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A semente divina - Gaudium et Spes

O Concílio Vaticano II é o 21º da Igreja Católica e assim deve ser lido: em consonância com os outros vinte concílios anteriores, pois ele não anula os ensinamentos passados, nem os substitue, mas é apenas um documento que expressa o ensinamento de sempre numa linguagem mais acessível ao homem moderno.

Texto do episódio
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A Constituição pastoral sobre a Igreja no mundo contemporâneo “Gaudium et Spes”, do Concílio Vaticano II, traz em seu texto uma expressão muito utilizada para denegrir o próprio Concílio. Eis:

Professando a sublimidade da vocação do ser humano e reconhecendo como que uma semente divina semeada nele, o sagrado Sínodo oferece ao gênero humano sua colaboração sincera para instituir aquela fraternidade de todos que corresponda a essa vocação. (GS 03)

Muitos alegam que a expressão em destaque remete a uma heresia gnóstica, e que o CVII, ao utilizá-la, está introduzindo um conceito errôneo no seio da Igreja.

A heresia gnóstica afirma que existe na alma humana uma centelha divina. Para eles, existe um deus bom e um deus mal, o demiurgo, aquele que criou o mundo material, portanto, ruim. O deus bom, que criou as coisas espirituais, portanto, boas, teria deixado cair essas fagulhas da sua divindade, que foram aprisionadas pelas almas humanas. Portanto, o homem possuiria em si mesmo partículas da divindade, sendo também divino. Esta é a doutrina herética. Mas, é isso que está dizendo o texto do Concílio Vaticano II?

Evidentemente, o CVII não foi escrito em português. Assim, para saber o que realmente foi escrito é preciso recorrer ao texto original, em latim:

“Ideo Sacra Synodus, altissimam vocationem hominis profitens et divinum quoddam semen ineo insertum asseverans, …”

Existe, portanto, no ser humano, uma certa semente divina, é isso que o CVII está falando de forma clara, ainda que se utilize de uma analogia, de uma metáfora. O contexto chama a atenção para o fato de que todo ser humano, por ter alma, tem algo espiritual e que provém de Deus. A alma foi criada por Deus do nada, isto é doutrina católica. Veja o que diz o Catecismo da Igreja Católica:

O homem: com sua abertura à verdade e à beleza, com seu senso do bem moral, com sua liberdade e a voz de sua consciência, com sua aspiração ao infinito e à felicidade, o homem se interroga sobre a existência de Deus. Mediante tudo isso percebe sinais de sua alma espiritual. Como ‘semente de eternidade que leva dentro de si, irredutível à só matéria’, sua alma não pode ter origem senão em Deus. (CIC 33)
A Igreja ensina que cada alma espiritual é diretamente criada por Deus - não é ‘produzida’ pelos pais - e é imortal: ela não perece quando da separação do corpo na morte e se unirá novamente ao corpo na ressurreição final. (CIC 366)

Assim, o homem realmente tem uma semente divina, não porque seja uma centelha oriunda da divindade por emanação, mas sim algo de divino porque foi criada diretamente por Deus. Quando um novo ser é formado, por meio da fecundação, compõe-se com metade da mãe e metade do pai, porém, a alma vem inteiramente de Deus. Criada do nada e infundida por Deus no novo ser. Retomando o texto conciliar, em seu número 18, e estando refletindo sobre a morte, diz:

O germe da eternidade que nele existe [no homem], irredutível à pura matéria, insurge-se contra a morte. [...] Enquanto, diante da morte, qualquer imaginação esvanece, a Igreja, ensinada pela revelação divina, afirma que o homem foi criado por Deus para um fim bem-aventurado, para além dos limites da miséria terrena.

O conceito de imortalidade da alma não pertence apenas aos cristãos, pelo contrário, é uma convicção humana que se encontra também nas filosofias pagãs, tais como de Sócrates, de Aristóteles, Platão; e, se explica, justamente por essa semente, esse germe de eternidade mencionado pela Gaudium et Spes. É a alma que vem de Deus.

Portanto, nada há de gnóstico nessa expressão utilizada pelo CVII.

Um ponto que deve ser esclarecido, para finalizar, é o esforço do Papa Bento XVI em propor uma hermenêutica do CVII em sintonia com aquilo que é tradição de dois mil anos da Igreja.

O Concílio Vaticano II é o 21º da Igreja Católica e assim deve ser lido: em consonância com os outros vinte concílios anteriores, pois ele não anula os ensinamentos passados, nem os substitui, mas é apenas um documento que expressa o ensinamento de sempre numa linguagem mais acessível ao homem moderno.

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