John Ronald Reuel Tolkien foi um católico convicto: Missa diária, confissão semanal, devoção à Igreja Romana, à Eucaristia e a Nossa Senhora.
Alguns atribuem sua catolicidade à educação recebida no colégio dos padres oratorianos, fundado por São John Henry Newman, e particularmente à forte e decidida orientação do Padre Morgan, que foi para Tolkien como um verdadeiro pai — após a morte de sua mãe, ele foi o seu tutor. Outros a atribuem ao exemplo luminoso de sua própria mãe, definida por Tolkien como uma “mártir”: ela pagou sua conversão ao catolicismo com o abandono por parte de todos os familiares e, com isso, [viu-se privada] do apoio e da ajuda econômica suficientes para curá-la da doença que a levaria a uma morte prematura.
Tudo isso certamente contribuiu para o nascimento e o desenvolvimento da fé em Tolkien, mas seria um erro subestimar sua correspondência pessoal, seu aprofundamento constante, sua convicção cada vez mais firme e profunda — amadurecida ao longo dos anos — de que somente na fé católica se encontra todo o bem: a verdade, a beleza, a santidade.
Sua fé provinha sobretudo de dois amores, apoiava-se em dois pilares, que constituem a identidade do católico numa Inglaterra onde convivem as mais diversas confissões cristãs, principalmente a anglicana, com a qual Tolkien lidava diariamente. Esses dois amores, esses dois pilares, são a Eucaristia e Nossa Senhora.
Por isso, ele aprendeu o Cânon da Missa e o recitava mentalmente quando os compromissos o impediam de participar da Santa Missa, além de recitar com frequência o Magnificat, a Ladainha Lauretana e o Sub tuum praesidium (uma antiga oração mariana), que havia memorizado em latim.
Em suas obras literárias, poemas, contos, fábulas e mitologia, esses dois amores parecem surgir e ressurgir continuamente, mesmo que de forma velada.
Naturalmente, Tolkien reiterou várias vezes que não escreveu nenhuma alegoria nesse sentido. De fato, ele estava convencido de que a alegoria não era o meio adequado para transmitir a verdade e que, muitas vezes, acabava por banalizá-la e ridicularizá-la. Por outro lado, porém, não podia negar que da fé e, em particular, da Eucaristia e da Virgem Maria, tinha aprendido todos aqueles conceitos de beleza, moralidade e santidade que estão disseminados em vários graus em seus escritos e que pretendem ser um raio de luz para o leitor, um caminho para conduzi-lo além da simples vida natural de cada dia, para aquilo que a transcende.
A propósito de Nossa Senhora como fonte de inspiração, numa carta ao amigo jesuíta Robert Murray, ele disse o seguinte: “Acho que sei exatamente o que entendes por ordem da Graça [order of Grace]; e [isto], é claro, por tuas referências a Nossa Senhora, na qual se baseia toda a minha pequena percepção de beleza, seja em majestade, seja em simplicidade” [i].
É dessa fonte mariana que ele tirava inspiração para criar as figuras femininas mais luminosas e celestiais, mais belas e sábias, mais puras e angelicais dos seus livros. É o caso, por exemplo, da rainha dos elfos Galadriel, em cuja presença os viajantes da Companhia encontram descanso e alívio, conselhos e presentes para continuar sua missão. Isso nos leva a refletir sobre como Tolkien, um mês antes de morrer, quis revisitar essa figura na tentativa de absolvê-la de toda culpa “original”; aquela culpa que se concretizou para os elfos na época da rebelião de Fëanor. Se nos escritos anteriores Galadriel estava envolvida no pecado, no último escrito ela sai ilesa e entre os mais ferrenhos opositores da desobediência dos Noldor contra os Valar. Essa versão não entrou no texto “oficial” do Silmarillion, mas deixa bem claro o desejo de Tolkien de apresentar uma figura totalmente santa e imaculada que fosse uma “antecipação” histórica da Virgem Maria. Digo antecipação porque, na mente de Tolkien, o mundo de Arda não era senão um mito distante no tempo, um mito que chegou antes da Revelação cristã; um mito que, de certa forma, a antecipa, predispõe e prepara.
Outra figura que “antecipa” a Virgem Maria é a rainha dos Valar (que nós chamaríamos de anjos), Elbereth, rainha das estrelas e inimiga mortal de Morgoth, o Valar decadente e corrompido pelo mal (imagem de Lúcifer). A ela se dirigem, mais do que a qualquer outra, os elfos e os homens que, em meio aos perigos da Terra-média, buscam proteção e refúgio contra o mal. O próprio Frodo a invoca na noite sem luz do túnel que leva à terra sombria de Mordor, encontrando salvação, esperança e força.
E a lista poderia continuar com Arwen, esposa do Rei Aragorn, toda beleza, sabedoria e majestade; ou com a jovem donzela de Rohan, Éowyn, que corta a cabeça do malvado rei dos Nazgul, cumprindo assim as profecias anunciadas... Todas elas são figuras que, na mente de Tolkien, não eram senão um pequeno vislumbre, um pequeno prenúncio, um pequeno reflexo da beleza e da santidade da Virgem Maria.
Poderíamos até dizer que mesmo as coisas inanimadas de seus contos se inspiram poeticamente na Virgem Maria. A própria luz, por exemplo, é retratada como algo vivo e feminino que espalha pureza e santidade, afastando o mal por onde quer que passe com seus raios benevolentes. Em suma, podemos dizer com [Stratford] Caldecott:
As belezas naturais das paisagens e florestas, das montanhas e rios, e a beleza moral do heroísmo e integridade, da amizade e honestidade — tudo celebrado no mundo imaginário de Tolkien — são dons de Deus que vêm através dela [de Maria], e ela é a medida desses dons, com sua beleza a concentrar-lhes a essência. Esta é a Maria que Tolkien sempre tinha presente, no centro de seu imaginário, envolvida por toda a beleza natural, a mais perfeita das criaturas de Deus, tesouro de todos os dons terrenos e espirituais.
[Completemos dizendo que Maria é] a mais elevada e distante por sua sublimidade e santidade, e a mais próxima por seu calor e doçura, por sua misericórdia e maternidade.

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