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Texto do episódio
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 13, 16-17)

Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: “Felizes sois vós, porque vossos olhos veem e vossos ouvidos ouvem. Em verdade vos digo, muitos profetas e justos desejaram ver o que vedes, e não viram, desejaram ouvir o que ouvis, e não ouviram”.

Celebramos com grande alegria a memória dos avós de Nosso Senhor Jesus Cristo, os pais de Nossa Senhora: São Joaquim e Sant’Ana. Celebrá-los é celebrar a promessa de Deus realizada. Quando Cristo veio ao mundo, Deus realizou o seu projeto, o seu decreto eterno de amor pela Encarnação do Filho; mas, ao realizar essa vontade salvífica de mandar o Filho ao mundo, Deus realizou também uma série de outros atos unidos a esse decreto, a essa vontade e decisão divinas. Deus, ao decidir que o seu Filho eterno, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, iria encarnar-se, decidiu também todas as circunstâncias em que isso iria acontecer. É por isso que, desde a antiguidade, foi prometida uma descendência a Davi. Foi prometido que dele viria o Salvador. Assim, ao longo dos séculos, toda a tribo de Judá (isto é, os descendentes de Davi) esperava o Salvador que dela viria. Hoje vemos acontecer maravilhosamente a promessa de Deus, e de uma forma muito mais abundante, muito mais generosa e especial do que jamais poderíamos imaginar: o Messias prometido não é só o Messias, é o próprio Deus que vem habitar entre nosso meio, assumindo a natureza humana no ventre de uma mulher perfeitíssima, a Virgem Maria, concebida imaculada, sem nenhuma mancha do pecado, em superabundância de graças. Ela é a gratia plena, κεχαριτωμένη, aquela que é a cheia de graça. Cristo vem ao mundo não para morar no meio dos espinheiros ou no deserto, mas num jardim belíssimo, no jardim das delícias de Deus: na Virgem Maria. Tota pulchra es, Virgo Maria, “tu és toda bela, ó Virgem Maria”! É ali, nesse belíssimo jardim de amor, no Coração imaculado de Nossa Senhora, que o Verbo de Deus vem ser plantado.

Essa é a nossa fé, e por ela vemos o quanto é eleito esse casal, São Joaquim e Sant’Ana, escolhidos por Deus para ser os pais felicíssimos da Virgem Maria. Já velhinho, quando Sant’Ana, humanamente falando, não podia mais conceber, São Joaquim, que nada mais esperava de uma descendência, recebe a revelação de que Deus fará um milagre. Em obediência ao anjo que lhe revelou que ele teria uma filha, Joaquim retorna para a esposa e volta a ter intimidade com ela. Assim nasce a Virgem Maria. Mas esse milagre, que é um milagre de natureza (uma mulher já envelhecida concebe e dá à luz uma filha), é somente uma sombra diante do milagre extraordinário que Deus opera no ventre de Sant’Ana. Dentro da barriga dela acontece a Imaculada Conceição, ou seja, no momento em que Sant’Ana concebe Maria, ou seja, no exato momento em que a Virgem passa a existir, Deus realiza o maior de todos os portentos e milagres da graça: o milagre de que ela tem uma graça tão abundante, que é maior do que a graça de todos os santos e anjos do céu. O maior milagre da graça para uma pessoa humana aconteceu no ventre de Sant’Ana. É claro que o milagre da Encarnação do Verbo é muito maior, mas falamos aqui de pessoas humanas. O maior milagre aconteceu no ventre de Sant’Ana! A superabundância da graça divina foi derramada na barriga dela sobre a Virgem Maria. Por isso é agraciado esse casal, São Joaquim e Sant’Ana, e por isso nós somos felizes ao venerar e recorrer à intercessão dele. Foram muito amados por Nossa Senhora, e, evidentemente, Jesus tem no céu um lugar de honra e privilégio para os pais de sua Mãe bendita e cheia de graça. Deus escolheu esse casal. — Que Ele, pela intercessão de São Joaquim e Sant’Ana, abençoe também nossas famílias. Peçamos a graça de, pela intercessão desse santo casal, realizarmos a vontade de Deus trazendo ao mundo filhos e filhas felizes — felicíssimos porque cumpridores da vontade de Deus.

* * *

A finalidade dos sermões parabólicos de Nosso Senhor não parece ser outra além da que flui tanto da economia de seu ministério (evangelizar os pobres: cf. Lc 4, 18) quanto da natureza de uma parábola, i.e., propor e descrever, a partir de algo sensível tomado da natureza (v.gr., um grão de mostarda, os lírios do campo) ou da sociedade humana (v.gr., as bodas de um filho, o arrendamento de uma vinha), uma verdade de ordem superior em matéria de fé ou moral.

Há no entanto uma passagem dos sinóticos que parece contradizê-lo. É aquela em que Jesus, após a parábola do semeador, responde aos discípulos por que falava às multidões por semelhanças e figuras, como se lê em Mt. (13, 13): Porque vendo não veem, e ouvindo não ouvem nem entendem. E cumpre-se neles a profecia de Isaías (6, 9): Ouvireis com os ouvidos, e não entendereis etc.; em Mc. (4, 12): Para que, olhando, vejam, e não vejam: e, ouvindo, ouçam, e não entendam,; e em Lc. (8, 10): Para que vendo não vejam, e ouvindo não entendam.

A esse respeito, os intérpretes católicos não seguem em tudo a mesma opinião:

a) Quanto à natureza das parábolas. De fato, para a maioria deles, o gênero parabólico é em si mesmo claro e apto para ensinar com facilidade; para muitos porém é um recurso enigmático, idôneo para ocultar de todo uma doutrina; na opinião de outros, enfim, é uma forma de ensino que em parte oculta, em parte revela o que se pretende transmitir.

b) Quanto ao tempo em que o método parabólico começou a ser usado por Cristo, i.e., se foi inaugurado no sermão no lago ou já antes dele.

c) Quanto à relação entre Cristo e as multidões, i.e., se no tempo em que as parábolas foram propostas no lago a condição das turbas era pior ou se manteve substancialmente a mesma que dantes.

É natural, por conseguinte, que, respondendo de várias formas à questão acima proposta, alguns defendam a tese da justiça, outros, ao contrário, a tese da misericórdia, enquanto outros, enfim, prefiram uma via média entre ambas as alternativas.

α) Tese da justiça: O gênero parabólico, por sua própria natureza, é obscuro e enigmático. Cristo usou desta forma literária “não para que os ouvintes o compreendessem melhor, mas para que fossem punidos com uma pregação enigmática os que não queriam crer nele quando falava aberta e claramente” (Maldonado, In Mc 4, 13); logo, quis explicitamente punir a má vontade dos judeus. É o que parecem sugerir Mc. e Lc. pelo uso da partícula final ἵνα (lt. ut, pt. “a fim de que”).

A versão de Mc., portanto, deve ser interpretada em sentido óbvio: Falo em parábolas com a intenção de que, olhando, vejam a imagem, e não vejam, i.e., não captem sua verdade; e isso é feito de sorte que não (gr. μήποτε, lt. nequando, pt. “para que nunca”) se convertam etc. Com essas palavras, promulga-se a rejeição definitiva (ou ao menos temporária) do povo. O que pouco depois diz o mesmo evangelista, conforme o permitia a capacidade dos ouvintes (4, 33), equivale a: conforme eram dignos de entender. As palavras de Mt., por sua vez, revelam não só um fato, mas também a vontade perversa do povo: Falo-lhes em parábolas porque, vendo, não veem, i.e., porque, embora certamente vejam, não querem contudo entender…, e assim fazem para não suceder que se convertam (13, 14), i.e., por repugnância à conversão. Confirma-o, por último, aquele provérbio em Mt 13, 13 e Mc 4, 25: Ao que tem lhe será dado, mas ao que não tem até o que tem lhe será tirado, i.e., “ao que quer entender e crer lhe falo claramente, sem parábolas, para que entenda cada vez mais; aos que não querem crer e entender, porém, lhes falo por parábolas e tão obscuramente, que, mesmo que queiram, não entendem” (Maldonado).

Embora conte com grandes defensores, essa opinião: 1) parece demasiado dura e pouco conforme à benignidade do Senhor, que veio salvar o que tinha perecido (cf. Lc 19); 2) exagera em excesso a obscuridade das parábolas, como se fossem todas incompreensíveis; 3) supõe uma causa (a dureza e a malícia das turvas) que dificilmente se pode concluir dos evangelhos.

β) Tese da misericórdia: As parábolas, conquanto sejam um gênero de discurso “indireto” e velado, são não obstante um instrumento pedagógico. Foi pois com o único propósito de ensinar que o Senhor, não só no lago, mas desde o início de sua pregação se serviu delas (cf. Mc 2, 19ss; 3, 23ss). Ao Mestre não se pode atribuir qualquer intenção de falar obscuramente, mas somente a de acomodar-se à capacidade dos ouvintes, para que homens lentos de entendimento e pouco idôneos para compreender as coisas divinas entendessem o que lhes era dito. Uma pregação mais clara e direta, com efeito, daria lugar aos maiores inconvenientes. Além disso, que de fato tanto os Apóstolos quanto as multidões não captassem às vezes o sentido das parábolas não se deve à natureza delas nem à intenção de Cristo, senão que é um efeito colateral e per accidens devido à relativa obscuridade do antítipo, à incapacidade ou à preguiça dos ouvintes que negligenciavam aprofundar-se na doutrina. Afinal, Cristo estava sempre preparado para explicar a verdade com maior clareza a quantos lho pedissem. — Assim pensam muitos autores, fundados menos nas palavras do Evangelho que: 1) na noção de parábola, 2) no caráter misericordioso de Cristo e de sua missão salvífica e 3) nas disposições das multidões, de modo algum avessas à pessoa e à doutrina de Cristo. — Mt. é o que melhor traduz as intenções do Senhor: Falo em parábolas porque (gr. ὅτι, lt. quia), de outra forma, vendo, não veem e, ouvindo, não ouvem nem entendem; de fato (καί declarativo), cumpre-se neles a profecia de Isaías etc.

O trecho de Mc., para que, vendo, vejam e não vejam, que parece contradizer essa opinião, admite uma interpretação mais benigna, se à partícula ἵνα se atribuir: 1) mero valor consecutivo (ἵνα ecbático = ὥστε = “de modo que”), ou o sentido da fórmula usual ἵνα πληρωθῇ (para que se cumpra…), ou também 3) significação causal (ἵνα aitiológico = ὅτι, διότι, διά τοῦτο ὅτι = “porque, porquanto, já que” etc.), como em Mt. Ainda que não desapareça de todo a obscuridade, em outro lugar Mc. declara claramente qual é o objetivo das parábolas: falava (Cristo) em parábolas conforme o permitia a capacidade dos ouvintes, i.e., segundo lhe permitiam falar a ignorância e a limitada capacidade das turbas.

Com respeito à passagem de Isaías (cf. 6, 9s), 1) no texto original não há que entendê-la em sentido causativo, pois seria a um tempo contra a santidade de Deus e a missão do profeta; mas num sentido atenuado, referido a algo previsto e permitido, i.e., às consequências efetivas do ministério profético. Sobre isso vale notar que a forma hebraica hiph‘il, por si, é de fato causativa, mas pode significar também ocasião e permissão; além disso, é sabido que os semitas não costumavam distinguir entre causalidade estrita e ocasião ou permissão, como o provam inúmeros exemplos (cf. Ex 9, 2; Dt 2, 30 etc.); — 2) no mesmo sentido, há que tomar este caso: a dureza de coração é ocasião para a pregação parabólica e causa de maior endurecimento, por conta da instrução desprezada.

γ) Alguns propõem ainda uma opinião mista. A pregação em parábolas seria primária e essencialmente uma obra de misericórdia: destinava-se, com efeito, à instrução dos ouvintes; mas satisfazia também às exigências da justiça, na medida em que Cristo, ao não falar abertamente, quis de certo modo, com este gênero literário obscuro, punir a má ou ao menos indolente disposição dos ouvintes, negando-lhes uma instrução clara (devida?). “Deus cega não ajudando” (Agostinho, In Ioh. tr. 53, 6).

Para evitar toda confusão, deve-se notar o seguinte:

1) As parábolas de Cristo, por sua própria natureza, eram aptas para ensinar a verdade e, não raro, fácies de entender (cf., v.gr., as parábolas morais). — 2) Como se vê pela índole delas, pelo espírito pedagógico que anima todo o Evangelho e pelo próprio costume dos rabinos, era quase sempre com esse propósito que o Senhor as contava. — 3) Às vezes, porém, sobretudo quando há nelas elementos alegóricos, algumas parábolas requerem explicação para ser compreendidas, em razão dos conceitos espirituais nelas contidos (i.e., em razão do antítipo: cf. Mt 16, 6ss; Mc 4, 13; 7, 14ss). — 4) É fato, ademais, que Cristo deixou inexplicadas algumas locuções figuradas e parábolas alegóricas, com o fim de expor a doutrina do reino de maneira enigmática, sob o manto de certa obscuridade. Atestam-no explicitamente os evangelistas, ao menos no caso das parábolas do lago (cf. Mt 13, passim) e nas parábolas sobre a verdadeira pureza (cf. Mt 15, 10ss), embora seja provável que o Senhor o tenha feito noutras ocasiões.

Se, por outro lado, se pergunta pela razão deste modo de agir, parece que se deve responder o seguinte:

α) Cristo não agiu assim para punir com “enigmas” a maldade dos ouvintes, pois, como sabiamente nota São João Crisóstomo: “Se não queria que ouvissem, convinha antes calar, e não falar em parábolas” (In Matt. hom. 45 [al. 46], 2: PG 58, 473).

β) Enquanto instrumento de ensino e esclarecimento em geral, Cristo serviu-se deste método para tornar até certo ponto “perceptíveis” a profundidade e a novidade de sua doutrina a um povo de capacidade limitada e desigual. E o que Ele disse depois aos Apóstolos: Tenho ainda muitas coisas a dizer-vos, mas não as podeis compreender agora (Jo 16, 12), nada impede que o tenha dito outras vezes também às multidões. Eram, com efeito, totalmente incapazes de receber uma instrução mais clara, como atesta Mc. (4, 33). Assim, para não privá-las de alguma instrução, mas também para não revelar claramente os mistérios do reino a quem ainda não os podia compreender direito, escolheu falar em parábolas. Logo, a cegueira do povo foi motivo ou ocasião para as parábolas, mas não constituía a finalidade delas; noutras palavras, as parábolas não causavam cegueira, mas eram propostas por causa dela.

γ) Enquanto instrumento de ensino indireto e de iluminação imperfeita, sobretudo no caso das parábolas inexplicadas e alegóricas, Cristo serviu-se deste método a fim de provar as disposições dos ouvintes e estimular neles a boa vontade, insinuando-lhes por figuras as verdades do reino e suscitando o desejo de um conhecimento mais pleno, se porventura se aproximassem para lhes fazer perguntas e, assim, aprendessem outras coisas.

Por má vontade, os fariseus realmente sentiram ódio e inveja de Cristo mais de uma vez; as turbas, por outro lado, sonolentas e preguiçosas, desinteressaram-se por uma instrução mais clara e profunda, enquanto aos Apóstolos e aos outros discípulos (cf. Mc 4, 10), porque interrogavam o Mestre, Ele tudo explicava em particular (Mc 4, 34). Daí que, por ocasião das parábolas no lago, se faça distinção entre, de um lado, os Apóstolos e os outros que estavam em torno de Jesus (οἱ περὶ αὐτὸν: cf. Mc 4, 10) e, de outro, “os demais” (Lc.), ou “aqueles que são de fora” (Mc.). Àqueles, porque interrogavam depois o Mestre, foi dado conhecer os mistérios, i.e., a doutrina do reino de Deus; a estes porém não foi dado, senão que tudo se lhes diz em parábolas.

δ) Portanto, os diferentes efeitos das parábolas não devem de modo algum ser atribuídos à intenção positiva de Cristo nem à natureza das parábolas, que é objetivamente a mesma para todos, mas às diferentes disposições dos ouvintes, sobretudo daqueles que, por desprezo ou negligência, não buscavam instruções mais claras. As parábolas, de resto, eram aptíssimas para tornar manifesta essa diversidade de disposições: Este Menino está posto para ruína e ressurgimento de muitos em Israel e para ser alvo de contradição… Assim se descobrirão os pensamentos escondidos nos corações de muitos (Lc 2, 34s). Cristo, por sua vez, portou-se de maneira negativa, na medida em que livremente deixava de explicar os pontos mais obscuros, deixando o problema à boa (ou má) vontade dos ouvintes.

Conclusão: Cristo ocultou de certo modo a doutrina do reino, não para deixar cegas as turbas, mas para lhes insinuar a verdade e estimular o desejo de uma compreensão mais plena. Assim, não lhes revelando abertamente os mistérios, como no sermão da montanha, evitava a um tempo lançar o que é santo aos cães e induzir os ouvintes que se criam já muito instruídos a maior soberba ou à infidelidade. É mais correto dizer, pois, que Cristo falava às turbas em parábolas, não para que não entendessem e ficassem cegas, mas porque eram cegas e, às vezes, pouco dispostas a acolher as verdades do reino. — Este como que ocultamento da verdade procedia não tanto da vontade de Cristo como da indisposição dos ouvintes. Por isso é necessário distinguir: a) aos discípulos e israelitas piedosos, que buscavam a verdade e a justiça, as parábolas serviam como instrumento, não de punição, mas de iluminação; b) aos escribas e fariseus, que buscavam qualquer palavra mal colocada para acusar o Mestre, a pregação enigmática tinha como efeito (quase per accidens) ocultar de fato a verdade, para que não fossem atiradas aos porcos as pérolas da doutrina divina (cf. Mt 7, 6).

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