O Segundo Livro dos Macabeus fornece um relato impressionante do martírio de uma mãe judia e de seus sete filhos sob o governo do Rei Antíoco IV, do Império Selêucida. Naqueles dias (175–164 a.C.), Antíoco governava a Judeia, a Síria e outras terras a leste do Mar Mediterrâneo. Antíoco esperava poder unificar os povos conflitantes da região impondo a cultura helenística, enraizada na religião grega, em seu império. No entanto, os judeus fiéis se recusaram a aceitar os costumes gregos, pois estes eram incompatíveis com a Lei de Deus.
Em 2 Macabeus 7, os selêucidas prenderam uma mulher e seus sete filhos por rejeitar as práticas que Antíoco procurava impor. Se a família comesse carne de porco, uma prática explicitamente proibida pela Lei (cf. Lv 11, 7-8; Dt 14, 8), eles ficariam livres. Eles recusaram. Os soldados do rei começaram a torturar cada irmão, mas cada um, esperando que Deus um dia os ressuscitasse dos mortos por sua fidelidade, recusou-se a quebrar as leis divinas dadas nas Escrituras. Os opressores os mataram, um por um.
O martírio mais impressionante é o do sétimo irmão. Depois de detalhar a morte dos seis irmãos mais velhos, o autor conta:
Receando, todavia, o desprezo e temendo o insulto, Antíoco solicitou em termos insistentes o mais jovem, que ainda restava, prometendo-lhe com juramento torná-lo rico e feliz, se abandonasse as tradições de seus antepassados, tratá-lo como amigo e confiar-lhe cargos (2Mb 7, 24).
Isso marca uma mudança de tática. Antíoco não apenas ameaçava esse rebelde com torturas; agora prometia benefícios também. E esses benefícios não eram insignificantes — era um título oficial ser “amigo” do rei, este “o teria na classe dos seus favorecidos” (segundo a tradução do Pe. Matos Soares) [i].
A mudança também nos ajuda a entender qual era a perspectiva de Antíoco. A ambição marcou a sua vida. Ele havia tomado o controle do império de Heliodoro, um chanceler arrivista que assassinara o seu irmão, o Rei Seleuco IV. No entanto, nem o poder de Antíoco nem suas ameaças puderam superar a vontade dos mártires macabeus. Isso o perturbou, então ele tentou a nova estratégia da generosidade. Ele estava disposto a dar suas riquezas e poder, duramente conquistados, a um ninguém. Entretanto, esse ninguém recusou a oferta de riquezas e poder, as mesmas coisas que o rei passou a vida buscando. E para quê? Para evitar comer um bocado de carne de porco. “Abrasado de ira e enraivecido pela zombaria, o rei maltratou este com maior crueldade do que os outros” (2Mb 7, 39).
O filho mais novo conhecia a bondade da Lei. Ela deu a ele um relacionamento com Deus. Seguir seus estatutos minuciosamente lhe deu meios para honrar a Deus nas minutiæ de sua vida. Por outro lado, abandonar o código alimentar que Deus deu sob a aliança seria o mesmo que abandonar a Deus. O filho mais novo preferiu Deus aos bens que definiam a vida de Antíoco. Assim, esse menino impotente era uma ameaça; seu amor pela Lei condenou todo o estilo de vida de Antíoco. Se o menino estava certo no que fazia, então Antíoco era um desperdício perverso de homem, cujas obras não valiam nada.
O Rei Antíoco foi presenteado com uma ocasião de graça naquele dia. A família dos mártires mostrou-lhe a possibilidade de um caminho mais elevado; seu testemunho sugeria um novo modo de vida, um caminho de piedade, devoção e lealdade ao Deus eterno e Criador.
No entanto, Antíoco tinha um coração duro. Ele se ofendeu com a família que preferia morrer a quebrar a Lei de Deus. Ele estava disposto a doar dinheiro e honra para conquistar o mais novo, mas não estava disposto a considerar a possibilidade de que deveria mudar. Por isso matou o menino.
Antíoco não foi o último a cometer tal erro, pois os mártires são sempre pessoas ofensivas. Eles contradizem o mundo ao seu redor em assuntos que parecem ninharias. Em seu amor a Deus, eles revelam a vaidade da riqueza e do poder. Os homens sem fé, como o Rei Antíoco, só podem considerar maliciosa a devoção deles. Mas os que têm fé sabem que os mártires escolheram a melhor parte. Deus merece o amor do homem acima de todas as coisas; e esse amor é forte como a morte (cf. Ct 8, 6).
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