Rodrigo de Abreu, conhecido hoje como “Tiffany”, pode, sim, jogar a Superliga feminina de vôlei. Essa foi a conclusão da comissão médica da Federação Internacional de Vôlei (FIVB), que se reuniu na última quarta-feira (24), em Lausanne, na Suíça, para reconsiderar o problema e emitir um novo parecer. O caso havia gerado muitas críticas de jogadoras e treinadores, o que obrigou a FIVB a se posicionar outra vez.

Algumas coisas chamam a atenção. A nota divulgada pela comissão médica da FIVB reconhece que a participação de transgêneros nos esportes femininos deve ser amplamente discutida, “a fim de garantir que qualquer decisão tomada pela FIVB seja baseada nos dados e conhecimentos mais recentes nesta área”. Para o secretário-geral da federação, o brasileiro Luis Fernando Lima, o tema é complexo e deve causar um “impacto definitivo” nos esportes.

Até aí, tudo bem. Não há dúvida de que um tema como esse precisa ser tratado com prudência e considerado a partir de uma visão ética e científica. Assim como a educação, a política e a cultura, os esportes também têm um papel social e não podem servir a fins ideológicos, principalmente quando essas ideologias ameaçam o direito natural e o patrimônio histórico de uma sociedade.

Acontece que a FIVB fez exatamente o oposto do que recomenda em sua nota. A comissão médica reuniu-se “a toque de caixa” para, em poucas horas, ratificar uma decisão altamente questionável e complexa. Se estivesse mesmo “empenhada em estudar mais esta questão”, como diz a nota divulgada por sua comissão médica, a FIVB não teria permitido uma situação que, a curto e longo prazo, pode não somente prejudicar as mulheres, mas o esporte e a sociedade como um todo. Tudo isso dá a entender que o objetivo da reunião não era realmente debater o problema e ouvir as críticas dos atletas e treinadores, mas apenas seguir com a agenda ideológica da “teoria de gênero.

Vejamos este outro trecho da nota: “O objetivo [da reunião] é assegurar tanto em competições de quadra como de praia que se respeite a escolha individual de uma pessoa, ao mesmo tempo que assegure condições equitativas no campo de jogo”. Como é? Respeitar a escolha individual de uma pessoa? Que significa isso?

Para compreender o objetivo da FIVB, é preciso recordar a regra do Comitê Olímpico Internacional que, em 2015, liberou a participação de transgêneros nos esportes. O texto diz o seguinte: “Para preservar a justa competição, não é necessário exigir do atleta a cirurgia de mudança física como uma pré-condição para a participação nos jogos, pois isso pode ser contrário ao desenvolvimento da legislação e das noções de direitos humanos” (grifos nossos). O COI apresenta ainda outras regras para homens que desejam competir em times femininos:

  • O atleta deve declarar que sua identidade de gênero é feminina. Essa declaração não pode mudar, para fins esportivos, por um mínimo de quatro anos (grifos nossos);
  • O atleta deve demonstrar que seu nível total de testosterona no sangue está abaixo de 10 nmol/L há pelo menos 12 meses antes de sua primeira competição (para um período superior a este, será necessário basear-se em uma avaliação confidencial caso a caso, considerando se 12 meses são ou não tempo suficiente para diminuir qualquer vantagem nas competições femininas);
  • O nível total de testosterona do atleta deve permanecer abaixo de 10 nmol/L por todo o período da elegibilidade desejada para competir na categoria feminina;
  • O cumprimento dessas condições pode ser monitorado por meio de testes. Caso não sejam cumpridas, a elegibilidade do atleta para a competição feminina será suspensa por 12 meses.
Fallon Fox se tornou um caso emblemático de transgêneros nos esportes.

O absurdo é flagrante. O Comitê Olímpico Internacional (COI) sempre foi extremamente rigoroso, punindo com severidade os atletas reprovados no exame antidoping. Desde as categorias de base (a partir dos 15 anos), os esportistas têm de provar regularmente que não sofreram nenhuma mudança física inadequada, seja por causas naturais ou artificiais. Em 2017, a delegação olímpica da Rússia foi totalmente banida dos Jogos Olímpicos de Inverno — que serão realizados em Pyeongchang (Coreia do Sul), nos próximos dias 9 a 25 de fevereiro —, após a descoberta de seu sistema de dopagem para aumentar o rendimento dos competidores.

No caso dos esportes femininos, a cobrança é ainda mais rígida. As mulheres são submetidas a testes frequentes para garantir que seus corpos não sejam alterados por testosterona. O COI não admite sequer casos de testosterona endógena, isto é, quando o corpo da mulher produz mais hormônio masculino do que o normal. Atletas que apresentam esse tipo de distúrbio podem perder as medalhas ou mesmo ser excluídas da competição, como aconteceu com a corredora Dutee Chand, que sofria de “hiperandrogenismo” e acabou punida pela Confederação Olímpica, sob a alegação de “não ser uma mulher”. Até exames antigos das atletas são objetos de análise, e o COI pode penalizá-las caso encontre alguma irregularidade não identificada até então.

Apesar do rigor, essas regras do Comitê Olímpico serviam para garantir uma competição limpa, na qual todos estivessem em iguais condições de participação. Elas se fundamentavam precisamente na diferença biológica entre homens e mulheres, que é a coisa mais básica do mundo dos esportes. Não fosse assim, a altura da rede do vôlei, o tamanho da bola de basquete, os recordes de salto com vara etc. seriam os mesmos para as categorias masculina e feminina.

Tudo isso está ameaçado agora. Se a primeira preocupação dos esportes não é mais a biologia humana, mas, como disse a comissão médica da FIVB, “a escolha individual de uma pessoa”, como impedir que atletas como Tiffany participem das competições que bem quiserem, ou que atletas se aproveitem de hormônios ilícitos antes do período previsto para a competição?

As regras do COI para a participação de transgêneros nos esportes são irresponsáveis e servem claramente à ideologia de gênero. O COI substituiu a natureza humana para fortalecer o discurso relativista de que cada um pode ser o que pensa ser, ainda que isso contrarie a realidade. Eis a razão de um transgênero não precisar da cirurgia de mudança de sexo para ter o direito de jogar entre as mulheres; basta a sua declaração e um tratamento prévio que regule o nível de testosterona. Se um homem de 2m afirmar-se mulher e tiver o nível de testosterona adequado ao que prescreve a lei, ele poderá tranquilamente substituir uma jogadora em quadra. O discurso vale mais que a verdade.

O objetivo da “teoria” de gênero — atenção — é acabar com os conceitos de “homem” e “mulher”, acabar com a noção metafísica de pessoa humana, a fim de que tudo se resuma aos interesses emocionais do indivíduo. Assim diz a filósofa Judith Butler, em seu livro Subjects of Desire: “Meu trabalho consiste em delinear a última etapa da batalha filosófica contra a vida do impulso, o esforço filosófico de domesticar o desejo como uma instância de lugar metafísico, a luta por aceitar o desejo como princípio de deslocamento metafísico”.

Toda essa verborragia pretende negar a sexualidade objetiva do sujeito, da pessoa humana, para admitir apenas a noção de que tudo pode mudar conforme os desejos do indivíduo, inclusive o seu “eu”. Para a ideologia de gênero, masculinidade e feminilidade são apenas palavras que não têm ligação com a biologia.

Ora, não é exatamente isso o que está por trás daquela regra do COI, em que se lê: “o atleta deve declarar que sua identidade de gênero é feminina” e “essa declaração não pode mudar, para fins esportivos, por um mínimo de quatro anos”? Aqui se supõe que Tiffany pode voltar a ser Rodrigo, Tiago, Bianca, Rebeca… quantos “eus” Tiffany quiser ser.

No fundo, os jogos olímpicos se transformaram em mais uma plataforma ideológica, que pretende anestesiar o bom senso e emudecer a lei natural do espírito humano. Não é só o legado esportivo que está em jogo, mas a sanidade de uma civilização que, aos poucos, vai transformando erros em verdades e verdades em erros.

É claro que transexuais, assim como qualquer pessoa, são bem-vindos nos esportes. Mas essa sua participação deve ser adequada e livre de qualquer instrumentalização ideológica. No MMA, por exemplo, um ex-militar e ex-caminhoneiro estava “sentando a mão” em mulheres sob a desculpa de que é uma “mulher transgênera”. Não importa que no passado ele tenha construído um corpo masculino e extremamente forte. O que vale é o que ele diz de si mesmo.

Quem não consegue identificar a gravidade do momento prepare-se para, no futuro, ver suas mulheres apanharem de outros homens e não poderem fazer nada para impedi-lo. Afinal de contas, as feministas que inventaram tudo isso dizem que não há maior forma de opressão do que a de ser protegida por um homem. Agora, elas apanham deles e o mundo paga ingresso para aplaudi-los, seja na quadra, seja no octógono.

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