Santa Regina nasceu no ano 238, de pais pagãos. Tendo perdido a mãe pouco depois de seu nascimento, foi confiada pelo pai a uma ama que, felizmente, era cristã, embora este fato lhe fosse desconhecido. Ele deixou todo o cuidado e educação de sua amada filha a essa piedosa mulher, cujo único objetivo era fazer de sua pequena protegida uma cristã devota. Assim, logo que a luz da razão começou a despontar na mente da criança, ela a ensinou a respeitar a fé cristã e, como Deus tinha dotado Regina de grande inteligência, esta não tardou muito a reconhecer a inutilidade dos ídolos e a veracidade da nossa santa religião. A este conhecimento seguiu-se a resolução de tornar-se cristã e ser batizada em segredo. 

A solícita mulher sabia que o pai de Regina provocaria uma violenta tempestade quando soubesse do que tinha acontecido. Por isso, esforçou-se por preparar a recém-batizada para o martírio que lhe estava reservado. Contou-lhe os tormentos que tantos jovens e donzelas tinham suportado pela fé cristã; como tinham sofrido heroicamente e como tinham sido milagrosamente fortalecidos pelo Todo-Poderoso; descreveu-lhe a grande felicidade de sofrer por amor a Cristo, e como era grande a recompensa reservada àqueles que davam a vida pela confissão da fé. Explicou-lhe, também, com tanta eloquência o valor inestimável da pureza virginal, que Regina não hesitou em consagrar sua virgindade ao Todo-Poderoso. O desejo de ganhar a coroa do martírio também foi despertado no coração da terna donzela, e ela rezava diariamente a Deus para que lhe concedesse a graça de morrer por amor a Cristo. Como em tudo o que fazia era movida pelo pensamento de agradar ao Todo-Poderoso, sua conduta era tal que todos a admiravam e estimavam.

Santa Regina, num vitral da Basílica de Ars, na França.

O pai, que ignorava o fato de ela ter se tornado cristã, amava-a muito e estava ansioso para garantir sua felicidade com um casamento adequado. Quando a informou disso, ela lhe disse: “Querido pai, sei que me amas e que só procuras a minha felicidade ao desejar dar a minha mão ao jovem de quem falas. Mas se eu conhecesse alguém que me fizesse ainda mais feliz, opor-te-ias a que eu me unisse a ele?” O pai respondeu: “Ao contrário, eu me alegraria com isso. Mas onde encontrarás tal homem?” “Já o encontrei”, disse Regina. “É Jesus Cristo, o meu Salvador. Eu o escolhi. A Ele entreguei a minha lealdade e a minha fé.” Atônito com esta confissão, o pai, a princípio, não soube o que responder. Tendo-se controlado um pouco, exclamou: “Será possível, minha filha, que sejas cristã? Tu te deixaste enfeitiçar a ponto de abraçar uma fé tão desprezível? Nunca darei o meu consentimento a isso. Pensa bem se verás em mim o teu carrasco ou o teu pai.” Regina respondeu sem medo: “Não estou enfeitiçada. A fé cristã não é desprezível; é uma grande honra ser contado entre os fiéis. Não preciso de tempo para considerações; sou cristã e como tal viverei e morrerei.” 

O pai, demasiadamente enfurecido para ouvir ou dizer mais alguma coisa, deixou-a, e Regina dirigiu-se rapidamente à sua ama para informá-la do sucedido. Ela abraçou-a com alegria e felicitou-a por um começo tão corajoso, mas também aconselhou-a a rezar fervorosamente para obter forças do alto, a fim de sair vitoriosa no combate que se aproximava. Regina obedeceu e, como previra a ama, sua luta não tardou a começar: o pai esforçou-se por afastá-la de Cristo, alternando palavras amáveis e sinceras, carícias e ameaças. Mas tudo foi inútil, e Regina permaneceu firme na resolução de viver e morrer virgem e cristã.

Naquela época, Olíbrio, governador da Gália, foi de Marselha até Alésia, onde Regina residia. Tendo ouvido falar dela, mandou chamá-la imediatamente e comunicou-lhe que desejava torná-la sua consorte e esperava não ser rejeitado, pois ela não podia esperar um casamento que lhe pudesse dar maior felicidade ou elevá-la a uma dignidade mais alta. Regina, apesar de tê-lo tratado com a maior delicadeza, disse-lhe francamente que já tinha alcançado uma felicidade maior, pois tornara-se cristã e escolhera Cristo como seu esposo

Olíbrio, profundamente irritado com esta resposta, e percebendo que nem as lisonjas nem as ameaças podiam alterar a sua resolução, ordenou que a encarcerassem e acorrentassem de tal forma que não pudesse sentar nem deitar. Ela suportou este suplício por um mês, durante o qual foi acossada por seu pai e outros parentes a negar a Cristo, mas tudo foi em vão. As palavras deles não impressionaram Regina, que, considerando-se muito feliz em sofrer por causa de Cristo, só rezava a Deus para que lhe desse a graça de morrer pela verdadeira fé. Olíbrio mandou esticá-la no cavalete e açoitá-la com tanta crueldade, que todos os que presenciaram o fato ficaram cheios de pena e começaram a murmurar em alta voz contra a bárbara sentença. Temendo que o povo se revoltasse, o governador mandou-a de volta para a prisão.

Xilogravura retratando o martírio de Santa Regina.

A heroína cristã, que passou a noite em oração, teve, no final da mesma, uma visão muito consoladora. Viu uma grande cruz que se estendia da terra até o Céu. Uma pomba brilhante pairava sobre a cruz, e Regina ouviu claramente as palavras: “Alegra-te, amada esposa de Cristo! Tua virgindade e paciência prepararam-te uma coroa, que em breve receberás. Tua cruz e teu sofrimento tornar-se-ão uma escada sobre a qual subirás ao Céu.” Oh, como o coração da virgem foi consolado por esta visão! 

No dia seguinte, por ordem de Olíbrio, foi de novo estendida no cavalete e, depois que seu corpo machucado e ferido foi barbaramente torturado com tochas acesas, colocaram-na numa banheira com água fria. Já não sentia dores durante este martírio, mas, dirigindo-se aos que a cercavam, exortava-os a converter-se ao Deus único e verdadeiro, a quem ela adorava. Durante este discurso, viu a mesma pomba que lhe tinha aparecido no cárcere, trazendo no bico uma coroa preciosa; e quando esta se aproximava da santa mártir, ouviu uma voz que lhe dizia: “Vem, Regina, e reina no Céu com o teu Esposo.” Mais de 800 pagãos foram, naquela ocasião, convertidos à fé cristã. Olíbrio, porém, permaneceu obstinado e ordenou, por fim, que Regina fosse decapitada. Assim terminou gloriosamente a vida esta heroína cristã, com apenas 16 anos.

Considerações práticas

I. Depois de Deus, Santa Regina teve de agradecer à sua ama por sua conversão à verdadeira fé, pelo desejo de ser mártir e por sua constância durante o martírio. Portanto, ela se salvou graças aos piedosos cuidados de sua ama. 

Quanto bem é feito, às vezes, por pessoas aparentemente de pouca importância! Que bem não fariam os domésticos uns aos outros, e ainda mais às crianças sob seu cuidado, dando-lhes sãs exortações, afastando-as do mal e guiando-as no caminho da retidão! E quanto mal podem eles causar, mantendo discursos pouco castos na presença das crianças, ou mesmo tentando-as a fazer o mal! Os pais devem ser cuidadosos na escolha daqueles a quem confiam seus filhos, pois não é incomum, nos dias de hoje, que sejam sedutores de crianças aqueles que foram escolhidos para vigiá-las. Que fiquem longe de casa tais empregados! As crianças devem avisar imediatamente os pais se alguém as tentar a fazer o mal. 

Os serviçais e professores, de ambos os sexos, devem lembrar-se da terrível conta que terão de prestar no dia do Juízo Final, se tiverem afastado seus jovens pupilos do caminho da virtude e os tiverem conduzido pelo caminho da perdição. Devem, pelo contrário, esforçar-se por dar-lhes um bom exemplo. “Porém, o que escandalizar um destes pequeninos, que crêem em mim, melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço a mó de um moinho, e que o lançassem ao fundo do mar”, diz Nosso Senhor Jesus Cristo (Mt 18, 6).

Santa Regina de Alésia, por Francisco Pacheco.

II. Santa Regina assegurou uma coroa no Céu graças à conservação de sua virgindade e à sua paciência. Não duvido que você tenha uma cruz a carregar, que tenha de sofrer, e isto, senão agora, virá a seu tempo. Mas será que sua cruz lhe servirá de escada para subir ao Céu? O modo como você suporta seus sofrimentos decidirá isso. Se os suportar por amor a Deus, como fez Santa Regina, com paciência e sem murmurar, eles serão uma escada que o conduzirá às glórias do Céu; mas, se não os suportar com espírito cristão, eles serão uma escada pela qual você descerá às trevas do Inferno. O que você prefere? É preciso sofrer, é necessário carregar a cruz. Se você sofrer com paciência, entrará no Céu; se murmurar contra a Providência, cometerá um pecado e poderá perder-se eternamente. 

A paciência e a conservação da sua castidade prepararam no Céu uma coroa para Santa Regina; a impaciência e a falta de castidade preparam um lugar no Inferno para inúmeras almas. Regina preferiu sofrer os mais inauditos tormentos a perder a sua pureza virginal. 

O que você tem a dizer sobre isso, se é um daqueles que, por um bem temporal insignificante, ou por uma breve sensualidade, perderam para sempre esse tesouro inestimável, e além disso, nem mesmo lamentam uma perda tão grande? Ah! Enquanto estiver vivo, derrame lágrimas de sangue por causa dessa cegueira, dessa loucura — e certamente você tem motivos de sobra para fazer isso. Rogue humildemente ao Todo-Poderoso que o perdoe e que lhe conceda a graça de obter, pelo verdadeiro arrependimento, a coroa que já não pode ganhar pela castidade virginal. “Choremos somente pelo pecado”, diz São João Crisóstomo. “Bem-aventurados os que choram não pelos mortos, nem pelas perdas temporais, mas por suas iniquidades.” 

Mas, se você ainda possui o tesouro inestimável da virgindade, agradeça-o humildemente a Deus, e comprometa-se antes a perder todos os seus bens temporais, sim, até mesmo sua vida, a ver-se privado dela pelo pecado. “A castidade virginal é tua maior riqueza, teu tesouro mais precioso, teu tesouro inestimável”, diz São Jerônimo. É um tesouro que lhe alcançará, no Céu, uma glória especial!

Referências

  • Extraído, traduzido e adaptado passim de: Lives of the saints: compiled from authentic sources with a practical instruction on the life of each saint, for every day in the year, v. 2. New York: P. O’Shea, 1876, p. 304ss.

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