Das famosas dez pragas do Egito, a mais importante de todas foi, sem dúvida, a última, não só porque representou o maior de todos os castigos infligidos aos egípcios (cf. Ex 11, 6), mas também porque foi o estopim para a libertação definitiva de todo o povo de Israel. Depois de rãs, mosquitos, tumores e gafanhotos, um anjo exterminador foi enviado às terras do Faraó para matar os primogênitos de todos os egípcios e de todos os seus animais.

Tudo isso foi realizado para que o povo de Deus, liderado por Moisés, fosse retirado da escravidão. De fato, o coração duro do Faraó só permitiu que os israelitas partissem do Egito depois que o seu próprio filho, o herdeiro de seu trono, teve a vida ceifada pelo anjo da morte. Naquele dia, instituiu-se a festa da páscoa: à "passagem" de Deus, o Egito ficou banhado de sangue, enquanto os judeus foram preservados do extermínio.

Na ocasião, o que salvou o povo hebreu? Ficou determinado que todas as famílias de Israel deviam, no décimo quarto dia daquele mês, imolar um cordeiro "sem defeito", tomar o seu sangue e untar os umbrais de suas portas. À vista disso, o anjo da morte não entraria em suas casas. "Quando o Senhor passar pelo Egito para castigá-lo, e reparar o sangue sobre a moldura das portas, passará por vossas portas e não permitirá que o Exterminador entre em vossas casas para causar dano" (Ex 12, 23). De fato, pelo sangue dos cordeiros, os israelitas foram preservados da morte.

Para entender plenamente essa história, é preciso recorrer ao juízo da Igreja, a quem Cristo deu o poder das chaves (cf. Mt 18, 18; Lc 10, 16) e o encargo de interpretar corretamente as Escrituras. Certos trechos da Bíblia, de fato – e a história contada acima é um exemplo –, aparentam não ter nada a ver com o que vivem os homens de hoje e parecem não ter nenhum ensinamento a oferecer à modernidade. O extermínio dos egípcios apontado pelo livro do Êxodo, então, poderia muito bem ser enquadrado naquela denominação de "páginas 'obscuras' da Bíblia", usada pelo Papa Bento XVI [1]. Como entender que Deus estenda a mão sobre o Egito e mate todos os seus primogênitos em uma só noite?

À pergunta provocadora, urge responder com a única chave interpretativa de toda a revelação divina: "o Evangelho e o mandamento novo de Jesus Cristo realizado no mistério pascal" [2]. Nas palavras de Hugo de São Vítor, "toda a Escritura divina constitui um único livro e este único livro é Cristo, fala de Cristo e encontra em Cristo a sua realização" [3]. As pragas do Egito e o sangue que quebrou os grilhões dos israelitas carregam o seu próprio significado [4], mas constituem, sobretudo, um sinal daquilo que estava por vir, uma figura que aponta para "o cordeiro de Deus, aquele que tira o pecado do mundo" (Jo 1, 29).

À páscoa judaica se segue, então, a Páscoa por excelência. O sangue dos cordeiros, incapaz de "eliminar os pecados" (Hb 10, 4), é substituído pelo verdadeiro Cordeiro, indefectível, que, "depois de ter oferecido um sacrifício único pelos pecados (...), levou à perfeição definitiva os que são por ele santificados" (Hb 10, 12.14). A liberdade agora conquistada não é simplesmente o fim de uma escravidão física; é a destruição do pecado, que escraviza o espírito. A morte agora vencida não é mais a morte deste corpo terreno e passageiro, consequência inevitável de sermos filhos de Adão; é a morte definitiva, que precipita a alma na desgraça e na escravidão eternas. Foi para esta liberdade que Cristo nos libertou (cf. Gl 5, 1), derramando voluntariamente o Seu próprio sangue (cf. Jo 10, 18) e untando as portas da nossa alma com o sacramento do Batismo.

Para elevar ainda mais à perfeição a analogia do cordeiro, porém, Ele não só foi imolado verdadeiramente, mas deu-se como alimento para todos os que vivem a Sua vida. Os que comiam o cordeiro da antiga páscoa com os ázimos (cf. Ex 12, 8) estavam livres da praga exterminadora, mas presos ainda aos grilhões da morte. "Os vossos pais comeram o maná no deserto e, no entanto, morreram. Aqui está o pão que desce do céu, para que não morra quem dele comer" (Jo 6, 49-50). Mas, como se dá isso? Como acontece que quem come e bebe do Corpo e Sangue do Senhor viva para sempre?

Santo Tomás de Aquino, comentando a passagem de Jo 6, 54: "Se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós", explica que a realidade do sacramento da Eucaristia "é a unidade do corpo místico, sem a qual não pode haver salvação, porque ninguém tem acesso à salvação fora da Igreja, como tampouco no dilúvio houve salvação fora da arca de Noé" [4]. Ou seja, a Eucaristia nos salva porque nos incorpora à Igreja, que é o corpo místico de Cristo. O antigo povo de Deus estava limitado a uma raça, à comunidade dos judeus; o povo da Nova Aliança é a santa Igreja, a assembleia de homens e mulheres, de todas as raças, povos e nações, que têm em comum a comunhão no Corpo e Sangue do Cordeiro.

"Ecce Agnus Dei, ecce, qui tollit peccáta mundi – Eis o Cordeiro de Deus, eis o que tira os pecados do mundo", repetem os sacerdotes em todas as Missas. E a Igreja canta a Deus a sua ação de graças: porque "Cristo amou a Igreja e se entregou por ela"; porque "quis apresentá-la a si mesmo toda bela, sem mancha nem ruga ou qualquer reparo, mas santa e sem defeito" (Ef 5, 26-27); porque é ela, agora, unida à sua cabeça, que deve oferecer o seu sacrifício; porque somos nós, agora, que devemos completar em nossa carne o que falta à paixão de Nosso Senhor (cf. Cl 1, 24). "Eu vos exorto, irmãos, pela misericórdia de Deus, a oferecerdes vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus: este é o vosso verdadeiro culto" (Rm 12, 1).

Referências

  1. Cf. Exortação Apostólica Verbum Domini (30 de setembro de 2010), 42.
  2. Idem.
  3. De arca Noe, 2, 8 (PL 176, 642 C-D).
  4. Cf. BETTENCOURT, Dom Estêvão. Para entender o Antigo Testamento. Agir: Rio de Janeiro, 1956. pp. 205s
  5. Suma Teológica, III, q. 73, a. 3.

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