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A pobreza, a castidade e a obediência são para todos!

É para combater a idolatria das coisas, das pessoas e do próprio “eu” que existem a pobreza, a castidade e a obediência. E, embora só os religiosos estejam obrigados, por voto, a esse tríplice desapego, todos somos chamados a imitá-los em alguma medida, onde quer que estejamos.

Texto do episódio
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos (Mc 6, 7-13)

Naquele tempo, Jesus chamou os doze, e começou a enviá-los dois a dois, dando-lhes poder sobre os espíritos impuros. Recomendou-lhes que não levassem nada para o caminho, a não ser um cajado; nem pão, nem sacola, nem dinheiro na cintura. Mandou que andassem de sandálias e que não levassem duas túnicas. E Jesus disse ainda: “Quando entrardes numa casa, ficai ali até vossa partida. Se em algum lugar não vos receberem, nem quiserem vos escutar, quando sairdes, sacudi a poeira dos pés, como testemunho contra eles!” Então os doze partiram e pregaram que todos se convertessem. Expulsavam muitos demônios e curavam numerosos doentes, ungindo-os com óleo.

A Igreja nos propõe neste 15.º Domingo do Tempo Comum o evangelho de São Marcos, capítulo 6, versículos 7–13, nos quais Jesus chama os doze Apóstolos por Ele escolhidos e os envia de dois em dois, dando-lhes poder sobre os espíritos impuros. Os Apóstolos então partem com o poder de curar doentes, expulsar demônios e pregar a Palavra de Deus; antes, porém, Jesus lhes deixa algumas recomendações, lembrando-os de que os pregadores não devem pregar apenas um conteúdo correto, mas seguir um estilo de vida.

Os Apóstolos devem ser desapegados, e, para ensinar o desapego, Jesus manda que levem nada para o caminho, a não ser um cajado, nem pão, sacola ou dinheiro: Ide de sandálias e não leveis duas túnicas. São recomendações práticas a que, é evidente, não precisamos obedecer literalmente, porque o que Jesus está querendo ensinar é outra coisa. A Igreja, ao interpretar esse Evangelho, nos dá uma dica logo na primeira leitura, que aos domingos serve sempre de chave de leitura para o Evangelho. Hoje, ela é tirada do profeta Amós.

Amós, um homem simples que vivia da criação de gado e de sicômoros, é chamado por Deus para profetizar, mas quando ele começa a atuar no reino de Israel, ou seja, na parte norte da Terra Santa, o sacerdote Amasias, crendo-se o “profeta oficial” do reino, o repreende por “ocupar seu território”: Aqui em Betel vive o rei de Israel, e tu queres profetizar? Vai para o sul, para Judá, e encontra quem te queira pagar tuas profecias!

Mas o que é um profeta? O que é um Apóstolo, enviado para profetizar, isto é, para ensinar o Evangelho com autoridade divina? É, antes de tudo, um homem que se deixa mover por Deus. Ninguém é verdadeiro profeta se é movido por outros interesses, como o dinheiro, por exemplo. 

Infelizmente, há quem pense o contrário. No entanto, alguém movido pelo dinheiro não irá pregar realmente o Evangelho. Por quê? Porque dirá aos outros o que querem ouvir, não o que Deus lhes quer dizer. O sacerdote de Betel, Amasias, profetizava na corte do rei, mas era o rei quem lhe pagava para profetizar. Ora, o que Amasias lhe dizia? O que o rei queria ouvir. É assim: quem se torna dependente no dinheiro deixa de ser livre, porque passa a ter patrão, dono.

Livre é o pobre do Evangelho, isto é, o que faz voto de pobreza. Eis o homem livre. Por isso a Igreja Católica, durante séculos, incomodou imperadores, reis, políticos, lordes, senhores feudais, empresários, burgueses etc., porque sempre contou com homens pobres, que não tinham nada a perder. Sim, o voto de pobreza faz os homens livres, porque já não se preocupam com dinheiro. Quem se preocupa não prega o que Deus quer, mas filtra apenas o que pode agradar ao público. É a primeira lição que podemos tirar deste Evangelho.

Há mais, porém. Num nível de leitura mais profundo, vemos que a liberdade interior do profeta é para todos, mesmo que não sejam profetas ou pregadores do Evangelho. A liberdade interior, afinal de contas, é necessária para a vida de oração. De fato, a única diferença entre o simples fiel que reza e o pregador é que o primeiro ouve a Deus e, no máximo, ensina os filhos e alguns amigos, isto é, tem uma forma de propagar o Evangelho mais limitada, enquanto o pregador alcança um público maior. Mas, no fundo, todo cristão é profeta. 

Sabemos disso pelo Batismo, graças ao qual recebemos uma participação nos três múnus de Jesus Cristo, sacerdote, profeta e rei. Com efeito, todo batizado é, de alguma forma, sacerdote, profeta e rei. Não se trata, obviamente, de uma participação idêntica à do sacerdote ordenado, mas guarda com ela certa semelhança. Todo cristão, de alguma forma, tem de criar em seu coração um espaço de liberdade interior para ouvir a Deus. Por quê? Porque, no fundo, quem não cultiva essa liberdade terá, nas encruzilhadas da vida, de optar entre Deus e o dinheiro, ou outros ídolos.

A vida da Igreja elaborou os conselhos que Jesus deu aos Apóstolos na forma do que chamamos de conselhos evangélicos. O que são eles? São um estilo de vida de combate à idolatria. A pobreza é um meio de combater o amor desordenado ao dinheiro e aos bens materiais, amor que nos torna surdos à voz de Deus. O monge e a monja, o frade e a freira, o religioso e a religiosa com voto de pobreza o vivem de forma mais explícita, mas o chamado é o mesmo para todo cristão, porque todos devem combater a idolatria do dinheiro: Não podeis servir a Deus e ao dinheiro.

No entanto, a independência dos bens materiais, embora seja o que move a sociedade atual, é a mais fácil de conseguir. Não é tão complicada, porque a gente se acostuma a viver na pobreza. A gente está acostumada a ter smartphone, computador etc., mas se a vida impuser restrições, a gente se acostuma a viver de arroz, feijão e ovo frito. Sofre-se um pouco no início, mas não “arranca pedaço”. Como dizia São Paulo: Eu sei viver na abundância e na penúria.

Embora, pois, seja a mais terrível hoje em dia e também a mais universal, a idolatria do dinheiro não é a mais difícil de superar. Existe outra pior: a idolatria do prazer, principalmente do prazer sexual. Essa já é um pouco mais penosa. Por quê? Porque há uma série de situações afetivas, emocionais, carências etc. — desordens próprias do pecado original — das quais é mais difícil se livrar.

A avareza, a ganância e a cobiça não têm raiz na natureza animal do homem. Olhemos para o mundo dos animais. Nenhum animal tem necessidade de dinheiro, nenhum animal tem ganância e cobiça de acumular bens. Isso não existe. No nosso cérebro não há algo que nos torne dependentes do dinheiro, mas nele há algo que nos imuplsiona em direção ao sexo e ao prazer, o que pode ser uma pedra de tropeço para muitos.

A Igreja combate isso como? Com o voto de castidade. Os religiosos vivem o voto de castidade. Até os padres diocesanos, que não têm voto de pobreza, têm voto de castidade. Mas também o casado, também o solteiro precisa viver a castidade porque ninguém pode pôr o sexo no lugar de Deus. Se queremos ter vida espiritual e ouvir de Deus o que Ele quer de nós, precisamos ordenar nossa sexualidade. Precisamos pedir a Deus a graça da castidade.

O que fazer concretamente? Temos, por exemplo, vários conselhos da Igreja: por exemplo, guardar os olhos, não ficar olhando as pessoas como se fossem mercadoria sexual, principalmente nas redes sociais; controlar as fantasias nem ficar pensando em sexo. O sexo não foi feito para ser pensado, mas realizado quando um homem e uma mulher, unidos em santo matrimônio e abertos à vida, estão diante um do outro na intimidade do quarto.

Se, portanto, o combate à idolatria das coisas é o espírito do voto da pobreza, o combate à idolatria dos corpos é o espírito do voto da castidade. Mas não existe somente a dependência sexual. Às vezes colocamos pessoas ou relações afetivas no lugar que pertence a Deus. Também aqui precisamos ter independência interior, se queremos ser homens de vida espiritual. Quantas vezes nos pomos a rezar, e logo nos invadem o pensamento inúmeras pessoas a quem nos apegamos ou por quem nos preocupamos… Não é raro que as estejamos pondo no lugar de Deus.

O terceiro voto é o mais difícil: o voto de obediência. Por quê? Porque ele combate uma idolatria ainda mais radical, mais interior, que é a idolatria do eu: eu me pus no lugar de Deus — “Seja feita a minha vontade, assim na terra como no céu”. Ora, quem quer ouvir a Deus precisa, antes de tudo, parar de ouvir a si mesmo!

Por quê? Porque, na oração, é preciso estar disposto a mudar de ideia, a que Deus diga o contrário daquilo que se quer ouvir, a que Deus diga algo que incomode, a que Deus peça aquela “reserva técnica” que não se quer entregar, aquele “tudo, menos isso…”. 

O que é esse “menos” que não queremos entregar? Começamos a colocar coisas ou pessoas no lugar de Deus, quando não a nós mesmos! E se Deus não faz o que queremos, revoltamo-nos, enquanto o diabo se aproveita e nos sussurra ao pé do ouvido: “Onde está o teu Deus? Se Ele te ama, por que não faz o que pedes?” Ora, quem disse que Deus fará sempre o que pedirmos? Jesus nunca o prometeu a ninguém, mas disse: Renuncia-te a ti mesmo, toma a tua cruz dia após dia e segue-me. Esse é o voto de obediência de todo o mundo. Quem quiser me seguir renuncie a si mesmo. Renunciar é dizer não aos próprios caprichos, vontades e veleidades.

Deus faz sempre algo maravilhoso conosco: Ele nos contraria. Todo dia tem suas contrariedades. Não há dia que saia do jeito que planejamos. Os problemas se sucedem. Quando tudo parece finalmente acertado, surge algum negócio não resolvido: problemas de saúde, problemas de família, problemas de dinheiro…  Contrariedades! Mas tudo ficará diferente se soubermos transformá-las em amor. — Sim, há em nós um homem velho que precisa morrer.

Jesus, no Evangelho deste domingo, envia os Apóstolos para evangelizar. Com isso, Ele está mais preocupado em evangelizar os doze do que evangelizar os evangelizados! Jesus está querendo salvar a alma dos Apóstolos e prepará-los para ser as colunas sobre as quais irá edificar a Igreja.

Quando Deus nos coloca na posição de mestres para ensinar alguém, a primeira coisa que Ele quer é que nós mesmos aprendamos; quando Deus nos manda evangelizar, a primeira coisa que Ele quer é que nós mesmos sejamos evangelizados; quando Deus nos manda santificar, a primeira coisa que Ele quer é que nós mesmo sejamos santificados. 

Um pai que está tentando ensinar algo ao filho precisa entender que ele mesmo precisa aprender muitas coisas de Deus; uma mãe que está tentando mudar a vida de um filho precisa entender que é ela quem, em primeiro lugar, tem de mudar de vida conforme o desejo de Deus. Ninguém pode transformar os outros se não houver sido transformado antes!

O Evangelho, de fato, nos transforma por dentro para sermos cristãos, sal da terra e luz do mundo, para evangelizar e fazer as pessoas diferentes. Deus nos dá para isso poder e graça. Jesus não enviou os Apóstolos sem lhes dar o poder da graça: poder de desapegar-se, poder de fechar os ouvidos aos ídolos do dinheiro, da opinião alheia etc. e abri-los à voz de Deus. É um grande poder para combater os três inimigos da alma, que são o diabo, o mundo e a carne.

Demos graças a Nosso Senhor, porque Ele fez de nós evangelizadores. Ele quer que todos sejamos profetas, ou seja, homens desapegados dos ídolos, que optaram por fazer a vontade de Deus. Que possamos verdadeiramente dizer: “Senhor, seja feita a vossa vontade assim na terra, no meu coração, como ela é feita no céu pelos anjos e santos”.

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