Existe hoje um grande problema entre os católicos que ainda participam da Missa: a recepção coletiva e indiscriminada da Sagrada Comunhão, mesmo por quem não se encontra bem preparado e disposto para receber com fruto o Corpo do Senhor. Trata-se de um problema grave, denunciado com palavras claras e diretas pelos últimos dois Papas:

Algumas vezes, ou, melhor dito, em casos bastante numerosos, todos os participantes na assembleia eucarística se apresentam à Comunhão; mas, certas vezes, como confirmam pastores avisados, não houve a devida preocupação de aproximar-se do sacramento da Penitência para purificar a própria consciência. [1]

Este trecho poderia até ganhar o prêmio de “melhor eufemismo”, mas o seu sentido, em todo caso, é indiscutível: purificar a própria consciência por meio da confissão sacramental frequente — sobretudo quando se cometeu algum pecado mortal — é o único meio de garantir a reverência devida a Nosso Senhor Jesus, o Santo de Israel, realmente presente no Santíssimo Sacramento como viático para esta nossa peregrinação rumo ao céu.

Como ensina a Igreja, a Eucaristia não é um remédio para os que estão espiritualmente mortos, mas alimento para os que, já estando vivos, precisam ser fortalecidos na caridade. Podemos passar um dia inteiro dando de comer a um cadáver, mas esse alimento de nada servirá.

Na vida espiritual, a situação é ainda pior: quando um homem espiritualmente morto come do pão da vida, sua culpa agrava-se. Entregar tão sagrado alimento a pecadores públicos e impenitentes (como fazem, por exemplo, alguns padres e bispos que dão a Comunhão a políticos favoráveis ao aborto) é como amontoar brasas vivas sobre a cabeça tanto de quem administra como de quem recebe a Eucaristia (cf. Rm 12, 20). Não há meio termo; este é o ensinamento unânime dos Padres, Doutores e Papas, guardiões da fé católica.

O Papa Bento XVI fez notar numa entrevista o quanto o escandalizava ver multidões se aproximarem para comungar durante grandes eventos no Vaticano, situações em que, obviamente, os participantes são em grande parte apenas turistas e visitantes, ou católicos sem as disposições requeridas para comungar (pela falta de jejum eucarístico, por exemplo). Por isso, o Pontífice reintroduziu o costume do genuflexório e da comunhão na língua, para que as pessoas assim se lembrassem de que a Comunhão é um ritual sagrado, que envolve ninguém menos do que o Santíssimo:

Justamente nas celebrações de massa, como aquelas na Basílica de São Pedro ou na Praça, o perigo da banalização é grande. Ouvi falar de pessoas que colocam a Comunhão na bolsa, levando-a quase como se fosse um souvenir qualquer. Num contexto semelhante, no qual se pensa que é óbvio receber a Comunhão — da série: todos vão lá na frente, então também faço o mesmo —, queria apresentar um sinal forte, isto deve ficar claro: “É algo particular! Aqui está ele, diante dele é que caímos de joelhos. Prestem atenção! Não se trata de um rito social qualquer, do qual se pode participar ou não”. [2]

Os motivos dessa preocupação são, no fundo, bastante simples. O Concílio de Trento os expressa com brevidade e clareza incomparável:

Se não convém aproximar-se de nenhuma função sagrada a não ser santamente, por certo, quanto mais o cristão descobre a santidade e a divindade deste sacramento celeste, tanto mais cuidará diligentemente de aproximar-se dele só com grande reverência e santidade, principalmente quando lemos no Apóstolo aquelas palavras terríveis: “Quem come e bebe indignamente, come e bebe a própria condenação, não distinguindo o corpo do Senhor” (1Cor 11, 29). Por isso, a quem quiser comungar se deve lembrar o preceito: “Que o homem se examine a si mesmo” (1Cor 11, 28). [3]

À vista disso, os católicos precisam saber o que significa ter o cuidado de não se aproximar do Eucaristia “sem grande reverência e santidade”. Quais são, pois, as condições necessárias à recepção frutuosa e frequente do Santíssimo Sacramento?

A resposta a essa pergunta foi dada de forma autoritativa em 1905 pelo decreto Sacra Tridentina Synodus, um reflexo da mente e da vontade do Papa S. Pio X. Em resposta a insistentes formas de jansenismo que dissuadiam os fiéis de aproximar-se do altar, S. Pio X reduziu a idade mínima da primeira comunhão e encorajou o costume da comunhão eucarística frequente. As condições requeridas são as seguintes:

Em primeiro lugar, quem quiser aceder ao sagrado banquete deve estar em estado de graça, ou seja, não pode estar consciente de nenhum pecado mortal ainda não perdoado no sacramento da Confissão.

Em segundo, deve-se ter “intenção reta e piedosa”. O decreto assim define essa condição: “A reta intenção consiste nisto, que quem acede à sagrada mesa não o faça por costume, vaidade ou por razões humanas, mas queira satisfazer o desejo de Deus, bem como unir-se mais estreitamente a Ele pela caridade e socorrer suas enfermidades e defeitos com o remédio divino”.

Noutras palavras, a comungante deve estar consciente do que está fazendo, de Quem irá receber (logo, sem espírito de rotina) e de que o faz para satisfazer o desejo de Deus e santificar a própria alma mediante uma mais estreita união com Ele, e não pelo que os outros podem estar pensando (logo, sem vaidade e não por razões humanas).

Em terceiro lugar, “embora seja sumamente conveniente que os que comungam todos os dias estejam livres de pecados veniais, ao menos dos completamente voluntários, nem estejam inclinados a eles, todavia é suficiente que não tenham pecado mortal e o propósito de no futuro não mais pecar”.

É particularmente importante ressaltar este ponto hoje em dia, dada a grande confusão que existe entre os fiéis. Um católico que não tem a intenção de abandonar a vida de pecado, cooperando em uma ação objetivamente pecaminosa (como, por exemplo, unir-se civilmente a outra pessoa enquanto o legítimo cônjuge ainda vive) talvez nunca possa receber a Santa Comunhão, já que lhe falta “o propósito de no futuro não mais pecar”.

Por fim, embora não seja absolutamente necessário que o comungante preceda à santa comunhão com uma longa e cuidadosa preparação nem que reserve depois algum tempo à ação de graças, ambas as coisas — preparação e ação de graçassão vitais para que se colham com abundância os frutos da Sagrada Eucaristia, pois, como diz o Decreto, “este Sacramento […] produz tanto mais efeito quanto maiores e mais proporcionadas são as disposições de quem o recebe”.

Sem levar em conta os secretos desígnios de Deus, que pode elevar umas almas mais do que outras, é (no que a nós diz respeito) o exercício de uma fé viva e o ardor da devoção atual com que se aproxima do altar e se comunga o Corpo de Cristo o que diferencia os que, pela comunhão diária, se tornam santos daqueles que parecem não sair do lugar mesmo com o toque diário do Senhor.

Em resumo, as quatro condições necessárias para aceder com frequência e fruto à Sagrada Comunhão são: 1) estar em estado de graça; 2) ter uma intenção reta e piedosa; 3) não estar apegado ao pecado, no sentido de ter o propósito de não mais pecar no futuro; e 4) preparar-se antes e dar graças depois.

Que resultado teremos se observarmos os sábios conselhos da Santa Madre Igreja? É o mesmo Decreto que responde: “Por meio da Comunhão freqüente ou diária se estreita a união com Cristo, robustece-se a vida espiritual, enriquece-se a alma com maior tesouro de virtudes e assegura-se melhor a vida eterna”.

Que grande privilégio! E que grande desafio é viver de tal modo que possamos crescer em graça e pureza, fé e devoção!

Referências

  1. Papa S. João Paulo II, Carta Dominicae Cenae (24 de fevereiro de 1980), n. 11.
  2. Papa Bento XVI, Luz do Mundo: o Papa, a Igreja e os Sinais dos Tempos (trad. bras. de Paulo F. Valério), São Paulo: Paulinas, 2011, p. 191.
  3. Concílio de Trento, Decreto sobre o sacramento da Eucaristia, sessão XIII, c. 7 (DH 1646).

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