Os numerosos e elevados elogios feitos a São Lourenço pelos mais antigos e ilustres dos Santos Padres da Igreja — Santo Agostinho, Santo Ambrósio, São Leão Magno, São Máximo e São Pedro Crisólogo — são o sinal mais seguro de que esse santo foi sempre considerado um dos mais notórios mártires a derramar o sangue por Cristo.
Nasceu de pais cristãos, em meados do século III, em Osca, uma cidade em Aragão (atual Espanha). Seu pai se chamava Orêncio e sua mãe, Paciência; ambos são venerados como santos, e deram ao filho uma santa educação. Desde cedo, Lourenço demonstrou, em todas as ocasiões, um amor especial a Deus, uma constância intrépida na verdadeira fé e um cuidado vigilante na preservação de sua pureza. Ainda jovem, foi para Roma e conquistou, devido à sua vida irrepreensível, a mais elevada consideração de todos os que entravam em contato com ele. O Papa Xisto, ou Sisto, ordenou-o diácono, e suas funções eram servir o Papa no altar, cuidar dos tesouros da Igreja e distribuir as receitas destinadas ao sustento dos sacristãos e dos pobres.
Na época em que viveu São Lourenço, os cristãos sofriam uma terrível perseguição. O Papa Sisto foi capturado e encarcerado na Prisão Mamertina. Quando Lourenço viu, de longe, que estava sendo arrastado, correu em sua direção e, chorando amargamente, disse-lhe: “Pai, aonde vais sem teu filho? Santo Padre, aonde vais sem teu diácono? Nunca tiveste o hábito de oferecer o santo sacrifício sem mim, teu servo. Em que te desagradei, ó meu pai? Acaso me consideraste indigno de ti e do teu serviço sagrado? Prova-me agora e vê se escolheste um servo adequado ao confiar-me a dispensação do Sangue de Cristo!” O santo disse isto e muitas outras coisas, desejando sofrer com São Sisto por amor a Deus.
O santo Papa respondeu-lhe: “Meu filho, não te abandonarei, mas terás de sofrer uma grande provação. Nós que já somos velhos não temos muito que suportar; mas tu, por seres jovem e forte, tens de obter uma vitória mais gloriosa sobre o tirano. Não chores. Dentro de três dias, tu me seguirás. Vai agora e cuida dos tesouros da igreja que estão sob tua responsabilidade.”
Consolado pela profecia do santo Pontífice, Lourenço foi logo buscar os vasos sagrados e paramentos sacerdotais, distribuiu aos pobres o dinheiro arrecadado para ajudá-los, visitou os cristãos (reunidos em diversas casas e câmaras subterrâneas), exortou todos à constância e passou a noite inteira praticando obras de caridade e humildade. No dia seguinte, quando o Papa estava sendo levado para a execução, o santo levita aproximou-se novamente dele, dizendo: “Santo Padre, não me abandones! Os tesouros que me confiaste estão todos distribuídos.” Tal como no dia anterior, consolou-lhe o Papa, antes de ser levado embora e ter sua vida terminada pela espada.
Enquanto isso, alguns dos soldados, tendo ouvido Lourenço falar em tesouros, informaram do fato o Imperador Valeriano, o qual, igualmente avaro e cruel, mandou prender Lourenço, entregando-o a Hipólito, um oficial que o meteu numa prisão com vários malfeitores. Um deles, Lucílio, havia ficado cego de tanto chorar enquanto estava preso. Compadecido dele, Lourenço recomendou-lhe aceitar a fé cristã e ser batizado, pois assim recuperaria a visão. Lucílio seguiu o conselho e, pouco depois de receber o Batismo, voltou a enxergar. Hipólito, tocado pela graça de Deus devido a este milagre, converteu-se com toda a sua família. No dia seguinte, o imperador ordenou que Lourenço fosse levado até ele. O valente confessor de Cristo alegrou-se com a mensagem e disse a Hipólito: “Vamos, pois duas gloriosas coroas estão preparadas: uma para ti e outra para mim.”
O imperador perguntou-lhe quem era, de onde vinha e onde escondera os tesouros da Igreja. À primeira e segunda perguntas, Lourenço respondeu destemidamente: “Sou cristão e nasci na Espanha”. À terceira, disse que, se o imperador lhe desse algum tempo, recolheria tais tesouros e os mostraria a ele. Encantado com tais palavras, o imperador concedeu-lhe de bom grado o tempo desejado, mas ordenou a Hipólito que não saísse de perto dele por um só instante, para que não fugisse. O santo então reuniu todos os pobres que conseguiu encontrar e, levando-os ao tirano, disse: “Eis aqui os tesouros da nossa Igreja.”
Tomando por insulto a resposta, enfureceu-se o tirano e, pelos deuses, jurou vingança. Entregou Lourenço ao prefeito e ordenou-lhe que o torturasse da pior maneira possível, caso se recusasse a adorar os ídolos. O prefeito, tão cruel quanto o imperador, ordenou aos seus lictores que arrancassem as vestes do santo e o açoitassem, como a um vil escravo, até cobrir-lhe inteiramente o corpo de sangue e feridas. Depois, mostrou-lhe diversos instrumentos de tortura, ameaçando usá-los caso insistisse em não adorar os deuses. Lourenço encarou-os sem preocupação alguma: “Eles não me podem assustar. Há muito que desejo sofrer por causa de Cristo. Os vossos ídolos não são dignos de ser adorados; não são deuses, e nunca lhes oferecerei sacrifícios.”
Mal terminou de falar, o santo homem foi estendido no cavalete, erguido depois, e todo o seu corpo açoitado com flagelos, de cujas extremidades pendiam rosetas ou esporas. Depois disso, os carrascos acenderam tochas e as encostaram em seu corpo mutilado. Mesmo assim, a firmeza do mártir não podia ser abalada. Voltando os olhos para o Céu pedia, apenas, forças para resistir. O prefeito, espantado com tal heroísmo, atribuiu-o à magia, e ameaçou o santo com tormentos ainda maiores. Cheio de coragem, ele respondeu: “Fazei de mim o que quiserdes. Refugiando-me sob o nome de Jesus, não temo a dor. Ela não dura muito tempo.” O tirano fez com que o espancassem pela terceira vez; e com tamanha crueldade, que o próprio santo pensou que chegara a sua hora. Então, clamou a Deus: “Tomai a minha alma, Senhor, e libertai-a da mortalidade.”
Ouviu-se porém uma voz do Céu, que dizia: “Uma vitória ainda mais gloriosa espera por ti.” O povo ficou espantado, mas o tirano retrucou: “Romanos, escutais como os demônios consolam este homem ímpio? Veremos, no entanto, quem vencerá.” O santo foi novamente flagelado, e neste momento um dos soldados, Romão, avistou um anjo, que consolou o diácono e limpou o suor de sua testa e o sangue das suas feridas, milagre que o levou à conversão. Os carrascos estavam cansados de torturá-lo, mas não o santo de sofrer. A alegria e a paz irradiavam de seu rosto. O tirano ameaçou torturá-lo por toda a noite, se ele não sacrificasse aos deuses. Mas o santo respondeu-lhe: “Não há noite mais agradável para mim do que esta com que me ameaças. Nunca sacrificarei aos teus falsos deuses.” Diante desta resposta, bateram-lhe na boca com pedras e levaram-no de volta à prisão.
Durante a noite, o prefeito ficou pensando em uma nova maneira de torturar Lourenço da forma mais cruel possível; decidiu, por fim, assá-lo vivo. No dia seguinte, bem cedo, ordenou aos carrascos que fizessem uma cama de ferro em forma de grelha, colocassem brasas vivas debaixo dela, estendessem e prendessem o santo sobre ela, de modo a assá-lo pouco a pouco. A ordem foi cumprida, para grande horror de todos os presentes. O santo, no entanto, deitou-se com toda a tranquilidade sobre a grelha em brasa, como se fosse um canteiro de rosas, dizendo apenas em intervalos: “Recebei, Senhor, este holocausto como um perfume agradável.” Seu rosto resplandecia de alegria celestial, e os cristãos ali presentes diziam que uma luz divina o envolvia e que seu corpo exalava um suave odor.
Depois de queimar por muito tempo, voltou os olhos para o prefeito e disse: “Estou bem assado de um lado; vira-me e come a minha carne.” Podemos imaginar facilmente como o tirano reagiu a estas palavras. O santo, porém, continuava alegre e cheio de divina consolação. Louvava a Deus e agradecia-lhe a graça concedida de morrer pela fé. Por fim, com os olhos voltados para o Céu, entregou sua alma heroica nas mãos de seu Redentor, no dia 10 de agosto de 258. Muitos dos pagãos ali presentes converteram-se à fé em Cristo, graças a este glorioso martírio.
Considerações práticas
I. A vida de Lourenço, grande herói cristão, contém uma prova incontestável de que a Santa Missa era celebrada já nos primeiros séculos da era cristã, e era considerada o verdadeiro sacrifício do Novo Testamento, pois São Lourenço dizia que, quando São Sisto celebrava a liturgia, ele o servia como diácono. Portanto, como se atrevem os não católicos a considerar este santo sacrifício um ato supersticioso, quando eles mesmos admitem que a Igreja Católica, nos primeiros quatrocentos anos depois de Cristo, era a verdadeira Igreja?
Cristão católico, que nada abale sua fé. Não tenha nenhuma dúvida de que, na Santa Missa, aquele que ofereceu a si mesmo na Cruz ao Pai celestial, como vítima por todos os homens, é oferecido diariamente em sacrifício incruento. Mas, como você acredita verdadeiramente nisso, manifeste sua fé assistindo a esse santo sacrifício com frequência e devoção. Se tiver ocasião, não deixe passar um só dia sem fazê-lo, pois são verdadeiras as palavras de São Lourenço Justiniano: “Não há sacrifício mais excelente, nem mais agradável à Majestade divina, nem mais proveitoso para nós mesmos, do que este.”
II. “Refugiando-me sob o nome de Jesus, não temo a dor, porque ela não dura muito tempo”, disse Lourenço ao tirano. E foi exatamente isso o que aconteceu. Os tormentos sofridos por ele, apesar de terríveis, duraram pouco.
Mas, ainda que tivessem durado meses ou anos, teriam chegado ao fim, e aquilo que acaba, podemos dizer acertadamente, é breve. “Tudo o que termina com o passar do tempo”, diz Santo Agostinho, “é breve”. Bem diferente são os tormentos com que o Todo-Poderoso castiga o pecado no Inferno. Eles são terríveis, duram eternamente, nunca têm fim. Centenas de milhares de anos se passarão, e mesmo assim não terão cessado esses sofrimentos. “Seu verme não morre, e o fogo não se apaga”, diz o próprio Senhor (Mc 9, 44).
Quando você tiver de sofrer, pense nesses longos e terríveis sofrimentos, e certamente jamais se queixará do peso ou duração de suas provas, mas se sentirá encorajado a suportá-las com paciência. Tenha em conta que o sofrimento é breve e acaba logo, ao passo que os tormentos do Inferno não têm fim.
O que não devemos fazer, portanto, a fim de escapar desses terríveis sofrimentos! Se, assim como São Lourenço, tivéssemos de ser assados numa grelha em brasa para escapar do Inferno, de bom grado deveríamos aceitá-lo! “Quem não aceitaria, de bom grado”, comenta Santo Agostinho, “ser queimado por uma hora com São Lourenço, para se livrar do fogo do Inferno?”
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