Santo Eleázar, cujo nome o Martirológio Romano registra hoje, nasceu de uma família nobre e ilustre. Sua mãe, uma senhora muito estimada por suas virtudes, consagrou-o a Deus logo após o nascimento, fazendo esta humilde súplica ao Todo-Poderoso: se Ele antevisse que seu filho um dia viesse a ofendê-lo com um pecado mortal, que o levasse para junto de si depois de batizado. Para ela, era melhor perder o filho ainda inocente do que deixá-lo viver um momento sequer em pecado.
Não podemos duvidar que essa consagração, feita com um coração sincero, tenha sido agradável a Deus, porque Ele concedeu a Eleázar a graça de conservar sua inocência imaculada até a morte. A compaixão para com os pobres parece ter nascido com ele, pois desde criança não permitia que ninguém saísse da porta de sua casa sem uma esmola. Vasculhava a casa à procura de tudo o que pudesse dar aos pobres e distribuía-o entre eles com muita bondade. Foi educado no mosteiro de São Vítor, em Marselha, e não media esforços nem para adquirir conhecimentos nem para praticar todas as virtudes cristãs. Por isso, era muito amado e querido por todos.
Por ordem do Rei Carlos II, foi, ainda muito jovem, unido em casamento a uma princesa chamada Delfina, tão virtuosa quanto ele. Após a cerimônia de casamento, Delfina informou Eleázar que tinha sido obrigada a casar-se, mas que estava decidida a preservar sua virgindade, se ele permitisse. Eleázar admirou a virtude de Delfina e aceitou sua piedosa resolução; pouco depois, fez também ele um voto de castidade perpétua. Portanto, ambos viveram no celibato até o fim de suas vidas.
Os meios de que se serviram para perseverar nesse caminho incomum foram a oração, a Comunhão frequente, a mortificação contínua dos sentidos e a devoção filial à Santíssima Virgem. Assim obtiveram a graça de manter-se livres de todas as tentações contra a pureza. Por seu companheirismo constante, sentiam-se também cada vez mais motivados a respeitar a castidade.
Quando Santo Eleázar fez vinte anos, pediu ao avô, com quem morava, autorização para mudar-se com a esposa para um castelo pertencente a ela. Neste local, organizou de tal forma seu lar, que mais parecia um mosteiro que a residência de um conde. Escreveu as seguintes regras memoráveis para seus servos e os outros moradores da casa:
- Ouvir todos os dias a Santa Missa.
- Confessar-se todas as semanas e comungar uma vez por mês.
- Trabalhar com diligência.
- Abster-se de blasfêmias, maldições e conversas licenciosas.
- Levar uma vida pura.
- Evitar brincar com dados e outros jogos de azar.
- Manter a paz e a harmonia entre si e, após uma discussão, reconciliar-se antes do fim do dia.
- Reunir-se diariamente para uma leitura espiritual.
Estabeleceu estas e outras regras semelhantes para sua casa, designando também algumas punições para quem as transgredisse. E para que todos pudessem mais facilmente ser levados a observá-las, ia adiante deles com seu próprio exemplo. Seu amor pelos pobres, que, como dissemos, já se manifestava desde a mais tenra idade, aumentava à medida que ele envelhecia. Lavava diariamente os pés de dez pobres, mesmo leprosos, a quem também alimentava e ajudava com esmolas.
Certo dia, visitou um hospital vizinho, onde encontrou seis leprosos cuja aparência por si só causava pavor a quem os observava. Ao aproximar-se deles, Eleázar consolou-os e não só lhes ofereceu muitos presentes, como também os abraçou com toda a ternura. Em retribuição a essa abnegação heroica do conde, Deus libertou a todos eles da lepra. Por ocasião de uma grande carestia e fome, Eleázar esvaziou todos os seus celeiros para fazer caridade aos pobres.
Também não foi menos generoso no perdão das injúrias. Certa vez, quando os negócios o obrigaram a ausentar-se, alguns de seus súditos revoltaram-se e, naturalmente, temeram ser castigados quando ele voltasse. Mas o conde, perdoando-os, libertou-os do medo e, com este ato de bondade, conquistou-lhes o coração. No entanto, foi severamente justo em outra ocasião, pois não deixava impunes as más ações, assim como não deixava de recompensar as boas.
O Rei Roberto pediu-lhe que desempenhasse as funções de presidente do Conselho de Nápoles, até seu retorno de uma viagem à Provença. Eleázar aceitou o cargo e teve muitas oportunidades de demonstrar seu amor pela justiça. Nenhum respeito pelas pessoas, nenhuma oferta de presentes, era capaz de fazê-lo desviar-se do que considerava justo e correto. Algumas de suas expressões sobre subornos merecem ser lembradas. Alguém o aconselhou a aceitar certos presentes, dizendo que podia fazê-lo de consciência tranquila, ao que ele respondeu:
É verdade. Eu poderia aceitar esses presentes com a consciência tranquila, mas do que podemos aceitar legitimamente passamos fácil ao que não se pode aceitar com justiça. Começamos por tirar o fruto, depois tiramos a árvore e, por fim, o jardim em que cresce a árvore.
Apesar da inocência e santidade de vida de Eleázar, Deus não deixou de visitá-lo com cruzes e perseguições. No entanto, jamais foi visto desanimado, perturbado ou descontente. Em seus sofrimentos, recorria às santas chagas de Cristo e à proteção da Mãe de Deus, onde sempre encontrava consolo e força.
Por fim, quando alguns negócios o levaram a Paris, adoeceu e, apesar de nenhum médico ter considerado grave sua doença, chamou um sacerdote, fez uma confissão geral e recebeu a Sagrada Comunhão. Durante o período em que esteve doente, pedia todos os dias que lessem para ele a história da Paixão de Cristo. Pediu e recebeu o santo viático ainda na posse de todas as suas faculdades. Encomendando o sacerdote a sua alma, e chegando às palavras da ladainha: Per Crucem et passiónem tuam, líbera eum, Dómine — “Pela vossa Cruz e Paixão, livrai-o, Senhor!”, disse claramente o santo homem: “Esta é a minha esperança; nisto morrerei.”
Antes de morrer, teve ainda de travar um duro combate, que se refletiu em seu semblante. Depois de algum tempo, exclamou: “Grande é o poder dos espíritos do Inferno, mas a força e os méritos de Jesus Cristo os aniquilaram.” Por fim, disse: “Eu venci. Deus seja louvado. Eu venci por completo!” Seu rosto ficou, então, inteiramente iluminado; um brilho celestial parecia emanar dele, até que sua alma pura e virtuosa entrou na presença de seu Criador, no ano de 1323.
Considerações práticas
Santo Eleázar era de origem nobre, e rico em bens temporais, mas viveu uma vida cristã e santa. A nobreza e a riqueza não nos impedem, por si mesmas, de alcançar a salvação. A virtude e a piedade podem muito bem estar unidas à nobreza de nascimento e às riquezas. Só temos de usá-las corretamente, como fez o santo conde Eleázar. Mas, se forem usadas de outra forma — como, por exemplo, a nobreza para gerar orgulho, desprezar e oprimir os outros; e as riquezas para entregar-se ao luxo imoderado, ou a outros pecados e vícios —, podem levar os homens à perdição.
Santo Eleázar mostrou que os bens materiais podem ser empregados para a honra de Deus e a salvação das almas. No dia do julgamento, a vida desse santo confundirá todos os nobres deste mundo, que imaginam não poder viver piedosamente e tornar-se santos em sua condição, como se os exercícios de devoção não fossem adequados ao seu estado de vida, mas bons apenas para pessoas comuns, religiosos em um convento ou eremitas em um deserto.
Como poderão justificar-se com as desculpas que agora apresentam, de que seus negócios os impedem de rezar, ou que, sobrecarregados com tantos cuidados, não podem viver piedosamente? Santo Eleázar também tinha grandes encargos, e o governo de seus súditos dava-lhe certamente muito trabalho; no entanto, encontrava tempo para servir a Deus. Então, por que outros da mesma posição não podem fazer o mesmo? Com o exemplo do santo conde, aprendam estes, ainda, como governar de forma cristã o lar, e como conduzir no caminho do dever e da retidão aqueles que estão sob o nosso comando. Aprendam também o cuidado que devem ter em aceitar presentes quando têm de administrar a justiça.
Todos os cristãos, por fim, ao lerem como foi severamente tentado no leito de morte este santo conde, devem aprender com ele a não confiar demasiado em si mesmos. Aprendam também onde buscar refúgio na tentação, e como combatê-la, para que também eles possam exclamar na última hora: “Eu venci!” Pois só aos que vencem é prometido o Céu. “Aquele que vencer, fá-lo-ei sentar comigo no meu trono”, diz o Todo-Poderoso (Ap 3, 21).
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