A palavra vício diz respeito àqueles maus hábitos adquiridos ao longo da vida, cuja consequência mais direta é a dependência. Uma pessoa viciada em algo dificilmente consegue libertar-se, a não ser por meio de grandes esforços de ascese e de renúncia. O primeiro passo no caminho da recuperação é a humildade para reconhecer-se escravo, e, conforme as possibilidades, buscar o tratamento certo.

Tradicionalmente, a Igreja sempre considerou a luxúria — isto é, as práticas sexuais desordenadas, como a masturbação, o homossexualismo, a fornicação, o adultério etc. — um vício gravíssimo. Isso porque esses atos, além de contrariarem a natureza do sexo humano, escravizam o homem e a mulher, tornando-os reféns de suas paixões.

Percebam: um rapaz normal não fica excitado ao ver o retrato de Teresinha do Menino Jesus ou Gemma Galgani. Permanece livre e tranquilo, ainda que reconheça a beleza dessas duas santas mulheres. Ao contrário, a simples visão de uma imagem sensual o coloca em graves apuros, tendo ele de fazer grande violência contra si mesmo para não ceder aos impulsos da carne. É que a imagem dos santos, por mais bela que seja, inspira unicamente o desejo de amar e doar-se verdadeiramente, ao passo que a imagem sensual tem justamente a missão de seduzir, como as sereias seduzem os navegadores para matá-los.

O mundo moderno não aceita a pregação da Igreja sobre esse assunto porque, igual ao bêbado que não admite sua doença, também não se reconhece dependente da droga. Todavia, qualquer pessoa minimamente sadia conseguiria enxergar a imoralidade da cultura contemporânea. A música, o teatro, o cinema e as próprias leis estão infestados pelo vírus da luxúria. A união sexual é desfigurada pelo desejo doentio da dominação de um pelo outro (cf. Gn 3, 16). O modo utilitarista com que muitos homens costumam se referir às mulheres e à relação com elas — dizendo-lhes palavras mais apropriadas ao campo da alimentação — dá mostra de como o sexo, para esta época, tornou-se um pelourinho, onde um senhor aproveita-se de um escravo. Ambos se tratam como objeto, um abusando do outro.

Os efeitos da luxúria na sociedade

As consequências do vício da luxúria são várias. O escravo da carne padece muitas derrotas pelos seus impulsos, porque tamanha é a força do desejo que, sem a ajuda da graça, ninguém consegue resistir-lhe. Após o primeiro passo, a prática de atos cada vez mais aberrantes leva pouco tempo. Ademais, a razão fica entorpecida, pois, tomada pelo prazer sensual, esquece-se de seu fim último e cai no tédio, "de onde facilmente se dá origem a um ódio à religião" [1]. E nem se mencione os estragos à propagação do gênero humano — de que a Europa já é testemunha.

A história está repleta de personagens importantes, às vezes bíblicos, que, por causa do vício da luxúria, atraíram sérias consequências para suas famílias, países e até mesmo para pessoas inocentes. Davi teve de chorar lágrimas amargas pela curiosidade de seu olhar. Salomão terminou adorando falsos deuses. João Batista literalmente perdeu a cabeça pela insanidade de Herodes. Sodoma e Gomorra foram consumidas pelo fogo. Na raiz de todas essas tragédias estava a concupiscência, a escravidão dos desejos libidinosos. De fato, os impudicos, como ensina São Francisco de Sales, "assemelham-se a borboletas que, pensando que o fogo é tão doce quão belo, atiram-se a ele e se queimam nas chamas" [2].

É preciso ser bem claro nestes assuntos, a fim de que não reste dúvida acerca da gravidade do pecado contra a castidade. Ele é nefasto e, por sua causa, grande ruína recaiu sobre toda a nação inglesa, na época em que outrora reinava um "defensor da fé". Henrique VIII ganhou esse título do papa por sua eloquente defesa do cristianismo contra as heresias de Martinho Lutero. O monarca inglês era belo, de rosto formoso e inteligência arguta. Também possuía dotes para o esporte. Toda a Europa o via como homem admirável, reto cristão, de louvável castidade, clemência e justiça — no mesmo acreditava São Thomas More, o qual, mais tarde, seria forçado a mudar de opinião.

Um retrato do Rei Henrique VIII, por Hans Holbein, o Jovem.

Ocorre que o soberano não se conformava com a falta de um herdeiro para seu trono e, instigado pela culpa original, ardia em paixões por outra mulher: Ana Bolena. Com a possibilidade de que a amante lhe desse o filho tão desejado, não hesitou um único momento. Henrique VIII decidiu-se pelo divórcio, exigindo da Santa Sé a declaração de nulidade para seu matrimônio com Catarina de Aragão. A resposta do papa, porém, não foi nada satisfatória. Pelo contrário, foi o estopim para que o rei desse vazão à sua ira e sensualidade, pelo que se autoproclamou chefe supremo da Igreja da Inglaterra. Os que se opuseram ao decreto real foram severamente punidos com a forca. Conforme os relatos do historiador Daniel-Rops, no rol de crimes da coroa inglesa estiveram "dois cardeais, 18 bispos, 13 abades, 575 padres, 50 doutores, 12 lordes, 20 barões e cavaleiros, 335 nobres, 124 burgueses e 110 mulheres de nobre estirpe" [3]. Entre essas vítimas, o bispo São João Fisher e o humanista São Thomas More.

Henrique VIII ainda se casou outras quatro vezes após ter mandado Ana Bolena para a forca. Aos poucos, a fúria do rei o foi transformando num homem bem diferente daquele outrora belo jovem, amado e querido por todos: "Tudo o que nele ainda havia de sensibilidade na juventude desapareceu para dar lugar a uma crueldade fria, comandada pelo orgulho e pela sensualidade."

Uma luta de todos

A história de Henrique VIII, como a de outros reis lascivos, evidencia claramente a escravidão na qual qualquer pessoa pode cair, mesmo um defensor fidei, se se deixar levar pelos impulsos sensuais, por menores que sejam. Ninguém está isento da batalha pela castidade. Ela inclui homens e mulheres, jovens e adultos, casados e solteiros, homossexuais e heterossexuais. Quando a Igreja prega a virtude da santa pureza como caminho certo para uma autêntica liberdade, ela não está reprimindo a sexualidade de ninguém — como gostam de sugerir certos movimentos, cuja luta parece resumir-se à falsa noção de "sexo livre". Na verdade, uma relação sexual verdadeiramente livre só acontece dentro do matrimônio, por meio de uma entrega total, fiel e fecunda. O "sexo livre" defendido por tais movimentos não passa de um cartão verde para todas as formas de perversões e desejos de dominação (a própria agressividade do chamado "sexo anal e oral", em que um fica de joelhos diante do outro, prova o caráter opressivo dessa prática). Isso não pode trazer liberdade alguma.

A Igreja quer a liberdade para todos. Por isso, insiste no combate às ideologias que deturpam a sexualidade humana, em nome de errôneos "direitos reprodutivos". A cura para o machismo e para toda forma de discriminação injusta é a virtude da pureza, ensinada por todos os santos e homens justos da história, a qual se obtém por meio de atos heroicos e de abnegação: oração, jejum, frequência aos Sacramentos, fuga das ocasiões, afastamento imediato dos pensamentos impuros, devoção à Virgem Santíssima e aos outros santos etc. Há uma série de práticas eficazes no caminho para a restauração.

Com a pureza, o homem torna-se senhor de si mesmo e capaz de amar, pois são os puros de coração os que verão a Deus (cf. Mt 5, 8).

Referências

  1. Josef Aertnys-Damen. Theologia Moralis secundum doctrinam Sancti Alphonsi de Ligorio. Domus Editorialis Marietti, 1947.
  2. São Francisco de Sales. Filoteia (trad. de Frei João José P. de Castro). Petrópolis: Vozes, 2012, p. 193.
  3. Henri Daniel-Rops. A Igreja da Renascença e da Reforma (I) (trad. de Emérico da Gama). São Paulo: Quadrante, 1996, p. 456.
  4. Idem.

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