Com grande alegria, damos sequência às meditações sobre os mistérios gozosos neste tempo do Advento: o tempo de realmente prepararmos o nosso coração para viver esses mistérios de salvação.
É importante entendermos com clareza o que é meditar um mistério. O Concílio Vaticano II, na constituição Dei Verbum, recorda-nos algo importante: Deus revela-se para nos salvar e nos salva revelando-se. É uma via de mão dupla. Jesus não veio do Céu para nos contar alguns segredos como se estivesse apenas saciando a nossa curiosidade. A Revelação de Deus é eficaz: quando Deus vem nos trazer uma mensagem do Céu, essa verdade é salvífica.
Quando, meditando sobre a Revelação divina, enxergamos a verdade, estamos sendo salvos. Qual o processo de nossa salvação? O que Deus fez para nos salvar? Ele veio do Céu, encarnou-se no ventre da Virgem Maria e nasceu em Belém… Todas essas realidades salvadoras nos dizem como Deus é, revelam o coração divino e seus segredos. Portanto, o ato de salvar é revelador; e o ato de revelar é salvador, as duas coisas completam-se mutuamente.
Ao nos empenharmos em fazer Meditações para o Advento, podemos cair no erro de pensar que se trata apenas de uma espécie de exercício mental. Nada disso. A meditação cristã difere totalmente das meditações das religiões orientais. A meditação é um processo de encontro e união com Deus, numa dinâmica de transformação interior. É um processo similar ao do fogo aplicado ao ferro: o ferro, que era frio vai ficando quente; era opaco, e aos poucos começa a ficar incandescente; era enferrujado, e vai se purificando; era duro, e vai ficando maleável até que, finalmente, fica fluido. Assim como o ferro vai sendo transformado em contato com o fogo, adquirindo as propriedades deste, a nossa vida também vai mudando nesse contato íntimo com Deus.
Na meditação deste segundo mistério gozoso — A Visitação de Maria a Isabel —, todo esse processo ficará ainda mais claro para nós. Vimos anteriormente que a Virgem Maria recebe uma notícia salvadora do Arcanjo Gabriel: ela conceberia do Espírito Santo e daria à luz o Filho de Deus. Encerramos, então, a nossa reflexão passada já com Nossa Senhora grávida.
Agora, como é necessário em toda meditação, devemos primeiramente nos colocar na presença de Deus. Sem a consciência dessa presença divina, não estamos em oração mental, mas apenas fazendo um mero estudo ou exercício intelectual. Devemos nos recordar de que estamos num encontro, em que Deus e cada um de nós estão presentes, na companhia um do outro. É um encontro de amizade entre duas pessoas que se amam. É fundamental, nesta ocasião, também nos darmos conta da grandeza de Deus e de nossa pequenez. Aqui estamos, nós e Deus, olhando para este segundo mistério gozoso. Queremos ver esse momento da vida de Nossa Senhora com o olhar e a presença do Senhor.
Maria acabou de conceber, e Jesus está agora em seu ventre. O anjo já a deixou, como diz o Evangelho de Lucas no capítulo 1, versículo 38: “E o anjo saiu da sua presença” (Lc 1,38b). Nesse exato momento, o Evangelho de São Lucas apresenta um detalhe ao qual dificilmente damos importância. Ele diz: “Ἀναστᾶσα δὲ Μαριὰμ” (Anastasa de Mariam): “Naqueles dias, Maria levantou-se e foi apressadamente à região montanhosa, a uma cidade de Judá” (Lc 1,39). “Anastasis” quer dizer “levantar-se”, “ficar de pé”. Significa, então, que Maria estava ajoelhada, prostrada, e prontamente ficou de pé; levantou-se a fim de providenciar logo o que era necessário para partir em viagem, em direção à casa de sua parenta Isabel.
Precisamos ter consciência de que viajar, naquela época, era algo muito diferente do que fazemos hoje: juntar algumas coisas, entrar no carro e acessar uma rodovia. A viagem de Nazaré até a Judeia era difícil (cerca de 150 km); era necessário organizar o que fosse preciso para percorrer aquele trajeto. O Evangelho nos diz que Maria “foi apressadamente” — “μετὰ σπουδῆς” (meta spoudēs) — “em pressa”, “despachadamente”. Coloquemo-nos diante de Nossa Senhora: ela acabou de receber o anúncio do anjo e, assim que ele partiu, Maria fica de pé, em atitude de prontidão. Esse é o sinal mais claro daquilo que chamamos de devoção.
A devoção é a prontidão para servir, para amar! Maria Santíssima acabou de dizer ao anjo: “Eis aqui a escrava do Senhor!” E agora está demonstrando isso concretamente, com suas atitudes. Sua resposta a São Gabriel não é da “boca para fora”. Maria é realmente a fiel serva do Senhor, aquela que deseja acima de tudo fazer a vontade de Deus. Porque Deus é amor, Maria também quer amar. E então, imediatamente, ela quer partir para servir Isabel.
Podemos imaginar que a Virgem Maria fez essa viagem com São José, uma vez que já estavam casados. Recordemos que o casamento, naquela época, acontecia em duas etapas: desde a primeira — os esponsais, a assinatura — os noivos já se tornavam casados, mas ainda não coabitavam; isso só acontecia após uma segunda cerimônia, uma festa em que o noivo ia buscar a noiva na casa dela (como na Parábola das Dez Virgens, que, sendo amigas da noiva, estavam esperando a chegada do noivo). Conforme a cultura da época, antes mesmo dessa etapa da coabitação, o casal já tinha o direito de ter relações sexuais, uma vez que já estavam casados de fato.
Maria estava nessa primeira etapa: já casada, mas ainda não coabitando com José. Por isso, é muito provável que ela tenha feito a viagem para a Judeia com seu marido, já que se tratava de uma viagem longa e perigosa: era preciso atravessar a Samaria e o deserto da Judeia, para finalmente chegar à região montanhosa.
Pois bem, vemos aqui a Virgem Maria como grande servidora, indo prontamente ajudar Isabel. Nossa Senhora é a perfeita imagem daquela passagem do Salmo 123 (122): “[...] como os olhos da escrava [estão atentos], às mãos de sua senhora” (v. 2b). Isso significa que, ao mínimo sinal da senhora, a escrava prontamente estava disponível, ficava pronta para servir.
Era a prontidão de quem, ao analisar os prós e contras de uma decisão, como todos fazemos, nunca calculava o seu próprio custo pessoal. Nos cálculos de Maria Santíssima, a única lógica que importava era o que poderia ou não dar maior glória a Deus; com que amor ela mais poderia amar a Deus e procurar o bem dos irmãos, servindo-lhes — num completo esquecimento de si.
No mistério da Visitação a Isabel, está o próprio Mistério do Coração de Maria. Aqui, podemos e devemos olhar de perto a alma de Nossa Senhora que, ao chegar na casa de sua parenta, entoa o cântico que mostra por dentro como é esse coração, o Magnificat: “A minha alma engrandece o Senhor, e meu espírito exulta em Deus, meu Salvador” (Lc 1,46s).
Vamos, então, imaginar os detalhes dessa cena. Maria acabou de receber a mais importante notícia de todas: tornou-se a Mãe de Deus. Mesmo ciente de que era a criatura mais digna de toda a história, ela não pensa em si mesma, mas em servir; essa é a sua preocupação. A atitude de ir até Isabel, mostra-nos um coração devoto, que não calcula o preço que precisa pagar para servir a Deus — ela sabe que nasceu para isso. A Mãe de Deus segue com prontidão para caridosamente servir a Isabel. Só isso já é algo espantoso!
Podemos agora imaginar Maria como a Arca da Aliança. A Arca original, no Antigo Testamento, era uma espécie de urna, ou baú, que continha: as Tábuas da Lei, um pouco do maná descido do céu e o bastão de Moisés. Em cima dela, havia uma tampa, que se chamava propiciatório, onde estava a imagem de dois querubins olhando um para o outro. Aquele espaço vazio entre os dois anjos era o “lugar onde Deus habitava” — era ali que o Senhor caminhava com o seu povo. Se, no Antigo Testamento, a Arca da Aliança “carregava” a presença de Deus, Maria agora é a verdadeira Arca da Aliança, que está carregando, em seu ventre, o próprio Deus encarnado.
Ainda no Antigo Testamento, há um episódio importantíssimo, que diz sobre esse título da Virgem Maria. No meio da procissão que levava a Arca para o palácio do Rei Davi, duas pessoas morreram fulminadas porque tocaram naquele objeto santo. E então, amedrontado, Davi disse: “De onde me vem que a Arca do meu Senhor venha me visitar?” (cf. 2Sm 6). Mil anos depois, naquelas mesmas montanhas da Judeia, o paralelo desse acontecimento está exatamente na cena em que Isabel, ao receber Maria, exclama: “De onde me vem que a mãe do meu Senhor venha me visitar?” (cf. Lc 1,43).
É interessante notarmos mais detalhes do trecho em que Maria chega à casa de Zacarias e Isabel: “Ela entrou na casa de Zacarias e saudou Isabel. Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança saltou de alegria em seu ventre. Isabel ficou repleta do Espírito Santo e, com voz forte, exclamou: ‘Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre!’” (Lc 1,40ss). Podemos perceber que não foi um encontro “simples”, foi uma exultação, um grande grito: “κραυγῇ μεγάλῃ” (kraugē megalē). Kraugē é uma palavra onomatopaica, que se parece com o som de um grito: “Kra!” Isabel realmente deu um grande grito, quando disse: “Bendita és tu entre as mulheres…” — eis aí um trecho da Ave Maria, um grito tão forte que ecoou ao longo dos séculos, bilhões e bilhões de vezes na boca de cada católico, em cada conta do Santo Rosário.
Maria é bendita entre as mulheres: escolhida, eleita, abençoada e querida por Deus. E quem diz isso é o Espírito Santo, por meio de Santa Isabel — “ἐπλήσθη Πνεύματος Ἁγίου” (eplēsthē Pneumatos Hagiou) “ficou cheia do Espírito Santo” —, bradando um grito santo que atravessou os séculos. Como há quem ainda ouse dizer que Maria não é bendita? Ela é a verdadeira e definitiva Arca da Aliança, aquela que foi preparada por Deus, transformada pela graça para ser a mãe bendita do Salvador, fruto de seu ventre.
Admirada com a honra daquela santa visita, Isabel exclamou: “Unde hoc mihi”: “De onde me vem que a mãe do meu Senhor venha me visitar?” Em cada texto que rezamos e meditamos, a Mãe do Senhor também vem nos visitar, e nós deveríamos ficar espantados como ficou Isabel! Nas aparições de Nossa Senhora, todos os videntes são unânimes ao relatar a beleza indescritível, a luz celestial, a vontade de morrer que eles tinham ao ver Maria Santíssima, a vontade de ir logo para junto de Deus. Aqueles que receberam alguma visão de Nossa Senhora, a partir daquele momento, passaram a viver arrebatados pelo desejo do Céu.
A pastorinha Lúcia, vidente de Fátima, foi tomada de tristeza quando Nossa Senhora disse que Jacinta e Francisco logo iriam para o Céu, enquanto ela ainda ficaria aqui por um bom tempo. Que desolação foi para Lúcia permanecer neste mundo depois de ter visto a Rainha do Céu. Após a visita da “Mãe do meu Senhor”, tudo se torna opaco e dispensável nesta vida terrena.
Ao meditarmos sobre o encontro de Maria com Isabel, fizemos uma visita à visita de Nossa Senhora. Nós dizemos com o anjo: “Ave Maria”, e a Virgem Santíssima nos saúda de volta: “Ave, Paulo!”, “Ave, Isabel!” E ao saudarmos a mãe de Nosso Senhor, o Espírito Santo também nos arrebata e nos conduz a exclamar, com forte grito: “Bendita és tu entre as mulheres, e bendito é o fruto do teu ventre!” Precisamos assim bendizer, com a voz e sobretudo com o coração; e ainda que sejamos indignos dessa visita, o Espírito Santo nos toca e, com sua luz, nos revela a verdade que estamos meditando.
É importante notarmos isso: à medida que vamos meditando, algo se acende dentro de nós, alimentando-nos profundamente. Precisamos aceitar essa verdade: estamos sendo visitados pelo próprio Deus por meio da oração mental. Voltemos à cena da Visitação, testemunhando o que Santa Isabel narra que aconteceu nela interiormente: “Logo que ressoou aos meus ouvidos a tua saudação, a criança pulou de alegria no meu ventre.” (Lc 1,44) Aqui, há uma bem-aventurança que nem sempre notamos: “é feliz aquela que acreditou”, “καὶ μακαρία ἡ πιστεύσασα” (kai makaria hē pisteusasa). Vemos aqui Maria como “aquela que faz o ato de fé”.
Quando fazemos isso, Deus realiza em nós as coisas que prometeu. Acontece a hipóstase das coisas prometidas, sua substância sedimenta-se dentro de nós. Ora, ninguém creu mais do que Maria! No Antigo Testamento, Abraão foi o grande exemplo de fé, ao subir o Monte Moriá para sacrificar seu filho Isaac. Maria subirá a mesma montanha, agora chamada de Gólgota. É o mesmo Monte Sião, sobre o qual foi construída Jerusalém; é o local onde Abraão ofereceu aquele sacrifício, e onde Maria subiu acompanhando seu filho Jesus para a crucificação.
Uma vez que Isabel revela seu coração, Maria também revela o segredo que carregava no seu interior. Ao sair de Nazaré, ninguém sabia que o Filho de Deus estava em seus ventre, aquilo era um segredo entre ela, o anjo e Deus. Porém, inspirada pelo Espírito Santo, Isabel “rasga o véu do Templo” e revela: “Eis aí a Arca da Aliança!”. Considerando que José acompanhou Maria nessa viagem, podemos imaginar que esse foi um momento dramático para ele.
Muitos pensam que o drama vivido por José no início do Evangelho seria o fato de que ele poderia ter desconfiado dela, por estar grávida. Não é isso que aconteceu! O fato é que, ao ouvir de Isabel: “De onde vem que a mãe do meu Senhor venha me visitar”, o pobre carpinteiro soube imediatamente que o Filho de Deus estava no ventre da sua esposa. E sendo José um homem justo, começou a pensar num jeito de deixar Maria por não se sentir digno de ter parte naquele divino mistério. Eis o dilema do patriarca: José sabia que não era digno, mas não queria abandonar Maria nem prejudicá-la, e ficou naquele drama até que, por meio de um sonho, o anjo apareceu-lhe e aplacou seus temores (cf. Mt 1,20s).
Seja como for, quando Isabel revelou o segredo, Maria então recebeu, de certo modo, “a liberação de Deus” para expressar o que estava em seu coração. É quando testemunhamos, nas palavras de São João Eudes, o “grande hino do coração de Maria”, o Magnificat.
Por “coração de Maria” devemos entender a “alma de Maria”. Nós somos corpo e alma, e também nos referimos ao espírito como o “topo da alma”, aquela parte que está em contato com Deus. Não devemos dizer que temos três partes distintas — espírito, alma e corpo — pois isso é uma noção gnóstica. Para nós, cristãos, há somente corpo e alma. Mas o espírito, sendo a parte mais elevada da alma, que está em contato com Deus, é aquele organismo sobrenatural em que o Senhor opera em nós a transformação.
Desse modo, ouvimos Maria dizer: “A minha alma engrandece o Senhor, e meu espírito exulta em Deus, meu Salvador...” (Lc 1,46s) — alma e espírito são a mesma coisa, mas sob aspectos diferentes —, “...porque olhou para a humildade de sua serva.” (v. 48a); aqui temos a palavra ταπείνωσιν (tapeinōsin): a “humildade”, o “nada”, e até mesmo o “tapete” da serva, “eu sou o capacho de Deus, mas Ele olhou para o chão, para a condição baixa de sua escrava” (tapeinōsin tēs doulēs autou).
Maria então reiterou o que Isabel acabou de exclamar com aquele forte grito: “Doravante todas as gerações, desde agora, me chamarão bem-aventurada” (v. 48b). E em sua admirável humildade — que consiste na verdade sobre aquilo que somos —, Maria não podia negar o que Deus lhe fez, e admirou-se com essa grande graça que ela, uma criatura humana, recebeu. Os pobres protestantes não acreditam nisso: não creem que Deus possa pegar o nada e fazer dele um tudo, dando-lhe verdadeira grandeza. Mas Deus não apenas pode, como Ele quer fazer e o faz. Basta dizermos o que Ele fez conosco: nos tirou do pecado, da miséria e da desgraça! “O Senhor fez em mim maravilhas” (v. 49) — “ἐποίησέν μοι μεγάλα ὁ δυνατός” (epoiēsen moi megala ho dynatos), “o Poderoso fez por mim grandes coisas”.
A saudação do anjo na Anunciação dizia que Maria Santíssima é “κεχαριτωμένη” (kecharitōmenē)”, “transformada pela graça”. Com isso, enxergamos essa grandeza do coração de Maria, repleto da graça e do amor de Deus.
Deixemo-nos conduzir por essa revelação maravilhosa do Imaculado Coração de Maria Santíssima, e por todas as coisas que pudemos enxergar nesta meditação: a disposição de Nossa Senhora, sua prontidão para servir; o grito de Isabel que atravessou os séculos; a fé de Nossa Senhora; o véu que se rasgou revelando o grande segredo da Encarnação; e o magnífico canto de uma alma totalmente dócil a Deus.
Qual dessas verdades brilhou para você com mais intensidade? De tudo o que testemunhamos hoje, o que mais acalentou seu coração? É exatamente esse espírito que somos convidados a trazer em nossa alma sempre que rezamos o segundo mistério gozoso do Santo Rosário. Lembremo-nos sempre da luz que se acendeu em nosso coração durante esta meditação, para que Deus verdadeiramente nos dê a graça de nos aprofundarmos nas sublimes verdades contidas nesse mistério, colhendo assim os frutos da devoção do santo Terço.
Recordemos sempre: quando Deus se revela, Ele salva, e quando Deus salva, Ele se revela. A meditação é o que chamamos de oração mental, e as meditações que fazemos com a Palavra de Deus, versículo por versículo, vão criando em nós um valioso tesouro. Um tesouro que consiste nas verdades que guardamos em nossa alma, às quais podemos acessar quando rezamos o Terço com profundidade e devoção, sabendo que é assim que Deus vai nos transformando interiormente.
O que achou desse conteúdo?