Entre os santos que glorificaram e abrilhantaram a Igreja de Cristo no século XV, São João foi um dos mais famosos. Capistrano, seu sobrenome, deriva da cidade do reino de Nápoles onde ele nasceu. Depois de estudar as artes liberais, foi enviado a Perúgia para cursar teologia e direito, áreas em que logo se tornou tão competente que foi nomeado oficial do tribunal de justiça, granjeando a mais elevada estima de toda a cidade.
Um dos homens mais ricos e importantes da região deu-lhe a filha em casamento junto com uma grande fortuna. Tudo parecia favorável a João, mas sua sorte não durou muito tempo. Perúgia recusou-se a reconhecer Ladislau, rei de Nápoles, como soberano legítimo, e revoltou-se contra ele. João era adepto do rei em segredo e tinha uma boa posição no exército real. Após a divulgação desse fato, ele foi preso.
João tinha certeza: aquele em cujo serviço perdera a liberdade, tomaria sua defesa e o livraria da prisão. Mas isso não aconteceu. Então, o santo começou a enxergar o quanto é ilusório o mundo e passageira toda felicidade temporal. Mais ou menos na mesma época, sua jovem esposa veio a falecer, e ele decidiu deixar o mundo e esforçar-se por ganhar, numa Ordem religiosa, a graça do Altíssimo e a salvação eterna.
Para levar a cabo tal objetivo, vendeu todos os seus bens e deu o dinheiro recebido como resgate por sua liberdade. Depois, foi ao convento de São Francisco, onde pediu humildemente para ser admitido. Temendo que João tivesse feito sua resolução de maneira muito precipitada e que não perseverasse, o superior examinou-o com muito rigor e provou sua vocação com a máxima severidade. João resistiu ao teste e foi autorizado a fazer os votos após o noviciado.
Depois disso, sua vida foi um contínuo jejum. Só comia uma vez por dia e ficou sem comer carne por 36 anos. Só dormia três horas por noite, e ainda por cima diretamente no chão. Além disso, flagelava-se todos os dias até sangrar e procurava mortificar-se de todas as maneiras possíveis.
Seu coração ardia de amor a Deus, e nada lhe era mais agradável que a união com o Todo-Poderoso na oração, na leitura de livros devotos e na escuta da Palavra. Passava horas inteiras de joelhos diante do crucifixo ou na presença do Santíssimo Sacramento, ora com lágrimas nos olhos, ora em profundo arrebatamento. O nome de João, dizia ele, fora-lhe dado por especial desígnio de Deus, para que se esforçasse por ser um discípulo predileto do Senhor e um filho fiel da Santíssima Virgem. Tinha grande zelo pela salvação dos homens e percorreu, durante vários anos, as principais cidades de Itália, pregando a Palavra de Deus em todos os lugares. Tinha um dom especial para sensibilizar os pecadores mais empedernidos, e os suspiros e lágrimas de seus ouvintes obrigavam-no, por vezes, a interromper o sermão.
Naquele mesmo tempo vivia São Bernardino de Sena, um santo missionário, tão zeloso quanto João, mas que fora denunciado em Roma por sua veneração ao Santíssimo Nome de Jesus, que alguns julgavam imoderada. João foi a Roma defender o amigo, e assim sua virtude e sabedoria ficaram conhecidas dos Papas, que serviram-se dele em muitos assuntos importantes, todos eles conduzidos a contento pelo santo.
Nicolau V enviou-o como legado apostólico para a Hungria, Polônia e Alemanha, o que lhe deu a oportunidade de realizar nesses países um bem indescritível. Muitos hereges, principalmente os hussitas, foram conduzidos de volta à verdadeira Igreja. Ao convertê-los, João não se importava com o perigo em que colocava a própria vida: foi envenenado duas vezes pelos inimigos da verdadeira fé, mas Deus o protegeu milagrosamente.
Por falta de espaço, omitimos muitos outros trabalhos deste santo homem em benefício dos fiéis. Todavia, não podemos deixar de mencionar aqui um feito pelo qual ele mereceu os agradecimentos de todo o mundo cristão.
Maomé II ameaçava exterminar o cristianismo. Tinha acabado com o império grego em 1453, tomando Constantinopla e mais de 200 outras cidades; e em 1456, com um imenso exército, sitiou a cidade e a fortaleza de Belgrado, com a intenção de tornar-se senhor de todo o Império Ocidental. Confiando mais na virtude e na santidade que nas armas dos príncipes cristãos, o Papa enviou São João para pregar a guerra santa contra o arqui-inimigo da cristandade, e para exortar todos os príncipes cristãos a pegar em armas; ordenou-lhe ainda que estivesse pessoalmente junto ao exército cristão durante a campanha.
O santo homem executou a ordem, uniu as potências cristãs e incitou-as à batalha. Os dois exércitos — o turco e o cristão — estavam posicionados um contra o outro, mas o primeiro era muito superior ao segundo em termos numéricos; e, ainda assim, do resultado dessa batalha dependia o destino da cristandade. Com um crucifixo em mãos, São João ia de fileira em fileira, encorajando os soldados a lutar com bravura, repetindo-lhes que era a Cristo e sua Igreja que estavam defendendo.
A presença e a exortação de um homem tão santo encorajaram os soldados, que, já no primeiro ataque, levaram confusão ao exército infiel. O próprio Maomé II foi ferido, e seus soldados jaziam aos milhares no campo de batalha, cobertos de sangue. Foi uma vitória completa, e tão manifestamente fruto de um milagre, que nem os chefes dos exércitos cristãos, nem os soldados, a atribuíram ao poder das armas, mas à santidade e às orações de São João.
Agradecendo ao Senhor dos exércitos por sua proteção, o santo retirou-se, após a guerra, para um claustro na atual cidade de Ilok (Croácia), de onde, após três meses de uma vida muito santa, foi chamado a receber a coroa da glória eterna, aos 72 anos de idade. O Todo-Poderoso glorificou seu fiel servo com muitos milagres, antes e depois de sua morte. Na igreja de Santo Estêvão, em Viena, ainda é possível ver o púlpito de onde ele pregava.
Considerações práticas
I. Logo que São João reconheceu a instabilidade do mundo, a ilusão do favor e da amizade dos homens, e a vaidade de toda felicidade temporal, começou a buscar com afinco a predileção e a amizade do maior de todos os monarcas e, com ela, a salvação eterna. Ele agiu com sabedoria, pois a graça de Deus deve ser mais estimada que a de todos os monarcas do mundo. Ela é mais necessária, útil e desejável que a amizade de todos os homens. Esta dificilmente se ganha e facilmente se perde. E quando mais precisamos dela, raramente a encontramos.
É fácil obter a graça de Deus, e ninguém poderá tirá-la de nós, exceto nós mesmos, pelo pecado. Em todas as necessidades, podemos esperar ser amparados pelo Todo-Poderoso. Por que, então, você não a busca com mais afinco? Por que não se esforça por preservá-la? Por que se preocupa mais em obter os favores do homem mortal que a graça de seu Deus? Diz o piedoso Tomás de Kempis: “O amor do ser humano é falso e instável, mas o amor de Jesus é verdadeiro e constante.”
Ame e tome por amigo aquele que não abandona você, sobretudo no momento em que todos os outros o fazem. Permaneça com Jesus na vida e na morte. Entregue-se a Ele, que é o único que pode ajudá-lo quando todos os outros o abandonam.
II. Nada agradava mais a São João de Capistrano que a comunhão com o Altíssimo na oração, na leitura de livros devotos e na escuta da Palavra de Deus. Segundo Santo Agostinho, na oração nós falamos com o Todo-Poderoso; nos livros piedosos e nas instruções religiosas, é Ele quem fala conosco. Também lhe agrada esse tipo de relacionamento com Deus? Quanto tempo você dedica a ele?
Sua conduta demonstra que você prefere conversar com os homens que com Deus, pois dedica muito mais tempo a eles. São prova disso as suas muitas visitas frívolas, e suas conversas longas e vãs. Acaso você acha que esse tipo de relacionamento com os seres humanos é mais útil ou necessário que um relacionamento com o Todo-Poderoso? Não é possível que seja tão tolo! Diz Tomás de Kempis: “Os maiores santos evitaram a companhia dos homens”, diz Tomás de Kempis. “Sempre que estive entre os homens, voltei pior do convívio com eles. Quem me dera ter sido mais silencioso e não ter mantido qualquer relação com os homens.”
Raramente alguém sai de longas conversas sem pecar, pois o Espírito Santo nos assegura: elas são ocasião de pecado. Com isso, não quero proibir o convívio necessário ou oportuno com os outros. Mas não frequente ambientes mundanos ou perversos, tampouco abuse do convívio social. Não prolongue suas conversas sem necessidade. Evite falatórios vãos, inúteis ou ociosos. Se observar essas regras, terá mais tempo para estar com Deus na oração, na leitura e nas pregações. “Se te afastares das fofocas e das visitas inúteis, terás tempo suficiente para uma meditação piedosa”, diz Tomás de Kempis.
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