Na oração do Pai-nosso, após manifestar seu afeto filial, Jesus faz um primeiro pedido a Deus-Pai: Santificado seja o vosso nome. Esse pedido remete diretamente para o segundo preceito do Decálogo. Trata-se de honrar a Revelação de Deus ao homem. Ora, informar o nome a alguém significa tornar-se acessível. Antes da Revelação, os pagãos utilizavam-se dos nomes das divindades de forma deliberada. Acreditavam que os deuses estavam submetidos à vontade do homem; eram-lhes subordinados. Por outro lado, Deus, quando se revela, obriga a humanidade a contentar-se com esta afirmação: “Eu sou aquele que sou" (Ex 3, 14). Deus é desde sempre e para a eternidade. Não está submetido à vontade humana.
Na encarnação de Cristo, porém, o nome de Deus é manifestado mais diretamente, de maneira que já é possível instrumentalizá-lO. O nome de Jesus pode ser usado para justificar atrocidades e extorsões. É justamente o que comenta Bento XVI na primeira parte do famoso livro Jesus de Nazaré: “Agora o nome de Deus pode ser abusado e Deus ser desonrado. O nome de Deus pode ser instrumentalizado para nossos objetivos e assim deformada a sua imagem" [1]. Como não pensar no uso indiscriminado do nome de Deus para justificar atos terroristas, contrários à vida e à dignidade da pessoa humana?
A honra ao nome do pai expressa de maneira concreta o amor filial. Nada é mais gratificante a um filho que um elogio a seus pais. A blasfêmia, não obstante, é o típico pecado do Diabo. Basta lembrar que, por serem criaturas puramente espirituais, os anjos não podem fornicar. Por isso, o ataque demoníaco a Deus faz-se pelo orgulho. Dizia Santo Tomás de Aquino: “O orgulho é por natureza o pior de todos os pecados, mais grave que a infidelidade, o desespero, o homicídio, a luxúria etc" [2]. A blasfêmia, por conseguinte, nada mais é do que um meio para Satanás desonrar a essência divina, parodiando-a impunemente, a fim de que o homem tenha de Deus somente uma caricatura. Foi pensando nisso que, certa vez, Santa Teresinha pediu permissão a Jesus para amá-lO no inferno [3]:
[...] Uma tarde não sabendo como dizer a Jesus que o amava e quanto desejava que Ele fosse por toda parte amado e glorificado, eu pensava com dor que Ele nunca poderia receber no inferno um só ato de amor, então disse a Deus que para lhe dar prazer eu consentiria em ver-me aí mergulhada, a fim de que Ele seja amado eternamente nesse lugar de blasfêmia.
A blasfêmia significa um esquecimento da filiação divina e um esquecimento de si mesmo. É um atentado ao próprio homem. Tamanha é a gravidade desse pecado, que o Cura d'Ars perguntava-se espantado: “Não é um milagre extraordinário que a casa onde se acha um blasfemo não seja destruída por um raio ou cumulada com toda sorte de desgraças?" [4]. Em síntese, a agressão ao nome de Deus esconde em seu seio uma revolta contra o plano divino. Desse modo, o pecado contra o segundo mandamento não se traduz somente em ridicularizações hediondas - embora sejam elas as mais comuns, como se costuma apresentar em programas humorísticos, filmes, revistas, etc - às vezes, trata-se de algo muito mais sutil e, por essa razão, muito mais nocivo.
Em nome de um falso conceito de “misericórdia", inúmeras pessoas têm caído na presunção da tibieza, recusando-se a buscar a santidade pessoal. Essa é, sem dúvida, a pior de todas as blasfêmias, pois nessa atitude não só se espezinha o conteúdo das Tábuas da Lei, a pretexto de uma época que segue a regra materialista do laissez faire, laissez passer, le monde va de lui même (deixe fazer, deixe passar, o mundo vai por si mesmo), como também se deturpa a natureza do nome de Deus ao utilizá-lO para justificar posições morais claramente pecaminosas. É como dizer que a crucifixão de Cristo não teve nenhum valor. Não significou a purificação de nossos pecados. Ora, Jesus verteu sangue do alto do madeiro justamente para assumir a nossa culpa. Com efeito, quando a misericórdia é utilizada para a banalização do mal, aí já não há mais misericórdia. Pior do que feministas que invadem catedrais são católicos que banalizam o próprio pecado em nome da misericórdia de Deus.
Sobre essa tendência pouco cristã de se aceitar somente a face misericordiosa de Cristo, criticava o então Cardeal Joseph Ratzinger, na Via-Sacra de 2005 [5]:
Apesar de todas as nossas palavras de horror à vista do mal e dos sofrimentos dos inocentes, não somos nós porventura demasiado inclinados a banalizar o mistério do mal? Da imagem de Deus e de Jesus, no fim de contas, admitimos apenas o aspecto terno e amável, enquanto tranquilamente cancelamos o aspecto do juízo? Como poderia Deus fazer-Se um drama com a nossa fragilidade — pensamos cá conosco —, não passamos de simples homens?! Mas, fixando os sofrimentos do Filho, vemos toda a seriedade do pecado, vemos como tem de ser expiado até ao fim para poder ser superado. Não se pode continuar a banalizar o mal, quando vemos a imagem do Senhor que sofre. Também a nós, diz Ele: Não choreis por Mim, chorai por vós próprios... porque se tratam assim o madeiro verde, que será do madeiro seco?
“Toda a santidade, toda a perfeição de nossa alma consiste em amar a Jesus Cristo nosso Deus, nosso Sumo Bem e Salvador" [6]. Por esta sentença, Santo Afonso de Ligório introduzia seus discípulos à escola de perfeição cristã. Essa perfeição é atingida no louvor ao nome de Nosso Senhor, tornando-O conhecido entre todos os povos e nações. Ainda mais: traduz-se no amor àqueles que são queridos por Deus, a saber, a Virgem Maria e os santos. A forma mais eficaz de santificar o nome de Deus, por conseguinte, é fazendo que cada vez mais pessoas aproximem-se d'Ele com devoção e piedade. Nisto consiste o amor cristão.
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