Dúvida: Padre, ouvi falar recentemente da expressão “confissão devocional”. Creio que preciso disso, mas não tenho certeza do que se trata. Seria o tipo de confissão que fazemos quando não vivemos habitualmente em pecado grave ou venial? Seria uma ocasião para confessar de novos pecados antigos, a fim de receber o benefício do sacramento? Se for o caso, não seria um escrúpulo? Toda orientação será bem-vinda.
Resposta: Tenho a impressão de que sua pergunta pode ser resumida da seguinte forma: como posso receber as graças da Confissão, quando não estou pecando de forma óbvia (o tipo de pecado que cometia com tanta frequência)? Essa é uma boa pergunta, tendo em vista este mau hábito bastante comum: pensar que a Confissão só existe para os momentos em que pecamos tão gravemente a ponto de experimentar um terremoto espiritual. Sem dúvida, este é o principal objetivo do sacramento: abrir um caminho de reconciliação para o cristão batizado que caiu em pecado grave. Mas Papas e autores espirituais, ao longo dos últimos séculos, encorajaram de forma reiterada e enérgica, a todos, a prática da confissão frequente e regular. Santa Teresa de Calcutá se confessava semanalmente, assim como São João Paulo II. Obviamente, esses gigantes da fé não confessavam pecados mortais todas as semanas. Então, qual é o fundamento para a prática da confissão frequente e regular?
Benefícios da confissão frequente
Todo sacramento comunica sua própria graça particular. A graça sacramental da Confissão é, antes de tudo, o perdão dos pecados, mas também, de modo secundário, o fortalecimento espiritual da alma. Por isso ele é chamado sacramento de cura. Ele cura a nossa relação com Deus e com a Igreja, ferida ou rompida pelo pecado pessoal (reconcilia-nos com eles), e ao mesmo tempo fortalece essa relação.
Quando quebramos um osso, o corpo o regenera com uma dose extra de cálcio; dessa forma, após a recuperação, ele se torna realmente mais forte no ponto de ruptura do que antes do ferimento. Algo semelhante acontece na Confissão. Deus derrama a sua graça fortificante de uma forma especial sobre os elementos do nosso organismo espiritual que, por assim dizer, apresentamos a Ele na confissão.
Agora você consegue entender por que o demônio se esforça tanto por manter-nos afastados da confissão frequente e regular. Quando a nossa relação com Deus é rompida (pelo pecado mortal), ele não quer que nos reconciliemos. Mas, mesmo quando ela só é ferida (pelo pecado venial), ele tampouco quer que a fortaleçamos.
Esse sacramento, porém, confere ainda mais benefícios à alma, além das graças do perdão e do fortalecimento. Confessar-se supõe a árdua tarefa da autorreflexão. Todos os autores espirituais estão de acordo em que o exame de consciência frequente é uma peça-chave para o progresso espiritual. Temos de descobrir, com a ajuda de Deus, o quanto somos de fato carentes e miseráveis em termos espirituais, para que assim possamos nos abrir com ardor e confiança à ação de Deus. Confessar-se também é como um grande exercício espiritual. Por meio do processo de exame de consciência, arrependimento, confissão e penitência, exercitamos cada grande “grupo muscular” do espírito: as virtudes teológicas (fé, esperança e caridade), a humildade (ajoelhar-se e expor sistematicamente os próprios erros e faltas não é propriamente uma autoexaltação), a justiça, a prudência, a fortaleza (é necessário ter coragem para ir a um confessionário) e a abnegação. Esse sacramento é como uma “academia” da virtude cristã. Exercícios frequentes e regulares nela operam maravilhas em nossa saúde espiritual.
O que confessar?
Agora podemos abordar o cerne da questão. Toda confissão válida inundará a sua alma com esses benefícios, e quanto maior for o seu grau de consciência ao receber o sacramento, tanto melhor será o seu exercício. Para ser válida, uma confissão requer arrependimento sincero (o que inclui a intenção de cumprir a penitência dada pelo sacerdote) e a confissão dos pecados. Isso é fácil quando trazemos pecados óbvios na consciência. Mas, à medida que crescemos na vida espiritual, essas faltas tendem a diminuir. Quando isso acontece, precisamos nos examinar com mais cuidado a fim de desvelar atitudes, juízos e intenções ocultas que ainda são autocentradas, e não centradas em Cristo. A Sagrada Escritura nos alerta para o fato de que não sabemos a real profundidade do nosso egoísmo: “Quem pode, entretanto, ver as próprias faltas? Purificai-me das que me são ocultas” (Sl 18, 13). Esse é um excelente tópico para ser abordado em direção espiritual.
Porém, às vezes identificamos erros que não foram intencionais. Apenas os cometemos por fraqueza ou irreflexão. Nesse ponto, podemos entrar numa área nebulosa entre o pecado venial, pelo qual somos de algum modo responsáveis diretamente, e aquilo que os autores espirituais chamam de “imperfeições”, pelas quais somos apenas remotamente responsáveis, se tanto. Um bom exemplo disso são os juízos e críticas internas que fazemos de outras pessoas. Às vezes só percebemos que estamos fazendo isso depois de alguns minutos, sem que tivéssemos decidido de forma consciente começar a julgá-las. Trata-se de uma injustiça, mas ela tem origem em nossas tendências egoístas, e não na falta de caridade deliberada (a menos que continuemos fazendo isso mesmo depois de nos darmos conta da atitude).
Quando a matéria da confissão está nessa região nebulosa, é uma prática saudável finalizá-la com a menção de alguns pecados passados mais evidentes. Se já tiverem sido confessados, não precisamos confessá-los novamente em detalhes (isso seria, como você sugere, um passo em direção ao escrúpulo), mas apresentá-los ao Senhor é uma excelente maneira de mostrar-lhe que estamos verdadeiramente arrependidos de todos os nossos erros e pecados. Então, por exemplo, se no passado os seus pecados evidentes tiveram a ver com roubo, fraude ou suborno, você poderá terminar a sua confissão regular dizendo algo do tipo: “Confesso estes pecados (aqueles já mencionados por você) e todos os de minha vida passada, particularmente aqueles contrários à virtude da justiça. Estes são os meus pecados”.
Agora que exploramos alguns aspectos teóricos e práticos da confissão regular e frequente, você pode estar se perguntando: “Qual deveria ser a frequência da minha confissão regular?” Bom, se Madre Teresa se confessava semanalmente, esse não é um mau critério. Mas nem sempre isso é possível, além de possivelmente fazer com que você se sinta sob pressão. A confissão quinzenal intensificará a sua amizade com Cristo, e na cultura destrutiva de hoje a confissão mensal é quase o mínimo necessário para alguém que leva a sério o crescimento espiritual. Mas lembre-se de que a Igreja só exige que nos confessemos anualmente, caso a nossa consciência nos acuse de algum pecado mortal. A Confissão frequente não é um dever imposto pela Igreja; é apenas um conselho sábio e sincero.
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