Há cento e setenta anos, no dia 17 de outubro de 1849, falecia o compositor e pianista franco-polonês responsável pela renovação da sonoridade do piano romântico: Frederic Chopin (1810–1849).

Sua arte sobre-humana, melancólica e apaixonada é bem-resumida pelas belas e comoventes palavras que o Venerável Papa Pio XII dirigiu a um grande grupo de poloneses em Roma, no dia 30 de setembro de 1939:

Há em cada um de vós um pouco da alma de vosso imortal Chopin, cuja música extrai de nossas pobres lágrimas humanas, de modo tão brilhante, uma alegria profunda e inesgotável. Se a arte humana pôde realizar tantas coisas, quanto mais habilidosa não deve ser a arte de Deus em aliviar a tristeza de vossas almas? [1]

Mais recentemente, o Papa Bento XVI elogiou Chopin com as seguintes palavras: “Que a música desse famoso compositor polonês, que contribuiu de forma tão significativa para a cultura da Europa e do mundo, aproxime de Deus aqueles que a escutam e ajude-os a descobrir a profundidade do espírito humano” [2]. 

A vida interior de Chopin teve três fases: a educação em Varsóvia numa família católica devota, o afastamento da Fé e da prática religiosa durante sua carreira relâmpago em Paris (sua principal residência, desde 1831 até os seus últimos dias de vida) e o movimento de retorno a Deus pouco antes da morte.

Os pais de Chopin, Nicolau (um emigrante francês) e Justina (primeira professora de piano dele e de Ludovica, sua irmã mais velha), jamais falharam em relação à honra e à responsabilidade de transmitir a Fé aos filhos. Numa carta escrita em meados de março de 1842, Justina assegura que ela e o marido estavam próximos dele por meio da oração, mesmo durante o período que esteve em Paris, o mais feliz e ativo de sua carreira musical: “Esqueceste, meu querido filho, que teus velhos pais vivem apenas para ti e rezam todos os dias para que Deus te abençoe e proteja.”

Mas foi em Paris que sua fé definhou e sua vida ficou mais atormentada. Muitos de seus novos amigos eram “homens e mulheres sem princípios, ou melhor, de maus princípios” [3]. Sequer algumas mulheres lhe serviram de consolo — especialmente a escritora romântica George Sand, uma “devoradora de homens”, que o conheceu em 1836 e, depois de divergências de ideias e de personalidade, abandonou-o em 1847. 

A morte de Chopin.

Sua já delicada saúde, particularmente em função das cada vez mais graves e frequentes infecções nos pulmões, enfraqueceu-o bastante nos seus últimos anos de vida. Um dos mais ilustres representantes da emigração polonesa, o padre Alexandre Jelowicki, amigo íntimo de Chopin, esteve próximo do músico em seu leito de morte. O próprio sacerdote viria a relatar detalhadamente o retorno de Chopin à sua antiga fé [4]. 

O padre Alexandre se aproveitou do humor adocicado do compositor para conversar com ele sobre sua querida mãe Justina, uma boa cristã. “Sim”, disse Chopin, “para não ofender minha mãe eu receberia os sacramentos antes de morrer, mas não tenho por eles a consideração que desejas. Compreendo a bênção da confissão como o alívio de um coração pesado por meio de uma mão amiga, mas não como um sacramento. Estou pronto para me confessar contigo se desejares, porque te amo, não porque considero isso necessário”. Mas o sacerdote não desesperou da graça, que parecia estar próxima. 

Na noite de 12 de outubro de 1849, o médico do músico, convencido de que Chopin faleceria muito em breve, chamou o padre Alexandre, que foi correndo ao encontro dele. O moribundo apertou a mão do médico, mas pediu que ele fosse embora; garantiu que o amava, mas não quis falar com ele.

No dia seguinte, festa de São Eduardo, o Confessor, no martirológio tradicional, o padre Alexandre celebrou a Missa pelo repouso da alma de seu irmão Eduardo, morto com um tiro em Viena durante os motins de 1848, e rezou pela alma de Chopin. Ele voltou ao leito do músico e recordou-o de que aquele era o dia do onomástico de seu irmão, a quem o músico tanto amava. “Ó, não falemos sobre isso”, lamentou o moribundo. “Caríssimo amigo”, continuou o sacerdote, “deves me dar algo pelo dia do onomástico de meu irmão”. “O que devo te dar?” “Tua alma.” “Compreendo. Aqui está ela; toma-a!”

O músico segurou o crucifixo que lhe fora oferecido pelo padre Jelowicki; professou a fé em Cristo que sua mãe lhe ensinara e recebeu os sacramentos que o prepararam para se encontrar com o Deus vivo. Seu sofrimento durou quatro dias, mas ele se resignou, teve paciência e às vezes até sorria. O sacerdote escreveu:

Ele abençoou seus amigos e, quando — depois de uma crise que aparentava ser a última — viu a si mesmo rodeado pela multidão que dia e noite enchia seu quarto, perguntou-me: “Por que eles não rezam?” Ao ouvir essas palavras, todos se ajoelharam e até os protestantes se uniram às ladainhas e orações pelo moribundo.

Estas foram algumas das últimas palavras de Chopin: “Sem ti, meu amigo, eu teria morrido como um porco!” [5]. Ele invocou os nomes de Jesus, Maria e José, agarrou o crucifixo, apertou-o junto ao coração e disse, agradecido: “Agora me encontro na fonte da bem-aventurança!” Num apartamento no número 12 da Place Vendôme em Paris, onde hoje funciona uma joalheria, às duas da manhã de uma quarta-feira, 17 de outubro de 1849, Chopin, o rebelde, morreu aos 39 anos de idade. “Assim morreu Chopin”, concluiu padre Jelowicki, “e na verdade sua morte foi o mais belo concerto de sua vida” [6].

Referências

  1. The Catholic Northwest Progress, Seattle, WA, 6 de outubro de 1939, p. 3.
  2. Insegnamenti di Benedetto XVI, VI, 1, 2010, Libreria Editrice Vaticana, p. 284.
  3. J. Huneker, Chopin: The Man and His Music, New York: C. Scribner’s Sons, 1918, p. 79.
  4. Huneker, op. cit., 78-84.
  5. Wierzynski, The Life and Death of Chopin, New York: Simon and Schuster, 1949, p. 412.
  6. Huneker, op. cit. pp. 83-84.

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