O namoro é um tempo exigente. Os jovens precisam controlar as paixões para viver um relacionamento casto e sincero, sobretudo agora que os modelos de namoro não propõem virtudes e estimulam os casais à sexualidade desregrada, como se fossem coisas descartáveis.
Infelizmente, a castidade é uma virtude fora de moda. E talvez por isso seja oportuno exaltar a nobreza de um homem que, embora não esteja na fila para a canonização, soube, apoiado em sua fé católica, esperar e respeitar a sua namorada e futura esposa por longos três anos. Falamos de John Ronald Reuel Tolkien, o autor das consagradas obras de ficção O Senhor dos Anéis e O Hobbit.
Tolkien ficou órfão muito cedo; ele e o irmão Hillary praticamente não conheceram o pai, Arthur, que morreu por conta de uma febre reumática, quando trabalhava na África do Sul. Após a morte do marido, dona Mabel Tolkien aproximou-se da Igreja Católica, onde encontrou forças e segurança para continuar a educar os filhos.
No Oratório de Birmingham, fundado em 1859 pelo Cardeal Newman, Mabel conheceu o padre Francis Morgan, um sacerdote zeloso em quem ela encontraria também um amigo fiel, especialmente durante o tempo de sua enfermidade. Para que não voltassem ao anglicanismo, religião de seus familiares, Mabel confiou os filhos ao padre Francis antes de morrer, desejando que os educasse na fé católica e preparasse para a universidade.
Padre Francis cuidou dos meninos Tolkien como um pai. Ele os educou com afeto e presença, ensinando-lhes desde muito cedo o caminho das virtudes e o amor a Nosso Senhor Jesus Cristo. Anos mais tarde, Tolkien escreveria a um de seus filhos dizendo: “Apaixonei-me pelo Santíssimo Sacramento desde o começo — e pela misericórdia de Deus nunca me afastei dele outra vez”.
Na verdade, Tolkien amou e respeitou padre Francis, principalmente porque aquele sacerdote era a primeira figura paterna com que ele e o irmão tiveram contato. E essa relação se mostrou ainda mais verdadeira quando padre Francis teve de aplicar o rigor da disciplina sobre o jovem Tolkien, para assegurar-lhe o futuro que sua mãe, dona Mabel, havia sonhado.
Tolkien tinha 18 anos e se preparava para um exame de admissão à Universidade de Oxford quando se sentiu atraído por uma jovem da vizinhança chamada Edith Bratt. Os dois começaram a sair juntos e logo o que era apenas uma amizade se transformou em romance. Tolkien e Edith tinham histórias parecidas — ambos eram órfãos e tiveram de se mudar várias vezes —, o que fazia da relação deles algo mais apaixonante.
Mas não pensem os apressados que era um namoro escandaloso. Era mesmo um romance às antigas, com direito a conversas à janela, enquanto o resto da casa dormia, e passeios de bicicleta pelos bosques da cidade, onde paravam à beira de um lago para falar sobre os seus sonhos. Além disso, Tolkien havia aprendido a tratar as mulheres com respeito e delicadeza, como um verdadeiro cavalheiro deve fazer.
O romance seguiu firme até a novidade chegar aos ouvidos de padre Francis. Como havia prometido a dona Mabel, padre Francis deveria garantir a carreira acadêmica tanto de John quanto de Arthur. E isso significava trabalho duro e fuga de qualquer distração.
A advertência não tardou. Tolkien foi proibido de aproximar-se de Edith novamente. A notícia foi um golpe para o casal, e Tolkien acabou implorando pelo relacionamento, dizendo ao seu tutor que ele e Edith estavam mesmo apaixonados. O sacerdote, então, deu-lhe um ultimato: acabar com o namoro e, se depois de três anos, quando Tolkien já fosse maior de idade, os dois ainda sentissem interesse um pelo outro, poderiam reatar a relação.
Apesar de doloroso, o pedido de padre Francis deveria ser atendido por Tolkien, que entendia as razões de seu tutor e sabia que aquilo era o certo a se fazer. Os exames para Oxford eram dificílimos, e ele precisava do máximo de atenção naquele momento. De fato, o namoro podia distraí-lo. Tolkien decidiu afastar-se de Edith e meter-se de cabeça nos estudos, a fim de conseguir a tão sonhada bolsa universitária. Mas se Tolkien, de um lado, estava certo de que devia obedecer ao padre, o seu coração, de outro, ainda suspirava por Edith, o que significava uma chance para os dois. Eles acabaram se encontrando de novo.
A família de Edith resolveu enviá-la para morar em outra cidade, onde pudesse desenvolver melhor seus estudos. A notícia pegou o casal de surpresa e, assim, Tolkien e Edith marcaram um último encontro, onde ambos juraram fidelidade por aqueles três anos que passariam longe; Tolkien deu uma joia para Edith como sinal de sua promessa e presente de aniversário. Ela presenteou-o com uma caneta. Quando soube do encontro, padre Francis ficou profundamente magoado e tomou uma decisão duríssima: Tolkien não só foi proibido de se encontrar com Edith como agora estava proibido de escrever-lhe. Ele teria de aguentar os próximos três anos sem sequer falar com Edith.
Essa provação, porém, serviu para forjar o caráter de Tolkien, tornando-o um homem forte e responsável. Na faculdade, o jovem logo se destacou tanto pela inteligência e dedicação com que desenvolvia suas tarefas quanto pela firmeza moral nos costumes que havia adquirido. Embora os tempos fossem outros, longe da decadência de hoje, muitos estudantes daquela época já se envolviam com bebidas, drogas e sexo. Tolkien, por outro lado, manteve distância de tudo isso. O máximo que fazia era sair com amigos para beber cerveja e fumar charutos, o que era um hábito perfeitamente aceitável na sociedade inglesa.
De resto, o coração do futuro senhor das fantasias ainda pertencia a Edith Bratt.
Tolkien completou 21 anos em 1913 e, na véspera de seu aniversário, escreveu para Edith, reafirmando sua fidelidade e desejo de casar-se com ela. A resposta que Tolkien esperava, entretanto, não foi animadora; Edith havia noivado com um rapaz chamado George Field. Por um momento, as esperanças de Tolkien desapareceram.
Mas, a 8 de janeiro do mesmo ano, ele tomou um trem em direção à cidade em que Edith morava, decidido a recuperá-la. Os dois se encontraram ali mesmo na estação de trem e conversaram por um bom tempo até que ela percebesse que Tolkien, de fato, ainda a amava. Edith rompeu o noivado e, finalmente, Tolkien e ela puderam retomar o namoro.
J. R. R. Tolkien e Edith Bratt se casaram em 1916 e tiveram quatro filhos. Os dois, infelizmente, não foram uma segunda versão de Santa Zélia e São Luís Martin, mas viveram um matrimônio profundamente católico, marcado pela fidelidade e pelo compromisso.
Apesar das guerras e do trabalho, Tolkien foi um marido atencioso e um pai presente, algo realmente notável em comparação com a vida de outros intelectuais que, para se dedicarem a suas obras, abandonaram esposas e filhos. Tolkien, ao contrário, amou a mulher e por ela soube preservar-se durante três anos de provação, pelo que se demonstra que a castidade não é uma virtude de eunucos ou frígidos, mas de quem está disposto a amar até as últimas consequências. Antes de ser o senhor da fantasia, Tolkien foi, primeiro, senhor de si mesmo.
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