São Caetano, fundador da santa Ordem cujos membros são chamados teatinos, nasceu em 1487, em Vicenza, na Lombardia, de pais nobres e piedosos. Logo após o Batismo, sua mãe consagrou-o à Santíssima Virgem, pedindo-lhe humildemente que o guardasse e pusesse sob sua proteção maternal o bem-estar espiritual dele. 

Sua vida posterior provou a eficácia das orações de sua mãe. Mesmo na infância, nunca foi como as outras crianças: seu maior prazer consistia em rezar, construir pequenos altares, dar esmolas aos pobres e ser o mais perfeito na obediência aos pais. Seu comportamento era tal que, já na infância, era chamado de santo. 

Depois foi para a universidade, onde, em meio a tantas tentações, sempre teve o maior cuidado em preservar a inocência. Depois de ter recebido, em Pádua, o diploma de direito civil e canônico, foi para Roma, onde foi ordenado sacerdote e escolhido pelo Papa Júlio II para um elevado cargo eclesiástico. Após a morte do Papa, renunciou à sua dignidade e voltou para casa, desejoso de trabalhar mais eficazmente pela salvação das almas. 

Escultura de São Caetano na Basílica de São Pedro, no Vaticano.

No tempo da peste, serviu os doentes com incansável caridade, dentro e fora dos hospitais. A princípio, trabalhou apenas em sua cidade natal; mais tarde, porém, foi para Veneza. Seu principal objetivo era salvar almas. Suas exortações amáveis e gentis transformavam os corações dos doentes e seus sermões fervorosos conduziam todos à virtude. O povo dizia que Caetano parecia um serafim diante do altar e um apóstolo no púlpito. A devoção com que rezava a Missa igualava-se ao fervor e ao zelo com que pregava. Sempre que tinha oportunidade, procurava ganhar uma alma para o Todo-Poderoso. 

Depois de algum tempo, voltou para Roma, onde, inspirado por Deus, e com a cooperação de três outros homens piedosos e eruditos, fundou uma Ordem para os sacerdotes que desejavam viver uma vida apostólica; reformar a negligência do clero e a moral corrupta das pessoas que viviam no mundo; observar cuidadosamente as cerimônias sagradas da Igreja; restaurar a observância de uma conduta piedosa nos templos dedicados ao culto do Altíssimo; trabalhar no combate aos hereges; assistir os doentes e moribundos; e, em suma, promover o bem-estar dos homens da melhor forma possível. Ele impôs uma obrigação especial aos membros no que diz respeito ao voto de pobreza: eles não só estavam proibidos de ter rendimentos anuais, mas até mesmo de pedir esmolas. Tinham de entregar todo o cuidado de sua subsistência a Deus e esperar pacientemente pelo que lhes enviasse a Providência. Por mais difícil que nos pareça suportar uma pobreza tão extrema, ela atraía muitas pessoas, a tudo dispostas por amor a Deus.

A primeira casa da Ordem estabeleceu-se em Roma, mas foi abandonada após o primeiro ano, por causa de uma incursão de soldados imperiais, que também trataram Caetano com grande crueldade. Entre estes soldados havia um que conhecera o santo em Vicenza, quando ele era muito rico. Acreditando que este ainda possuía grandes riquezas, tentou roubá-las dele, agredindo-o brutalmente e prendendo-o diversas vezes. De Roma, o santo fundador foi para Veneza, onde novamente cuidou dos acometidos pela peste. 

“São Caetano de Thiene”, por Giovanni Battista Tiepolo.

Em seguida, o Papa ordenou-lhe que fosse para Nápoles, a fim de fundar uma nova casa para sua Ordem. Foi então que a vigilância de São Caetano livrou da heresia o povo fiel, já que vários discípulos de Lutero (que naquela altura difundia suas doutrinas maléficas na Alemanha) tinham ido para Nápoles e começado a promover a nova doutrina, em privado e em público, sob o nome de “liberdade evangélica”. Também haviam levado consigo vários livros com as doutrinas luteranas, visando distribuí-los ao povo e, assim, contaminar a cidade. Quando o santo foi informado disso e viu o Maligno no púlpito ao lado de Bernardino Ochino, um dos discípulos de Lutero, sussurrando-lhe ao ouvido cada palavra por ele pregada, notificou as autoridades eclesiásticas e pregou tão zelosamente contra a nova heresia, que os livros heréticos foram todos recolhidos e queimados, e os habitantes da cidade foram conservados na verdadeira fé. O santo prestou o mesmo serviço a várias outras cidades da Itália. 

O santo homem era extremamente severo consigo. Nunca tirava seu áspero cilício. Quase todos os dias se flagelava sem misericórdia. Era tão temperante no comer, que sua vida podia ser chamada, com razão, um contínuo jejum. Passava a maior parte de suas noites em exercícios devotos, descansando apenas um pouco sobre a palha. Nunca falava, exceto para honrar a Deus ou favorecer os homens. Era incansável nos trabalhos em prol da salvação das almas e, por isso, não surpreende que Deus lhe tenha concedido tantas graças. 

Numa noite de Natal, quando passava a noite na Igreja de Santa Maria Maior, em Roma, apareceu-lhe o santo Menino, e a Virgem Santíssima, que o levava no colo, deitou-o nos braços do santo, enchendo a sua alma de consolação celeste. O santo homem teve muitas outras visões durante a vida, e era frequentemente visto em êxtase durante suas orações. Possuía também o dom da profecia e curava milagrosamente muitos doentes. 

Visão de São Caetano.

Havia um padre de sua Ordem cujo pé tinha de ser amputado. Na noite anterior à operação, o santo examinou o pé, que estava muito inchado e gangrenado; beijou-o, fez o santo sinal da cruz sobre ele e enfaixou-o novamente, exortando o doente a confiar em Deus e pedir a intercessão de São Francisco. Depois disso, dirigiu-se a Deus em oração. Quando, no dia seguinte, o cirurgião veio fazer a dolorida e perigosa amputação, verificaram, com espanto, que o pé estava curado. 

Quando São Caetano viajou de Veneza para Nápoles, desabou uma terrível tempestade e, durante todo o trajeto, as pessoas a bordo achavam que o barco afundaria a qualquer momento. Caetano tomou o seu Agnus Dei [i] e atirou-o ao mar, que imediatamente se acalmou. 

A vida dele está repleta de acontecimentos semelhantes; nós, porém, não dispondo de mais espaço para enumerá-los, limitamo-nos a relatar a felicidade e a caridade heroica com que terminou sua carreira neste mundo.

As autoridades civis e eclesiásticas de Nápoles haviam decidido instalar na cidade o tribunal do Santo Ofício, a fim de proteger os fiéis contra a heresia. Porém, o povo opunha-se de tal modo ao projeto, que temia-se uma revolta, e nem as exortações e argumentos de São Caetano, nem as de outros homens, surtiram efeito. O santo homem se angustiava profundamente com o risco que corria uma cidade tão grande e tantas almas. Por isso, ofereceu sua vida como sacrifício para apaziguar a ira do Todo-Poderoso, rezando para que Deus a aceitasse e, assim, restabelecesse a paz e poupasse a cidade e seus habitantes. 

O Todo-Poderoso ficou satisfeito com tal sacrifício. A prova é que, pouco depois de sua oblação, Caetano foi acometido por uma grave doença e, renovando sua oferta ao Céu, morreu de forma pacífica e santa, com o privilégio de ver a Cristo e à Santíssima Virgem. O Salvador garantiu-lhe a salvação, e a Mãe de Deus assegurou-lhe proteção até a hora da morte. 

“A Sagrada Família aparece a São Caetano”, por Andrea Vaccaro.

Mesmo assim, seu único desejo era morrer como penitente, pois, quando o médico lhe indicou um leito mais confortável, Caetano protestou enfaticamente, dizendo que não permitiria conforto algum ao seu corpo nos últimos momentos. Ao contrário, queria ser estendido sobre cinzas no chão, com vestes penitenciais. E acrescentou: “Não há caminho que conduza ao Céu senão o da inocência ou o do arrependimento. Aquele que se afastou do primeiro, deve tomar o segundo; caso contrário, está eternamente perdido.” 

Recebeu os últimos sacramentos com grande devoção, voltou os olhos ao Céu e entregou a alma tranquilamente a Deus, no ano 1547 de Nosso Senhor. Pouco depois, cessaram os conflitos na cidade e a paz foi restabelecida: assim, Deus demonstrava ter aceitado a vida de seu servo como oferta de paz para a salvação de inúmeras almas. A grande fé que São Caetano manifestou na divina Providência, instituindo em sua nova Ordem uma pobreza tão completa, foi recompensada pelo Todo-Poderoso com numerosos milagres, inclusive após a sua morte. Eis como Deus o honrou. 

Por fim, também a Igreja o elevou aos altares, em 1671, quando o canonizou o Papa Clemente X.

Considerações práticas

Desejo vivamente que a última frase dita por São Caetano no leito de morte se fixe em seu coração: “Não há caminho para o Céu senão o da inocência ou o da penitência.” Esta verdade está fundamentada na Sagrada Escritura. Portanto, se você deseja com sinceridade ir para o Céu, examine-se com cuidado e verifique se está trilhando o caminho certo. Como anda sua inocência? E sua penitência? 

Deixo-lhe a tarefa de responder a tais perguntas, e com as palavras de São Caetano direi apenas o seguinte: “Se te afastaste do caminho da inocência, deves entrar no da penitência; caso contrário, estarás eternamente perdido.” Dito isto, darei algumas instruções sobre a vida deste grande servo de Deus.          

I. São Caetano depositava uma confiança especial em Deus no que diz respeito às necessidades da vida. 

Muitas pessoas preocupam-se excessivamente com os problemas temporais; outras, muito pouco; estas levam uma vida ociosa, não cuidam de seus lares, não trabalham de acordo com seu estado de vida ou desperdiçam seus ganhos ou herança. Mas a maioria das pessoas é, de longe, demasiadamente ávida de riquezas. Seus pensamentos, do início da manhã até tarde da noite, ocupam-se com seus negócios temporais. Nem sequer se dão ao trabalho de rezar a oração da manhã ou de assistir à Santa Missa, porque temem perder alguma coisa com isso, ou pensam que negligenciam os deveres domésticos. Não dirigem um só pensamento a Deus ou à sua alma ao longo de todo o dia. Em suma, andam completamente absorvidas pelos negócios temporais, como se as riquezas fossem o único fim e objeto de sua existência. Esperam tudo de seus próprios esforços, não se lembrando de que todo sucesso depende do Todo-Poderoso. 

Que você não pertença a nenhuma dessas classes. Trabalhe para ganhar seu sustento de acordo com seu estado de vida; evite a ociosidade; mas, acima de tudo, confie em Deus, que certamente não o abandonará, se você cumprir o seu dever. 

Olhai para as aves do céu, que não semeiam, nem ceifam, nem fazem provisões nos celeiros, e contudo vosso Pai celeste as sustenta. Porventura não valeis vós muito mais do que elas? E por que vos inquietais com o vestido? Considerai como crescem os lírios do campo: não trabalham nem fiam. Se pois Deus veste assim uma erva do campo, que hoje existe, e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós, homens de pouca fé! Buscai, pois, em primeiro lugar, o reino de Deus e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão dadas por acréscimo (Mt 6, 26.28.30.33). 

II. São Caetano nunca passou necessidade. Deus o ajudava frequentemente por meio de milagres. 

Escultura de São Caetano, por Joseph Anton Pfaffinger.

Com muitos homens a situação é bem diferente. Muitas vezes, passam necessidade, e Deus não os ajuda. Em alguns casos, a culpa é deles; em outros, é uma provação. Estes últimos devem consolar-se com o pensamento de que essa necessidade lhes serve para obter a salvação. Tal como fez com Lázaro, Deus quer conduzir essas pessoas ao Céu por meio da pobreza. Se Lázaro possuísse bens terrenos como o rico, talvez tivesse de sofrer no Inferno como ele. Por isso, não devem se entristecer com sua pobreza, mas suportá-la com resignação. Devem empenhar-se por levar uma vida cristã e depositar toda a confiança em Deus, que certamente não os abandonará. 

Mas aqueles que ficaram pobres por causa da ociosidade, ou do trabalho desnecessário aos domingos e dias festivos, ou da busca de lucro por meios ilícitos, não devem se surpreender se passarem necessidade, pois como podem esperar ser abençoados pelo Todo-Poderoso, se transgridem seus Mandamentos com tanta frequência, sem medo nem vergonha? Não sabem eles que a maldição de Deus ameaça aquele que transgride suas leis? “Serás maldito na cidade, maldito no campo. Maldito o teu celeiro, malditas as tuas sobras. Maldito o fruto do teu ventre, o fruto da tua terra, as crias das tuas vacas e das tuas ovelhas” etc (Dt 28, 16-18). 

Mas o Todo-Poderoso também promete sua bênção àqueles que guardam os Mandamentos: “Tu serás bendito na cidade e bendito no campo. Será bendito o fruto do teu ventre, o fruto da tua terra, o fruto dos teus animais, as crias de gado graúdo e de gado miúdo. Benditos os teus celeiros” etc (Dt 28, 3-5). Se os homens desejam que Deus os ajude na pobreza, devem resolver guardar melhor os Mandamentos, trabalhar de acordo com seu estado de vida e cuidar adequadamente de seus negócios. “Eu chamo hoje por testemunhas o céu e a terra, em como vos propus a vida e a morte, a bênção e a maldição. Escolhe, pois, a vida, para que vivas tu e a tua posteridade” (Dt 30, 19). 

Referências

  • Extraído, traduzido e adaptado passim de Lives of the saints: compiled from authentic sources with a practical instruction on the life of each saint, for every day in the year, v. 2. New York: P. O’Shea, 1876, pp. 175ss.

Notas

  1. “O nome Agnus Dei refere-se a certos discos de cera impressos com a figura de um cordeiro e abençoados em épocas determinadas pelo Papa. Eles são às vezes redondos, às vezes ovais. O cordeiro geralmente carrega uma cruz ou bandeira, enquanto figuras de santos ou o nome e o brasão de armas do Papa também são comumente impressos atrás. Esses Agnus Dei podem ser usados pendurados ao pescoço, ou guardados como objetos de devoção. Em virtude da consagração que recebem, são considerados (a exemplo da água benta, dos ramos bentos etc.) como ‘sacramentais’” (Herbert Thurston, “Agnus Dei”. In: The Catholic Encyclopedia. New York: Robert Appleton Company, 1907. Acessado em 13 jun. 2023. Disponível em).

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