Todo coração católico sente-se irresistivelmente atraído por Maria. Quem tem a graça de crer, mesmo que careça de maior instrução, reconhece nela, por uma suave inspiração do Espírito Santo, não só a Mãe de Deus segundo a carne, mas também a própria Mãe segundo a graça.

Mas, apesar dessa inclinação espontânea que todos temos a Nossa Senhora, será que é realmente necessário ser devoto dela? Não seria possível ser católico e conseguir a salvação eterna sem ter por Maria Santíssima um amor especial e uma singular veneração?

Neste texto, de autoria do Padre Gabriel M. Roschini, grande mariólogo italiano, você irá entender por que tantos santos, baseados nas Escrituras e na razão humana, afirmaram que a devoção mariana é não apenas útil e conveniente, mas uma verdadeira necessidade, querida por Deus para a nossa santificação e salvação.


É realmente necessário que um católico seja devoto de Maria? Será mais fácil respondermos a esta pergunta, de consequências tão decisivas para a nossa vida espiritual, se levarmos em consideração as seguintes verdades, fundamentadas no testemunho tanto das Escrituras quanto da razão humana.

Como sabemos, todos os eleitos devem reproduzir em si mesmos a imagem de Jesus, cujo nome, segundo o Apocalipse, levarão escrito em suas frontes (cf. Ap 22, 4), porque, conforme as palavras do Apóstolo, “os que Ele distinguiu de antemão, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho” (Rm 8, 29).

Ora, Jesus é por natureza Filho de Deus e de Maria; e nós, pela graça, somos filhos de Deus e de Maria. Logo, para reproduzirmos em nós a semelhança e a vida de Jesus e, portanto, sermos predestinados, temos de imitar o seu terno amor, não só ao Pai, mas também à sua Mãe. Em outras palavras, se para sermos salvos devemos ser cópias vivas de Jesus, e se Jesus, como bom Filho, teve por Maria grande veneração, quem não tiver devoção a Ela não será salvo, porque lhe faltará um elemento característico de Jesus, modelo único dos eleitos.

Além disso, a necessidade da devoção à Virgem SS. para obter a inestimável graça da eterna salvação decorre como que de três princípios inconcussos, de suas três qualidades fundamentais:

  1. de sua condição de Mãe de Deus;
  2. de sua condição de Mãe dos homens; e
  3. de sua condição de Mediadora entre Deus e os homens.

Essa necessidade decorre, antes de tudo, de sua condição de Mãe de Deus. De fato, é sabido que para alcançar a salvação eterna é preciso crer no mistério da Encarnação [1]. Ora, como é possível crer no mistério da Encarnação, ou seja, no mistério de um Deus feito homem, sem crer ao mesmo tempo no mistério de uma mulher Mãe de Deus? Com efeito, há um vínculo íntimo entre o filho e a mãe, entre o Verbo encarnado e a Mãe deste Verbo encarnado.

O mesmo ato de fé necessário para salvar-se abarca, portanto, o homem-Deus, Jesus, e a Mãe de Deus, Maria. Por isso, desde os tempos apostólicos, e com grande probabilidade desde os próprios Apóstolos, pedia-se ao batizando, antes de receber o Batismo, um ato de fé explícito em “Jesus Cristo, nascido da Virgem Maria”. Ora, este mesmo ato de fé na Encarnação e em Maria deve-se repetir, de acordo com a opinião mais comum, aliquoties in vita, isto é, algumas vezes durante a vida, sob pena de pecado grave.

Logo, para salvar-se é preciso também, necessariamente, um ato de fé em Maria. Ora, este ato de fé em Maria, Mãe do Verbo encarnado, não é porventura um ato de culto, ou seja, de devoção, uma vez que a fé é o grande obséquio da inteligência a uma verdade revelada? Não se salva, portanto, quem, ao menos aliquoties in vita, não quiser render à divina maternidade de Maria, inseparável do conceito de Encarnação do Verbo, a devida homenagem.

Ademais, em toda a linguagem humana, entre as tantas palavras que a compõem, há uma que por si só forma um verdadeiro poema de amor. É uma palavra que fala ao coração e só ao coração; uma palavra que não respira outra coisa que amor; é a primeira palavra que floresce nos lábios e geralmente é também a última que deles se desprende. É a palavra “mãe”.

Pois bem, Maria é nossa Mãe, Mãe espiritual dos homens. Mãe, com efeito, é aquela que coopera para dar a vida, e quando a dá, rodeia-a de cuidados até alcançar seu pleno e completo desenvolvimento. Ora, acaso não cooperou a Virgem SS. com o divino Redentor para dar-nos a vida sobrenatural da graça, vida divina da qual, desgraçadamente, estávamos privados pelo pecado de nossos progenitores?

A graça, com efeito, é princípio da vida: ela é para a alma o que esta é para o corpo. É a alma o que dá vigor e movimento ao corpo: numa palavra, toda a sua vida. E, da mesma maneira, a graça é o que dá uma nova vida à alma, a vida sobrenatural dos filhos adotivos, dos amigos de Deus: com razão, pois, a graça é chamada “alma de nossa alma”. Pois bem, uma vez que a Virgem SS. cooperou para a nossa regeneração, para a nossa vida da graça, é evidente que devemos reconhecê-la e saudá-la como nossa verdadeira Mãe espiritual.

É verdade, sim, que não existe nenhuma definição explícita e solene desta grande e consoladora verdade. Os Sumos Pontífices, no entanto, ressaltaram com frequência que se trata de uma verdade inquestionável. Portanto, a S. Escritura, assim como a Tradição, com as quais a razão, entusiasmada, faz coro, são também muito claras e explícitas acerca deste suavíssimo tema. Acertadamente, pois, o Cardeal H.-M. Lépicier a qualifica de “verdade católica, pertencente propriamente à fé. De maneira que negá-la seria algo, não só temerário, mas de sabor herético” (Trac. de B. M. V., III, c. 1, a. 1, p. 456).

Ora, há um preceito formal que obriga todo filho a honrar pai e mãe. Se Maria é verdadeira Mãe espiritual dos homens, Mãe não só de nome, mas especialmente com os fatos, pelos diligentes cuidados maternais que Ela prodigaliza a todos os seus filhos, é nosso dever honrá-la. E dado que seria coisa monstruosa não conhecer os deveres de piedade filial com respeito à própria mãe terrena, assim também, e com maior razão, seria monstruoso desconhecer os deveres de piedade filial com respeito à própria mãe celestial, Maria. A graça, com efeito, não destrói a natureza, mas a aperfeiçoa.

Uma outra razão teológica, que bastaria por si só a provar a nossa tese, está tomada do ofício de Mediadora dos homens. O ofício de Mediadora pode ser considerado sob um duplo aspecto: enquanto indica a cooperação na aquisição das graças e especialmente de nossa reconciliação com Deus, pelo que mereceu o título de Corredentora do gênero humano; e enquanto indica a cooperação de Maria na distribuição das graças, pelo que merece o título de Dispensadora de todas as graças.

Pois bem, a gratidão àqueles que nos fizeram algum bem e nos livraram do mal é um dever. “Grati estote”, exorta o Apóstolo (cf. Col 3, 15). Ora, ninguém, depois de Deus, nos fez tantos benefícios e nos livrou de tantos males como a Virgem SS. Com efeito, enquanto Corredentora do gênero humano, Ela nos livrou do inferno e nos abriu as portas do céu. Não seria monstruoso, pois, negar-lhe o culto da inteligência, não reconhecendo sua participação na obra de nosso resgate, e negar-lhe o culto do coração, com o agradecimento por tudo o que Ela fez e padeceu por nós?

É de fé, além disso, que sem a graça atual não podemos ser salvos. A graça é necessária para todo ato sobrenatural, porque deve haver certa proporção entre o efeito e seu princípio. Nós, por nossas próprias forças, por mais que usemos bem de nossa liberdade, não podemos nem dispor-nos positivamente à conversão nem perseverar no bem por um tempo notável, e muito menos perseverar até a morte: “Sem mim”, diz Jesus a seus discípulos, “nada podeis fazer”. Não podeis ter sequer um bom pensamento, acrescenta S. Paulo, porque Deus é quem obra em vós o querer e o operar (cf. Jo 15, 5; 2Cor 3, 5; Fl 2, 13).

Pois bem, sem levar em conta a graça primeira, que nos é dada gratuitamente sem que a peçamos e que constitui o princípio mesmo da oração, é uma verdade indiscutível que a oração é o meio normal, eficaz e universal pelo qual Deus quer que tenhamos todas as graças atuais. Ora, não é a Virgem SS. a Mediadora de todas as graças? Acaso não passam por suas mãos todas as graças concedidas aos homens? Não é Ela como que o “pescoço” pelo qual passam os influxos da Cabeça, Jesus? Não é Ela o canal por que passam as águas que correm da fonte, Jesus? Nenhuma graça, e muito menos a mais preciosa de todas — a perseverança final — é concedida a quem quer que seja, sem a sua maternal intervenção. E se tal é assim, como se poderia negar a necessidade de sua devoção?

O Doutor Angélico, Santo Tomás de Aquino, depois de estabelecer a necessidade da oração, propõe-se a seguinte pergunta: devemos rogar aos santos para que intercedam a nosso favor? E responde enunciando uma lei estabelecida pelo próprio Deus, segundo a qual a ordem da oração deve corresponder à ordem dos benefícios. Ora, os benefícios provêm de Deus por meio dos santos; logo, é pelo mesmo meio que a Deus deve chegar a nossa oração: as coisas inferiores, com efeito, devem dirigir-se a Deus por aquelas que são como meios até Ele.

O que o Angélico afirma de modo geral da mediação dos santos deve ser dito, de uma maneira particular, também da Rainha de todos os santos. O mesmo Doutor Angélico nos ensina que a mediação de Maria é anterior à de todos os outros eleitos. E acrescentamos, de nossa parte, que a mediação de Maria é necessária, ao passo que a mediação dos outros eleitos é, ao menos, utilíssima: porque até nas graças obtidas pelos santos não está ausente a intercessão de Maria.

Ela é, portanto, o canal necessário de nossas súplicas. E se tal é assim, como não dizer que é necessário o culto de oração à Virgem SS.? Como não chamar necessária à devoção de Maria para a salvação? Além disso, é fato digno de ter em conta, porquanto não carece de força probatória: em todo o mundo católico, floresce e se desenvolve a flor da devoção a Maria; todos os fiéis, movidos pelo instinto que a todos nos move em direção à nossa Mãe, se voltam a Ela, proclamam-na bem-aventurada, encomendam-se a Ela, pondo em suas mãos especialmente o negócio importantíssimo de sua eterna salvação. Quem, entre os fiéis, não conhece e não reza a Ave-Maria? É a primeira oração, ao lado do Pai-Nosso, que se aprende a balbuciar sobre o aconchego do colo materno.

Todo o mundo católico, todos os fiéis, sem exceção, sentem a necessidade da devoção a Maria: sentem-na e, mais do que tudo, praticam-na. Poderíamos, é claro, perguntar em que grau, ou seja, em que medida é necessária a devoção a Maria, e especialmente o culto de oração, para salvar-se. É difícil determinar semelhante coisa, porque depende de múltiplas e variadas circunstâncias. O que, sim, se pode e deve dizer é o seguinte: quanto mais fervorosa e frequente for a nossa devoção a Maria, sobretudo a nossa oração, mais generosamente Ela fará descer sobre nós suas graças e favores celestiais, com cuja ajuda podemos estar seguros de nossa eterna salvação.

Se assim é, “quem de nós”, diz S. Leonardo de Porto Maurício, “recusará alistar-se no número dos devotos de Maria, a fim de assegurar o grande negócio de sua eterna salvação?” (Disc. 7, n. 3). “Abracemos todos com grande fervor a verdadeira devoção a Maria, e assim nos salvaremos todos” (Disc. 16, n. 4).

Repitamos, pois, mais com o coração do que com a língua, em união com este santo:

Ó Maria! Já que está em vossas mãos a minha salvação, e vós salvais todos os que vos são devotos e se encomendam a vós, eis-me aqui, ó grande Virgem: lanço-me desde este momento em vossos braços e professo-me para sempre vosso verdadeiro devoto. Ó amada Maria, aceitai-me e salvai minha pobre alma! (Disc. 10, n. 3).

Referências

  • Tradução e adaptação de Gabriel M.ª Roschini, La Madre de Dios según la Fe y la Teología. Trad. esp. de Eduardo Espert. 2.ª ed., Madrid: Apostolado de la Prensa, 1958, vol. 2, pp. 533-544.

Notas

  1. As opiniões discrepam quanto a isso. Cf., e.g., A. R. Marín, “A fé da Igreja”, n. 38: “Para obter a vida eterna, além da fé habitual unida à caridade, é necessário a todos os homens adultos com uso da razão crer expressamente que Deus existe e que é remunerador, ou seja, premiador dos bons e castigador dos maus”; n. 39: “Não consta com certeza que, para salvar-se, seja necessária a todos os homens do mundo a fé explícita na Encarnação do Verbo”, salvo nos casos em que se tenha recebido instrução suficiente acerca dos mistérios da fé.

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