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Espiritualidade
Por que chamamos a Deus de “nosso Pai”?
Ainda em preâmbulo à Oração do Senhor, Santo Tomás explica neste texto em que sentido Deus é chamado de Pai, expondo os deveres que temos seja para com Ele, enquanto filhos, seja para com o próximo, enquanto irmãos.
Santo Tomás de Aquino
Tradução: Equipe Christo Nihil Praeponere
29.Ago.2017Tempo de leitura: 3 minutos
01
II․ "Pai"
3․ Em que sentido Deus é Pai․ — Aqui se nos deparam duas questões: saber em que sentido Deus é Pai e o que lhe devemos enquanto tal. Ora, Deus é chamado Pai (a) em razão do modo especial com que nos criou, fazendo-nos à sua imagem e semelhança, não impressas nas criaturas inferiores: "Não é ele teu Pai, teu Criador, que te fez e te estabeleceu?" (Dt 32, 6). Também o é (b) em razão de seu governo; ora, ainda que tudo esteja sob seu poder, a nós Ele governa como senhores, ao passo que as demais coisas são como escravas em suas mãos: "Sois vós, Pai, que o governais pela vossa Providência" (Sb 14, 3) e, como se lê no mesmo livro, "nos governais com muita indulgência" (Sb 12, 18). Deus é Pai, além disso, (c) a título de adoção, pois se às outras criaturas concedeu alguns pequenos dons, a nós transmitiu uma herança, porque nos fez filhos seus e, "se filhos, também herdeiros" (Rm 8, 17). Como diz o Apóstolo, "não recebestes um espírito de escravidão para viverdes ainda no temor, mas recebestes o espírito de adoção pelo qual clamamos: Aba! Pai!" (Rm 8, 15) [1].
4․ O que a ele devemos․ — De nossa parte, devemos-lhe quatro coisas.
a) Em primeiro lugar, que o honremos: "Se eu, pois, sou vosso pai, onde está a minha honra?" (Ml 1, 6), a qual consiste em três coisas: (i) em relação a Deus, dar-lhe louvor, como canta o salmista: "Honra-me quem oferece um sacrifício de louvor" (Sl 49, 23), que deve estar não só nos lábios, mas também no coração: "Esse povo", disse o Senhor <por boca do profeta>, "vem a mim apenas com palavras e me honra só com os lábios, enquanto seu coração está longe de mim" (Is 29, 13); (ii) em relação a si mesmo, guardar a pureza de corpo, <como exorta o Apóstolo>: "Glorificai, pois, a Deus no vosso corpo" (1Cor 6, 20); (iii) em relação ao próximo, julgá-lo com equidade, como diz o Salmo: "Reina o rei poderoso que ama a justiça" (Sl 98, 4).
b) Em segundo, que o imitemos, uma vez que é nosso Pai: "Chamar-me-ás pai, e não cessarás de me seguir" (Jr 3, 19). Ora, imitamo-lo perfeitamente quando a ele nos assemelhamos em três aspectos: (i) no amor: "Sede, pois, imitadores de Deus como filhos muito amados. Progredi na caridade" (Ef 5, 1), e isso deve estar no coração; (ii) na misericórdia, pois o amor deve vir acompanhado de compaixão [2]: "Sede, portanto, misericordiosos" (Lc 6, 36), o que tem de manifestar-se em nossas obras; e (iii) na perfeição, pois o amor e a misericórdia devem ser perfeitos: "Portanto, sede perfeitos, assim como o vosso Pai celeste é perfeito" (Mt 5, 48).
c) Em terceiro lugar, que lhe sejamos obedientes: "Com quanto mais razão nos havemos de submeter ao Pai de nossas almas?" (Hb 12, 9). E isto por três motivos [3]: primeiro, (i) por seu domínio, já que ele é o Senhor: "Faremos tudo o que o Senhor disse e seremos obedientes" (Ex 24, 7); segundo, (ii) pelo exemplo que nos deu o verdadeiro Filho, ao fazer-se obediente ao Pai até a morte, como se diz na Epístola aos Filipenses (cf. Fl 2, 8); terceiro, (iii) porque nos é proveitoso: "Dançarei diante do Senhor que me escolheu" (2Sm 6, 21s) [4].
d) Por fim, que sejamos pacientes nas adversidades com que ele nos castiga, <como aconselha o rei Salomão>: "Meu filho, não desprezes a correção do Senhor, nem te espantes que ele te repreenda, porque o Senhor castiga aquele a quem ama, e pune o filho a quem muito estima" (Pr 3, 11s).
III. "… nosso…"
5․ O que devemos ao próximo․ — Com esta palavra se põem em evidência os nossos dois deveres para com o próximo. O primeiro é o (a) amor. Com efeito, visto que todos são filhos de Deus, temos de tratar o próximo como a um irmão: "Porque aquele que não ama seu irmão, a quem vê", diz São João, "é incapaz de amar a Deus, a quem não vê" (1Jo 4, 20). O segundo é o (b) respeito, por ser ele filho de Deus: "Acaso não é um mesmo o Pai de todos nós? Não foi um mesmo Deus que nos criou? Por que razão somos pérfidos uns para com os outros?" (Ml 2, 10); "Adiantai-vos em honrar uns aos outros" (Rm 12, 10). <Assim temos de tratar o nosso semelhante>, por causa do fruto que recebemos daquele que "se tornou autor da salvação eterna para todos os que lhe obedecem" (Hb 5, 9).
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