São Corbiniano nasceu na comuna de Melun, na França. Filho de pais ricos, sua juventude foi marcada por grande inocência e piedade. Querendo servir a Deus e também incentivar os outros a fazer o mesmo, construiu uma cela perto da igreja de São Germano, na qual passou quatorze anos em profunda santidade. 

A fama de sua virtude e sabedoria levou muitas pessoas até ele, tanto para pedir seu conselho em questões difíceis, quanto para pedir suas orações. Isto causava um grande incômodo no santo, que desejava servir a Deus na solidão e no silêncio. Por isso, foi a Roma e pediu ao Papa que lhe desse um lugar não muito longe da Basílica de São Pedro, onde pudesse viver alheio ao mundo. Seus modos e sua maneira de falar levaram o Santo Padre a concluir que se tratava de um homem de grandes virtudes e capacidades, e tão logo se convenceu disso, ordenou Corbiniano sacerdote e depois o sagrou bispo. Depois disso, o Papa ordenou-lhe que regressasse e exercesse suas funções episcopais para a salvação das almas, onde quer que fosse necessário.

São Corbiniano recebe das mãos do Papa a mitra e o pálio. Afresco presente na Catedral de Frisinga, Alemanha.

Corbiniano submeteu-se aos decretos da Providência, obedeceu ao Papa e voltou para casa percorrendo a Lombardia e grande parte da França, e pregou em todos os lugares com grande sucesso. A santidade de Corbiniano e os milagres que o Todo-Poderoso realizava por meio dele faziam com que todos o estimassem e respeitassem. Para evitar isso, retornou à sua antiga residência e permaneceu lá por vários anos. Quando, porém, souberam onde ele estava e começaram a procurá-lo novamente, ele empreendeu uma segunda viagem a Roma.  

Desta vez, Deus o conduziu pela Baviera, para grande benefício de seus habitantes, pois, quando o santo bispo percebeu a ignorância do povo em matéria de fé, imediatamente começou a instruí-los. O piedoso Duque Teodoro, então reinante na Baviera, alegrou-se muito com os bons resultados dos trabalhos apostólicos do santo e desejou que ele permanecesse em seus domínios. O mesmo desejava Grimoaldo, filho do duque, que morava em Frisinga. 

Dirigindo-se apressadamente a Roma, Corbiniano suplicou ao Papa que o dispensasse de sua dignidade episcopal. No entanto, o pedido não foi atendido, e o Santo Padre o exortou a prosseguir zelosamente em seu trabalho pela salvação das almas. Por isso, Corbiniano voltou para a Baviera. Em um burgo e castelo não muito longe de Merano, que naquela época pertencia à Baviera, ele permaneceu vários dias junto ao túmulo de São Valentim, que fora bispo de Passau. Informado de sua chegada, Grimoaldo enviou mensageiros para encontrá-lo e convidá-lo a ir até Frisinga. 

O santo aceitou o convite, mas ao saber depois que o duque vivia em união irregular com Biltrude, mulher de seu falecido irmão, mandou um de seus companheiros dizer que não poria os pés no palácio enquanto não fosse desfeito tamanho escândalo. Acrescentou que as palavras do Apóstolo eram e seriam eternamente verdadeiras: “Nem os fornicadores nem os adúlteros possuirão o reino de Deus” (1Cor 6, 9). Biltrude, muito enfurecida com a mensagem destemida do santo bispo, resolveu, como outra Herodíades, contratar um assassino e matá-lo em segredo. Mas as exortações do sacerdote que o santo enviara a Grimoaldo impressionaram tão profundamente o duque e Biltrude, que ambos, reconhecendo sua culpa e arrependendo-se dela, lançaram-se aos pés de Corbiniano e prometeram mudar de vida. O santo recebeu-os com bondade e aconselhou-os seriamente a fazer penitência e a dar esmolas.

Escultura de São Corbiniano.

Depois disso, o bispo trabalhou por algum tempo na Igreja de Frisinga, convertendo os ímpios, induzindo os mornos e preguiçosos a serem mais solícitos por sua salvação e incentivando os piedosos e zelosos a terem ainda mais fervor, por meio de seus sermões, admoestações e exortações. Biltrude, porém, retornou à sua antiga vida perversa e, para não ser perturbada em suas maldades, ordenou a um de seus asseclas que matasse Corbiniano. Mas antes que o algoz cercasse o palácio do bispo com seus soldados, Corbiniano, informado do plano malévolo, fugiu. 

Chegando a Merano, o santo prelado anunciou a Grimoaldo e a Biltrude o castigo divino que em breve os atingiria. A profecia não tardou a cumprir-se. Grimoaldo foi assassinado por um de seus súditos, e Biltrude, privada de poder e riqueza, terminou sua vida na miséria, que ela mesma havia atraído para si com sua conduta perversa. Também o assassino contratado pelo casal recebeu o que merecia: foi apunhalado e, portanto, chamado de modo intempestivo ao tribunal do Todo-Poderoso. 

Hugiberto, filho mais novo do piedoso Duque Teodoro, que sucedeu Grimoaldo no governo, suplicou ao santo bispo que regressasse à sua sede e perdoasse as injustiças que lhe tinham sido feitas. O santo consentiu, retornou a Frisinga e foi recebido com regozijo universal pelos habitantes da cidade. Mal havia chegado e Deus revelou-lhe a sua hora derradeira. Depois de ter resolvido de modo satisfatório todos os assuntos de sua diocese, pôs as vestes episcopais no dia que devia ser o seu último na terra, foi à igreja e celebrou a Missa. Ao voltar para casa, tomou uma ligeira refeição, benzeu-se e expirou calmamente, na presença de alguns sacerdotes, sem ter adoecido e sem dar sinais de dor ou sofrimento. 

Seu santo corpo foi sepultado, com grande solenidade, na catedral, mas como o santo havia desejado que seu túmulo fosse erguido em Merano, o Todo-Poderoso manifestou claramente que tal desejo deveria ser cumprido, pois, logo após o funeral, teve início uma chuva torrencial que só terminou quando as sagradas relíquias de Corbiniano foram levadas para o local que ele escolhera como seu lugar de descanso. Cinquenta anos depois, quando os lombardos invadiram o Tirol e devastaram a região, o piedoso bispo Aribo exumou novamente o santo corpo e levou-o para Frisinga, onde ainda é muito venerado.

São Corbiniano é transferido de Frisinga para Merano. Afresco da Catedral de Frisinga.
Em Merano, o piedoso bispo Aribo constata que o corpo de São Corbiniano está incorrupto.

Este santo bispo costuma ser representado com um urso a seu lado, pela seguinte razão: Quando fez sua segunda viagem a Roma e foi obrigado a permanecer uma noite ao ar livre com os que o acompanhavam, um urso atacou seu cavalo, que estava carregado com o que ele necessitava para sua viagem. Corbiniano, que só chegou ao local depois de o cavalo estar parcialmente devorado, ordenou ao urso, em nome do Altíssimo, que tomasse o fardo com seus suprimentos e o levasse até Roma. O animal obedeceu e carregou pacientemente, até o fim da viagem, o fardo colocado sobre suas costas. Muitas pessoas testemunharam o acontecimento. Evidentemente, o desejo do Todo-Poderoso era glorificar seu servo fiel por meio disso, bem como por vários outros eventos não menos notáveis.

Afresco na Catedral de Frisinga representa São Corbiniano domesticando o urso.

Considerações práticas

I. São Corbiniano admoestou Grimoaldo e Biltrude por causa de sua conduta criminosa. Não há dúvida de que o fez por amor a Deus, e também por amor a esses dois pecadores, cuja destruição previu e de quem se compadeceu. A princípio, parece que os dois receberam a admoestação de bom grado e se arrependeram, mas logo retomaram sua vida pecaminosa e procuraram retribuir o bem com o mal. 

Se você tiver a oportunidade de exortar os outros, faça-o por amor a Deus e ao ser humano, a fim de evitar a ofensa a Deus e a destruição do próximo. Se alguém lhe fizer uma admoestação, receba-a com benevolência, sobretudo se ela vier de seu confessor ou de seu pároco, que são obrigados a adverti-lo e, ao fazê-lo, só procuram o seu bem. Por que, então, se queixar e ofender com isso? “É melhor ser repreendido pelo sábio, do que ouvir o canto (de adulação) dos insensatos” (Ecle 7, 5), diz o Espírito Santo. E escreve São João Crisóstomo: “Um doente age com insensatez quando se queixa de um médico que lhe prescreve um remédio útil ou necessário para a sua saúde.”

O brasão de armas de Bento XVI traz o urso de São Corbiniano. De fato, antes de ser Papa, Ratzinger foi arcebispo de Munique e Frisinga. Além disso, aceitou o ministério pontifício como um “fardo”, por pura obediência a Deus — como o urso da hagiografia.

Ainda mais tolamente age você, quando murmura de seu confessor, diretor espiritual ou pároco, que lhe corrige as faltas por amor a você e desejo de salvar sua alma. Esteja certo de que, no outro mundo, Grimoaldo e Biltrude estão arrependidos há muito tempo por não terem seguido a admoestação de São Corbiniano. Muitos sofrem no Inferno por não terem dado ouvidos às exortações de seus confessores. Tome cuidado para não se tornar um deles.

II. São Corbiniano morreu feliz porque sempre esteve preparado para a morte. 

Há muitas pessoas que adiam para a última hora sua penitência e preparação para a morte. Pensam que a melhor ocasião de fazer penitência é quando estão doentes. Como são cegas! Quem prometeu que a doença seria a precursora de sua morte? Acaso é impossível que morram de súbito, como tem acontecido a tantos? Mas, mesmo que adoeçam, não poderá ser uma doença que lhes tire a razão, ou que seja tão dolorosa a ponto de não poderem se lembrar de seus pecados e confessá-los corretamente? Em tais circunstâncias, como elas vão se preparar para a morte? Além disso, será que, naquele momento derradeiro, desejarão se preparar? Satanás lhes dirá que não há perigo, que em breve serão curados. Seus parentes e conhecidos, movidos por uma falsa compaixão, falarão de modo semelhante. Muitos têm sido enganados dessa forma. 

Seja como for, uma coisa é certa: um arrependimento tardio raramente é um arrependimento verdadeiro. A hora da morte ou da enfermidade não é o momento adequado para um ato tão grandioso e tão importante como a preparação para a morte, da qual depende toda a eternidade. Se quiser ter alguma garantia, prepare-se a tempo e não adie sua penitência para o fim. São verdadeiras as palavras de Santo Agostinho: 

A penitência de um doente é uma penitência doente, e a de um moribundo, receio, é uma penitência moribunda ou morta. Portanto, quem quiser buscar a misericórdia de Deus, que faça penitência enquanto seu corpo e mente estiverem saudáveis, para que possa alcançar a salvação no mundo que há de vir. 

E, em outro lugar, diz este grande e santo mestre: 

Como não sabemos a que hora seremos chamados, apressemo-nos, sem demora, a migrar das trevas para a luz. Não devemos confiar nem na saúde nem na idade. Quem não está seguro de sua vida, não deve adiar o uso dos meios que lhe assegurem a salvação. Aquele que nos garante que o pecador, sempre que se arrepender, receberá o perdão de suas iniquidades, adverte-nos também: “Não tardes em te converter ao Senhor, não o difiras de dia para dia” (Eclo 5, 7). 

Apressemo-nos, pois, em converter-nos, enquanto os meios estão ao nosso alcance.

Referências

  • Extraído, traduzido e adaptado passim de: Lives of the saints: compiled from authentic sources with a practical instruction on the life of each saint, for every day in the year, v. 2. New York: P. O’Shea, 1876, p. 308ss.

Notas

  1. As leis canônicas vigentes à época tinham por incestuoso esse tipo de união. Daí a advertência de São Corbiniano e o escândalo provocado pela conduta de Grimoaldo e Biltrude. (N.T.)

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