“À Espera dos Bárbaros”, poema de Konstantínos Kaváfis sobre o colapso da civilização, descreve uma Roma tão desanimada e desmoralizada, que já quase não possui esperança alguma. Ela se agarra aos bárbaros como a sua última tábua de salvação — há rumores de que as hordas barbáricas se aproximam, sem dúvida para saquear e queimar, mas também para construir, talvez, um novo império a partir das ruínas do antigo.
Mas numa mudança repentina que se assemelha a um soco, Kaváfis puxa o tapete de Roma. Não há bárbaros. De nada adiantará que se reúnam, esperando por ventos e turbilhões fora do reino que venham a determinar o seu destino. Se há qualquer salvação para Roma, ela deve vir de dentro.
Ao observar nossas nações e a Igreja, nós, católicos, nos perguntamos onde foi parar a vitalidade da nossa fé. Onde está o ardor missionário que converterá a América e o mundo? Onde está o ímpeto que deveria levar os católicos de hoje a perseverar na prática da religião e na transmissão de uma fé vibrante para a geração vindoura? Onde estão o destemor e a firmeza das eras da fé, que eram como anéis de luz a cingir o mundo?
Talvez devêssemos tentar aproveitar uma força vital de nossa própria época. Que movimento vigoroso poderíamos acolher em nosso meio a fim de conferir nova relevância à nossa Igreja? Talvez devêssemos acolher o Antifa em nossas igrejas e apoiar os seus membros na luta por justiça social. Ou poderíamos explorar o vigor do movimento pró-imigração, ou o movimento ambientalista, ou talvez montar o irascível touro do marxismo. “Um dia”, escreveu Teilhard de Chardin num ímpeto de otimismo prepotente, “depois de dominar os ventos, as ondas, as marés e a gravidade, deveremos dominar para Deus as energias do amor, e então, pela segunda vez na história do mundo, o homem terá descoberto o fogo”.
Palavras radiantes. Mas toda essa procura fora da Igreja de Cristo por sinais dos tempos, energias do amor, forças da história e ventos de mudança equivale simplesmente a aguardar a chegada dos bárbaros. Somos cidadãos decrépitos de um império moribundo ou membros vivos do Corpo Místico de Cristo?
Esse Corpo Místico possui o centro pulsante das forças do verdadeiro amor: o Sagrado Coração de Jesus, no qual encontramos a resposta para todos os problemas de nossa época, sejam eles políticos, filosóficos ou espirituais. Não precisamos sentar diante dos portões da cidade, tentando em vão chamar a atenção das causas populares do momento. Temos entre nós a fonte de toda a vitalidade, que é Jesus Cristo, o mesmo ontem, hoje e sempre.
No Sacratíssimo Coração de Jesus nós encontramos a solução para as nossas sociedades cada vez mais confusas e divididas. Somente o amor de Cristo e a sua bondade podem mudar os corações cheios de ódio e as mentes dominadas por ideias errôneas e falsos juízos. Sua autoridade amorosa pode ensinar os nossos policiais, pais e líderes a combinar mansidão e força. Na encíclica Haurietis Aquas, de 1956, Pio XII disse que o Sagrado Coração de Jesus “é a escola mais eficaz do amor de Deus”, que é “o fundamento sobre o qual o reino de Deus é construído nos corações dos indivíduos, das famílias e das nações”.
No Sacratíssimo Coração de Jesus nós encontramos a cura para as nossas personalidades feridas e fraturadas. Seu divino Coração de carne nos ensina a bondade da humanidade física e nos ajuda a rejeitar teorias gnósticas que, por desprezar completamente o corpo humano, afirmam que a vontade humana é livre para o modificar e redefinir como quiser, ou para o eliminar através da eutanásia ou do aborto. Sua humanidade perfeita nos faz ter a esperança de que, por meio de seu amor e de sua graça, as nossas feridas e erros, sejam eles resultado das nossas ações ou da injustiça e crueldade de outras pessoas, podem ser curados.
Os nossos problemas políticos também podem ser resolvidos se recorrermos ao Sagrado Coração. Leão XIII escreveu com tristeza na encíclica Annum Sacrum, de 1899, que trata da separação entre Igreja e Estado: “Essa política tende praticamente à eliminação da fé cristã em nosso meio e, se fosse possível, à eliminação de Deus mesmo da terra”. No entanto, é por meio de Cristo, como nos diz São Paulo, que aprouve ao Pai “reconciliar consigo todas as criaturas, por intermédio daquele que, ao preço do próprio sangue na cruz, restabeleceu a paz a tudo quanto existe na terra e nos céus” (Col 1, 20). Como poderemos ter paz na terra sem o Príncipe da Paz?
Em sentido oposto, como os papas ensinaram diversas vezes e como Pio XI reiterou na encíclica Quas Primas, em 1925: “Quando os homens reconhecerem, na vida pública como na privada, que Cristo é Rei, a sociedade finalmente receberá as maiores bênçãos da verdadeira liberdade, da disciplina bem ordenada, da paz e da harmonia”. Esse reconhecimento não requer uma mudança de regime. Tanto as estruturas democráticas quanto as monárquicas possuem a capacidade e o dever de reconhecer que toda lei tem por fundamento a lei de Cristo; toda justiça, a justiça de Cristo; e toda ordem, a ordem de Cristo.
Eles devem, além disso, reconhecer de modo formal que Cristo é o Rei dos reis e o governante de todas as nações, com o que só estarão reconhecendo a realidade daquilo que é. Pois o Filho de Deus nos governa independentemente de nós escolhermos ou não, em nossa fantasia de grandeza, reconhecer esse fato; mas a nossa busca por ordem e justiça estará condenada desde o início se nos recusarmos a fundamentá-la no amor que move o sol e todas as estrelas.
Amigos católicos, parem de esperar pelos bárbaros. Temos no seio da Igreja uma fonte de vitalidade, uma força de amor suficiente para transformar todas as coisas em Cristo: o Sacratíssimo Coração de Jesus, com a sua divindade e humanidade, os seus santos poderes legislativos e judiciários, a sua realeza sagrada e infinita.
Essa é a maior das causas e a única, pois contém o que é bom e digno em todas as causas menores, excluindo todo o resto. Essa é a energia de amor que temos de aproveitar caso queiramos mudar o mundo.
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