Diz um antigo provérbio francês que “Deus amou tanto as mães que desejou ter uma também”. Há nisto um sentido tão sublime quanto humano. Quando penso em Nossa Senhora, não penso em seus títulos gloriosos ou nos impecáveis argumentos teológicos que os baseiam; vejo simplesmente uma Mãe. Enquanto Mãe de Deus e, portanto, Mãe da Igreja, Maria confere à fé cristã uma dimensão materna muito atraente, já que ela mesma foi total e belamente humana.
Nenhuma outra religião possui um ícone mais carinhoso do que ela. Anos atrás, em visita a uma exposição de arte asteca, fui surpreendido por sua violência latente e pelo fato de que o conceito “mãe e filho” não pertencia ao universo de referência dos astecas. Isso me fez lembrar o quanto esse conceito está profundamente relacionado à nossa civilização cristã. Prova disso são as grandes catedrais góticas a Maria, além das várias pinturas que a retratam.
Vislumbres da misteriosa força exercida pela personalidade de Nossa Senhora podem ser encontrados em “Regina Coeli: Artes e Artigos sobre a Virgem Maria”, do Pe. Michael Morris, um livro que reúne alguns de seus comentários mensais para a revista Magnificat. De acordo com ele, durante os séculos em que a arte religiosa dominou e floresceu no Ocidente, Nossa Senhora parece ter sido pintada tanto ou até mais mais do que seu divino Filho. Sua beleza espiritual, sua ternura maternal, sua nobreza de estado e conduta têm inspirado artistas a dar o máximo de si.
Não só isso. Nossa Senhora inspirou também devoções populares. De fato, a Arte com maiúscula não teria sentido sem o amor dos fiéis comuns à Virgem Santíssima. Em um de seus artigos, Pe. Morris descreve a Imaculada Conceição do pintor espanhol Velázquez. Morris afirma que, durante a Contra-Reforma na Espanha, havia um grande entusiasmo popular por esse privilégio mariano. Quando o Papa Pio V alinhou-se à defesa scotista da Imaculada Conceição, declarando como “menos piedosa” a opinião tomista segundo a qual Maria não teria sido concebida sem pecado, mas santificada no ventre, dispararam-se fogos de artifícios, dançaram-se carnavais, jogaram-se torneios e touradas por todo o país.
Na última noite do ano (ou nas vésperas da Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, como dizemos os católicos), o som dos fogos reverberou por todo o meu bairro. É incrível que na sociedade de hoje os fogos ainda sejam usados para celebrar uma obscura, ao menos em aparência, crença católica; o espírito de fé que animou os espanhóis do século XVII, afinal, já acabou.
Em seu livro, Pe. Morris menciona ainda a presença de S. Bárbara na Madona Sistina, de Rafael. Acredita-se que S. Bárbara, aprisionada em uma torre pelo pai, um pagão, tenha dado origem à fábula de Rapunzel. J. R. R. Tolkien, citado no livro do Pe. Morris, disse certa vez: “Toda minha percepção de beleza, tanto em majestade quanto em simplicidade, é fundada em Nossa Senhora”. A boa notícia é que, graças ao consentimento dela para se tornar Mãe de Deus, todos podemos, como na história de Rapunzel, “viver felizes para sempre”.
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