São Galo, que veio a ser um santo abade e confessor, nasceu na Irlanda na metade do século VI. Seus pais queriam que ele se tornasse um perfeito servo do Altíssimo, por isso entregaram-no ainda pequenino aos cuidados de São Columbano, que era abade do mosteiro de Bangor. Tendo o mesmo desejo dos pais, Galo foi de bom grado ao santo abade e, como tinha uma mente brilhante, além de inclinação para tudo o que era bom, fez em pouco tempo grandes progressos na virtude e no conhecimento. Columbano exultava com isso. 

Como houvesse decidido partir para tentar despertar em outros países o amor à solidão, oração e austeridade, o abade escolheu alguns dos que viviam em seu mosteiro para acompanhá-lo. Dentre os escolhidos estava Galo, com quem Columbano e outros monges viajaram, da Irlanda à Inglaterra e daí à França. O soberano que reinava na época recebeu Columbano e seus companheiros com grande benevolência, designando na fronteira das dioceses de Toul e Besançon um lugar onde eles pudessem, como desejavam, servir a Deus na solitude e na oração. São Columbano construiu aí um mosteiro e uma igreja, e deu certas regras de conduta àqueles que desejavam viver sob a sua orientação. São Galo foi o primeiro a adotar tais regras e conformou sua vida tão perfeitamente a elas, que tornou-se modelo de devoção, penitência e recolhimento aos demais, incitando-os a seguir seus passos. 

“São Galo recebe o báculo pastoral de São Columbano”, pintura do século XIX.

A santa comunidade passou muitos anos com seu venerável mestre nessa solidão, até ser arrancada do silencioso mosteiro pela perseguição de Brunilda, uma mulher ambiciosa e inconstante. Então, Columbano partiu com seus religiosos para a Austrásia, sob a proteção do Rei Teodeberto, que lhe deu permissão de escolher um lugar para morar. Andando pelo território com essa intenção, o santo chegou ao Lago de Constança, onde viviam pagãos bárbaros. São Galo, vendo os costumes idolátricos daquela gente, pregou-lhes com grande fervor, mostrando o quanto eram cegos por cultuar a madeira ou a pedra sem vida como se fossem o Deus verdadeiro. Percebendo, porém, que não lhe davam ouvidos, atirou ao chão alguns dos ídolos de seus altares, despedaçou-os e atirou-os no lago. Enfurecidos com isso, os idólatras decidiram matar o homem apostólico. 

Alertado por Columbano, porém, Galo fugiu, partindo com seu mestre para o povoado de Arbon (ou Arbona) onde conheceram um santo sacerdote chamado Vulmaro (ou Willemar). Ele indicou-lhes um lugar, onde havia uma capela dedicada a Santa Aurélia, mas que fora profanada pelos pagãos, que haviam colocado ali os seus ídolos. Inflamado de santa devoção, Galo começou logo a pregar ao povo — que lhe acorria aos borbotões — e mostrava tão claramente a inexistência de seus deuses que muitos se converteram à verdadeira fé. Depois disso, ele purificou a capela, consagrada por São Columbano em seguida, e nela ergueu um altar para a celebração dos divinos mistérios. Ao redor da capela, construíram-se celas como habitação para aqueles que desejassem viver a clausura. 

Por um tempo, tudo transcorreu bem, e o número de cristãos, bem como de eremitas, crescia diariamente. Contudo, não demorou muito para que Gunzo, o duque que governava aquela parte do território, se enfurecesse contra os servos de Deus e mandasse-os deixar imediatamente os seus domínios. Columbano decidiu ir para a Itália, e pretendia levar consigo seu discípulo Galo, mas Deus visitou este último com uma febre tão grave que ele foi obrigado a permanecer ali com alguns companheiros. 

Após recobrar a saúde, o santo voltou para junto do piedoso Vulmaro, que lhe apontou outro lugar no deserto como habitação. Embora o local parecesse uma morada adequada apenas a feras selvagens, e também fosse assombrado por maus espíritos, São Galo, que não temia nem a uns nem a outros, foi para lá com seus companheiros. Erguendo uma cruz, passou três noites em jejum e oração, recorrendo com confiança a Deus e a sua santíssima Mãe, e assim afugentou do lugar todos os espíritos infernais.

“São Galo pregando no Lago de Constança”, por Johannes Cahn.

Os animais selvagens também partiram, à exceção de um urso, que perturbava muito os servos do Altíssimo. Um dia, quando o urso estava levando embora a pouca comida dos eremitas, São Galo, inspirado por Deus, dirigiu-se ao animal, ordenando que deixasse os alimentos ali e trouxesse da floresta a madeira necessária aos eremitas. Deus, que à oração de Josué mandara o sol suspender seu curso, ordenou que o urso obedecesse ao santo. O animal arrastou uma grande árvore de uma floresta adjacente até o lugar onde estava São Galo. Como recompensa, o santo deu-lhe um pão e a permissão de ficar ali, sob a condição de que não ferisse nenhum dos monges nem qualquer outro ser humano. O urso obedecia às suas ordens, para grande espanto de todos quantos iam ter com o santo ou viviam no deserto.

Quando o lugar ficou totalmente livre de feras selvagens e espíritos maus, São Galo quis organizar tudo como São Columbano fizera no mosteiro anterior, uma vez que ele e seus companheiros haviam decidido servir a Deus com a mais absoluta fidelidade, mediante vigílias, jejuns e orações. Mas, quando estavam prestes a iniciar sua obra, chegaram mensageiros do já mencionado duque Gunzo, os quais, em nome do nobre, imploraram perdão pela injustiça cometida contra os religiosos, e suplicaram que São Galo fosse ao duque para libertar-lhe a filha, que estava possuída pelo demônio. O santo atendeu ao pedido e persuadiu a princesa a fazer um voto a Deus, prometendo servi-lo em pureza virginal até o fim de sua vida, como ação de graças pelo favor recebido. Para mostrar sua gratidão a São Galo, Gunzo quis dar a ele a sé episcopal de Constança, mas o santo recusou aceitá-la. 

Tão logo regressou ao deserto, construiu uma igreja, cercando-a com doze celas: assim nasceu a célebre Abadia de São Galo, que ainda existe na Suíça e deu origem à cidade de mesmo nome (Sankt Gallen). Concluídas as celas, São Galo instituiu entre seus discípulos a observância da regra de São Columbano. Ele mesmo conservou sua vida santa até os oitenta anos, sem jamais afrouxar, por doença ou pelo enfraquecimento próprio da velhice, as austeridades a que se submetia.

Vista da Abadia de São Galo, na cidade suíça de mesmo nome.

Pouco antes de sua morte, foi convidado por São Vulmaro a pregar na cerimônia da dedicação de uma igreja. O santo aceitou o convite e pregou com profundo fervor, para grande edificação de todos. Imediatamente após o rito, Galo foi acometido de uma febre e morreu em paz duas semanas mais tarde. Por intermédio de seu santo corpo, operaram-se muitos milagres, tanto antes de ser transladado para o deserto como durante o período em que esteve enterrado lá, na igreja que havia erigido. Àqueles que visitam sua igreja, o Altíssimo agracia com muitos dons, pela intercessão do santo.

Considerações práticas

São Galo, servo do Altíssimo, ordenou que uma fera selvagem da floresta nunca mais perturbasse ou ferisse ninguém, e o animal, desprovido de razão, obedeceu. Deus, Mestre e Senhor seu, dá muitas ordens a você, que é dotado de razão; a você, que se intitula servo do Senhor, e deve sê-lo de fato, se tem a esperança de ir para o Céu. E no entanto você não obedece, embora esse Deus possa punir, e certamente punirá, a sua desobediência. Qual será a sua desculpa para agir assim? 

São Galo, esculpido por Peter Paul Metz.

A fera selvagem nada podia esperar de São Galo, a não ser talvez um pouco de alimento. A você, Deus promete o Céu, se lhe for obediente. Por não obedecer a um Mestre tão generoso, que recompensa uma breve obediência com a vida eterna, não lhe é devido o Inferno? Se o prêmio não o anima, pense no castigo. Há milhares de anos, Deus já castiga muitas de suas criaturas no Inferno por causa de sua desobediência; e ameaça-o com o mesmo castigo, se você não lhe for obediente. Se isso não for motivo bastante para impelir-nos a obedecer, certamente não haverá clemência alguma para nós quando formos lançados naquele lugar, onde já sofrem tantos desobedientes. 

Se você não quer ser contado entre esses infelizes, obedeça a Deus de agora em diante. Ele é o seu Senhor: apresente-se diante dele como servo obediente. Aos servos piedosos e fiéis, Ele dá o Céu. Servos que não obedecem não são nem piedosos nem fiéis. A servos inúteis e desobedientes, Ele os lança fora, na escuridão, castigando-os com dores atrozes. “Está bem, servo bom e fiel, já que foste fiel em poucas coisas, dar-te-ei a intendência de muitas; entra no gozo de teu senhor” (Mt 25, 23), mas “a esse servo inútil lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá pranto e ranger de dentes” (Mt 25, 30). “Aquele servo que conheceu a vontade do seu senhor e nada preparou, e não procedeu conforme a sua vontade, levará muitos açoites” (Lc 12, 47).

Referências

  • Extraído, traduzido e adaptado passim de: Lives of the saints: compiled from authentic sources with a practical instruction on the life of each saint, for every day in the year, v. 2. New York: P. O’Shea, 1876, p. 476ss.

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