“O Ouro do Amor” e “Cântico de Núpcias” são os títulos de dois belos poemas de Dom Marcos Barbosa, monge beneditino do século XX que também foi membro da Academia Brasileira de Letras.
Natural da cidade de Cristina (MG), Dom Marcos é autor de vasta bibliografia, com destaque para seus “Poemas do Reino de Deus” — onde estão os poemas abaixo, e onde também é possível ler um elogio à sua obra por Gustavo Corção e um poema dedicado a ele por Cecília Meireles.
O Ouro do Amor
— Ouro saído das minas,
o que na terra vais ser?
— Serei do rei a coroa,
o cetro do seu poder.
— Ouro saído das minas,
qual na terra o teu destino?
— Serei do poeta a pena
jorrando o verso divino.
— Ouro saído da terra,
na terra qual o teu fado?
— Serei um par de alianças
para selar um noivado.
Um foi ouro de poder,
outro foi ouro de glória;
mas foi o ouro do amor
que teve a mais bela história.
Pois quando o império passou
e foi o poema olvidado,
o amor restava, brilhando,
nos filhos transfigurado...
Cântico de Núpcias
Nossos caminhos são agora um só caminho,
nossas almas, uma só alma.
Cantarão para nós os mesmos pássaros,
e os mesmos anjos desdobrarão sobre nós
as invisíveis asas.
Temos agora por espelho os nossos olhos;
o teu riso dirá a minha alegria,
e o teu pranto, a minha tristeza.
Se eu fechar os olhos, tu estarás presente;
se eu adormecer, serás o meu sonho;
e serás, ao despertar, o sol que desponta.
Nossos mapas serão iguais,
e traçaremos juntos os mesmos roteiros
que conduzam às fontes escondidas
e aos tesouros ocultos.
Na mesma página do Evangelho encontraremos o Cristo,
partiremos na ceia o mesmo pão;
meus amigos serão os teus amigos,
perdoaremos com iguais palavras
aqueles que nos invejam.
Será nossa leitura à luz da mesma lâmpada,
aqueceremos as mãos ao mesmo fogo
e veremos em silêncio desabrochar no jardim
a primeira rosa da Primavera.
Iremos depois nos descobrindo nos filhos que crescem,
e não mais saberemos distinguir em cada um
os meus traços e os teus,
o meu e o teu gesto,
e então nos tornaremos parecidos.
E nem o mundo nem a guerra nem a morte,
nada mais poderá separar-nos,
pois seremos mais que nunca,
em cada filho,
uma só carne
e um só coração.
Que o homem não separe o que Deus uniu.
Que o tempo não destrua a aliança que nos prende,
nem os amores, o amor.
Que eu não tenha outro repouso que o teu peito,
outro amparo que a tua mão,
outro alimento que o teu sorriso.
E, quando eu fechar os olhos para a grande noite,
sejam tuas as mãos que hão de fechá-los.
E, quando os abrir para a visão de Deus,
possa contemplar-te como o caminho
que me levou, dia após dia,
à fonte de todo amor.
Nossos caminhos são agora um só caminho,
nossas almas, uma só alma.
Já não preciso estender a mão para alcançar-te,
já não precisas falar para que eu te escute...
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