No Fédon de Platão, o filósofo da Grécia Antiga, Sócrates — um professor que ficou conhecido por procurar a verdade, amá-la, defendê-la e morrer por ela —, explica a seus pupilos que a sublimidade da sabedoria não revela sua gloriosa beleza àqueles que não levam uma vida moral.

Não interessa o quão inteligente, educado ou sofisticado seja um pupilo, ele não será capaz de chegar às alturas da sabedoria, se tiver uma vida impura. A verdade, pura por natureza, não se revela aos impuros: “Para uma pessoa que não é, ela mesma, pura”, afirma Sócrates, “atingir o reino da pureza é uma violação da justiça universal”.

Assim como uma mulher cortejada por um homem não aceita um pedido de casamento a menos que esteja convencida da honestidade de suas intenções e da sinceridade do seu amor, também a sabedoria não se submete a ninguém que tenha segundas intenções, que procure o conhecimento com propósitos egoísticos. Não são os diplomados que tomam posse da sabedoria em virtude da formação que receberam, mas sim os puros de coração, os que amam a verdade por ela mesma, sem interesses, que alcançam o objeto de seus desejos.

As pessoas com ensino superior são os principais proponentes da agenda da revolução sexual, com o divórcio sem culpa, a mentalidade contraceptiva, a legalização do aborto e o casamento homossexual. Professores, editores, advogados e jornalistas têm travado uma batalha intelectual por essas causas, e juízes da Suprema Corte têm legalizado leis injustas, violações da lei natural e da moral cristã.

Como explicar o fato de que a intelligentsia não consiga enxergar verdades autoevidentes (a criança no ventre materno é um ser humano, abortar uma criança recém-nascida é infanticídio, o matrimônio é a união entre um homem e uma mulher com o fim de formar uma família)? A declaração de Sócrates esclarece a resposta. Eles levam vidas destemperadas, têm corações impuros, rejeitam o conhecimento religioso, perderam o sentido do sagrado, ou pensam com uma inteligência obscurecida.

Aqueles que não honram a verdade como algo sagrado em sua origem ou como algo de autoridade venerável, submetem-na à manipulação. Ao invés de se render docilmente à autoridade da sabedoria, a mente impura distorce a verdade para acomodar suas paixões e preconceitos. Aqueles que legalizam a imoralidade ou fazem propaganda dela, indicam sua aprovação ou vontade de tomar parte nessas práticas e justificam-nas como leis sancionadas por autoridade judicial ou parlamentar.

Sócrates.

Se os desejos do ser humano não são temperados e ordenados pela razão, então, na famosa frase de Shakespeare, reason panders will, “a razão cede à vontade”. A razão torna-se escrava do desejo e inventa desculpas, teorias e leis a fim de justificar a imoralidade e aliviar a culpa. Os instruídos e inteligentes recorrem à sofística e a toda a arte da retórica e da oratória a fim de popularizar e “glamourizar” o mal.

Sócrates perseguiu a verdade como quem a amava e nela exultava como o mais precioso dos dons, chamando à filosofia “a mais elevada das artes”, por levar a mente à descoberta das realidades eternas, dos mais elevados padrões conhecidos como a verdade, o bem e a beleza, os quais deixam entrever sua origem sagrada: “beleza, bem, honestidade e santidade absolutos”. A revolução sexual expulsou esses ideais sublimes e esses padrões divinos com a licença a desejos incontroláveis, a propaganda da mídia, leis humanas injustas e decisões judiciais que colocam ideias radicais no lugar de tradições morais veneráveis e padrões absolutos e atemporais.

Ao invés de filosofia — literalmente, “o amor à sabedoria” —, a revolução sexual recorre a todas as táticas e ardis da sofística, a hábil retórica de fazer o argumento mais fraco parecer o mais forte. Os sofistas, maiores críticos e principais inimigos de Sócrates, sempre identificavam “o bom” com o que é prazeroso, não com o que é moral ou justo. Sócrates, no entanto, argumentava que a justiça ensina o autocontrole e a felicidade resulta da ordem que a temperança inculca na alma: “Mantenho eu que um homem e uma mulher são felizes se honrosos e bons, mas miseráveis se viciosos e perversos.”

Como os sofistas à época de Sócrates, todos os advogados da revolução sexual estão comprometidos com o culto do prazer, da intemperança e da autoindulgência, que eles racionalizam como liberdades, direitos e libertação.

Sócrates divide a natureza humana entre almas puras e impuras, sendo as primeiras ordenadas pelo poder da razão controlando os apetites, e as segundas corrompidas pelos excessos da gula, da luxúria e da avareza.

Em Górgias, o sofista Cálicles insiste em que o prazer seria a essência da felicidade e do bem, e não o autocontrole ou a moderação: “Luxúria, excesso e licenciosidade… são virtude e alegria; todo o resto é mero fingimento, regras feitas pelos homens e contrárias à natureza, hipocrisia sem valor.” O sofista, alegando ser a temperança “contrária à natureza”, havia reduzido o homem a um animal sem reta razão, sem autocontrole e sem uma consciência. Sócrates, em resposta, compara os desejos do homem destemperado a um vaso ou peneira furada, “uma vida de desejo destemperado que não pode ser saciado jamais”.

Esse vaso furado Sócrates o compara a um pássaro sujo sempre comendo e defecando, e a um homem constantemente se coçando sem descansar. O filósofo se esforça por convencer o sofista do mundo de diferença que existe entre “bons e maus prazeres”, entre prazeres racionais ordenados pela razão e desejos animais regulados pelo instinto.

O sofista, no entanto, afirma que “alguém que queira viver de verdade, ao invés de reprimir seus apetites, deve estimulá-los ao máximo e ser capaz de lhes satisfazer, com coragem e inteligência, proporcionando o que quer que eles desejem”. O argumento do sofista resume a premissa da revolução sexual: não interessa o dano, a doença, a imoralidade ou as consequências, todo prazer sexual é admissível, desde que haja consentimento mútuo.

A que conduz uma vida de contracepção senão à perseguição desinibida de um “mau prazer” com os mesmos resultados fúteis e autodestrutivos de se derramar água dentro de um vaso furado? O que faz o aborto senão eliminar e descartar o bem da vida humana porque alguns seres humanos, como pássaros sujos e incapazes de reprimir seus apetites, escolheram “uma vida de desejo destemperado que não pode ser saciado jamais”?

O que são todos os argumentos, retórica e propaganda dos defensores da revolução sexual, enfim, senão o sofisma de tornar a razão escrava da paixão; transformar o argumento mais fraco no mais forte; reduzir o homem, animal racional, ao “primata de calças” — na expressão de C. S. Lewis —; e definir a natureza humana como instinto animal, ao invés de ordenação racional da alma?

Sócrates faz ao sofista uma última e profunda questão: quem faz mais à saúde de uma pessoa, o cozinheiro que cede ao prazer servindo-lhe apenas doces sobremesas, ou o médico que prescreve um remédio amargo para curar-lhe a doença? Ceder à natureza mais baixa do homem não produz a felicidade de um ser humano com alma racional. Ainda que haja bons e maus prazeres, o prazeroso não é sinônimo de bom, e o doloroso nem sempre é sinônimo de mau.

O uso correto da razão distingue entre prazeres temperados e destemperados, racionais e irracionais, mas o sofista só o que faz é perseguir o prazer a todo custo, seja a seu corpo, seja a sua alma, “sem traçar nenhuma distinção entre prazeres bons ou maus, e sem se preocupar com nada, a não ser com a própria gratificação, sejam quais forem os meios, faça-lhe bem ou mal.”

Prazeres destemperados produzem vontades desordenadas; vontades desordenadas provocam inteligências obscurecidas; inteligências obscurecidas, por sua vez, cedem ao corpo e ignoram a alma. A sabedoria do grande filósofo é luz eterna para inteligências obscurecidas.

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