Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
(Mc 1, 29-39)
Naquele tempo, Jesus saiu da sinagoga e foi, com Tiago e João, para a casa de Simão e André. A sogra de Simão estava de cama, com febre, e eles logo contaram a Jesus. E ele se aproximou, segurou sua mão e ajudou-a a levantar-se. Então, a febre desapareceu; e ela começou a servi-los. À tarde, depois do pôr do sol, levaram a Jesus todos os doentes e os possuídos pelo demônio. A cidade inteira se reuniu em frente da casa. Jesus curou muitas pessoas de diversas doenças e expulsou muitos demônios. E não deixava que os demônios falassem, pois sabiam quem ele era.
De madrugada, quando ainda estava escuro, Jesus se levantou e foi rezar num lugar deserto. Simão e seus companheiros foram à procura de Jesus. Quando o encontraram, disseram: “Todos estão te procurando”. Jesus respondeu: “Vamos a outros lugares, às aldeias da redondeza! Devo pregar também ali, pois foi para isso que eu vim”. E andava por toda a Galileia, pregando em suas sinagogas e expulsando os demônios.
O Evangelho desta quarta-feira nos relata a cura da sogra de S. Pedro. Trata-se de um episódio registrado nos três evangelhos sinóticos, cada um dos quais sublinha certos detalhes que, considerados em conjunto, nos ajudam a compreender com maior profundidade esta cena tão tocante, uma das primeiras do ministério público de Nosso Senhor. A Liturgia de hoje nos propõe como leitura a versão do evangelista S. Marcos, que tem a particularidade de empregar, no v. 31, um verbo bastante expressivo, κρατέω, para significar o gesto de segurar a mão da sogra de Pedro: “A sogra de Simão”, escreve Marcos, “estava de cama, com febre, e eles logo contaram a Jesus. E ele se aproximou, segurou (κρατήσας) sua mão e ajudou-a a levantar-se”. É deste mesmo verbo que vem a palavra pantocrator (Παντοκράτωρ), que quer dizer, literalmente, “o que tudo sustenta”. Um pantocrator, como se sabe, é uma representação iconográfica de Cristo como Juiz e Senhor onipotente, por quem e para quem foram feitas todas as coisas (cf. Jo 1, 3.10). É por isso que em muitas imagens do pantocrator estão escritas, ao redor da cabeça de Jesus, as palavras ὁ ὤν, tradução grega do nome que Deus revelou a Moisés na sarça ardente: ᾿Εγώ εἰμι ὁ ὤν, “Eu sou o que sou” (Ex 3, 14). Com isso, quer-se indicar tanto a divindade de Nosso Senhor, consubstancial ao Pai, quanto o fato de que a sustentação que Jesus oferece aqui à sogra de Pedro não é nem meramente moral nem exclusivamente física, como se Ele se limitasse a curá-la da febre, mas eminentemente ontológica. Cristo, em outras palavras, segura-lhe a mão porque a sustenta e conserva no ser, como Senhor e Criador de todas as coisas.
O seu ministério, mais do que o de um taumaturgo que realiza prodígios, é o de um legado divino, que com poder e autoridade vem ao mundo como Senhor dele, a fim de desfazer as obras com que o demônio perdeu o gênero humano. Há, de fato, uma perfeita harmonia entre o relato do Gênesis e os acontecimentos dessa página do Evangelho. Como notaram muitos SS. Padres, uma vez que o pecado entrou no mundo pela serpente e pela mulher, era conveniente que Cristo, após expulsar o demônio — como relata S. Marcos nos versículos anteriores —, curasse logo em seguida uma mulher dos males que, pelo pecado, a serpente introduziu na história. Assim, ao inclinar-se sobre a sogra de Pedro e segurar-lhe a mão, Jesus expressa a um tempo que Ele, como Criador, se inclina sobre as suas criaturas para sustentá-las na existência e, como Redentor, se inclina sobre a nossa miséria para tirar-nos do pecado e conservar-nos na vida da graça. — Que o deixemos entrar em nossas casas, inclinar-se sobre nós e curar-nos de nossas enfermidades espirituais. Ele, que a todo instante pensa em nós, comunicando-nos o ser com que somos, se digne participar-nos também a vida com que Ele mesmo vive, vida divina e eterna.
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