Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 11, 16-19)
Naquele tempo, disse Jesus às multidões: “Com quem vou comparar esta geração? São como crianças sentadas nas praças, que gritam para os colegas, dizendo: ‘Tocamos flauta e vós não dançastes. Entoamos lamentações e vós não batestes no peito!’
Veio João, que nem come e nem bebe, e dizem: ‘Ele está com um demônio’. Veio o Filho do Homem, que come e bebe e dizem: ‘É um comilão e beberrão, amigo de cobradores de impostos e de pecadores’. Mas a sabedoria foi reconhecida com base em suas obras”.
No Evangelho de hoje, Jesus apresenta os paradoxos do cristianismo. Essa expressão, que é o título de um capítulo do livro “Ortodoxia”, de Chesterton, expressa a aparente contradição entre João Batista, que fazia jejum e todo mundo dizia: “Está endemoniado”, e Jesus, que come e bebe, enquanto os outros dizem: “ É um beberrão”.
Esse mundo que recebeu Jesus, há dois mil anos atrás, assim como hoje, é um mundo mimado, que não aceita os paradoxos do cristianismo. Nós, cristãos, queremos as coisas bem claras, o vermelho é bem vermelho e o branco é bem branco. O cristianismo não suporta muito essa coisa “cor de rosa”. Quando nós, por exemplo, aceitamos a virgindade, então nós queremos a castidade total; mas, quando a pessoa se casa, é para ter muitos filhos. Ou seja, parece contraditório, por que por um lado você é um bom cristão tendo filho nenhum, mas depois é um cristão tendo muitos filhos? Não parece estranho?
Não parece estranho que uma pessoa seja um bom cristão sendo um eremita numa montanha, dedicando-se somente à oração e, ao mesmo tempo, seja um bom cristão num apostolado onde ele se deixa devorar pelos irmãos e trabalhando pelos outros a vida inteira? Esse é o cristianismo. Por quê? Porque, na realidade, as duas verdades são lados de uma mesma moeda, quase que cumprindo a profecia de Isaías que diz: “O leão e o cordeiro se deitarão juntos”. O leão não vai devorar o cordeiro, mas também o cordeiro não vai tornar o leão “manso e inofensivo”. Chesterton comenta essa passagem dizendo que seria terrível, seria um imperialismo da parte do cordeiro querer que o leão deixasse de ser feroz.
O cristianismo tem santos que, ao mesmo tempo, combatem na batalha como soldados e tem santos que, ao mesmo tempo, se entregam pacíficos para não derramar sangue. Esse é o cristianismo. Por quê? Porque todas as virtudes são vividas ao mesmo tempo.
No nosso site, você encontra uma imagem do Cristo que traz em si esse paradoxo, é um famoso ícone antigo, que hoje se encontra no Mosteiro do Monte Sinai, em que o Cristo é apresentado no lado direito de sua face com um rosto manso e cheio de misericórdia, e no lado esquerdo um rosto terrível de ira. Por quê? Porque a verdade é tão mais verdadeira quanto, de alguma forma, ultrapassa a nossa capacidade de domesticá-la, de sistematizá-la.
É verdade que nós podemos fazer um esforço teológico e encontrar uma teologia como a de Tomás de Aquino, por exemplo, que distingue os aspectos e explica essas coisas que são aparentemente contraditórias. Sim, porque o cristianismo não é louco e contraditório, mas é constituído de realidades paradoxais que são apenas aparentes contradições.
Como é possível que o Cristo, manso e humilde de coração, pegue o chicote para expulsar os vendilhões do templo? Como é possível que Aquele que perdoa a adúltera, ao mesmo tempo, dirija invectivas furiosas contra os fariseus? Isso é possível porque todos esses são aspectos da verdade, aspectos do amor de Deus. Às vezes Ele nos ama acariciando e perdoando, às vezes nos ama desafiando e nos chamando à mudança de vida. Essa é a verdade do cristianismo. João Batista e Cristo não expressam uma contradição, na verdade, são duas formas de Deus apresentar o seu amor na nossa vida.
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