Em 2019, o Papa designou o 3.º Domingo do Tempo Comum como o Domingo da Palavra de Deus. Aparentemente, a iniciativa não teve muita adesão nos bancos das igrejas, provavelmente porque a maior parte dos católicos não os tem frequentado nos últimos anos. Mas fica também o questionamento: “A que mais diria respeito o Domingo, senão à Palavra de Deus?” A Missa inteira gira em torno da Palavra, nas suas orações, nas suas leituras e no altar. Isto, é claro, põe em destaque a intenção específica do Papa para este dia — a saber, que nos atentemos e devotemos mais à Escritura, Palavra escrita de Deus.
As leituras de hoje, em particular, ensinam-nos como ouvir a Palavra de Deus em seu devido lugar: a Liturgia, que é o seu habitat natural.
A Primeira Leitura (cf. Ne 8, 2-10) descreve uma Liturgia da Palavra primitiva. Alguns veem nela o princípio da Liturgia da Palavra judaica (e, por consequência, da católica). Os elementos nos são familiares. O povo se reúne enquanto assembleia. O sacerdote Esdras apresenta-lhes a Lei — isto é, algum texto do Gênesis, do Êxodo, dos Números, do Levítico e do Deuteronômio. Depois, ele explica o texto. Esdras chega a ficar de pé “num lugar mais alto”, “sobre um estrado de madeira, erguido para esse fim” (vv. 4-5). Ele lê e prega “desde o amanhecer até ao meio-dia” (v. 3) — o que também sinaliza, talvez, a impressão que nos deixam algumas homilias.
Com esta assembleia, aprendemos a ouvir a Palavra de Deus na Missa. “Todo o povo escutava com atenção a leitura do livro da Lei” (v. 3). Isto acontece depois que eles regressam do exílio na Babilônia. Aqui está a Palavra de Deus cuja proclamação eles ansiaram tanto por ouvir. Aqui está o relato de sua própria história, de quem eles são, e do que Deus realizou por eles. Aqui estão as palavras que, ouvidas por eles, tê-los-iam livrado das mãos de seus inimigos. Portanto, eles não estão a ouvi-las como parte desinteressada, ou como se o texto fosse alguma relíquia interessante do passado. Eles encontram a si mesmos “dentro” da Palavra e conhecem a si mesmos através dela.
A assembleia também responde: “Todo o povo chorava ao ouvir as palavras da Lei” (v. 9). Choravam talvez por escutar o que tanto desejavam ouvir, e ainda por cima em sua própria terra. Talvez porque ouviam falar da bondade de Deus, e de seus alertas contra a rebeldia que os levou para o exílio. Seja qual for o caso, trata-se de uma resposta de corpo e alma [i], a indicar uma união profunda entre a Palavra e a assembleia.
Nós devemos encontrar a nós mesmos na assembleia de Esdras. Quando ouvimos a Palavra de Deus na Missa, não devemos fazê-lo como ouvintes distantes, alheios. As leituras não são apenas uma narrativa histórica ou filosofia antiga interessante. Elas dizem respeito a nós enquanto povo de Deus. Descrevem a condição humana, a luta contínua que experimentamos entre a bondade divina e a nossa fraqueza. Seja na busca, na inconstância e na rebeldia dos israelitas; seja na alegria e na tristeza do salmista; seja nas virtudes e vícios da Igreja primitiva: em tudo isso nós devemos ver e ouvir a nós mesmos.
Portanto, ao ouvir as leituras na Missa, por favor — eu lhe peço: não se sente no banco da igreja com os braços esticados e as pernas cruzadas, como se a Palavra de Deus fosse proclamada para entretê-lo ou saciar a sua curiosidade, ou como se ela estivesse sujeita à sua aprovação. A Palavra tem a ver com você e com o Deus que salva você. Sente-se com atenção, ansioso por ouvir a sua Palavra, não por criticá-la. E peça ao Espírito que o ajude a receber a verdade que salva.
A conclusão da Primeira Leitura é instrutiva. Esdras e Neemias tentam conter o choro do povo dizendo a eles: “Não fiqueis tristes, porque a alegria do Senhor será a vossa força” (v. 10). De fato, não importa o quão difíceis ou desafiadoras sejam as leituras, a alegria e a gratidão são sempre a resposta mais adequada à palavra de Deus.
É por isso que a Mãe Igreja nos faz responder, depois de cada leitura: Deo gratias — “Graças a Deus”. Observe que esta resposta é dada independentemente de quão fácil ou difícil, consoladora ou desafiadora, tenha sido a leitura. Não nos é dado escolher uma resposta diferente se a leitura não nos agrada. Não, a resposta é sempre de alegria e gratidão. Graças sejam dadas a Deus! — Diga estas palavras de propósito, com vontade, e não como uma reação litúrgica automática. Ao pronunciá-las, você confirma a verdade e a bondade da Palavra de Deus… por mais incômoda que ela tenha lhe parecido.
Avançando rapidamente alguns séculos depois de Esdras, o Evangelho deste domingo (cf. Lc 1, 1-4; 4, 14-21) transporta-nos à Liturgia da Palavra na sinagoga, em um sábado qualquer. Nosso Senhor está ali, a observar todos os protocolos litúrgicos. A exemplo de Esdras, Ele lê a Palavra e depois a interpreta. E é então que se opera uma mudança drástica: Jesus “começou a dizer-lhes: ‘Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabastes de ouvir’” (v. 21). Com isto, ele convidou-os a crer nisto: a Palavra de Deus, no fim das contas, não é um rolo escrito, mas a sua própria Pessoa.
“Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabastes de ouvir”. Longe de limitar-se àquele momento singular na sinagoga de Nazaré, estas palavras tornam-se verdade em cada Missa. E não se trata daquela única passagem, cumprida naquele momento em particular. Toda a Palavra de Deus tem se cumprido e continua a cumprir-se nele. Cristo é o cumprimento contínuo da Palavra que ouvimos. E e este cumprimento que Cristo realiza confirma: a Palavra de Deus é digna de toda a nossa atenção e resposta confiante.
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Riquíssimo! Deus lhes abençoe!
Nossa postura durante a missa é muito significativa.Dou Graças a Deus após ler este texto do Padre Paulo Ricardo.
Sentar-se, displicentimente, denota realmente, q a pessoa não está interessada no q vai ouvir e passa p o orador, uma péssima mensagem ... ninguém, senta na mesa p comer desse jeito...e qdo estamos no banco da igreja, estamos comendo e bebendo o Cristo q, nos salvou da morte eterna. Na santa Missa, estamos no Céu, na terra!
Maravilhoso, obrigada por tanto ensinamento Padre Paulo Ricardo.
Que Deus continue te abençoando, Padre Paulo Ricardo.
Acabei de chegar da Santa missa e nosso reverendo falou exatamente sobre isso! Estar feliz e completo ao ouvir a palavra de Deus
Obrigada Pe.Paulo Ricardo! Peço humildemente sua benção !
Muitíssimo obrigada Pe Paulo!
Sua benção!!
Maravilhoso 😍