CNP
Christo Nihil Præponere"A nada dar mais valor do que a Cristo"
Todos os direitos reservados a padrepauloricardo.org®

O pecado da dissimulação

Advertindo contra a duplicidade, Nosso Senhor ensina que não é possível receber o perdão divino se não estivermos dispostos a perdoar a quem nos tem ofendido: “Assim vos tratará meu Pai celeste, se cada um não perdoar de coração ao seu irmão”.

Texto do episódio
00

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 18, 21-35)

Naquele tempo, Pedro aproximou-se de Jesus e perguntou: “Senhor, quantas vezes devo perdoar, se meu irmão pecar contra mim? Até sete vezes?”

Jesus respondeu: “Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete. Porque o Reino dos Céus é como um rei que resolveu acertar as contas com seus empregados. Quando começou o acerto, levaram-lhe um que lhe devia uma enorme fortuna. Como o empregado não tivesse com que pagar, o patrão mandou que fosse vendido como escravo, junto com a mulher e os filhos e tudo o que possuía, para que pagasse a dívida. O empregado, porém, caiu aos pés do patrão e, prostrado, suplicava: ‘Dá-me um prazo, e eu te pagarei tudo!’ Diante disso, o patrão teve compaixão, soltou o empregado e perdoou-lhe a dívida. Ao sair dali, aquele empregado encontrou um dos seus companheiros que lhe devia apenas cem moedas. Ele o agarrou e começou a sufocá-lo, dizendo: ‘Paga o que me deves’.

O companheiro, caindo aos seus pés, suplicava: ‘Dá-me um prazo, e eu te pagarei!’ Mas o empregado não quis saber disso. Saiu e mandou jogá-lo na prisão, até que pagasse o que devia.  Vendo o que havia acontecido, os outros empregados ficaram muito tristes, procuraram o patrão e lhe contaram tudo. Então o patrão mandou chamá-lo e lhe disse: ‘Empregado perverso, eu te perdoei toda a tua dívida, porque tu me suplicaste. Não devias tu também ter compaixão do teu companheiro, como eu tive compaixão de ti?’

O patrão indignou-se e mandou entregar aquele empregado aos torturadores, até que pagasse toda a sua dívida. É assim que o meu Pai que está nos céus fará convosco, se cada um não perdoar de coração ao seu irmão”.

Meditação. — 1. No Evangelho deste domingo, S. Pedro aproxima-se de Jesus para lhe fazer a seguinte pergunta: “Senhor, quantas vezes devo perdoar, se meu irmão pecar contra mim? Até sete vezes?” Como em outras ocasiões, a resposta de Nosso Senhor é igualmente desconcertante:Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete”. E para ilustrar o novo ensinamento, Cristo propõe aos discípulos a parábola do servo impiedoso.

Logo nos primeiros versículos (v. 23-28), temos o cenário de um julgamento. Jesus fala de um rei que, diante da enorme dívida de seu servo, age com justiça, emitindo uma sentença de condenação: “[...] mandou que fosse vendido como escravo, junto com a mulher e os filhos e tudo o que possuía, para que pagasse a dívida”. O servo, por outro lado, embora não tivesse recursos para ressarcir o rei, implora à sua majestade por um prazo (o original grego diz μακροθύμησον = “tem paciência”). E o rei, movido de compaixão, “soltou o servo e perdoou-lhe a dívida”, conta-nos o evangelista.

A primeira lição dessa parábola é sobre a misericórdia de Deus. Enquanto estivermos neste mundo, por mais graves que sejam nossas faltas, sempre teremos a oportunidade de recomeçar. A simbologia por trás do número de vezes que Jesus nos manda perdoar (70 vezes 7) representa a paciência de Deus, que jamais se esgota; Ele sempre nos dá uma nova chance de emenda. Em razão disso, somos impelidos a agir com a mesma compaixão, perdoando aqueles que nos causaram algum dano.  Até porque a nossa dívida com Deus é infinitamente maior que a de qualquer pessoa conosco. E se, mesmo assim, Ele está sempre inclinado a perdoar-nos qualquer culpa, não há razão justificável para sermos inclementes com aqueles que nos ofenderam.

2. Dito isso, a parábola apresenta uma sequência surpreendente: “Ao sair dali, aquele empregado encontrou um dos seus companheiros que lhe devia apenas cem moedas”. Contudo, em vez de agir com misericórdia, S. Mateus conta-nos que “ele o agarrou e começou a sufocá-lo, dizendo: ‘Paga o que me deves’”. Esse companheiro chegou também a implorar-lhe um prazo (de fato, ele fez a mesma prece:  μακροθύμησον = “tem paciência”), mas o perdão não veio, e o empregado “mandou lançá-lo na prisão até que pagasse o que devia”. Quando o rei soube do ocorrido, ficou irado e “mandou entregar aquele servo aos carrascos, até que pagasse toda a dívida”.

A parábola termina com a advertência de Jesus: “Assim vos tratará meu Pai celeste, se cada um não perdoar de coração ao seu irmão”. É interessante notar como a pregação de Cristo não omite essa questão delicada. Movidos por uma falsa misericórdia, alguns pregadores modernos gostam sempre de enfatizar a bondade de Deus, relativizando a existência do juízo final, sob a alegação bastante incerta e infundada de que o inferno estaria vazio. Ora, não existem evidências que nos levem a crer nisso nem as palavras de Nosso Senhor, manso e humilde de Coração, autorizam-nos a pensar semelhante coisa. 

3. A misericórdia consiste, na verdade, em fazer o pecador sair do seu erro, como nos previne a segunda leitura: “Lembra-te do teu fim e deixa de odiar; pensa na destruição e na morte, e persevera nos mandamentos” (Eclo 27, 6s). Jesus lança-se, portanto, contra a hipocrisia e a duplicidade com que o empregado mau age diante do rei e de seu companheiro. Trata-se de um aviso: o Pai conhece o coração de cada homem e nada está oculto aos seus olhos. Não é possível fazer teatro para Deus. Por isso, a parábola como que explicita aquilo que está na oração do pai-nosso: Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós (lt. “sicut et nos”) perdoamos a quem nos tem ofendido.

Quem medita sobre a caridade divina e o quanto Deus está disposto a nos perdoar, não tem muita dificuldade de esquecer as culpas alheias. Aliás, a consciência reta acerca dessa matéria ajuda-nos, outrossim, a fazer uma confissão piedosa, cuja motivação não é tanto o medo do inferno quanto a dor de ter ofendido a Deus. Agindo assim, deixaremos de ser “homens carnais”, preocupados apenas com assuntos egoístas, para nos convertermos em “homens espirituais”, cheios da misericórdia de Deus.

Oração. Ó Deus, criador de todas as coisas, volvei para nós o vosso olhar e, para sentirmos em nós a ação do vosso amor, fazei que vos sirvamos de todo o coração. Por Nosso Senhor, Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina, na unidade do Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.

Material para Download

O que achou desse conteúdo?

0
0
Mais recentes
Mais antigos
Texto do episódio
Material para download
Comentários dos alunos