Madeleine Delbrêl foi uma leiga francesa. Nascida em 1904, herdou do pai o interesse pela arte e o talento para a escrita. Mas a educação religiosa não foi o forte de sua família. Por isso, com quinze anos, influenciada por um um círculo literário e filosófico de “livres-pensadores”, passa da indiferença religiosa ao ateísmo. Aos vinte, porém, aproxima-se de um grupo de amigos cristãos e vê entrar para os dominicanos o homem por quem era apaixonada — um choque para ela. Começa a rezar, então, e em 1924 encontra-se com Deus — ou antes, como ela mesma diz, Ele a encontra. Pouco tempo depois, passa a servi-lo através da assistência social e do escotismo. Em 1964, alguns meses antes de sua morte, declara: “Eu estava e continuo deslumbrada por Deus”. Em 2018, a Igreja declarou-a Venerável.

A ausência de um verdadeiro sacerdote, em uma vida, é um sofrimento que não tem nome. O maior presente que se poderia dar, a maior caridade que se poderia fazer, é um sacerdote que seja um sacerdote de verdade. É a maior aproximação que se poderia realizar aqui embaixo da presença visível do Cristo…

No Cristo há uma vida humana e uma divina. Também no sacerdote queremos reencontrar uma vida verdadeiramente humana e uma vida verdadeiramente divina. A tristeza é que muitos parecem amputados seja de uma, seja da outra.

Há sacerdotes que parecem nunca ter tido uma vida de homem, eles não sabem avaliar as dificuldades de um leigo, de um pai ou de uma mãe de família, com o seu verdadeiro peso humano. Eles não se dão conta daquilo que é realmente a vida de um homem ou de uma mulher. 

Quando os leigos cristãos encontram pela primeira vez um sacerdote que os “compreendeu”, que entrou com o seu coração de homem em suas vidas, em suas dificuldades, eles jamais se esquecem dele. Com a condição, porém, que ele misture sua vida com a nossa, sem viver da mesma forma que nós vivemos. Os sacerdotes trataram os leigos durante muito tempo como se fossem menores de idade; hoje, passaram para o outro extremo, tornaram-se seus companheiros. Gostaríamos que eles continuassem sendo pais. Quando um pai de família vê crescer seu filho, ele o trata como um homem e não como um moleque, mas ele o considera sempre seu filho: um filho, homem.

Precisamos também que um sacerdote tenha uma vida divina. O sacerdote, vivendo completamente no nosso meio, deve continuar em outro lugar.

Os sinais que nós esperamos desta presença divina?

A oração: há sacerdotes que nós nunca vemos rezar (o que geralmente se chama rezar).

A alegria: quantos sacerdotes agitados, angustiados!

A força: o sacerdote deve ser aquele que sustenta, sensível, vibrante, mas nunca se abate.

A liberdade: nós o queremos livre de todas as fórmulas, de todos os preconceitos.

O desinteresse: há quem às vezes se sinta usado por ele, ao invés de ele nos ajudar a realizar nossa missão.

A discrição: ele deve ser alguém que se cala. (Perde-se a esperança em quem nos faz confidências demais).

A verdade: que ele seja aquele que sempre diz a verdade.

A pobreza: é o essencial, alguém que seja livre diante do dinheiro; que sinta uma “lei da gravidade” que instintivamente o atrai para os pequenos, para os mais pobres.

O sentido da Igreja: que ele não fale jamais da Igreja com leviandade, como se estivesse fora. É imediatamente julgado o filho que se permite julgar sua mãe…

Mas muitas vezes há uma terceira vida que invade as duas primeiras e que as afoga: o sacerdote torna-se o homem da vida eclesiástica, do “ambiente clerical”. Seu vocabulário, sua forma de viver, seu jeito de dar nome às coisas, seu gosto por pequenos interesses e pelas pequenas intrigas de influência, tudo o que é uma máscara que dolorosamente esconde o sacerdote, que deixa para trás o sacerdote que ele é sem dúvida…

A ausência de um verdadeiro sacerdote numa vida é uma miséria que não tem nome; é a única miséria.

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