Santa Margarida, virgem casta e gloriosa mártir de Nosso Senhor Jesus Cristo, nasceu em Antioquia, na Pisídia. Seus pais, ricos e nobres, eram pagãos, e sua mãe morreu quando ela ainda era uma criança. Por isso o pai, chamado Edésio, entregou-a a uma ama que vivia numa pequena povoação vizinha. A ama era cristã e esforçou-se por educar Margarida no amor à fé. Deus decretou que Edésio deixasse a filha por vários anos aos cuidados da ama, que, tendo assim tempo e oportunidade, a instruiu nas doutrinas da verdadeira fé, e bem cedo despertou no coração dela o desejo de dar a vida por amor a Cristo, relatando-lhe as torturas que tantos cristãos tinham sofrido pelo amor que tinham ao seu Salvador. Quando Margarida chegou à idade da razão, não só desejou ser batizada, mas logo depois consagrou sua virgindade ao Todo-Poderoso, não desejando nada mais ardentemente do que ser contada entre os mártires.

“Santa Margarida de Antioquia”, por Guido Reni.

O pai de Margarida ficou muito irritado quando foi informado de que ela havia abraçado a fé cristã, mas ocultou sua ira e, depois de levar a filha para casa, tentou, por meio de diferentes promessas e terríveis ameaças, induzi-la a renunciar a Cristo. Quando viu que tudo era inútil, recorreu a outros meios, que acreditava serem eficazes. Disse-lhe que, dali em diante, não a consideraria mais como filha, mas como serva e escrava. Ordenou-lhe que deixasse de lado as roupas que usava até então e que vestisse roupas velhas e esfarrapadas; depois disso, expulsou-a de casa e ordenou-lhe que fosse para os campos guardar o rebanho. Edésio supunha que isso lhe seria mais difícil de suportar que os suplícios, e que inevitavelmente produziria uma mudança no seu espírito. Mas estava enganado. Margarida levava muito a sério o fato de Cristo ter se rebaixado tão profundamente por nossa causa, a ponto de esconder sua dignidade sob a forma humana. Por isso, alegrou-se em ser humilhada por causa dele e cumpriu fielmente os seus deveres. Guardava o rebanho com uma paciência incansável, embora sofresse muito com a inclemência do tempo, e não se queixava da comida miserável que lhe davam. Seu único consolo era o fato de poder ocupar o tempo com orações e cantos de louvor a Deus.

Um dia, Olíbrio, prefeito da Pisídia, passou de viagem pelo local onde Margarida vigiava o rebanho. Dirigindo-se a ela, quis saber o seu nome, onde tinha nascido e quem eram os seus pais. Margarida respondeu a todas as perguntas com tanto decoro e modéstia, que Olíbrio se interessou profundamente por ela. Como Margarida, no decurso da conversa, também lhe dissera que era cristã, Olíbrio aproveitou o pretexto para levá-la consigo para Antioquia. Falando-lhe com muita amabilidade, advertiu-a para que abandonasse o cristianismo, com o argumento de que ela tinha nascido para algo melhor que tomar conta de um rebanho, e que faria dela sua esposa, e uma das maiores damas da cidade, se ela consentisse com os seus desejos. Margarida declarou destemidamente que não abandonaria a Cristo, nem se casaria com um ser humano, pois estava unida a um Senhor muito maior. 

Uma resposta tão inesperada transformou o amor de Olíbrio numa fúria tão selvagem, que ele imediatamente ordenou que lhe arrancassem a roupa e a estendessem no chão; depois disso, ela foi tão barbaramente chicoteada que o chão ficou coberto com o seu sangue, a ponto de os espectadores da cena ficarem tomados de compaixão. Durante o suplício, a heroína cristã mantinha os olhos fixos no céu, sem mostrar qualquer sinal de sofrimento; e quando os seus carrascos se cansaram, ela parecia ainda disposta a sofrer mais por amor a Cristo. Aqui, a virgem, com o corpo todo mutilado, deu graças a Deus por tê-la sustentado em sua primeira e terrível luta, e humildemente rezou para que Ele a ajudasse ainda mais com sua graça. 

O céu permitiu que o Maligno, chamado na Sagrada Escritura de serpente, lhe aparecesse sob essa forma, ameaçando devorá-la; mas como ela havia vencido o tirano, venceu também a serpente infernal. Confrontando-o com o sinal da santa Cruz, ela o afastou; e quando ele apareceu uma segunda vez, ela fez novamente o mesmo sinal sagrado, e Satanás teve de confessar que não tinha mais poder para prejudicá-la.

“Martírio de Santa Margarida”, por Giuseppe Cesari.

Após essa dupla vitória gloriosa, Deus enviou um anjo que curou imediatamente as feridas dela e a encorajou a enfrentar novos conflitos, com a promessa de que a assistência divina lhe seria dada.

Na manhã seguinte, Olíbrio chamou novamente à sua presença a destemida heroína, e repetiu as promessas e ameaças da véspera. Sem sucesso. Quando atribuiu a cura de suas feridas aos ídolos dele, a santa virgem o refutou com provas incontestáveis, repetindo que preferia morrer mil vezes a renunciar à fé. O tirano, vendo sua firmeza, ordenou novamente que lhe arrancassem as roupas; depois disso, tendo atado suas mãos e pés, queimaram seu peito e seus flancos com tochas, e para tornar o sofrimento ainda mais intolerável, jogaram-na em água fria, depois que todo o seu corpo havia sido cruelmente torturado. 

Mas Margarida jamais estivera tão alegre como durante este terrível martírio, e naquele momento ouviu-se uma voz do céu que dizia: “Vem, esposa de Cristo, entra na morada dos santos e recebe a coroa da glória eterna!” Todos os presentes ouviram essas palavras e, enquanto a terra tremia sob os seus pés, um medo indescritível apoderou-se deles. Muitos admitiram abertamente que eram cristãos, e Olíbrio, temendo uma revolta, ordenou que Margarida fosse imediatamente decapitada. O carrasco mostrou timidez em obedecer às palavras do prefeito, mas a própria Margarida encorajou-o a obedecer, e assim, pela espada, terminou sua vida casta e santa, no ano 175 de Nosso Senhor.

Considerações práticas

I. Como deve ter sido alto o apreço de Santa Margarida pela castidade virginal, que a fez recusar um casamento muito favorável e preferir os mais intensos tormentos à perda de seu inestimável tesouro! E você, que valor dá à castidade correspondente ao seu estado de vida? É preciso demonstrar isso usando os meios necessários para guardá-la, e evitando fervorosamente todos os pecados que lhe são contrários. Eu sei bem, o mundo considera esses pecados como ninharias ou fraquezas humanas: mas é Satanás que fala pela boca do mundo. Em quem você acredita mais: nele ou em Deus? “Se não acreditarmos no Senhor, nosso Deus, em quem acreditaremos?”, pergunta Santo Ambrósio. O Deus justo ordenou há muito tempo que o Inferno fosse destinado aos pecadores. Nenhum pecado é mais severamente castigado do que este. Temos exemplos disso no Dilúvio e no fogo que desceu do céu sobre as cidades de Sodoma e Gomorra. Ora, como poderia Ele ter punido o povo de maneira tão terrível, se o pecado tivesse sido, a seus olhos, apenas uma debilidade humana? Será que o Todo-Poderoso pode ser acusado de ignorância ou de injustiça? Certamente, nenhum de nós se atreverá a fazê-lo. 

Não, o mundo corrompido é que deve ser acusado de mentiroso, quando trata como uma ninharia o que Deus vê como um crime e pune tão severamente. Ai daqueles que se deixam cegar pelo mundo enganador! “Não vos enganeis”, diz São Paulo, “nem os impudicos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas possuirão o reino de Deus” (1Cor 6, 9). De acordo com estas palavras inequívocas, os lascivos não têm esperança de salvação, a menos que se emendem e se arrependam. O pecado da falta de castidade fecha aos homens as portas do Céu. Portanto, como podemos considerá-lo insignificante e vê-lo apenas como uma fraqueza humana? Esse vício, acima de todos os outros, cega sua vítima e prepara o caminho para outros pecados abomináveis, até endurecê-la e torná-la tão impenitente que, ou ela não pensa mais em converter-se e fazer penitência, ou não está disposta a alterar sua conduta — como o Espírito Santo nos ensina com as seguintes palavras: “Não aplicam os seus trabalhos a voltar para o seu Deus, porque o espírito de prostituição está no meio deles, porque não conhecem o Senhor” (Os 5, 4). 

E qual é o fim de tais pessoas? Responda você mesmo a esta pergunta e julgue se os pecados contra a castidade devem ser considerados insignificantes.

“Santa Margarida de Antioquia”, por Francisco de Zurbarán.

II. Como é reconfortante a morte, quando somos convidados a receber a coroa da glória eterna, à semelhança de Santa Margarida. Se você deseja uma morte assim, combata corajosamente — a exemplo dessa virgem casta — as lisonjas e as ameaças do mundo, da carne e de Satanás, especialmente em se tratando da castidade. Estes três tiranos são seus piores inimigos, e atacam você continuamente, por meio ou da violência ou ou do assédio, com lisonjas e carícias, mas o sucesso deles depende do seu consentimento. “Satanás”, diz Santo Agostinho, “é como um cão acorrentado. Pode ladrar e provocar, mas só consegue morder aquele que deseja ser mordido. Ele não nos faz mal pela violência, mas persuade-nos por meio de conselhos; não nos obriga a dar o nosso consentimento, apenas o pede.” O mesmo se pode dizer do mundo e da carne. Eles não podem obrigá-lo a pecar, e se você permitir que seus inimigos triunfem — algo que acontece quando, de bom grado, dá ouvidos às tentações deles —, de nada adiantará esperar pela coroa da glória. Em vez disso, seu destino será a condenação eterna. 

A sentença já foi pronunciada. O julgamento imutável de Deus é revelado por São Paulo, pois, para além do que você ouviu na Carta aos Coríntios, ele também diz claramente, noutro lugar, que os impuros não podem herdar o Reino de Deus (cf. Ef 5, 5). São João assegura-nos ainda que os impuros terão sua parte no tanque ardente de fogo e enxofre (cf. Ap 21, 8). Como será profundo o seu pesar, quando, estando nesse tanque ardente, isto é, no Inferno, você se lembrar de que, por causa do breve e abominável prazer que procurou na satisfação de sua luxúria, privou-se por toda a eternidade da coroa celestial e precipitou-se no fogo inextinguível do Inferno. “Consideremos longamente em nosso coração”, diz Santo Agostinho, “o destino daqueles que permaneceram até o fim na luxúria e nos prazeres desta vida. Olhemos para seus túmulos e perguntemo-nos: o que resta de seu orgulho, de suas riquezas, de sua devassidão? Procuremos suas vestes esplêndidas, seus luxos; procuremos os divertimentos frívolos, os banquetes esplêndidos que frequentavam; procuremos suas brincadeiras fúteis, seus risos e prazeres ilícitos. Onde está tudo isso agora? E onde estão eles?” 

Preste bem atenção às últimas palavras: “Onde está tudo isso agora, e em que eternidade estão eles agora?

Referências

  • Extraído e traduzido de Lives of the saints: compiled from authentic sources with a practical instruction on the life of each saint, for every day in the year, v. 2. New York: P. O’Shea, 1876, pp. 83-86.

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