Não faltam pérolas que garimpar nos escritos de Santo Tomás de Aquino. Sua doutrina sobre a intercessão dos santos está entre as mais brilhantes delas.

No suplemento da Suma Teológica, o Aquinate argumenta que os santos têm consciência de seu papel como intercessores e das súplicas que lhes são dirigidas. Ele começa com a ideia de que ver a essência divina dá [ao santo] conhecimento do que lhe diz respeito:

Mas é necessário que, quanto às outras coisas, cada beato veja na essência divina o que a perfeição da bem-aventurança requer. Ora, para a perfeição da bem-aventurança requer-se que o homem “tenha tudo o que quer, e que não queira nada desordenadamente” (Agostinho, De Trinit. XIII 5). Mas isto todos querem com reta vontade, [a saber:] conhecer tudo o que lhes diz respeito. Ora, como nenhuma retidão falta aos santos, querem conhecer o que lhes diz respeito. E por isso é necessário que o conheçam no Verbo (Suppl. 72, 1c.).

Para Tomás de Aquino, os bem-aventurados contemplam a Deus em sua perfeição eterna, vendo nele as questões e preocupações do desígnio de Deus para com eles. O próximo passo do argumento é mostrar que os santos cooperam com Deus ajudando os necessitados em sua salvação: “Ora, compete à glória deles que prestem auxílio aos necessitados em ordem à salvação: assim, pois, tornam-se cooperadores de Deus, do qual nada há mais divino, como diz Dionísio em III Cael. Hier.” (ibid.).

O Doutor Angélico não oferece uma defesa [explícita] desta afirmação, mas a ideia de que os cristãos têm o papel de cooperar com Deus para que outros alcancem a salvação é claramente bíblica. Considerem-se, por exemplo, algumas declarações de São Paulo:

  • “Fiz-me fraco com os fracos, a fim de ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, a fim de salvar a todos” (1Cor 9, 22);
  • “Olha por ti e pela instrução dos outros. E persevera nestas coisas. Se isto fizeres, tu te salvarás a ti mesmo e aos que te ouvirem” (1Tm 4, 16);
  • “Aliás, como sabes tu, ó mulher, se salvarás o teu marido? Ou como sabes tu, ó marido, se salvarás a tua mulher?” (1Cor 7, 16).

Cooperar com Deus ajudando outros a alcançar a salvação é, claramente, parte do que significa ser cristão. Uma forma de dar essa assistência, e que é pertinente ao tema em questão, é a oração de intercessão. O Apóstolo escreve: “Irmãos, o desejo do meu coração e a súplica que dirijo a Deus por eles são para que se salvem” (Rm 10, 1). Para Paulo, é uma maneira de os cristãos contribuírem para suprir as necessidades dos “santos” [companheiros cristãos] (cf. Rm 12, 12s).

Se “contribuir para as necessidades dos santos”, ajudando-os a alcançar a salvação por meio da oração de intercessão, é essencial ao que significa ser cristão na terra, então certamente faz parte da identidade cristã de alguém no céu. Por que essa assistência pela oração de intercessão deixaria de fazer parte da vida cristã em um estado de existência mais perfeita?

Lembre-se: os bem-aventurados no céu são aqueles a quem Deus “predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho” (Rm 8, 29), e eles o são perfeitamente. Ora, estar perfeitamente conformado a Cristo é ser aperfeiçoado no que significa ser cristão. Visto que ser cristão implica cooperar com Deus para que outros alcancem a salvação, segue-se que compete aos que estão no céu, perfeitamente conformados a Cristo, cooperar com Deus para prestar essa assistência.

Além disso, cooperar com Deus para que outros alcancem a salvação pela oração de intercessão é uma forma de os cristãos se conformarem à imagem do Filho e, pelo Filho, levarem a “termo a salvação daqueles que por Ele vão a Deus, porque vive sempre para interceder em seu favor” (Hb 7, 25). Pois a conformidade a Cristo implica fazer o que Cristo faz.

Os bem-aventurados no céu estão perfeitamente conformados a Cristo. Portanto, ainda compete ao bem-aventurado no céu ajudar outros a obter a salvação por meio da oração de intercessão. Se ele não tivesse esse papel, sua conformidade à imagem de Cristo seria menos perfeita no céu do que na terra. Mas isso seria um absurdo!

“Santo Tomás de Aquino”, por José Risueño.

A última peça do quebra-cabeça, para Tomás de Aquino, é que o bem-aventurado deve estar ciente das invocações a ele feitas para ajudar na salvação [de quem suplica]: “Donde se patenteia que os santos têm conhecimento das coisas que para isso se requerem. E assim é evidente que, no Verbo, conhecem os desejos, orações e devoções dos homens que recorrem ao seu auxílio” (ibid.).

Para S. Tomás, não faz sentido que os santos do céu desempenhem o papel de intercessores sem saber que pedidos lhes são feitos.

Até agora, com a ajuda do Aquinate, temos razões muito fortes para acreditar que os santos no céu têm o papel de intercessores e que conhecem todos os pedidos feitos a eles. Mas daí se segue que os santos de fato intercedem por nós?

Pois bem, considere-se um cenário em que os santos no céu não intercedam por nós. Neste caso, eles seriam cristãos insatisfeitos, já que interceder por outros a fim de alcançar-lhes a salvação é essencial ao que significa ser cristão. Ora, um cristão insatisfeito é incompatível com a felicidade perfeita do céu. Portanto, os santos no céu devem, de fato, interceder por nós.

O Doutor Angélico pode ser mais conhecido por suas reflexões filosóficas sobre a existência e a natureza de Deus, a Trindade e todas as coisas que dizem respeito a Cristo. Mas seus insights sobre os mistérios inferiores na hierarquia das verdades [reveladas] são muito profundos, e a intercessão dos santos não é exceção.

Santo Tomás de Aquino,
rogai por nós!

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