Uma maneira bastante comum de desqualificar o adversário em um debate é rotulá-lo de algo odioso. Trata-se, obviamente, de um caso flagrante de desonestidade intelectual, mas que, não raras vezes, ganha espaço nas discussões, vejam, "acadêmicas". Nas redes sociais, então, a coisa torna-se um pouco mais grotesca. Palavras como "nazista" e "fascista" são disparadas a esmo, sem qualquer sentido, no único intuito de desmoralizar o oponente perante o público. O site mesmo já foi vítima desse tipo de expediente em algumas oportunidades. Os comentários em nossas publicações não nos deixam mentir.

Foi com base nesse tipo de atitude que o jurista americano Mike Godwin formulou uma lei: "À medida que uma discussão se torna mais longa, a probabilidade de uma comparação envolvendo Hitler e os nazistas se aproxima de 1". Claro, portanto, é que argumentações do gênero não merecem crédito algum. A não ser que haja razões muito plausíveis para isso. É o que pretendemos apresentar neste artigo.

Assistimos, sim, aos pressupostos de uma ditadura. Ao menos, já temos quase todos os elementos necessários a uma imposição totalitária contra a Igreja e os cristãos em geral. Percebam, por exemplo, a hostilidade com que o pensamento cristão é tratado. Recentemente, comentamos aqui a ojeriza criada em torno da faixa "100% Jesus", do jogador Neymar, usada na final da Champions League. Foi uma demonstração boçal de intolerância aos símbolos cristãos. O episódio lembrou outro momento constrangedor para a democracia e o bom senso, quando as meninas do vôlei brasileiro venceram as Olimpíadas de 2012 e, para agradecer a Deus pelo título, rezaram juntas o Pai Nosso. Na opinião de alguns, aquilo foi inadmissível, pois seria um caso de desrespeito à laicidade do Estado. Nenhum pio foi ouvido, porém, em relação à apresentação da cantora Marisa Monte, vestida de Iemanjá, no encerramento da mesma competição.

O Brasil possui cinco séculos de tradição cristã. Isso se manifesta na arte, no comportamento, no nome de ruas, cidades e estados. O Cristo Redentor, como disse certa vez o papa Bento XVI, "representa a hospitalidade e o amor com que o Brasil sempre soube abrir seus braços a homens e mulheres perseguidos e necessitados provenientes de todo o mundo" [1]. Nada disso, contudo, interessa às vozes contrárias ao cristianismo. No que depender delas, a iconografia cristã só pode ganhar notoriedade pública se estiver envolvida em atos, pasmem, de protestos e escárnio. Com raras exceções, praticamente toda a chamada grande imprensa apoiou o vilipêndio das imagens sacras durante a parada gay deste e de outros anos. Como não se lembrar, ainda, das reportagens indignadas que saíram contra a proibição da Arquidiocese do Rio de Janeiro ao uso da imagem do Cristo Redentor no filme Rio, eu te amo? Que a imagem do Cristo apareça nos cinemas sendo ultrajada, não há problema nenhum. Ofensivo mesmo é o Cristo crucificado presente nos tribunais de justiça do país. Esse, sim, deve ser censurado e banido.

Tudo se torna mais infame quando a discussão envolve educação e moral. É raro quem nunca ouviu a acusação de que a Igreja Católica, representada na figura da Companhia de Jesus, teria subjugado as populações indígenas à cultura europeia. São José de Anchieta, na ideologia de muitas universidades por aí, teria sido apenas um opressor branco e odioso. Nenhum mérito deve ser atribuído a ele. Louvável seriam apenas Paulo Freire e sua pedagogia do oprimidoem que pese o amontoado de críticas e desconfianças que existam a respeito. Tem mais. Em nome de uma falsa justiça aos povos nativos, o Brasil deveria deixar de lado toda essa religião branca e europeia e retornar às origens, à suposta verdadeira identidade da nação: o paganismo. Nenhuma menção se faz ao canibalismo presente em muitas das tribos indígenas da época, nem à barbárie dos infanticídios.

Com a discussão em torno da Ideologia de Gênero nos Planos Municipais de Educação, a desumanização dos cristãos fica ainda mais escancarada. Um jornal teve o disparate de escrever que contrários ao termo "gênero" estavam os cristãos e, a favor, estavam os movimentos LBGTs, professores e… sociedade civil. Entendam o absurdo: segundo certos jornalistas, os cristãos não são cidadãos de direito, estão alheios à sociedade civil. Não importa que esses cristãos sejam pais de família, sejam também professores, taxistas, donas de casa ou empresários. Membro da sociedade civil, para os laicistas, é somente o que reza na cartilha dos ditos movimentos sociais, dos revolucionários, dos sindicatos etc. e tal.

O que isso tudo tem a ver com uma ditadura?, você pode estar se perguntando. Resposta: tudo. Na Alemanha nazista, conta Bento XVI em sua autobiografia, o golpe começou com um discurso nacionalista de retomada das origens. Era necessário, por conseguinte, liquidar qualquer referência àquilo que havia, aparentemente, destruído a cultura germânica. Enquanto se exaltavam ícones pagãos, a herança cultural de outros povos, bem como o judeu e o cristão, era escarnecida. A justificativa era exatamente esta: pôr um fim à influência de povos estrangeiros. Ademais, havia um forte proselitismo contra os "inimigos" da raça ariana, retirando-lhes o direito à cidadania. Isso fica evidente neste famoso discurso do ministro da comunicação nazista, Goebbels, em que ele diz assim: "Um dia nossa paciência vai acabar e calaremos esses judeus insolentes, bocas mentirosas!"

A semelhança é gritante. Para uma pessoa como Bento XVI, que testemunhou na carne o terror nazista, é fácil identificar uma ditadura quando ela se apresenta, mesmo que de forma velada. Ele comenta: "Quando ouço, hoje em dia, as críticas ao cristianismo pela destruição da identidade cultural de um local, invadido por valores europeus, percebo como as argumentações são semelhantes e muitas frases floreadas me soam familiares" [2].

Os exemplos expostos acima são mínimos perto do que se poderia citar. Trouxemos particularidades do Brasil por motivos óbvios. Mas não é só aqui que as coisas caminham por esse rumo. Nos Estados Unidos, a pré-candidata à presidência, Hilary Clinton, fala abertamente em mudar as bases religiosas americanas, para garantir o "direito" ao aborto. Em outras regiões, pais estão sendo presos simplesmente por se recusarem à compactuar com a ideologia de gênero.

Escutemos as objeções: "Ah, mas a imposição de valores cristãos a um país laico também pode ser considerada uma ditadura". Devagar, senhores. A Igreja não defende nenhum valor religioso para o Estado que antes não seja também um valor universal ao gênero humano. Observem: toda a doutrina moral da Igreja está fundamentada em uma coisa chamada lei natural. E isso por uma razão muito evidente. O direito humano postula um fundamento sólido. Este fundamento, claro, deve ser uma lei inerente ao homem. Não pode estar submetido ao arbítrio da vontade. Ocorre que o direito positivista — defendido por aqueles que negam a lei natural — está baseado puramente na arbitrariedade. E isso traz consequências gravíssimas, pois "onde a razão positivista se considera como a única cultura suficiente, relegando todas as outras realidades culturais para o estado de subculturas, aquela diminui o homem, antes, ameaça a sua humanidade" [3]. Se o direito depende da vontade, logo, as leis estarão submetidas à vontade de quem? Prazer, meu nome é ditadura.

A observação do velho papa sobre a argumentação pomposa dos inimigos do cristianismo requer nossa máxima atenção. Ele está nos alertando: Cuidado, esse discurso é muito familiar. E terminou com seis milhões de mortos nos campos de concentração.

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