Quando se repete, nas aulas de catequese, que o primeiro mandamento é "Amar a Deus sobre todas as coisas", seria bom que se sublinhasse a palavra todas. Desde as menores — nossos bens e propriedades — às mais valiosas — a família que temos e a nossa própria vida —, nada deve figurar acima de Deus — já que é d'Ele tudo o que somos e recebemos.

De fato, diz o Catecismo que "Deus amou primeiro". Seguir os mandamentos é simplesmente "a resposta de amor que o homem é chamado a dar a seu Deus" (§ 2083). Quando o homem decide se entregar totalmente a Ele, adorando-O e sendo fiel à Sua vontade, não faz mais do que agir com generosidade diante de um amor muito maior que o que oferece. É o que testemunha São João Evangelista, quando escreve: "De tal modo Deus amou o mundo que lhe deu o seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jo 3, 16). E ainda: "Amamos, porque Deus nos amou primeiro" (1 Jo 4, 19).

No entanto, o risco que se corre é o de esquecer com que grande amor o homem foi amado e com que preço foi comprado — com o próprio sangue de Deus derramado no Calvário.

Pior: se há quem ignore tamanha prova de amor, há quem a conheça e, ainda assim, resista em tributar honra, glória e adoração ao Senhor. Neste ponto, os cristãos precisamos bater no peito — dizendo as palavras do Confiteor, "mea culpa, mea culpa, mea maxima culpa" — e reconhecer a nossa grande dívida, pois não temos vivido de acordo com as máximas do Evangelho; não temos nos ocupado "em primeiro lugar com o Reino de Deus e a sua justiça" (Mt 6, 33). Ao contrário, preocupando-nos demasiadamente com o dia de amanhã, temos nos esquecido do Amanhã Eterno ao qual todos um dia chegaremos.

A tolice de ajuntar "tesouros na terra", conduta contra a qual Jesus advertiu severamente — "Não ajunteis para vós tesouros na terra, onde a ferrugem e as traças corroem, onde os ladrões furtam e roubam" ( Mt 6, 19) —, é uma tentação atraente. Porém, é o que é todo pecado: uma mentira, uma distorção das dimensões da realidade.

Quem preferisse os bens terrestres às riquezas celestiais cometeria a sandice de uma noiva que ganha um anel de seu esposo, mas, apaixonando-se pelo presente, esquece-se do noivo. É a comparação que usa Santo Agostinho:

"Irmãos, suponhamos que um esposo fizesse um anel para sua esposa e esta tivesse mais amor pelo anel recebido que pelo esposo que lho fabricou; não é verdade que com aquele presente se revelaria que a esposa tem um coração adúltero, embora ela ame algo que é presente do esposo? É claro que ela ama algo que foi feito pelo seu esposo, mas se ela dissesse: 'Basta-me o seu anel, e não me interessa ver o seu rosto', que tipo de esposa seria esta? Quem não abominaria esta loucura? Quem não condenaria este sentimento de adúltera?" [1]

É "este sentimento de adúltera" o pecado que se concebe como idolatria. Na leitura de todo o Antigo Testamento é possível notar como o povo de Israel precisa muitas vezes batalhar consigo mesmo para resistir à tentação de adorar deuses fabricados pelos homens ao invés de cultuar o próprio Deus.

Hoje, a situação não é diferente. O cristão permanecerá toda a sua vida neste mundo lutando consigo mesmo para colocar em ordem a sua natureza corrompida e manchada pelo pecado. A luta contra a carne é a guerra contra o pior inimigo da alma, já que a concupiscência se trata de um "inimigo interno", que habita em nossa própria casa. A vitória definitiva sobre esta realidade só acontecerá na ressurreição dos mortos, quando todos os santos reinarão diante de Deus em corpo glorioso.

Até lá, no entanto, a batalha é quotidiana, não pára um só minuto. Muitas vezes, as insídias perigosas do demônio soarão inofensivas… Não pense o homem que as tentações serão para que o homem traia explícita e diretamente a Deus, que serão sugestões de infidelidade aberta e escancarada. O diabo começa a pavimentar a estrada para o inferno "maquiando" o primeiro mandamento: se o homem cai na armadilha, continua "amando" a Deus, mas não sobre todas as coisas. E aqui começa a sua perdição.

Não se engane o homem: "Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou odiará a um e amará o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e à riqueza" (Mt 6, 24).

Referências

  1. Santo Agostinho, Tractatus in Epistulam Iohannis ad Parthos, II, 11 (PL 35, 1995).

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