Há alguns anos, li uma série de romances sobre a Segunda Guerra Mundial com finais bastante insatisfatórios. Depois de histórias épicas sobre guerra, derramamento de sangue, crueldade humana e o poder do destino, esses romances terminavam com homens que, após a guerra, voltavam para casa e abandonavam a fé de sua infância. De volta ao lar, eles assumiam uma espécie de maturidade cínica, julgando-se mais espertos que as superstições do passado. 

Embora frustrada com esses livros, finalmente percebi que eles terminavam assim porque foi o que se deu de fato com muitos veteranos da Segunda Guerra Mundial. Suas cicatrizes e fragilidade criaram um vácuo na cultura, no qual as ideologias poderiam crescer sem controle, como trepadeiras, eliminando o que muitos passaram a ver como algo enfadonho e insuficiente.

Durante quase três gerações, agora que a maioria desses veteranos da Segunda Guerra Mundial já partiu para o descanso eterno, essas ideias dominaram as famílias, levando filhos e netos a seguirem todos os caprichos do coração e, ao mesmo tempo, evitarem os rituais maçantes de uma Igreja bimilenar.

Conheci recentemente uma escritora irlandesa-americana da Geração X, Jenny Holland, neta dessa velha guarda, que vive em Belfast [na Irlanda do Norte]. Holland, que se diz ateia e sem filiação partidária, critica os seus antepassados que, livres da fé, acreditavam piamente ter encontrado algo melhor. Ela está profundamente preocupada com o aumento dramático de comportamentos que só podem ser chamados de malignos, e em seu blog diz o seguinte sobre seu pai irlandês:

Eu gostava muito do meu pai, mas ele e outros baby boomers achavam que tinham tudo sob controle: que poderiam ter tudo, e que os seus filhos desfrutariam para sempre dos efeitos do liberalismo — porque a única coisa que o liberalismo poderia produzir era a libertação das amarras da tradição severa e da superstição. Eles estavam errados. Isso é muito óbvio para mim agora.

Em resposta a isso, Holland começou a olhar para trás, avaliando com novos olhos as coisas rejeitadas por seus pais, tios, primos e assim por diante. Nessa busca, embora não seja católica, ela confessa que, por algum motivo, começou a rezar o Rosário.

Mesmo sem possuir um conjunto abrangente de crenças, consigo reconhecer a importância do Rosário neste contexto como um símbolo de pureza, amor e esperança. Para o meu coração cínico e impuro da Geração X, já não importa que a “pureza” seja muitas vezes utilizada como desculpa para abusar e castigar — a culpa não é da pureza em si, mas sim das pessoas malévolas que a roubam para os seus próprios fins.

Recentemente, conversei com Holland pelo Zoom. Ela descreveu o lado materno da família: seus avós americanos conservavam a fé católica, mas os dez filhos se lançaram na vida louca e badalada. Aprofundando os detalhes, ela disse algo impressionante: “Lembro-me dos jantares em família na casa dos meus avós e comparo-os às nossas reuniões agora — especialmente desde que os meus avós faleceram —, e não consigo deixar de pensar: ‘Onde estão as risadas?’

Quadro de Norman Rockwell retratando uma típica ceia americana no Dia de Ação de Graças.

Esta questão não está restrita apenas à família de Holland. Devemos viver em comunidade, cercados por nossa família mais próxima e pelo círculo mais amplo de parentes dos nossos pais. São essas as pessoas com quem passamos a vida, compartilhando refeições de domingo, funerais, festas de casamento e comemorações de aniversário. São essas as pessoas com quem compartilhamos memórias, e das quais até mesmo herdamos muitas delas.

Eventos e refeições comuns às vezes são constrangedores, às vezes tediosos, muitas vezes cheios de agitação e correria, barulho e limpeza, mas, acima de tudo, devem ser marcados por risadas, o tipo de risada que vem da segurança, do conforto e da união. É disso que Holland se lembra em sua juventude.

Infelizmente, esses eventos, se é que ainda acontecem, parecem ser marcados por diferentes tipos de risadas: nervosas, sarcásticas, amargas ou provocadoras. A política se infiltrou com tanta profundidade em nossas famílias, que os assuntos pessoais não têm mais espaço. Mas a política não é a raiz do problema. É o orgulho que está sempre presente, como explica o Padre Dwight Longenecker: “As pessoas bem-humoradas são aquelas que têm humildade e são realistas. A incapacidade de aceitar uma piada ou fazer uma piada é uma das marcas do orgulho. Satanás nunca ri”.

A ausência de gargalhadas também pode indicar uma ausência de segurança, uma ausência do amor que deveria existir entre aqueles com quem devemos ter maior intimidade. Raramente vemos risos de alegria na criança exposta prematuramente à sexualidade; naqueles que recorrem à pornografia e/ou aos contraceptivos para alimentar e reparar as demandas da fertilidade; no casal em que o marido e a mulher já não confiam um no outro, pois seu vínculo matrimonial mais se deteriora do que se fortalece; ou naqueles que criam ídolos devido a uma liberdade desenfreada.

A busca incessante pelo prazer, poder ou dinheiro corrói os relacionamentos, deteriorando a responsabilidade e o amor. Para os homens e mulheres modernos, a família muitas vezes transmite a sensação de sufocamento ou escravidão, e não de alegria.

Na cultura atual, a doutrina católica é muitas vezes ridicularizada como um conjunto de regras e regulamentos idiotas, mas revela-se algo muito mais rico, profundo e saudável do que pensa a maioria das pessoas. É essa doutrina menosprezada que tem o potencial de proporcionar espaço para as nossas risadas. E quando ela é abandonada, as risadas acabam. Mas se mantivermos ou recuperarmos nossa própria integridade por meio da vida sacramental, a confiança, a vulnerabilidade e o cuidado verdadeiro terão espaço para crescer. As mesas podem voltar a animar-se com risos, gargalhadas e até bufonarias, enquanto as famílias se deleitam umas com as outras.

Holland não está sozinha na busca pela restauração do riso. Muitas pessoas estão silenciosamente à procura disso, inclusive aquelas que estão à nossa volta, em nossas mesas, bancos de igreja e locais de trabalho. Oxalá elas encontrem o que tanto procuram, para que os livros dos futuros romancistas históricos terminem não com dúvidas e desespero, mas com paz, esperança e até mesmo alegria.


Carrie Gress, autora deste artigo, é doutora em Filosofia pela Universidade Católica da América, editora-chefe de Theology of Home e mãe de cinco filhos, aos quais dá aula em casa. Assina também vários livros, dentre os quais “Anti-Maria desmascarada”, traduzido para o português. Seu texto foi publicado originalmente em The Catholic Thing.

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