O ano civil vai chegando ao fim, enquanto nós, cristãos, já vivemos o novo ano litúrgico. O tempo não é o mesmo na Cidade de Deus e na cidade dos homens. Nós, aqui em baixo, com a ajuda dos anjos, lutamos por Cristo, que detém o segredo do tempo e da eternidade e nos atrai para si, para o seu plano eterno.
Nele, a luz de sete sóis torna-se uma só. A grande festa do Natal dura doze dias [1]. A aurora do Alto se aproxima. Mesmo assim, ao sermos chamados para o alto com Cristo, vemo-nos agora atraídos para baixo, rumo à terra fria, à gruta de Belém, ao calor do hálito dos animais e ao nascimento virginal.
O fato de a vida cristã nos chamar com tanta frequência para a caverna — seja ela a gruta de Belém ou o túmulo de Cristo escavado na rocha — não é algo insignificante na balança da sabedoria. O filósofo nos chama para sair da caverna; a própria Sabedoria nos chama para entrar nela, onde, na escuridão, finalmente encontramos não simples sombras, nem ilusões perceptivas dançando à volta das margens do ser, mas sim a própria verdade, a verdade de Deus que se tornou homem para nossa salvação, a verdade da morte vencida na Ressurreição. Com a nossa visão fortalecida pela visão da própria Verdade, descobrimos que somos capazes não apenas de ver através dos elementos efêmeros do reino do devir, este mundo de mudança, decadência e pecado, mas também de abraçar o bem da criação. O amor nos chama para as coisas deste mundo, lembra-nos Santo Agostinho, e diante do Rei menino aprendemos novamente a glória de uma criação em cujos recintos o próprio Criador se dignou entrar.

Nossa cultura atual procura desesperadamente entrar naquela gruta em Belém. Por mais banais que possam ser, os ornamentos da temporada comercial de Natal, a intensidade quase maníaca com que as pessoas se atiram às compras e à decoração, dão testemunho do desejo inelutável do coração humano por uma verdadeira festividade. Somente um desejo tão poderoso e primitivo, ao que parece, poderia abrir caminho para que o nome de Cristo fosse ouvido nas estações de rádio FM que, desde o Dia de Ação de Graças [2] ou antes, tocam músicas natalinas sem parar. Não é a mera vaidade que canta Hosana.
O coração anseia pelo Evangelho, mas, por mais que desejemos nos alegrar, em muitos casos perdemos a compreensão de como nos alegrar de forma adequada. E assim, longe da gruta em Belém, muitas vezes nos vemos buscando a gruta que a maioria de nós carrega consigo ao longo do dia, nos bolsos ou nas bolsas. Nas escuras telas espelhadas dos nossos smartphones, vemos uma imagem sombria de nós mesmos; e no constante uso dos nossos aplicativos, buscamos sem cessar algum tipo de boa notícia.
Quantas curtidas obtive? Que mensagens recebi? Que elogios me fizeram nos últimos sete minutos? Aquele pagamento chegou à minha conta bancária? O consultor respondeu à minha pergunta? O editor aceitou o meu último envio? Que histórias de dívidas, doenças e destruição podem alimentar a minha ânsia pecaminosa de desespero?
O desfile de imagens passa diante de mim e, mesmo com o aumento das curtidas e a chegada das mensagens, o meu coração se entristece, esperando por aquela notícia que é a única verdadeiramente boa.

Deus entrou na caverna, mas nós criamos deuses à nossa maneira, deuses que carregamos conosco e procuramos satisfazer a cada hora. Se tal descrição parece melodramática, a questão, no entanto, merecer ser investigada. O ídolo é aquilo a que a minha mente se dedica quando está ociosa. Num momento de silêncio, o meu primeiro instinto é pegar o smartphone para verificar o e-mail, o 𝕏 e o Instagram? Essa tela é a minha primeira preocupação ao acordar e a última ao dormir? Contribuí para uma cultura de idolatria casual? Se, como diz Santo Agostinho, “a alma está tanto menos sujeita a Deus quanto menos ocupada com o pensamento de Deus”, então deixar de pensar em Deus não é uma questão menor.
Aqui deixamos de lado as ilusões mais obviamente perniciosas às quais a tecnologia pode levar, as cavernas assombradas da pornografia e dos jogos de azar, imagem após imagem processada em todo o espetáculo grosseiro da luxúria e da avareza que tantas vezes leva as famílias à ruína. Em vez disso, perguntamos simplesmente se, em conformidade com a cidade do homem, enchemos a hospedaria do coração com imagens falsas, em vez de seguirmos a estrela profética até o estábulo.
Se nos entregamos aos ídolos, agora é o momento de abandoná-los. Agora, no início do ano litúrgico, na mudança de maré, é o momento de deixar para trás as cavernas que criamos e voltar, seja qual for a distância da viagem, seja qual for o deserto, seja qual for a montanha, à caverna de Belém. É o tempo dos mistérios gozosos, quando as verdades da fé, absorvidas no frescor da oração, dissipam os falsos evangelhos das telas. São dias para tomar o alimento que Maria colocou na manjedoura, um tempo para nos alimentarmos intensamente daquela Carne que é o verdadeiro alimento, para que possamos ser um só corpo com Aquele que assumiu um corpo por nós e o elevou, em sua Ascensão, à casa do Pai. Ele, a Cabeça, nasceu; e, consumindo-o, tornamo-nos verdadeiramente como crianças, atravessando as dores do parto rumo à eternidade.
“Nós, que devemos morrer, exigimos um milagre”, diz W. H. Auden. Na gruta de Belém, o milagre aconteceu: o Infinito tornou-se um fato finito, como o poeta diz em seguida. Platão sabia do que falava. Ele também sabia o quanto o coração do homem cede facilmente ao desejo pela caverna da ilusão, uma caverna que agora a maioria de nós leva sempre consigo. Mas se Platão, como alguns supõem, conhecia os profetas hebreus, ele ainda não conhecia aquele que eles profetizaram. Ele se revelou a nós. Ele nos chama a adentrar a caverna com Ele — e, através dela, entrar na vida eterna. Ele nos chama especialmente agora, quando o ano recomeça e o coração busca uma nova vida.

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