O santo bispo Gerardo, que, segundo o Martirológio Romano, merece ser chamado Apóstolo dos húngaros, nasceu em Veneza, de pais muito piedosos. Recebeu num mosteiro beneditino as primeiras lições de artes liberais e, ao mesmo tempo, uma instrução completa na virtude e na santidade. Foi lá que absorveu o zelo apostólico praticado por ele, depois, de modo tão incansável.
À medida que envelhecia, sentia um desejo irresistível de ir a Jerusalém e visitar os lugares santos. Depois de satisfeito este piedoso desejo, por disposição da Providência, regressou pela Hungria, onde o santo Rei Estêvão o recebeu com muita bondade. Reconhecendo no jovem peregrino, além de grande sabedoria e talento, um ardente zelo pela salvação das almas, o rei pediu-lhe encarecidamente que fixasse residência na Hungria e o auxiliasse na grande obra que iniciara de converter toda a nação. Gerardo consentiu, mas, a fim de preparar-se melhor, foi com seus companheiros a um deserto, onde permaneceu durante muito tempo em oração, vigília e jejum. Depois disso, começou a obra de conversão com zelo e sucesso, e continuou-a com uma constância incansável, o que causou grande alegria ao rei.
Entretanto, a sé de Csongrád ficou vaga devido à morte do bispo, e o rei desejou que Gerardo a ocupasse, pois isso aumentaria sua autoridade perante o povo e o ajudaria em seus trabalhos apostólicos. O santo homem recusou-se a assumir o cargo, até que o Papa lhe ordenou o contrário. Como bispo, esforçou-se, com um zelo ainda maior, por exterminar a idolatria e difundir a verdadeira fé em todos os lugares.
Para progredir ainda mais eficazmente em sua santa obra, esforçou-se por obter a poderosa proteção da Santíssima Virgem, à qual era particularmente devoto. Procurou também suscitar naqueles que estavam sob sua responsabilidade uma grande veneração pela Mãe de Deus. Construiu, perto da Igreja de São Gregório, uma bela capela em honra da Santíssima Virgem, e nela ergueu um magnífico altar, diante do qual passava quase todo o tempo livre. Diante deste altar ficava um incensário de prata, que dia e noite era abastecido com o mais precioso incenso, pois o santo encarregara dois homens piedosos desse serviço.
O costume dos húngaros de não pronunciar em vão o nome de Maria, nem de atribuí-lo aos filhos no Batismo, começou com esse bispo, que lhes inspirou uma veneração tão profunda pela Mãe de Deus, que só a chamam de “Nossa Senhora”. Eles inclinam a cabeça ou se ajoelham quando ouvem seu nome sagrado. Alguns atribuem esse costume ao rei Santo Estêvão, e podemos supor que ambos contribuíram para isso, pois os dois eram muito devotos da Santíssima Virgem.
Sabemos que São Gerardo nunca recusava nada a quem lhe pedia alguma coisa em nome da Santíssima Virgem. Sempre demonstrou um amor paternal aos pobres e doentes, e mais de uma vez deu sua própria cama a enfermos, até mesmo a leprosos, enquanto passava a noite em oração, ou dormia no chão. Mortificava o corpo com jejuns e com um tosco cilício. A graça de Deus estava claramente com ele no trabalho de conversão dos infiéis, pois, com seus sermões e sua vida santa, ele trouxe um grande número deles para o seio da Igreja.
Após a morte de Santo Estêvão, um certo Aba usurpou o trono, baniu o neto do rei, que era o legítimo herdeiro do trono, tratou com muita crueldade os outros parentes do rei e forçou o povo a reconhecê-lo como seu soberano. Esse tirano exigiu ser coroado por São Gerardo, o que o santo, no entanto, recusou-se destemidamente a fazer, profetizando que ele teria uma morte infeliz em três anos, se não desistisse de sua cruel injustiça. O tirano não deu importância à profecia e morreu de acordo com as palavras do santo.
Depois dele, Pedro, um dos netos de Santo Estêvão, subiu ao trono e tratou seus súditos com tanta crueldade, que estes conspiraram contra ele, arrancaram-lhe os olhos e expulsaram-no do país. Durante o reinado de André, que sucedeu a Pedro, houve uma perseguição aos cristãos. Como o rei não era firme o bastante em combater e castigar os seus súditos idólatras que perseguiam os fiéis, São Gerardo, acompanhado de três outros bispos, foi a Buda (porção ocidental da capital húngara, Budapeste), onde vivia o rei, expôs-lhe a situação e ameaçou-o com uma vingança divina, caso se recusasse a ajudar os cristãos e impedir a perseguição dos infiéis.
Antes de deixar Budapeste, e depois de oferecer ao Todo-Poderoso o santo sacrifício da Missa, Gerardo disse que, no dia seguinte, ele e seus companheiros sofreriam o martírio por amor a Cristo. Suas palavras mostraram-se bem verdadeiras. Vários infiéis, sabendo que a ninguém deviam temer tanto quanto a São Gerardo, e informados da missão dele junto ao rei, organizaram uma conspiração e, no dia seguinte, liderados por um cristão apóstata, foram ao seu encontro. Assim que o viram de longe, atiraram pedras nele e em seus companheiros e, aproximando-se, derrubaram a carroça em que viajava o santo bispo e começaram a agredi-lo de forma bárbara, tanto por palavras como por atos.
Depois de ter sido atirado ao chão e pisoteado, o santo fez um esforço para se levantar, mas caiu de joelhos e exclamou com o protomártir Santo Estêvão: “Senhor, não os responsabilizeis por este pecado!” (At 7, 59). E rezou ainda com as palavras de Cristo: “Perdoai-lhes, Senhor, porque não sabem o que fazem”. Os assassinos enfureceram-se ainda mais com sua resignação e agrediram-no até extinguirem-se todos os sinais de vida. Para ter a certeza da sua morte, um deles trespassou-lhe o coração com uma lança. Foi assim, com uma morte gloriosa, que este grande apóstolo dos húngaros terminou sua santa vida, no ano 1046 de Nosso Senhor.
Considerações práticas
I. São Gerardo foi muito zeloso no culto à Virgem Maria e ao seu santo nome. Para aumentar a devoção a ela, exortava os fiéis a adotar o costume de inclinar a cabeça quando o nome de Maria era pronunciado. Depois do santíssimo nome de Jesus, não há nenhum que deva ser mais respeitado do que o de sua Mãe; por isso, agem corretamente os católicos que manifestam sinais exteriores de sua devoção quando o ouvem ou pronunciam. Erram aqueles que pronunciam, sem qualquer reverência, o nome da Rainha do Céu. Sabemos que muitos santos invocaram esse nome na hora do sofrimento e da tentação, e receberam um auxílio visível.
Siga o exemplo deles, pois, segundo São Boaventura, depois do nome de Jesus, nenhuma invocação é mais salutar e consoladora que a do nome de Maria. Em nosso país e em muitos outros, não se observa o costume instituído por São Gerardo, na Hungria, de não dar o santo nome de Maria no Batismo, mas aqueles que possuem tal nome devem saber: estão particularmente obrigados a imitar as virtudes daquela cujo nome receberam. Pois diz São João Crisóstomo: “O nome por si só não serve para nada; ao contrário, é motivo de vergonha e desonra para aqueles que, portando-o, levam uma vida tão diferente da vida da Santíssima Virgem.”
II. São Gerardo nutria um grande amor pelos pobres e doentes, e também por seus inimigos e perseguidores. Seguindo o exemplo de Santo Estêvão e de Cristo, rezava por estes e ajudava aqueles com todas as suas forças. Quanto a si mesmo, não usava de tanta ternura. Mortificava o corpo com grande austeridade, jejuando e vestindo toscos cilícios, e privava-se não só das comodidades ilícitas, mas até das inofensivas.
Os santos julgaram necessário agir assim para garantir sua salvação. Mas e você, tem agido de forma semelhante? Comprometa-se, pelo menos, a fazê-lo a partir de hoje. Seja compassivo com o próximo e ajude-o com palavras e gestos, sempre que puder. Mas não seja tão brando consigo mesmo, nem evite com tantos cuidados o que a lei de Deus ou da Igreja exigem de você, só porque é penoso ao seu corpo; não queira também fazer tudo por ele, nem lhe permita fazer tudo o que deseja livremente, quando o proíbem as leis de Deus ou da Igreja. Agindo assim, você demonstra amar o seu corpo mais do que a sua alma, mais do que o seu Deus.
Adão, de fato, amou a Eva mais do que ao Todo-Poderoso, pois atendeu ao desejo dela e fez o que Deus havia proibido, trazendo assim infelicidade para si e para ela. Você torna sua alma e seu corpo infelizes quando segue os impulsos da sua carne contra a vontade do Altíssimo. Tenha cuidado para não pertencer àqueles sobre os quais escreve São Bernardo: “Muitos estão indignados porque Adão preferiu obedecer à voz de sua esposa do que à voz do Todo-Poderoso, mas todos os dias eles obedecem a Eva, seu corpo, mais do que a seu Senhor e seu Deus.”
É inexplicável o prejuízo que você causa a si mesmo quando sua carne exige algo proibido por Deus, e você obedece a ela. “A carne jamais pode ter mais importância”, diz São Bernardo, “que a salvação da alma”. Porém, você perde a alma se, contrariando os Mandamentos de Deus, obedece à carne e escolhe viver em tudo segundo os seus desejos. Ao contrário, você se empenha em sua salvação e a favorece quando não dá ao seu corpo aquilo que não é possível fazer sem pecado. E avança ainda mais no caminho do Céu, se, por amor a Deus, deixa de dar ao seu corpo, em algumas ocasiões, até aquilo que lhe poderia conceder sem fazer mal; e se o castiga com penitências voluntárias — como fizeram São Gerardo e centenas de outros santos. Este seria o maior benefício para o seu corpo, como o foi para o de São Gerardo e outros santos. De tal corpo São Paulo escreve: “Ressuscitará glorioso” (1Cor 15, 40).
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