dizia aos fiéis presentes, em dialeto romano: “Vamos em frente. Somos romanos". De modo semelhante exprimia-se São Josemaria Escrivá no seu famoso livro Caminho: “Gosto de que sejas muito romano. E — assim prosseguia o santo do cotidiano — que tenhas desejos de fazer a tua 'romaria', 'videre Petrum', para ver Pedro." [1]

Historicamente, a cidade de Roma concentrou o poder temporal do maior império político já visto na terra. A sede de expansão e domínio fez com que os romanos chegassem até os confins do mundo, por assim dizer, levando consigo sua cultura, organização política e religião. Em meio a isso, emergia a figura imponente do imperador, a cuja pessoa os cidadãos e súditos deveriam prestar culto.

O anúncio de Jesus Cristo insere-se exatamente neste contexto. Deus, por razões misteriosas, quis que a encarnação de seu Filho — o Rei dos reis — coincidisse com o tempo em que outro homem arrogava para si o título de “Augusto". Cristo, por sua vez, encarna-se para anunciar o verdadeiro Evangelho; não aquele que pertencia à linguagem do imperador, mas o Evangelho da Alegria, capaz de encher “o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus" [2]. Dada essa realidade, não foi por acaso que o cristianismo logo se converteu no maior obstáculo para o imperador romano. Os cristãos agora possuíam outra medida, possuíam a glória da salvação eterna, um Deus em cuja face se manifestava o amor à criatura: o amor crucificado e ressuscitado. Com efeito, a ameaça de morte contra aqueles que não prestassem culto a César não mais poderia intimidá-los. Ao contrário, o martírio pelo Deus do amor havia se convertido no maior desejo de seus corações.

Na crucifixão de São Pedro, por conseguinte, Roma é lavada pelo sangue do apóstolo sobre o qual Jesus havia edificado seu Corpo Místico, isto é, a Igreja. Isso marca um ponto importante na história da Cidade Eterna. Ela não mais seria a sede do imperador, aquele que oprimia e subjugava, mas a Cátedra do “Servo dos Servos" de Cristo, o encarregado de “confirmar seus irmãos na fé" (cf. Lc 22, 32). Roma não seria mais o opróbrio das nações, submetendo-as às perversões mundanas, mas o símbolo da libertação, manifestada pelo canto alegre dos cristãos que, a exemplo de seu Senhor, iam para a cruz, entregando-se por amor a Deus. Não seria mais a capital do maior império político já visto nesta Terra, mas a casa dos cristãos, a casa universal, a casa dos filhos de Deus. Não seria mais a Roma de Nero, de Calígula, mas “dos mártires, dos santos" [3].

Assim se compreende a árdua luta empreendida por Santa Catarina de Siena, a fim de que o Santo Padre retornasse a Roma, quando o então papa Gregório XI encontrava-se num exílio em Avinhão. Para que a Igreja pusesse fim à crise que se insurgia entre os fiéis, convinha antes “pôr fim à longa ausência, a esse exílio em Avinhão que privava a Cristandade da sua autêntica capital, consagrada pelo sangue do Apóstolo" [4]. Por isso a santa não economizou palavras ao se dirigir ao seu “Doce Cristo na Terra": “Seja homem, volte para Roma".

Na teologia moderna, infelizmente, não é difícil encontrar a acusação de que a Igreja Católica teria sido fundada por Constantino. Além disso, não faltam aqueles que, dentro da Igreja, estabelecem como que um poder paralelo, a fim de dar início a uma “nova reestruturação e nova divisão eclesiástica do trabalho e do poder religioso", menosprezando a figura do papa ao mesmo tempo em que reduz o Corpo de Cristo à figura de empresa [5]. Ora, é preciso pouco esforço para enxergar o veneno por trás dessas teorias. Basta observar o esfacelamento do protestantismo, perdido em meio a tantas interpretações duvidosas da bíblia, como também o caos daquelas igrejas e Conferências Episcopais, que recusando a autoridade de Roma, acabaram subjugadas pela bota dos governos locais, numa nova espécie de Cesaropapismo. É o caso, por exemplo, da Igreja Ortodoxa, escrava do Kremlin, e de inúmeras igrejas da América Latina.

“A Igreja de Roma preside na caridade", afirmava Santo Inácio de Antioquia. Amemos, portanto, a capital da Cristandade, onde o sol não tem poente, onde se vence refulgente todo erro e todo mal!

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