A Anunciação, uma das maiores e mais antigas festas marianas que temos, é cheia de significado e expectativa. Primeiro, porque marca o início do fim do domínio de Satanás sobre a humanidade. Assim como o não da primeira Eva a Deus levou à nossa escravidão sob o pecado, o sim (ou fiat) da nova Eva a Deus abriu o caminho para a nossa salvação. O Papa Bento XVI descreve lindamente este fiat como o “sim” de uma proposta de casamento: “Maria, diante do Senhor, representava toda a humanidade: na mensagem do Anjo, era Deus que fazia uma proposta de matrimônio à humanidade; e Maria, em nosso nome, disse sim.”
E assim como a Anunciação é uma espécie de casamento entre Deus e o homem, também é uma espécie de casamento entre Maria e a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade. A Mãe de Deus é saudada como a “Esposa do Espírito Santo” porque neste dia o poder do Paráclito a cobriu (cf. Lc 1, 35). Como se não bastasse, a Anunciação é, juntamente com o Natal, uma grande festa da Encarnação. Este, aliás, é o dia em que aquela Segunda Pessoa da Santíssima Trindade se uniu à nossa humanidade, tornando-se humildemente um zigoto, uma única célula eucariótica, no seio de Nossa Senhora. Ou, para ser mais claro, este é o dia em que a Palavra se tornou carne e habitou entre nós (Jo 1, 14), e o lugar onde Ele primeiro escolheu habitar — ou, traduzindo o grego original mais literalmente, para armar sua tenda entre nós (ἐγένετο καὶ ἐσκήνωσεν ἐν ἡμῖν, egeneto kai eskēnōsen en hēmin) —; Ele estava dentro desta donzela de Nazaré, fazendo dela um santo tabernáculo e uma nova e mais verdadeira Arca da Aliança. Este é o dia, como proclama a liturgia maronita, em que “a paz de Deus é plantada, e as alturas e as profundezas gritam: ‘Oh, vem, Senhor Jesus!’” [i].
Alguns desses temas estão presentes nas orações do rito romano antigo. A Coleta, por exemplo, diz o seguinte:
Deus, qui de beátae Maríae Vírginis útero Verbum tuum, Angelo nuntiante, carnem suscípere voluisti: praesta supplícibus tuis; ut, qui vere eam Genitrícem Dei crédimus, ejus apud te intercessiónibus adjuvémur. Per eundem Dóminum nostrum. — Ó Deus, que pelo anúncio do Anjo quisestes que o vosso Verbo recebesse uma carne do ventre da bem-aventurada Virgem Maria: concedei aos que vos suplicam, [a nós] que nela cremos como verdadeira Mãe de Deus, sermos ajudados por suas intercessões diante de Vós. Pelo mesmo Cristo Senhor nosso.
Na primeira parte (ou prótase), a maioria das traduções diz “no ventre” de Maria em vez de “do ventre”, mas a preposição em questão não é “em”, mas “de”, que significa “a partir de”. Sem dúvida, podemos perdoar o antigo autor pela imprecisão biológica: os bebês não são formados a partir do tecido do útero de sua mãe, mas de um óvulo que está no útero, fato que não foi descoberto até o século XIX. Mas vale a pena contemplar o ponto principal: quando o Verbo se fez carne, esta veio inteiramente da carne de Maria, e não de uma mistura da carne do pai e da mãe. Para colocar em termos modernos, 100% do DNA de Jesus Cristo veio de Maria de Nazaré.
Na segunda metade (ou apódose) da oração, pedimos a ajuda de Deus por intercessão de Maria, quase como uma barganha: acreditamos que esta donzela deu à luz o Deus encarnado; em troca, não poderíamos receber dela alguns favores especiais? Embora a frase ejus apud te intercessiónibus… possa ser traduzida como “por suas intercessões convosco”, escolhi “por suas intercessões diante de Vós” para destacar o caráter distintivo da preposição apud, equivalente latino do francês chez (“na casa de”). Parece haver um contraste implícito entre o Verbo encarnado ter estado no ventre de Maria e esta encontrar-se agora na morada eterna de Deus. Aquela na qual Deus esteve encerrado, está agora encerrada em seu Paraíso.
A oração Secreta é assim:
In méntibus nostris, quáesumus, Dómine, verae fídei sacramenta confirma: ut, qui conceptum de Vírgine Deum verum et hóminem confitémur; per ejus salutíferae resurrectiónis potentiam, ad aeternam mereámur perveníre laetitiam. Per eundem Dóminum. — Confirmai em nossas mentes, nós vos suplicamos, Senhor, os mistérios da verdadeira fé: para que nós, que confessamos ser verdadeiro Deus e verdadeiro homem o fruto da Virgem, mereçamos, pelo poder de sua ressurreição salvadora, alcançar a eterna alegria. Pelo mesmo Cristo Senhor nosso.
Sacramenta, que traduzi como “mistérios”, também significa “sacramentos”. Dado que o sacramento da Eucaristia está para ser consagrado, é uma ambivalência adequada. Salutifera, que traduzi como “salvadora”, significa literalmente “trazer a salvação”. Quando pensamos na Encarnação, pensamos no poder salvador de sua Ressurreição.
A oração Pós-comunhão é esta:
Gratiam tuam, quáesumus, Dómine, méntibus nostris infunde: ut qui, Angelo nuntiante, Christi Filii tui incarnatiónem cognóvimus; per passiónem ejus et crucem, ad resurrectiónis gloriam perducámur. Per eundem Dóminum. — Infundi, Senhor, nós vos pedimos, em nossas mentes a vossa graça, para que nós, que pela Anunciação do Anjo conhecemos a Encarnação de Cristo, vosso Filho, pela sua Paixão e Morte na Cruz, sejamos conduzidos à glória da ressurreição. Pelo mesmo Cristo Senhor nosso.
A oração é bem conhecida dos católicos como a conclusão do Angelus, o que em si é uma escolha interessante, na medida em que uma devoção mariana termina com uma oração que, explicitamente, não faz menção alguma a Maria. Em todo caso, como Pós-comunhão para a festa da Anunciação, a oração contribui para um interessante padrão de mistérios que são ou não mencionados:
- a Coleta menciona Maria, o Anjo e a Encarnação;
- a Secreta menciona Maria e a Encarnação;
- a Pós-comunhão menciona o Anjo e a Encarnação.
Mais uma vez, nossos pensamentos vão naturalmente da Encarnação à Paixão e à glória da Ressurreição. Afinal, por que Deus se tornou homem? Para morrer por nós e ressuscitar para nos dar a glória. É mesmo uma mensagem angélica boa demais para ser verdade. Mas é tão boa que tem de ser verdade.
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É impossível que 100% do DNA de Jesus tenha vindo de Maria, se assim fosse Ele seria uma Mulher!! É impossível o DNA precisa necessariamente ter sido editado por Deus pra que Jesus pudesse ser homem. Assim sendo não pode ter sido 100% de Maria, no máximo 99%.