“Ide e ensinai a todos os povos, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (Mt 28, 19). Esse o preceito de Nosso Senhor Jesus Cristo aos Apóstolos, que assumiram a missão de percorrer o mundo pregando o Evangelho a todos os povos.

Admite-se, como hipótese muito provável, que São Tomé teria pregado aos índios do Ocidente, logo no início da era cristã.

Isto explicaria as cruzes encontradas com diversos grupos indígenas em toda a América, e certas pegadas gravadas nas pedras em vários lugares do Brasil e outros países, além de tradições orais nesse sentido, existentes entre os indígenas.

Presume-se — dizem alguns cronistas — que São Tomé teria vindo primeiramente para o continente americano, passando pela Ásia. Outros discordam, afirmando haver passado antes pelo Oriente.

“A Incredulidade de São Tomé”, de Caravaggio.

O certo é que esse Apóstolo pregou sempre os Evangelhos em terras longínquas, desconhecidas e inóspitas, tendo atingido a Etiópia, a antiga Pérsia (hoje Irã), indo depois para a Índia, o Tibet e chegando à China.

Em todos os lugares por onde pregou a Fé cristã, realizou sempre milagres extraordinários, deixando sinais que perduram até nossos dias.

Percorrendo São Tomé grande parte do mundo conhecido de então, criou-se em torno dele uma legenda universal. Por todas as partes onde esteve, mas principalmente nas Américas, e em particular no Brasil, foi deixando gravadas, em certas pedras do caminho, as impressões de seus pés como testemunhas de seu trânsito por esses lugares, além de cruzes.

As pegadas de São Tomé no Brasil. — Em nosso país, a legenda e vestígios de São Tomé encontram-se espalhados por muitos lugares.

Com base em informações dadas pelos índios à época do Descobrimento, os portugueses recém-chegados constataram a existência das impressões dos pés de São Tomé no litoral e mesmo no interior.

“A Nova Gazeta da Terra do Brasil” publicava, em 1514, tradições orais dos índios brasileiros quanto à existência no país das pegadas de São Tomé, bem como recordações que conservavam dele.

Ao mostrarem tais pegadas aos portugueses, os índios indicavam também cruzes existentes terra adentro. E quando falavam do Apóstolo, chamavam-no de deus pequeno, pois havia outro Deus maior.

É tradição antiga entre os índios que aquele Apóstolo, a quem chamavam Sumé, veio ao Brasil e lhes forneceu a planta da mandioca e da banana, ajudando-os a cultivar a terra. Pregou o bem àqueles indígenas, ensinando-os a adorar e servir a Deus e não ao demônio, a não terem mais de uma mulher e não comerem carne humana.

Outra informação histórica da existência das pegadas no Brasil foi-nos transmitida pelo padre Manoel da Nóbrega — dos primeiros missionários jesuítas vindos de Portugal após o Descobrimento ˆ em suas “Cartas do Brasil”.

Poucos dias após sua chegada aqui, em março de 1549, escrevia: “Também me contou pessoa fidedigna que as raízes de que cá se faz pão, que São Tomé as deu, porque cá não tinham pão”. E, em data posterior, acrescenta: 

Dizem os índios que São Tomé passou por aqui e isto lhes foi dito por seus antepassados e que suas pisadas estão sinaladas junto de um rio, as quais eu fui ver, por mais certeza da verdade, e vi com os próprios olhos quatro pisadas sinaladas com seus dedos. Dizem que quando deixou estas pisadas ia fugindo dos índios que o queriam flechar, e chegando ali se abrira o rio e passara por meio dele a outra parte sem se molhar. Contam que, quando queriam o flechar os índios, as flechas se tornavam para eles e os matos lhe faziam caminho para onde passasse.

Constata-se nesse relato do padre Manoel da Nóbrega a intenção missionária de São Tomé, espalhando por estas plagas brasílicas a palavra de Deus, e deixando visíveis as marcas de sua passagem em vários lugares conhecidos.

Desde o Rio Grande do Sul, passando por São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Paraíba, Ceará e Maranhão, encontramos pegadas atribuídas a São Tomé, que, pela tradição dos índios, vêm de remotas eras, anteriores ao Descobrimento, em 1500.

Além destas, e das cruzes mostradas pelos índios, há várias outras marcas e fatos pitorescos ocorridos em nosso território.

Perto da cidade de Cabo Frio, no estado do Rio de Janeiro, por exemplo, existe um grande penedo que parece ter levado várias bordoadas. Estas estão impressas na pedra como se o bordão tivesse golpeado com força em cera branda. E é tradição dos índios terem sido as bordoadas impressas pelo bordão de São Tomé, numa ocasião em que eles haviam resistido à doutrina pregada pelo Apóstolo.

Na Bahia, em São Tomé do Peripé, há uma fonte perene de água doce, que brota de um penedo junto a certas pegadas. É tradição que por ali desceu São Tomé. A esta fonte o povo deu o nome de São Tomé milagroso, porque a água nasce de pedra viva.

Pegadas e cruzes nas Américas. — Em diversos países americanos podemos encontrar marcas atribuídas a São Tomé, segundo tradições antigas dos silvícolas.

Elas estão espalhadas por todos os países da América do Sul.

Há ainda sinais análogos em Cuba e no Haiti. A eles se referiram os antigos maias na América Central, o mesmo acontecendo no México, Estados Unidos e Canadá.

Como no Brasil, também em outras nações aparecem cruzes: no Peru, os incas possuíam uma de mármore muito famosa, que, segundo a tradição de seus antepassados, lhes fora presenteada por São Tomé. Em Carabuco, porto costeiro do lado norte do lago Titicaca (Bolívia), havia uma cruz que os indígenas da região, de acordo com tradição muito antiga, asseguravam ter sido deixada por São Tomé a seus ancestrais. Venera-se hoje, na cúpula do altar-mor da catedral de Sucre, uma cruz confeccionada com a madeira negra da aludida cruz de São Tomé.

Fernão Cortez, quando chegou ao México, achou um muro de pedra quadrada, e no meio uma cruz de dez palmos de altura, venerada pelos aztecas, implantada pelo Apóstolo.

Também no Canadá os índios da parte oriental do país conheciam a cruz cristã, quando lá chegaram os primeiros desbravadores.

O padre Antonio Ruiz de Montoya, missionário no Paraguai, conta um episódio interessante em seu livro, escrito em 1639, quando de sua chegada a uma aldeia indígena daquele país, ostentando uma cruz.

Foi recebido com demonstração de amor, danças e júbilo. As mulheres foram recebê-lo com as crianças ao colo; os habitantes lhe ofereciam comida, coisa que nunca antes havia ocorrido. Os índios contaram-lhe então uma tradição antiquíssima recebida dos antepassados. Quando São Tomé, que chamavam de Pai Zumé, fez sua passagem por aquelas terras, dissera-lhes estas palavras: “A doutrina que eu agora vos prego, perdê-la-eis com o tempo. Mas, quando depois de muito tempo, vierem uns sacerdotes sucessores meus, que trouxerem cruzes como eu trago, ouvirão os vossos descendentes esta mesma doutrina que vos ensino”.

Foi essa tradição que os levou a dar ao missionário tão boa acolhida. Ali foi fundada uma povoação, início de muitas outras.

De volta dessa longa peregrinação pelo mundo, São Tomé, segundo a tradição, foi martirizado em Meleapor, na Índia, transpassado por uma lança. Dois séculos mais tarde, o imperador romano Alexandre Severo mandou buscar o corpo do Apóstolo, ordenando seu sepultamento em Edessa, hoje Urfa, na Turquia asiática.

A legenda de São Tomé desabrochou para os índios com a chegada dos novos missionários trazidos pelos descobrimentos dos séculos XV–XVI.

Tais missionários acabariam por se constituir nos verdadeiros herdeiros do ancestral mítico, enviado por Deus a nosso continente como primeiro propagador da Fé.

Hoje uma verdadeira campanha, bem orquestrada, procura denegrir a ação desses missionários.

Que São Tomé esmague uma vez mais as argúcias satânicas nestas plagas que ele tanto quis converter para Nosso Senhor Jesus Cristo por meio de Maria, Medianeira de todas as graças.

Referências

  • Pe. Antônio Ruiz de Montoya, Conquista Espiritual feita pelos religiosos da Companhia de Jesus nas Províncias do Paraguai, Paraná, Uruguai e Tape, Martins Livreiro Editora Ltda, 1.ª edição. Porto Alegre, 1985.
  • Maxime Haubert, Índios e Jesuitas no tempo das Missões, Editora Schwarcz Ltda, 1.ª edição. São Paulo, 1990.
  • Francisco Adolfo de Varnhagen, História do Brasil. Edições Melhoramentos, 5.ª edição. São Paulo. 1956.
  • Alberto Silva, A cidade de Salvador: Aspectos seculares, Prefeitura Municipal, Salvador. 1957.
  • Fray Diego de Ocaña. Un viaje fascinante por la America Hispana del siglo XVI, Studium Ediciones, Madri, 1969.

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