São Nicolau nasceu em Santo Ângelo, na Marca de Ancona, mas é chamado Nicolau de Tolentino por lá ter residido durante os últimos trinta anos de sua vida. Os pais dele, Campano e Amata, estavam há muito tempo sem filhos e, desejosos de ser abençoados com uma criança, fizeram uma peregrinação a Bari, ao santuário do bispo São Nicolau. Depois de cumprir fervorosamente suas devoções, foram agraciados com uma aparição do santo: eles lhes disse que teriam um filho em quem poriam o nome de Nicolau e que se tornaria um homem de eminente virtude. A veracidade da previsão não demorou a confirmar-se.
Era notável o fato de que, desde a infância, Nicolau possuía o espírito de oração em grau elevado, e quando chorava, como é costume das crianças, nada o acalmava mais facilmente do que lhe dizerem que o levariam à igreja. Quando lá se encontrava, permanecia sempre calado e, à medida que crescia, mostrava ter uma reverência verdadeiramente angelical. Jamais pronunciava uma só palavra quando estava na casa de Deus, nem olhava ao redor com curiosidade. Em toda a sua conduta nunca se viu qualquer tipo de infantilidade ou frivolidade.
Quando teve idade suficiente para iniciar seus estudos, demonstrou notável avidez pelo conhecimento e fez grandes progressos: por isso, foi admitido, ainda muito jovem, entre os cônegos da Igreja de São Salvador. Mas um dia, quando ouvia um sermão sobre as palavras do Apóstolo: “Não ameis o mundo, nem as coisas do mundo” (1Jo 2, 15), proferido por um eremita agostiniano, sentiu um desejo interior de deixar tudo o que é temporal e servir a Deus mais perfeitamente no estado religioso. Por isso, logo após o sermão, dirigiu-se ao superior da referida Ordem e pediu para ser admitido como noviço.
O pedido dele foi atendido e, cumprindo a profecia de São Nicolau, já no ano de noviciado, apresentou virtudes verdadeiramente eminentes, o que fez com que lhe fosse permitido fazer a profissão mais cedo que de costume. Sua constante mortificação suscitava a admiração de todos com quem se relacionava. Quando tinha apenas sete anos, ouvira dizer que seu padroeiro São Nicolau, quando criança, abstinha-se todas as quartas e sextas-feiras do seio de sua mãe, e começou imediatamente a passar os mesmos dois dias sem comer.
Com o passar do tempo, acrescentou mais dois dias de jejum. Passou trinta anos sem tocar em carne ou peixe, abstendo-se até de ovos, leite e fruta, contentando-se com pão, legumes e água. Mesmo quando estava gravemente doente, não abandonava essa austeridade. Certa vez, quando os médicos lhe receitaram carne e o superior geral da Ordem lhe ordenou que seguisse o conselho, ele obedeceu, mas depois de ingerir um bocado, pediu para ser dispensado de comer mais, dizendo que recuperaria as forças sem ela, o que não deixou de acontecer.
Além desses jejuns contínuos, o santo homem castigava seu corpo inocente de várias maneiras. Usava constantemente um cilício e açoitava-se todas as noites com uma corrente de ferro. À noite, descansava um pouco, deitando diretamente no chão, e nunca permitia ao seu corpo a mais ligeira recreação. Certa vez, quando alguém lhe disse para não ser muito severo consigo mesmo, ele respondeu: “Não entrei no estado religioso para me dar ao luxo do conforto próprio.” Em vão tentou o Maligno, com visões terríveis e crueldades, perturbar o zelo piedoso do servo de Deus, que se manteve fiel ao caminho que escolhera.
Sua preocupação com a salvação das almas era inesgotável, e ele corrigiu muitas delas com seus sermões e discursos particulares. Seu maior prazer era visitar os doentes e os presos, confortá-los e assisti-los. Não menos profunda era sua compaixão pelas almas do Purgatório, pelas quais oferecia diariamente suas orações, penitências e a Santa Missa, libertando muitas delas de seus sofrimentos.
Desde a infância foi devoto fervoroso de Maria, Mãe de Deus, e por isso recebeu dela muitos e grandes favores. Certa vez, quando sofria de uma febre intensa, pensou haver chegado sua última hora e, ao meditar sobre os juízos do Todo-Poderoso, foi tomado de medo. Recorreu à sua amada mãe, a Virgem Santíssima, que se dignou aparecer-lhe, dizendo para abandonar todo o medo e ter esperança. Ao mesmo tempo, ela abençoou uma casca de pão que estava ao lado dele e disse-lhe que a comesse. Ele o fez imediatamente, e a febre o deixou. Esta é a origem do chamado pão tolentino, abençoado na festa desse santo e, muitas vezes, bastante salutar para os doentes.
Ele mesmo fez muitos milagres em favor dos doentes e dos pobres, como se pode ver em sua biografia mais detalhada. Acrescentaremos apenas algumas linhas sobre sua morte feliz, cuja hora Deus lhe revelou, embora precedida de uma dolorosa doença que durou seis meses. Durante esse período, sentiu uma consolação indescritível por causa da música celestial que ouvia durante a noite ou pela manhã. Em muitas ocasiões, também as pessoas que estavam com ele a ouviam. Recebia os santos sacramentos com grande devoção, derramando muitas lágrimas. O crucifixo, que continha um fragmento do lenho da Santa Cruz, beijou-o com grande fervor, pedindo ao Todo-Poderoso que o socorresse em seu último combate e o protegesse de todos os perigos pelo poder da Santa Cruz.
Além disso, o coração dele estava tomado pelo desejo de contemplar no Céu aquele a quem havia amado acima de tudo na terra. Por isso, exclamou várias vezes em voz alta: “Tenho desejo de ser dissolvido e estar com Cristo!” (Fl 1, 23). Pouco antes de falecer, foi possível ver em seu semblante uma santa alegria, e quando lhe perguntaram a causa, ele respondeu: “Nosso Senhor Jesus Cristo, apoiando-se em sua amada mãe e em Santo Agostinho, chama-me para junto dele com estas palavras: ‘Vem, servo piedoso e fiel, entra nas alegrias do teu Senhor!’” Dito isto, fixou os olhos no crucifixo, disse: “Senhor, em tuas mãos entrego o meu espírito”, e em seguida expirou.
Ele é representado com um lírio na mão e uma estrela no peito. O lírio representa a pureza e a inocência angélica, que ele manteve invioladas; a estrela, a vida santa do grande servo do Todo-Poderoso. São Nicolau foi, por toda a vida, uma estrela brilhante na Igreja de Deus, por causa de suas muitas e grandes virtudes. Seu túmulo brilha ainda em nossos dias com uma luz divina, devido aos muitos e grandes milagres com que Deus honra seu servo fiel neste lugar.
*
Hoje o Martirológio Romano também apresenta um registro biográfico de Santa Pulquéria, Imperatriz. Esta santa era filha do Imperador Arcádio, que, ao morrer, deixou quatro filhas e um filho, o qual o sucedeu no trono e reinou gloriosamente sob o nome de Teodósio, o Jovem. Apesar de ser apenas dois anos mais velha que o irmão, Pulquéria ocupava o lugar de conselheira, sem cujo auxílio ele não tomava decisão alguma.
Deus concedeu-lhe tal sabedoria, que ela administrava os assuntos mais importantes do Estado, para satisfação geral e grande benefício do povo. Com todo o cuidado possível, ensinou seu irmão, o imperador, a levar uma vida santa, não só para si, mas também como exemplo para os súditos dele, cuja felicidade ela o ensinou a considerar a sua maior preocupação.
Ela corrigia as falhas do imperador de uma forma peculiar, a qual pode ser exemplificada pelo seguinte fato: O imperador confiava plenamente em alguns de seus conselheiros e costumava assinar sem ler todos os decretos e cartas que lhe eram apresentados. Querendo libertá-lo de um hábito tão perigoso, Pulquéria preparou um decreto por meio do qual a esposa dele, Eudóxia, deveria ser entregue a Pulquéria como prisioneira. O decreto foi apresentado ao imperador em meio a muitos outros, e o soberano o assinou juntamente com os demais. Pulquéria tomou-o, convidou a imperatriz para ir aos seus aposentos e, apresentando-lhe o decreto imperial, disse que ela era e deveria permanecer sua prisioneira, até que o imperador o revogasse.
Algum tempo depois, Teodósio mandou chamar a imperatriz, mas Pulquéria respondeu-lhe que Eudóxia era sua prisioneira e que, como tal, não a libertaria. O imperador, surpreendido, foi às pressas falar com a irmã a fim de obter uma explicação para a resposta dela. Apresentando-lhe o decreto assinado por ele, disse: “Vê, meu irmão e imperador, o que pode acontecer quando somos muito intempestivos em nossos negócios e assinamos o que não lemos e analisamos.” O imperador, recebendo amavelmente a admoestação, prometeu ser mais cauteloso no futuro.
Tudo correu bem durante vários anos, e Deus abençoou visivelmente o que fizera o imperador, aconselhado pela irmã. No entanto, por fim, Crisáfio, um conselheiro perverso, conseguiu fazer com que o imperador ficasse de tal forma contra Pulquéria, que ele desejou libertar-se de sua presença e governar o povo sem a orientação dela. Quando Pulquéria soube disso, afastou-se dos assuntos do governo e, deixando a corte, foi para uma casa de campo, não muito longe de Constantinopla, onde serviu a Deus com muito fervor em pacífica solidão.
Ela tinha feito há muito tempo o voto de castidade perpétua e havia persuadido suas três irmãs — Flacila, Arcádia e Marina — a fazer o mesmo. Por isso, ela não encontrou dificuldade em deixar os prazeres e honras da corte e ocupar-se apenas com aquele que escolhera como esposo.
A corte imperial, no entanto, logo assumiu um aspecto diferente. Omitamos muitos outros atos vergonhosos lá praticados e mencionemos apenas uma nova heresia, que teve liberdade para surgir e prosperar em Constantinopla, cujo autor foi um certo Eutiques. Crisáfio, seduzido por ele, transmitiu as doutrinas venenosas ao imperador e à imperatriz, os quais, favorecendo o heresiarca, logo começaram a perseguir os fiéis católicos. Ao saber disso, Pulquéria ficou profundamente angustiada com o fato de seu irmão ter se deixado seduzir de forma tão infeliz, a ponto de transformar-se, de zeloso protetor da verdadeira Igreja, em perseguidor dela.
Ela rezava incessantemente ao Todo-Poderoso para que iluminasse e convertesse seu irmão, e pedia as orações de outros piedosos servos do Senhor, com a mesma intenção. Deus atendeu-lhe ao pedido e concedeu a Teodósio a graça de reconhecer e corrigir o seu erro. Ao mesmo tempo, como estava claro para ele que nunca teria cometido um erro tão grave, se sua piedosa irmã estivesse perto dele com seus conselhos, pediu-lhe que regressasse à corte.
Embora Pulquéria estivesse feliz e satisfeita, e não quisesse regressar ao turbilhão do mundo, o desejo de guiar o irmão no caminho certo, e impedi-lo de desviar-se novamente dele, fê-la consentir. Assim, ela retornou à corte e à cidade e, depois de ter reconduzido integralmente seu irmão à verdadeira fé, esforçou-se, com o máximo de seu poder, por exterminar a nova heresia, empregando os mesmos meios que havia usado quando Nestório começou a disseminar seus erros heréticos. No Concílio de Calcedônia, os bispos chamaram-na protetora da fé, exterminadora da heresia e nova Santa Helena. O Papa São Leão Magno agradeceu-lhe e felicitou-a pela dupla vitória obtida contra aqueles dois hereges.
Com a morte de Teodósio, Pulquéria acabou se tornando senhora do império. Para ajudá-la nessa difícil posição, ela escolheu Marciano, que havia sido um oficial de alta patente sob o comando do falecido imperador, e era um homem de mérito distinto e grande santidade de vida. A ele entregou sua mão em casamento, mas com a condição de que ambos deveriam viver em continência, pois ela havia consagrado sua virgindade ao Todo-Poderoso. Marciano prometeu respeitar seu voto e manteve sua palavra fielmente. O benefício que a Santa Igreja e o Estado receberam desta união não pode ser descrito no espaço limitado de que dispomos.
O único desejo do povo era que Pulquéria e Marciano fossem poupados para reinar por muitos anos. Mas aprouve ao Rei de todos os reis chamar sua fiel serva Pulquéria à morada celeste no ano 453 d.C., antes de completar 55 anos. Como jamais pusera o coração nas coisas temporais, não teve dificuldade em deixar o mundo. Na verdade, quando pressentiu que a morte se aproximava, o desejo de se unir a Cristo, a quem tinha servido com castidade e amor fiel, tornou-se cada vez mais intenso. Depois de receber devotamente os santos sacramentos, terminou sua santa vida com serenidade e paz.
Os pobres, para quem esta incomparável imperatriz fora sempre uma mãe amorosa, tornaram-se herdeiros dela por testamento. Ela construiu e adornou generosamente muitas igrejas e hospitais. Apesar de estar sempre rodeada de divertimentos, praticava inúmeras penitências, lia diariamente um livro devoto e levantava-se frequentemente à meia-noite para honrar o Todo-Poderoso, cantando os Salmos. Prestava a devida reverência aos santos e às suas relíquias, e era profundamente devota da Rainha do Céu. Defendeu a honra da Santíssima Virgem, sobretudo contra o heresiarca Nestório, que blasfemava dizendo que Maria era mãe só de Cristo e não de Deus. O Concílio de Éfeso condenou essa blasfêmia e por causa disso Santa Pulquéria construiu uma magnífica igreja em honra da Santíssima Virgem.
Que o Todo-Poderoso dê à sua Igreja muitos protetores assim, e guarde e proteja aqueles que se esforçam por seguir o exemplo desta santa em seu zelo, generosidade e magnanimidade.
Considerações práticas
I. A meditação das palavras: “Não ameis o mundo, nem as coisas do mundo” (1Jo 2, 15), e o sermão sobre as vaidades do mundo, levaram Nicolau a se afastar de todas as coisas temporais e enveredar pelo caminho da santidade.
Se você também meditasse sobre a vaidade das honras temporais, das riquezas e dos prazeres, não os buscaria com tanta avidez, nem se dedicaria a eles com tanta insensatez. Reflita em seu íntimo o que realmente é tudo o que parece grande no mundo e quanto tempo dura. “Vaidade das vaidades, e tudo é vaidade” (Ecle 1, 2), disse o sábio Salomão, depois de ter desfrutado de todas as alegrias e bens deste mundo. Encontrou nelas apenas vaidade e aborrecimento de espírito, e viu que nada é estável nesta terra. Todos os prazeres, honras e riquezas desaparecem, e muitas vezes tão rapidamente, que já desapareceram mal pensamos ter começado a desfrutá-los.
E o que essas coisas deixam? O que dão ao homem? Acaso é muito mais feliz do que antes quem nelas toma parte? Na verdade, nem um pouco. O que elas deixam e dão ao homem não é senão a angústia da consciência, a tristeza do coração e um justo temor do castigo divino. O Espírito Santo diz que “a alegria pode terminar em amargura” (Pr 14, 12). E o que acontece com os amantes do mundo e das vaidades mundanas? São Bernardo escreve:
Dizei-me, onde estão os amantes do mundo, que ainda há pouco tempo estavam entre nós? Que resta deles senão pó, cinzas e vermes? Considerai o que são agora e o que foram. Eram homens como vós; comiam, bebiam e se divertiam, e foram precipitados, de repente, nas profundezas do Inferno!
É possível que você creia nisso e, no entanto, possa amar o mundo e ser escravo dos desejos da carne? Se deseja alegrias e bens, empenhe-se em ganhar os que são eternos.
II. Ao sentir próxima a morte, a santa Imperatriz Pulquéria manifestou um intenso desejo de unir-se ao Esposo celeste. Também São Nicolau recorre às palavras de São Paulo, exprimindo o desejo de estar com Cristo.
Somos criados para o Céu e para Deus. Aqui estamos no exílio, o Céu é a nossa casa. Estamos no mundo como peregrinos numa jornada. O fim deste caminho é o Céu, que alcançaremos seguindo sempre em frente. Por que não desejamos mais o Céu? Por que não suspiramos mais para ver a face do Todo-Poderoso? Certamente cometemos um grande erro ao pensar tão raramente no Céu e ao não manifestar nenhum desejo de ver a Deus. Isso é um sinal de que não acreditamos nos ensinamentos de nossa fé em relação ao Céu e a Deus, ou de que não estimamos o suficiente uma bênção tão elevada. Ambas as posturas estão erradas.
Por isso, no futuro, procure suscitar frequentemente o desejo do Céu, o desejo de ver a Deus, o Bem Supremo. Diga com atenção as seguintes palavras da Oração do Senhor: “Venha a nós o vosso reino”. Diga com o santo Rei Davi: “Quando irei e contemplarei a face de Deus?” (Sl 42, 3) ou, com São Nicolau, a exemplo de São Paulo: “Tenho desejo de ser dissolvido e estar com Cristo!” (Fl 1, 23). Exclama São Paulino: “Quão negligentes, imprudentes e preguiçosos somos nós em não nos esforçarmos por suspirar mais frequentemente pelo Céu, pela companhia bem-aventurada dos santos, e pela contemplação da Suprema Bondade!”
O que achou desse conteúdo?