Uma capa sensacionalista e nada mais. Assim pode ser resumida a reportagem sobre a Virgem Maria, publicada pela revista cujo nome não faz jus ao seu conteúdo. Na primeira edição de 2017, Superinteressante resolveu revelar ao público brasileiro aquela que seria a "verdadeira" Maria. Ocorre que a revista não traz nada de novo nem de interessante. Apenas repete a velha cantilena de que Nossa Senhora teve outros filhos, que era uma mulher qualquer, rica e independente.
Desde as primeiras formulações da fé, a Igreja "encontrou viva oposição, troça ou incompreensão por parte dos não-crentes, judeus e pagãos" a respeito da concepção virginal de Jesus [1]. Por isso, não é espantoso que, mesmo após tantos séculos, essa oposição ainda se encontre viva no contexto social, sobretudo agora quando a virgindade já não é vista como um dom a ser preservado. Ora, o próprio Catecismo da Igreja Católica esclarece que o "sentido deste acontecimento", isto é, da concepção virginal de Jesus, "só é acessível à fé, que o vê no 'nexo que liga os mistérios entre si', no conjunto dos mistérios de Cristo, da Encarnação até à Páscoa" [2].
É claro, portanto, que uma mente fechada à graça de Deus não compreenderá o porquê das glórias de Maria, concedidas a Ela pelo próprio Deus, e buscará qualquer pedaço de pau para espancar a doutrina católica. Mais: a virgindade perpétua da Virgem Santíssima é um testemunho contra uma mentalidade secularizada e pagã, que defende o sexo como passatempo e diversão promíscua. Neste sentido, é preferível acreditar em uma Maria "poderosa e atrevida", do que reconhecer suas virtudes heroicas, sua virgindade e sua santidade. Uma Maria "dona de si", "independente" e "rica" não exige de ninguém uma conversão interior.
Não é coincidência, a propósito, que na mesma capa em que Nossa Senhora é retratada dessa maneira espúria, Superinteressante também apresente um perfil muito semelhante das mulheres que abortam. A armadilha é sutil: se Maria fosse uma mulher do século XXI, sugere maliciosamente a revista, ela também abortaria. Na sua famosa trilogia sobre Jesus de Nazaré, Bento XVI analisa os perfis de Cristo defendidos pelos teólogos modernos e percebe como são parecidos com as opções ideológicas de cada autor. "Quem lê várias destas reconstruções, umas ao lado das outras, pode rapidamente verificar que elas são muito mais fotografias dos autores e dos seus ideais do que reposição de um ícone", escreve [3]. Aqui se verifica o mesmo problema. A "verdadeira" Maria de Superinteressante nada mais é que uma fotografia do ideal de mulher para os tempos modernos.
Mas quem é, afinal, a Virgem Maria?
É preciso reconhecer, antes de tudo, que o "que a fé católica crê, a respeito de Maria, funda-se no que crê a respeito de Cristo", e que "o que a mesma fé ensina sobre Maria esclarece, por sua vez, a sua fé em Cristo" [4]. Jesus e Maria estão intimamente ligados na economia da salvação. Por isso, não se pode fazer silêncio quando as verdades de fé sobre Nossa Senhora são negadas, uma vez que elas estão na base de outras verdades fundamentais da cristologia, como a doutrina sobre as naturezas divina e humana de Jesus. Quem nega aquelas, ipso facto, também nega estas. Como recorda o Catecismo, já no primeiro século os cristãos reconheciam o nexo existente entre Maria e Jesus, tal qual se pode ler neste escrito de Santo Inácio de Antioquia: "O príncipe deste mundo não teve conhecimento da virgindade de Maria e do seu parto, tal como da morte do Senhor: três mistérios extraordinários, que se efetuaram no silêncio de Deus" [5].
Em 1927, foi descoberto, no Egito, um fragmento de papiro datado do século III, no qual se podia ler a seguinte prece: "À vossa proteção recorremos Santa Mãe de Deus. Não desprezeis as nossas súplicas em nossas necessidades, mas livrai-nos sempre de todos os perigos, ó Virgem gloriosa e bendita". Trata-se da mais antiga oração cristã à Virgem Maria de que se tem notícia, depois, é claro, do louvor do anjo Gabriel e de Isabel (cf. Lc 1, 28; 42-45). Como se pode notar, os cristãos já se reportavam à sempre Virgem Maria como Mãe de Deus muito antes da definição do dogma, no Concílio de Éfeso. Não faz nenhum sentido, destarte, dizer que os dogmas católicos são adaptações à mentalidade pagã. De fato, a doutrina sobre a Virgem Maria é, sim, de origem apostólica.
Santo Irineu de Lião, cuja doutrina remonta diretamente ao apóstolo São João, escreve que, "assim como Eva, desobedecendo, se tornou causa de morte para si mesma e para todo o gênero humano, assim também Maria se tornou, pela sua obediência, causa de salvação para si mesma e para todo o gênero humano" [6]. Com essa sentença, Santo Irineu já explicava aquilo que seria definido séculos mais tarde no Concílio Vaticano II, sobre a mediação de Maria na obra da salvação. Notem: Santo Irineu é um autor do século II, que bebeu diretamente da fonte dos Apóstolos. Como não confiar no testemunho fidedigno desses santos, que derramaram o próprio sangue pela fé cristã?
A própria Sagrada Escritura dá testemunho de que Maria é mãe apenas de Jesus. Como já explicamos em outra oportunidade, "Tiago, irmão do Senhor", tinha outro pai e outra mãe: Maria, irmã de Nossa Senhora, e Alfeu, ou Cléofas em outras traduções. Além disso, as Sagradas Escrituras nunca dizem que esses "irmãos de Jesus" são filhos de Maria. Também Jesus não a teria confiado a João, na hora derradeira, se ela tivesse outros filhos (cf. Jo 19, 25-27).
Se mesmo os anjos se espantam e dizem "Quem é essa?" e os santos confirmam unanimemente: De Maria nunquam satis, "Sobre Maria jamais se dirá o bastante", parece muito pretensioso por parte de Superinteressante querer apresentar aos seus leitores a "verdadeira" Virgem Maria. É bom que deixem esse trabalho a quem, ao longo dos séculos, foi mais enaltecido pela obediência e humildade dessa mulher; Àquele que, pela boca de Isabel, proclamou: "Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre" (Lc 1, 42); Àquele que é, enfim, seu esposo e nosso vivificador, o Espírito Santo.
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