Os anos 1970 foram difíceis para as igrejas. Balaustradas, estatuária, retábulos, vitrais e elegantes púlpitos foram violentamente abandonados e substituídos por igrejas redondas, esculturas modernistas e estandartes de feltro. Mas há um movimento recente que busca fazer as igrejas mais antigas retornarem à glória de outrora, trocando a “renovacalhação” [i] por uma verdadeira renovação.

A historiadora da arte Liz Lev explica um triste fenômeno no mundo da arte, que em italiano chamam de chapucismo, ou “trabalho mal feito e negligente”, no qual obras de arte são submetidas a uma destruição irreparável. O Ecce Homo é talvez o exemplo mais conhecido: quem o vê não sabe se ri ou chora, pois o resultado foi uma tremenda caricatura.

O “Ecce homo” de Cecília Giménez: um trabalho infeliz de restauração que se tornou meme na internet em 2012.

A destruição de igrejas e da arte é muito similar a outro campo em que a beleza está sob ataque: as mulheres. As mulheres foram criadas para ser bonitas e foram tema da grande arte por milênios — e por uma boa razão. Ontem foi o Dia Internacional da Mulher, mas lamentavelmente desde os anos 1960 e 1970 a verdadeira beleza feminina foi convertida em puro sex appeal. Novas tendências na terceira onda do feminismo e em sua quarta onda, o movimento LGBTQ+, mantiveram essa nota de intensa sexualidade, mas também lançaram estilhaços em outra direção — a rejeição total ao feminino e a aceitação da ausência de gênero.

É da natureza humana que nós, mulheres, sejamos suscetíveis a tendências. É visto como virtude ser despojada e moderna ou parecer ter saído das páginas de uma revista de moda. Mas tendências não se limitam a cores de tecidos ou cortes de cabelo. Elas se estendem mais profundamente a maneiras de pensar e comportamentos. 

Uma tendência atual bem documentada — uma espécie de contágio social entre moças no Ensino Médio e jovens universitárias — é aventurar-se pelo mundo das injeções de testosterona e da fluidez de gênero. A Planned Parenthood se desdobrou para atender a nova demanda por hormônios para modificação corporal. Uma funcionária expressou o profundo conflito que viveu ao ver a casualidade com que as garotas estão buscando alterações físicas tão terríveis. Não é incomum que garotas se rebelem em grupos — como aconteceu há trinta anos, quando queriam colocar piercings na orelha —, mas agora o que as motiva é uma dor profunda e uma confusão sobre quem e o que são. 

Além dos hormônios e da mutilação de partes do corpo, há outras tendências: adotar uma aparência masculina, colocar piercings em tantas partes do corpo quanto possível e cobrir o corpo de tatuagens. Nesta apresentação de slides de 2018 (CUIDADO, CONTÉM IMAGENS FORTES), pode-se ver um antes e depois com as transformações por que passaram algumas garotas. O mais triste dessas tendências é que, ao contrário das igrejas, que podem ser renovadas, muitas dessas mudanças não podem ser desfeitas — é muito difícil restaurar um corpo feminino depois de anos de terapia com hormônio masculino e de uma cirurgia para remover os seios. É também um desafio curar o trauma deixado pelos estilos de vida que frequentemente acompanham essas mudanças externas. 

“Lady Agnew de Lochnaw”, de John Singer Sargent.

Alguém poderia objetar: “Se isso faz essas mulheres felizes, por que não?” Deve de fato chispar uma centelha de excitação ou de alívio quando vão a uma clínica da Planned Parenthood, quando ouvem palavras de afirmação e encorajamento de amigos e empregados, para não mencionar a habilidade de serem tratadas como heroínas pela elite. Modas e tendências no vestuário e no pensamento são assim — há uma espécie de satisfação em juntar-se à multidão e parecer estar na moda, particularmente para os mais jovens e impressionáveis. Mas essas coisas não são o prelúdio da verdadeira felicidade.

Estudos mostram que, à medida que continuamos a “progredir”, não aumenta o número de mulheres mais felizes — os dados contam sua própria história: o aumento de casos de depressão, de doenças sexualmente transmissíveis, de suicídios e de abuso de substâncias aponta para mulheres muito infelizes. Isso não é ciência aeroespacial, mas algo que as ciências sociais, a tradição e um número expressivo de costumes culturais têm-nos mostrado há anos.

O cerne da ideologia que destruiu igrejas e mulheres é a ideia de que não há noção objetiva de beleza e de que basta desejar para que a natureza humana mude. Mas a natureza humana não muda. Só porque queremos distância de conceitos como castidade, virgindade e monogamia, isso não os faz menos necessários nem menos importantes para o bem-estar das mulheres.

Alguns dirão que “a beleza está nos olhos de quem vê”. Porém, há maneiras concretas de reconhecê-la. Santo Tomás de Aquino ofereceu três critérios de avaliação: 1) integridade ou totalidade; 2) proporcionalidade e simetria; 3) claridade ou um tipo de resplendor. Esses elementos servem de guia sem, contudo, amordaçar. São elásticos o bastante para ser aplicados a uma igreja, a uma peça de arte ou ao corpo e à alma de uma mulher.

Nossa recente confusão não começou com o questionamento do que é belo, mas com questões sobre a função e a essência das coisas. Se gastamos décadas dizendo às mulheres que o feminino é um conceito inútil, não nos deve surpreender que a forma masculina seja idealizada. Se gastamos anos negando a presença real de Cristo na Eucaristia e tentando transformar nossas igrejas em alegres pontos de encontro onde ninguém jamais peca, os templos refletirão isso também. Tentamos arrancar o coração e a alma desses vasos vitais e descobrimos, para nosso pesar, que o coração e a alma da civilização foram arrancados com eles.

A igreja barroca de São Francisco de Assis, em Ouro Preto.
A igreja neogótica de Nossa Senhora do Bom Despacho, em Cuiabá.

Teologicamente, a Igreja é feminina — ela é a Esposa de Cristo. Nas línguas românicas, a igreja é chamada de “ela”. A Igreja e as igrejas são femininas. Todas elas são lugares a que vamos para sermos alimentados, perdoados, formados, amados e reconhecidos — natural e sobrenaturalmente. O feminino é abraço, é envolvimento, é nutrição, é aprimoramento. E esses são dons que as mulheres têm de sobra — alimentar, ajudar a formar, cuidar das necessidades daqueles que amamos e conhecê-los e amá-los pelo que são, dando-lhes liberdade para se tornarem ainda melhores.

É o que Santa Edith Stein sugeriu ao dizer que “a alma de uma mulher é um abrigo onde outras almas desabrocham”. O mesmo — com uma pequena reformulação — pode ser dito da Igreja: “Ela é um abrigo onde as almas desabrocham”. Quando as contemplamos, vemos que talvez não seja um acidente que a Igreja, as igrejas e as mulheres tenham todas experimentado um tipo parecido de dano — os últimos cinquenta anos foram de fato um ataque ao feminino. É mais do que hora de lhes restituir a glória.

Notas

  1. No original, a autora usa a palavra wreckovation. Wreck, em inglês, significa destruição; diz-se principalmente de um navio que naufraga. Tomamos a liberdade de criar uma palavra nova em português que evocasse o mesmo sentido, a saber, de uma tentativa de renovação que fracassou (N.T.).

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