São Venceslau, duque da Boêmia, era filho de Vratislau e Draomira. Enquanto o pai era um modelo de todas as virtudes cristãs, a mãe possuía todos os vícios, além de ser uma grande inimiga da religião cristã. No leito de morte, Vratislau entregou Venceslau aos cuidados de sua avó Ludmila, enquanto Boleslau, o filho mais novo, ficou com Draomira.
Como as duas mulheres tinham uma conduta moral completamente diferente, também a conduta dos dois filhos se tornou inteiramente distinta. Venceslau tornou-se piedoso e santo; Boleslau, ímpio e licencioso. Draomira, por sua vez, apoderou-se do governo do Estado e perseguiu os cristãos com crueldade.
Ela baniu os sacerdotes, expulsou os cristãos de todos os lugares públicos, que encheu de pagãos dos quais os fiéis não tinham nada a esperar senão maldade. Os nobres não quiseram submeter-se a esse governo e, após a deposição de Draomira, puseram Venceslau no trono, ligando-se a ele por um juramento de fidelidade. Furiosa ao perceber que os cristãos voltaram a ser protegidos pela piedosa Ludmila, Draomira tomou a decisão de vingar-se: contratou, pois, alguns assassinos que a estrangularam com seu próprio véu, enquanto ela praticava suas devoções em sua capela particular. Não satisfeita, ainda tentou escapar com o filho Venceslau.
Nesse ínterim, o santo príncipe comportava-se perante Deus e seus súditos de tal maneira que era amado e estimado por todos. Era extremamente bondoso em todas as suas ações, temperante no comer e no beber, incansável no cuidado com os súditos e irrepreensível em sua conduta.
Era tão caridoso com os pobres e os prisioneiros, tão compassivo com as viúvas e os órfãos, que o mundo cristão tinha poucos homens como ele. Visitava os presos à noite e dava-lhes generosas esmolas, aos doentes providenciava tudo de que necessitavam e tinha um coração paternal para com as viúvas e os órfãos. Sabemos que ele mesmo carregava lenha nos ombros para entregar aos necessitados à noite.
Nem sequer uma sombra de impureza manchou o brilho de sua vida, e conservou a castidade imaculada até o fim. Todos os dias, dedicava muitas horas à oração e, mesmo no inverno, visitava a igreja com frequência à noite, descalço. Um de seus servos, que o acompanhava, queixou-se um dia de frio, e o duque disse-lhe para pisar nas pegadas que ele, caminhando à sua frente, havia feito na neve. O servo assim o fez e já não sentia frio, porque as pegadas do príncipe eram aquecidas por seu amor à Santa Eucaristia.
Era sempre muito generoso com os sacerdotes. Servia-os frequentemente no altar e não permitia que lhes fizessem a menor injustiça, nem por palavras nem por ações. Distinguia-se especialmente pela devoção à Santa Missa, à qual assistia diariamente. Semeava, colhia e preparava com as próprias mãos o trigo usado para fazer as hóstias; cultivava e espremia as uvas para o vinho utilizado na Santa Missa. Numa palavra, Venceslau reinou e viveu como um santo.
O conde Radislau, desprezando a piedade do duque, fez o povo rebelar-se e marchar contra Venceslau. Este enviou-lhe uma delegação para propor a paz, mas Radislau nem mesmo quis ouvir a mensagem do rei, considerando-a um sinal de covardia. Por isso, o santo duque foi obrigado a confrontá-lo com seu exército. Os dois bandos estavam posicionados um de frente para o outro, quando Venceslau, triste com o derramamento de tanto sangue inocente, e disposto a dar o seu próprio em lugar do sangue de seus súditos, desafiou Radislau para um duelo: a vitória seria de quem matasse o seu adversário.
Radislau aceitou o desafio e, com a lança em punho, galopou de armadura completa em direção ao santo. Este também estava armado, mas trazia apenas uma espada. Radislau pretendia derrubar Venceslau com sua lança e assim dominá-lo. O santo, porém, foi ao encontro dele fazendo o sinal da cruz e, no momento em que Radislau estava prestes a cravar sua lança, viu, ao lado de Venceslau, dois anjos que lhe gritaram: “Afasta-te!” O brado atingiu Radislau como um raio, levando-o a mudar de intenção. Atirando-se do cavalo, caiu aos pés do santo, pediu-lhe misericórdia e perdão, prometendo-lhe obediência no futuro. Venceslau levantou-o do chão e recebeu-o de novo com bondade.
Pouco depois, o duque foi chamado a Worms para assistir à Dieta geral. O imperador e todos os príncipes e dignitários já se encontravam reunidos, mas Venceslau ainda não havia aparecido, pois estava ocupado ouvindo Missa. Pensando que o atraso era intencional e motivado por orgulho, decidiram recebê-lo com muita frieza e sem a honra que ele tinha o direito de esperar. Mas quando o santo entrou na sala, Otão, o imperador, viu que dois anjos o acompanhavam, levando diante dele uma cruz de ouro.
Quando o imperador se recompôs do espanto causado pela visão, levantou-se do trono e, dirigindo-se ao santo, conduziu-o ao lugar que lhe fora preparado. A assembleia inteira ficou muito espantada com esse ato do imperador, mas quando ele contou o que vira, todos olharam para Venceslau com a maior reverência. O imperador também concedeu a dignidade e o poder real a Venceslau; além disso, presenteou-o com o braço do mártir São Vito, que o santo recebeu com gratidão e com o devido respeito, levando-o consigo para a Boêmia. No final da assembleia, Venceslau regressou como rei e prosseguiu com sua santa vida.
Quanto mais os súditos amavam e honravam o piedoso monarca, por causa de sua santidade e nova dignidade, mais hostis Draomira e Boleslau se tornavam para com ele. Ao dar-se conta do fato, Venceslau decidiu renunciar à coroa, mas a perversa Draomira não quis esperar por isso. Boleslau tinha um filho, e Venceslau foi convidado a comparecer ao batizado do jovem príncipe. O santo rei tinha razões para supor que o convite envolvia outras intenções, mas aceitou-o para não revelar qualquer desconfiança em relação ao irmão.
Depois de ter se confessado e comungado, dirigiu-se destemidamente ao palácio de Boleslau. Foi recebido com grande honra e teve um magnífico tratamento. À meia-noite, antes de terminar o banquete, o santo saiu discretamente do salão e entrou na igreja, como de costume. Draomira aproveitou a oportunidade e, chamando Boleslau à parte, disse-lhe que tinha chegado a hora de ele vingar-se e tomar para si a coroa real. O tirano sedento de sangue não precisava ser persuadido. Tomando a espada, entrou às pressas na igreja com alguns assistentes e apunhalou seu santo irmão com uma força tão brutal, que o sangue respingou na parede, onde ainda hoje pode ser visto.
No entanto, o castigo de Deus não tardou a alcançar os assassinos. A terra abriu-se e engoliu Draomira, a instigadora do ato pecaminoso, com seu cavalo e carruagem, na região de Praga conhecida como Hradčany (Distrito do Castelo). Dos assassinos que estavam com Boleslau quando ele cometeu o crime, alguns perderam a razão, enquanto os outros tiraram a própria vida. O castigo de Boleslau veio mais tarde: depois de ser atormentado muito tempo pelas mais dolorosas doenças, terminou morto em toda a sua maldade.
Depois que Deus coroou sua alma virtuosa com a glória eterna no Reino dos Céus, o santuário do Rei Venceslau foi agraciado com muitos milagres.
Considerações práticas
I. Das muitas e grandes virtudes de São Venceslau que lhe apresentei, quero que leve a sério sobretudo a devoção dele ao santo sacrifício da Missa e a reverência pelos servos de Deus, os sacerdotes. Nem todos podem imitá-lo na colheita do trigo e do vinho para o sacrifício, mas todos podem imitá-lo na devoção com que assistia diariamente à Santa Missa, uma devoção que não podemos admirar o bastante, quando pensamos nos muitos assuntos importantes que ele, como duque e rei, tinha de tratar no governo do Estado.
Você, que não tem tantos afazeres como ele, e no entanto finge não ter tempo, o que tem a dizer sobre isso? Se sua estima pela Santa Missa fosse tão grande como a de São Venceslau, com certeza agiria diferente. Reflita sobre o que lhe ensina a esse respeito a santa fé, e você não só estimará mais a Missa, como dificilmente deixará passar um dia sem assistir a ela. Não receie que, por isso, você venha a sofrer perdas ou negligenciar seus negócios. Esse tempo dedicado ao Todo-Poderoso será de grande vantagem a você e ocasião de bênção para os seus negócios.
Portanto, faça a resolução de assistir à Missa diariamente, ou pelo menos tantas vezes quantas puder, mas procure, ao mesmo tempo, fazer isso com a devida reverência, como fazia o santo rei. Não converse, não olhe com curiosidade, não seja irreverente, não faça nada que seja desagradável aos olhos de Deus. Compareça diante dele como um mendigo deve comparecer perante o Senhor do céu e da terra, um pobre pecador diante de seu poderoso Juiz, um verme miserável perante o Criador de tudo o que existe. Pois a igreja é, na verdade, a casa de Deus e a porta do Céu.
II. Siga o exemplo do respeito que o santo rei manifestava pelos sacerdotes. De fato, eles são os embaixadores de Deus na terra, os enviados de Cristo para nos ensinar a palavra e a vontade do Todo-Poderoso. E a eles, ainda, devemos pedir o perdão dos nossos pecados, segundo o que foi instituído pelo Salvador. Estas razões não seriam suficientes para honrá-los? Quem se recusa a dar a devida honra ao embaixador de um monarca, recusa-a ao próprio monarca, e o mal causado ao primeiro é recebido pelo segundo como se feito a ele mesmo. Não lhe parece que o mesmo acontecerá com a honra ou a desonra feita aos sacerdotes?
Portanto, procure dar-lhes o devido respeito e honra. Não seja daqueles que falam de forma abusiva e irreverente dos padres e de suas ações, que divulgam suas faltas em todos os lugares, ou mesmo que os acusam de vícios dos quais são inocentes. Se um sacerdote tiver cometido um erro, não cabe a você desprezá-lo como embaixador de Deus. Muitos embaixadores dos poderes temporais têm seus defeitos, mas não ousamos insultá-los, porque são embaixadores reais. Os sacerdotes são enviados do Altíssimo e, devido a essa elevada dignidade, você deve a eles uma honra especial.
Se aqueles que falam tão desrespeitosamente dos sacerdotes considerassem suas grandes faltas, certamente concluiriam que não têm razão para caluniar os ungidos do Senhor. “Eles são como aqueles hipócritas”, diz São Gregório, “que carregam uma grande viga nos próprios olhos, sem vê-la, mas notam uma lasca nos olhos dos outros.” Preste atenção ao que diz depois o mesmo Santo Padre: “Se é uma lei justa que devem ser severamente punidos aqueles que, pela ofensa a um embaixador real, tornaram-se réus de lesa-majestade, que será daqueles que desprezaram a Majestade divina em seus sacerdotes?”
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