Quando é que cem crimes serão mais leves do que um? A história a seguir ajuda a elucidar-nos um ponto muito importante da doutrina moral católica:
O rei pagão Milinda perguntou a um velho padre católico que o instruía na fé: “Segundo o senhor, um homem que cometeu todo o mal possível por cem anos, mas que, antes de morrer, pedir perdão a Deus, vai renascer no Céu. Se ao contrário alguém cometer um único pecado e não se arrepender, vai para o Inferno. Isso é justo? Serão cem crimes acaso mais leves que um?”
“Se eu tomar uma pedra deste tamaninho”, respondeu o velho sacerdote, indicando uma pequena medida, “e a puser sobre a superfície do lago, ela vai boiar ou afundar?”
“Afundar”, respondeu o rei.
“E se tomar cem pedras grandes, colocá-las em um barco e o empurrar para o meio do lago, elas vão boiar ou afundar?”
“Vão boiar”.
“Então cem pedras e um barco são mais leves do que uma pedrinha?”
O rei não soube responder.
O velho sacerdote explicou: “Assim acontece com o homem. Mesmo que tenha pecado muito, se apoiar-se em Deus, não irá para o Inferno. Em vez disso, o homem que fizer o mal, mesmo que seja uma só vez, e não recorrer à misericórdia de Deus, perdido estará.”
A resposta para a pergunta inicial, portanto, está no barco. Para que não nos condenem, as pedras dos nossos pecados precisam ser colocadas em uma barca — imagem da estabilidade, da segurança. O primeiro significado que aqui nos vem à mente é a misericórdia de Deus: é no braseiro ardente do seu amor que devem ser lançados os nossos crimes, para que deles sejamos salvos, libertos, redimidos.
Mas poderíamos melhorar ainda mais a interpretação da história. Afinal, esta misericórdia divina nos é dispensada pela Igreja — tantas vezes associada a uma barca: a “barca de Pedro”; ou, ainda, a nova “arca de Noé”, entrando na qual nos salvamos das águas tempestuosas do Inferno. O sacramento da Confissão, também — pelo qual somos lavados de nossas culpas no Sangue do Cordeiro —, tantas vezes foi chamado de “segunda tábua após o naufrágio”. Pois, nos explica Santo Tomás:
O primeiro remédio para os que atravessamos os mares é nos conservarmos num navio em bom estado; o segundo, se ele naufraga, é apegarmo-nos a uma tábua. Do mesmo modo, o primeiro remédio no mar desta vida é conservarmos a nossa integridade; o segundo, recuperarmos essa integridade pela penitência, se a perdemos pelo pecado.
Exemplos práticos disto temos na vida de duas personagens do Novo Testamento: Judas Iscariotes e São Dimas.
O primeiro, Apóstolo, escolhido pelo próprio Senhor, terminou a vida traindo o Mestre e merecendo por isso o Inferno. Não seria exato dizer que Judas pecou uma só vez, pois os Evangelhos sugerem todo um caminho de autodestruição que foi sendo percorrido aos poucos: primeiro, a falta de fé em relação à Eucaristia (cf. Jo 6, 70); depois, a avareza que lhe consumiu o coração (cf. Jo 12, 6); e, enfim, a traição (cf. Jo 18, 2ss), o desespero e o suicídio (cf. Mt 27, 5). O caso ilustra bem, no entanto, como não há segurança neste mundo. Sem apoiar-se em Deus, mesmo uma alma eleita, que Jesus trouxe para junto de si e dignificou com o dom do sacerdócio, pode decair da graça e ter um péssimo fim.
São Dimas, por outro lado, quantos crimes não devia ter cometido durante sua vida de ladroagem? Muito mais que cem, possivelmente. Em seus momentos finais, contudo, o “bom ladrão” arrependeu-se, colocou as suas pedras sobre o madeiro bendito da Cruz (outra imagem possível para o barco da história) e por isso salvou-se!
Assim se cumpre aquilo que diz o Senhor pela boca do profeta Ezequiel:
Se o ímpio se arrepender de todos os pecados cometidos, e guardar todas as minhas leis, e praticar o direito e a justiça, viverá com certeza e não morrerá. Nenhum dos pecados que cometeu será lembrado contra ele. Viverá por causa da justiça que praticou. Será que eu tenho prazer na morte do ímpio? [...] Não desejo, antes, que mude de conduta e viva? Mas, se o justo se desviar de sua justiça e praticar o mal, imitando todas as práticas detestáveis feitas pelo ímpio, poderá fazer isso e viver? Da justiça que ele praticou, nada mais será lembrado. Por causa da infidelidade e do pecado que cometeu, por causa disso morrerá (18, 21-24).
Vem-nos à mente também, aqui, a figura do rei Salomão: conta-se que ele “superou todos os reis da terra em riqueza e sabedoria”, a ponto de o mundo inteiro querer estar em sua presença só “para ouvir a sabedoria que Deus lhe pusera no coração” (1Rs 10, 23-24). No entanto — tragédia das tragédias! —, o sábio rei de Israel morreu na prostituição e na idolatria: “Quando Salomão ficou velho, suas mulheres desviaram-lhe o coração para seguir outros deuses” (1Rs 11, 4). Por este dado bíblico, muitos autores espirituais questionam a salvação do filho de Davi, que não parece ter dado mostras de arrependimento antes de morrer. Grande miséria: passar a vida fazendo o bem e sair deste mundo apegado ao mal!
Que tudo isso sirva para nós como alerta. Aos que ainda estão no pecado, esperança: “Deus quer que todos se salvem” (1Tm 2, 4). Ele é paciente. Não quer que morra o pecador, mas que viva e salve-se. Aos que estão de pé, no entanto, manda que vigiem para não caírem (cf. 1Cor 10, 12).
Longe de nós o engodo de Lutero que, para justificar sua má vida, disse: pecca fortiter, sed crede fortius — “peca com força, mas crê com mais força ainda”. Não! Deus nos deu o dom da fé para que produzíssemos frutos de amor e de penitência. Não abusemos de suas graças para ofendê-lo! Enquanto é tempo, desfaçamo-nos das pedras dos nossos crimes.
Afinal, com uma carga assim pesada, não se pode subir ao Céu.
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Maravilhoso texto que nos infunde grande esperança,pois Deus quer nos salvar e só nos pede fidelidade!
Quem é o autor deste texto? Muito bom.
Perfeito!
Muito bom. Obrigada a tofos
Lula é ladrão e não deve ir para o céu!
Uma vez estava falando com uma pessoa sobre a sabedoria. Por que é muito fácil adiquirir sabedoria, o Olavo disse isso, Salomão pediu e Deus concedeu então ele pediu também e Deus concedeu, pensei... Vou pedir também! Aí a pessoa me alertou dizendo que Salomão pediu, mas se perdeu. Vale a pena ser sábio e se perder?
Então lhe respondi, mas temos algo que Salomão não tem. Salomão não tinha Maria. Nós podemos pedir sabedoria seguros por que temos Maria por mãe e professora.
Salve Maria!
Lutero se enganou.. e continua enganando tantos!..
Excelente