Ao compor esta breve novena ao Príncipe da Milícia Celeste, Santo Afonso Maria de Ligório intitulou-a “Razões para confiar na poderosa intercessão de São Miguel Arcanjo”. 

Todavia, ninguém deve esperar dela as extensas meditações e os amplos elencos de autores característicos de sua obra. Escrito em 1776, este opúsculo é um dos últimos livros de Afonso, redigido como uma “novena familiar”, breve e simples (que o próprio santo achou, depois, “confusa e mal ordenada”). Faltou-lhe, por conseguinte, um último remate, razão pela qual seu manuscrito ficou escondido por quase um século, vindo à luz só em 1886. Por isso, para esta publicação, foram necessárias algumas adaptações no texto da novena, que nós mesmos fizemos ao vertê-lo diretamente do italiano.

Recomendamos que os textos a seguir sejam lidos com as orações a São Miguel Arcanjo (o pequeno exorcismo composto por Leão XIII, sua ladainha, alguma oração de exorcismo privado etc.) que as pessoas costumam fazer na quaresma devocional a ele dedicada. A quem, no entanto, não pôde, não conseguiu (ou não se lembrou de) fazer os quarenta dias de São Miguel, fica a própria recomendação de Santo Afonso sobre o modo de rezar estes nove dias de meditação: “recitando durante nove dias nove Pai-Nossos, Ave-Marias e Glória em honra do Santo Arcanjo”. Por isso, acrescentamos esta orientação no final de cada dia da novena, mais a antiga oração Coleta para a festa de São Miguel Arcanjo.

Lembrando que esta se celebra a 29 de setembro. Portanto, em preparação para este dia, deve-se começar a novena abaixo dia 20 e terminá-la dia 28. Mas a qualquer época do ano pode-se invocar com fruto, também, o Príncipe da Milícia Celeste.

DIA 1

São Miguel Arcanjo, numa pintura de Bartolomé Esteban Murillo.

São Miguel, tendo vencido Lúcifer, que era o primeiro anjo do Paraíso, e que se revoltara contra o seu Criador, foi por Deus sublimado para ocupar o lugar de Lúcifer, e feito por Ele Príncipe da Milícia Celeste.

Ao mesmo tempo, foi constituído principal Protetor da Igreja, e por isso, na antiga Lei, São Miguel tinha o cuidado da Igreja judaica, à qual estava presente para conservar a fé em um só Deus — contra os idólatras, que adoravam muitos deuses — e também para manter a esperança no futuro Messias, que viria para salvar os homens já perdidos por causa do pecado de Adão.

Quando veio ao mundo Jesus Cristo e se recusaram os judeus a reconhecê-lo como seu Salvador, Deus reprovou a Igreja deles e quis que São Miguel fosse, depois de sua divina Mãe, o principal protetor da nova Igreja dos cristãos. Assim fala o Diácono Pantaleão [de Constantinopla], escritor antigo do século VII: “Desde então, [Deus] tem-nos colocado, a nós, os cristãos, sob os cuidados do maior defensor”. O mesmo escreveu São Lourenço Justiniano: “A sacrossanta Madre Igreja honra o bem-aventurado Miguel Arcanjo como o seu protetor especial e próprio, e assíduo intercessor”. Assim o declara a própria Igreja no [antigo] Ofício de 8 de maio, [festa da Aparição de São Miguel no Monte Gargano]: “Assim como outrora na sinagoga dos judeus, ainda hoje a Igreja de Deus o venera como patrono e protetor”.

Por isso, como protetor de toda a Igreja, São Miguel se apresenta continuamente a Deus em benefício dos cristãos, impetrando para eles socorro nas necessidades. Assiste também o Sumo Pontífice e todos os bispos da terra no governo das almas. Isso sem falar do grande cuidado que tem em defender todos os fiéis das injúrias dos demônios, os quais já foram derrotados por ele no Céu.

→ Rezem-se nove Pai-Nossos, nove Ave-Marias e nove Glórias.

Oremos. Ó Deus, que dispondes de modo tão admirável o ministério dos anjos e dos homens, fazei, por vossa misericórdia, que sejamos defendidos na terra por aqueles que sem cessar vos servem e assistem no Céu. Pelo mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

DIA 2 

Como, por culpa de Adão, perdeu-se o gênero humano, Deus predestinou o seu Filho a vir à terra para redimir os homens e, ao mesmo tempo, deu-lhes São Miguel como arma fortíssima para reprimir o poder de Lúcifer; assim escreveu o Diácono Pantaleão, já mencionado no dia anterior: “Deus, naturalmente benigno, deu-lhe qual arma fortíssima para se proteger o grande Miguel, príncipe da milícia [celeste], contra o poder do diabo”. O mesmo autor diz ainda que, embora seja o Céu a sua morada, São Miguel corre com grande velocidade por toda a terra a fim de consolar os homens, tentados que são pelo demônio a perder-se: “Miguel, estando sempre nos céus, percorre toda a terra que há debaixo do céu para assistir, fortalecer e consolar os justos em aflição” [i].

A Santa Igreja faz-nos saber que São Miguel é dado em auxílio a cada um de nós que a ele recorre: “São Miguel, que vem em auxílio do povo de Deus”. E o Santo Arcanjo, em especial, está pronto a ajudar os que são tentados pelo demônio; Pantaleão diz que ele também nos descobre as ciladas do demônio: “Miguel põe a descoberto todas as insídias do diabo, frustra as maquinações dos adversários”. Muitas vezes o demônio faz-nos pensar que certa ação seja lícita, santa até, e por meio dela trabalha em nossa ruína; mas São Miguel nos fará ver o perigo, e assim evitar a ruína.

São Miguel Arcanjo, por Claudio Coello.

No seu livro sobre São Miguel, o Padre Nieremberg conta que certo servo de um grande senhor, tendo levado durante muitos anos uma vida má, e chegado à morte nesse estado, foi confrontado com seus pecados pelo demônio, e fortemente tentado por ele ao desespero. Isto de tal modo que o inimigo chegou ao ponto de fazê-lo dizer que não queria confessar-se nem receber qualquer outro sacramento, porque já estava condenado. 

Mas, como este miserável pecador, no meio de sua má vida, não abandonara a devoção a São Miguel nem deixara de encomendar-se a ele, o Santo Arcanjo apareceu-lhe no leito de morte, avisou-o de que tinha rezado por ele ao Senhor, e [disse] que Deus, por sua intercessão, havia concedido a ele três horas de vida, para que se confessasse e recebesse os sacramentos. 

Então o moribundo, agradecendo com lágrimas ao seu Santo Arcanjo por lhe ter concedido esta grande graça, chamou o irmão e pediu que arranjasse para ele um confessor o mais depressa possível. O irmão dirigiu-se imediatamente a um convento dominicano próximo e, no caminho, encontrou dois destes religiosos, que lhe disseram ter sido chamados por um desconhecido para vir confessar o seu irmão e que, por isso, se tinham movido a vir. Presume-se, portanto, que tenha sido o próprio São Miguel a avisar os ditos religiosos e incitá-los a ir. De fato, eles foram e o enfermo confessou-se com grande compunção naquele espaço de três horas, tendo morrido com grande esperança de salvação.

→ Rezem-se nove Pai-Nossos, nove Ave-Marias e nove Glórias.

Oremos. Ó Deus, que dispondes de modo tão admirável o ministério dos anjos e dos homens, fazei, por vossa misericórdia, que sejamos defendidos na terra por aqueles que sem cessar vos servem e assistem no Céu. Pelo mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

DIA 3

Escreve o Diácono Pantaleão que São Miguel Arcanjo não só alcança, para os seus devotos, força para resistir às tentações do Inferno, mas que ele próprio se põe a combater, quando vê qualquer devoto seu fortemente oprimido pelo demônio e em perigo próximo de cair no pecado: “Repele as investidas dos demônios”. São Bruno, bispo de Segni e abade de Montecassino, que floresceu no século XI, diz que este Arcanjo ama tanto o gênero humano que não cessa, dia e noite, de lutar contra o dragão infernal, e chama os seus anjos como auxílio, a fim de que não sejamos vencidos por tal inimigo: “Miguel, com seus anjos, de dia e de noite não cessa de lutar contra o dragão”.

De fato, diz Pantaleão, o Santo Arcanjo “sempre monta acampamento ao redor dos fiéis”; no nosso entender, ele, juntamente com os outros anjos, seus companheiros, põe-se em guarda à volta dos cristãos, para que eles não se tornem presas do Inferno, sobretudo se tiverem recorrido a ele para que os ajude.

Conta-se que um certo Huberto Salônico, tesoureiro do rei da Polônia, tendo vivido em pecado durante muitos anos, acabou por morrer, e tê-lo-ia feito em condenação se São Miguel não viesse em seu socorro. Ele próprio confessou que já estava perdido e que os demônios já o tinham vindo buscar, mas o Arcanjo, de quem tinha sido devoto durante toda a vida, apareceu-lhe, afugentou os demônios [que o rodeavam] e, voltando-se para ele, disse que Deus lhe havia concedido oito dias para corrigir os erros da própria consciência. Depois [disso, o homem] mandou chamar um confessor, acusou-se com verdadeira dor de seus pecados, recebeu com devoção os outros sacramentos e morreu com grande esperança de salvação.

Não devemos deduzir deste exemplo que, mesmo levando uma vida má, São Miguel nos há de alcançar a salvação na hora da morte, porque estas graças são raras; por outro lado, aquele que “volta ao seu vômito” será abandonado por Deus (cf. Am 1, 3).

→ Rezem-se nove Pai-Nossos, nove Ave-Marias e nove Glórias.

Oremos. Ó Deus, que dispondes de modo tão admirável o ministério dos anjos e dos homens, fazei, por vossa misericórdia, que sejamos defendidos na terra por aqueles que sem cessar vos servem e assistem no Céu. Pelo mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

DIA 4 

São Miguel Arcanjo, por Luca Giordano.

São Miguel socorre os seus devotos que caíram no pecado, implorando-lhes luz para conhecer a fealdade de suas faltas e dor para detestá-las. Por isso, a Igreja nos ordena que, para obter o perdão dos pecados, confessemos os nossos pecados primeiro a Deus, depois à Santíssima Virgem e depois a São Miguel [ii], a fim de que ele também nos ajude a recuperar a graça divina perdida. Em razão disso São Sofrônio, Patriarca de Jerusalém no século VII (que escreveu um douto elogio de São Miguel, como se encontra na Biblioteca dos Padres Dominicanos), chama ao nosso Santo Arcanjo “condutor dos errantes e encorajador dos caídos”. Condutor dos errantes porque São Miguel guia os pecadores, que vivem separados de Deus, a encontrar o caminho e os meios para receber o perdão de Deus. Encorajador dos caídos, porque o Santo Arcanjo anima os seus devotos com santas inspirações para que saiam do estado infeliz em que caíram.

O Diácono Pantaleão escreve o mesmo: “Ele conduz ao caminho da penitência e cuida de obter a remissão dos pecados”. Porque muito ama as nossas almas, quando as vê mergulhadas no abismo do pecado, e prestes a passar para o abismo do Inferno, São Miguel procura por vários meios levá-las à penitência, que é o único meio de obter a remissão dos pecados. Este autor acrescenta [que ele] “afiança os pecadores”. E isto significa que São Miguel, vendo um de seus devotos em desgraça perante Deus, pede ao Senhor que lhe espere a penitência e, de certo modo, assegura-lhe com promessas que o pecador não mais o ofenderá, pois estará vigilante para o ajudar quando o vir em perigo de cair novamente.

Lemos muitos exemplos de pecadores salvos pela intercessão de São Miguel. Quero contar aqui um muito bonito, referido pelo Padre Nieremberg no seu livro em louvor a São Miguel. 

Havia um sacerdote, de nome Tarentão, que levava uma vida má havia vinte anos e que, por ter feito algumas devoções a São Miguel, tendo morrido o bispo daquele lugar, rezou ao Arcanjo, não para libertá-lo de seus pecados, mas para obter-lhe o bispado. São Miguel apareceu-lhe e disse-lhe que pensasse há quantos anos merecia estar no Inferno, mas que, por compaixão, ele lhe havia impetrado de Deus a misericórdia de esperar-lhe a penitência; razão pela qual exortou-o a não mais pensar no bispado, mas sim em preparar-se para a morte, que estava próxima, procurando obter neste ínterim a dor dos seus pecados a fim de receber o perdão. Depois desta advertência, o padre, com a ajuda de São Miguel, fez uma boa confissão e, em oito dias, morreu; quando estava morrendo, testemunhou aos circunstantes que [o Santo Arcanjo] o assistia e consolava.

Mas volto a inculcar que estes exemplos são raros. O que acontece com frequência é isto: aqueles que se obstinam em sua má vida, morrem [igualmente] mal. Por isso quero fazer-vos compreender que quem volta a cair no pecado quase nunca se emenda, primeiro porque quem volta a cair faz-se mais fraco; segundo, [porque] o demônio faz-se mais forte; e, terceiro, [porque lhe] falta a graça divina.

→ Rezem-se nove Pai-Nossos, nove Ave-Marias e nove Glórias.

Oremos. Ó Deus, que dispondes de modo tão admirável o ministério dos anjos e dos homens, fazei, por vossa misericórdia, que sejamos defendidos na terra por aqueles que sem cessar vos servem e assistem no Céu. Pelo mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

DIA 5

Escreve o Diácono Pantaleão que São Miguel “tem cuidado de todo o povo fiel”. Destinado por Deus a cuidar de todos os fiéis, este Santo Arcanjo, estando no Céu, não deixa de consolar os cristãos aflitos na terra. Acrescenta o bispo São Bruno [de Segni] que São Miguel, elevado pelo Senhor a chefe de todos os anjos, tem o encargo de distribuir a cada homem o próprio anjo da guarda; por isso escreve o santo: “Vê pois quantas graças devemos ao bem-aventurado Miguel arcanjo, de quem recebemos, como ministros para a nossa proteção, os anjos a nós destinados”. Ora, como é São Miguel quem ilumina todos os anjos que lhe são inferiores, ele mesmo dirige os anjos da guarda e os instrui sobre a melhor maneira de nos guardar e defender de nossos inimigos. Por isso, quando virmos alguém que, por causa de seus vícios, está a desviar-se ou a perseguir-nos, o melhor é rezar a São Miguel para que instrua o anjo da guarda designado a essa pessoa sobre o melhor modo de iluminá-la, para que se emende ou deixe de nos perseguir.

Diz ainda Pantaleão que, quando lhe pedimos ajuda, São Miguel nos livra de perigos, e até de necessidades temporais: “Salva de necessidades e perigos os que o invocam”. Acima de tudo, o mesmo autor diz que São Miguel assiste seus devotos para que cumpram a vontade divina: “Por vós”, dirige estas palavras ao Santo Arcanjo, “toda graça foi dada a nós, os fiéis, para que façamos a divina vontade”.

Todos sabem que toda a nossa salvação consiste em fazer a vontade de Deus. Peçamos, pois, especialmente a São Miguel que, ajudados por sua intercessão, se cumpra em nós a vontade divina. Toda a nossa salvação e vida da alma consiste em fazer a vontade de Deus: “A vida está na vontade dele” (Sl 29, 6) [iii]. Por isso devemos pedir sempre a Deus: “Ensinai-me a fazer a vossa vontade” (Sl 142, 10). Devemos pedi-lo a Nossa Senhora, ao anjo da guarda, aos santos padroeiros, de sorte que nos alcancem a graça de fazer a vontade divina.

Cumpre, porém, entender que devemos nos conformar [à vontade divina], mesmo nas contrariedades, e mesmo nas tribulações que nos vêm dos homens que nos perseguem, porque tudo vem de Deus. Assim cada um pode santificar-se e gozar da verdadeira paz: “Não entristecerá o justo o que quer que lhe aconteça” (Pr 12, 21).

→ Rezem-se nove Pai-Nossos, nove Ave-Marias e nove Glórias.

Oremos. Ó Deus, que dispondes de modo tão admirável o ministério dos anjos e dos homens, fazei, por vossa misericórdia, que sejamos defendidos na terra por aqueles que sem cessar vos servem e assistem no Céu. Pelo mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

DIA 6

“A Queda dos Anjos Rebeldes”, por Luca Giordano.

São Miguel foi especialmente constituído por Deus para assistir todos os pobres moribundos na hora da morte. Todos sabem que, na hora da nossa morte, os assaltos do demônio são mais terríveis e, ao mesmo tempo, a nossa força é mais fraca, porque na hora da morte nos encontramos confusos e aterrorizados pelos pecados que cometemos e por medo do julgamento que então tem de ser feito sobre as nossas almas [iv]. Por isso a Santa Igreja nos exorta a recorrer nessa altura a São Miguel, para que nos defenda no grande combate que teremos de travar contra os demônios, com estas palavras: Princeps gloriosissime, sancte Michaël Archangele, defende nos in prælio, ut non pereamus in tremendo iudicio“São Miguel Arcanjo, defendei-nos no combate para que não pereçamos no tremendo juízo” (Verseto do Aleluia na antiga festa da Aparição de São Miguel). E na recomendação da alma, a Santa Igreja quer que todos os circunstantes rezem a São Miguel, para que cuide de tomar sob a sua guarda aquela alma prestes a deixar o mundo: “[Que] a receba São Miguel Arcanjo”.

Ademais, lemos no Ofício as seguintes palavras, ditas por Deus mesmo a São Miguel: “Arcanjo Miguel, constituí-te príncipe sobre todas as almas que se hão de salvar”. Assim, pois, Miguel foi incumbido por Deus de receber as almas que devem passar desta vida para a eternidade.

E sabe-se por muitos exemplos que, com a sua proteção, São Miguel tem alcançado uma morte feliz para seus devotos. A um monge capuchinho chamado Ivone, muito devoto de São Miguel, apareceu um dia o Santo Arcanjo e lhe avisou que se preparasse para a morte, já próxima. Assim foi, porque naqueles dias o frei Ivone preparou-se para a morte com muitos atos de virtude, morrendo santamente, como conta o Pe. [Benedetto] Palocci, que escreveu a sua vida.

Narra-se na vida de São Caetano [de Thiene] escrita pelo Pe. [Ippolito] Falcone que, estando o santo às portas da morte, apareceu-lhe o demônio com outros sete espíritos malignos, que o perturbavam com tentações; mas São Miguel, de quem era muito devoto, apareceu-lhe e libertou-o de todas as angústias que lhe causavam os demônios.

→ Rezem-se nove Pai-Nossos, nove Ave-Marias e nove Glórias.

Oremos. Ó Deus, que dispondes de modo tão admirável o ministério dos anjos e dos homens, fazei, por vossa misericórdia, que sejamos defendidos na terra por aqueles que sem cessar vos servem e assistem no Céu. Pelo mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

DIA 7

São Miguel tem também o cuidado de consolar as almas do Purgatório. Lemos no responsório do Ofício de São Miguel que Deus entregou ao Arcanjo todas as almas que se salvam, a fim de que ele as conduza até o Paraíso: “Deus entregou-lhe as almas dos santos para as conduzir às alegrias do Paraíso”. No [antigo] ofertório da Missa de defuntos, a Igreja pede a São Miguel que apresente a Deus no Céu as almas dos mortos: Sed signifer sanctus Michaël repræsentet eas in lucem sanctam — “Mas que o signífero São Miguel as torne presentes à luz santa”. Por isso o Santo Arcanjo, pelo cuidado que tem das almas a ele confiadas, não deixa de assisti-las, nem de socorrê-las junto de Deus, impetrando-lhes muitos alívios naquelas penas. Já disse em dias passados que os devotos de São Miguel são por ele consolados em todas as aflições. Ora, quanto mais não devemos crer que São Miguel ajudará e aliviará os seus devotos nas penas do Purgatório, muito mais atrozes que todas as penas da vida presente?

São Miguel Arcanjo, numa pintura do Mestre de Zafra.

Lemos em [Giacomo] Massi que um sacerdote, como rezasse Missa de defuntos, ao chegar às palavras: “Mas que o signífero São Miguel” etc., enquanto encomendava algumas almas em particular, viu São Miguel descer do Céu e ir até o Purgatório libertá-las. Narra o mesmo autor que um monge cisterciense apareceu depois de morto a um sacerdote amigo seu e disse-lhe que ainda estava no Purgatório, pois que, se o tivesse recomendado a São Miguel na Missa, já estaria livre daquelas dores. O padre encomendou-o a São Miguel e, de fato, ele e outros viram a alma do amigo ser levada ao Céu pelo Arcanjo. 

Donde se conclui que a devoção a São Miguel agradará muito aos que se esforçam, com obras e devoções, em livrar dessas dores as almas do Purgatório. Também agradará muito a Jesus Cristo, que tanto ama essas almas e deseja que as ajudemos com nossas orações.

→ Rezem-se nove Pai-Nossos, nove Ave-Marias e nove Glórias.

Oremos. Ó Deus, que dispondes de modo tão admirável o ministério dos anjos e dos homens, fazei, por vossa misericórdia, que sejamos defendidos na terra por aqueles que sem cessar vos servem e assistem no Céu. Pelo mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

DIA 8

Jesus, nosso Redentor, por meio da Cruz em que morreu, salva a quantos se salvam, pois que, por meio dela, dá o perdão dos pecados e a graça divina. A Cruz, portanto, é o estandarte de salvação sob o qual estão inscritos todos os eleitos. Daí que a Santa Igreja, falando justamente da Cruz, cante no hino da festa de São Miguel e diga: Sed explicat victor crucem Michaël salutis signifer — “Mas hasteia, vitorioso, à Cruz Miguel, porta-estandarte da salvação” (Hino Te splendor et virtus Patris). Assim que, no dia do Juízo Final, será São Miguel quem, erguendo o estandarte da Cruz, chamará para debaixo dele todas as almas que se salvarem, e assim as conduzirá ao Céu e apresentará ao trono de Deus.

Sejamos, pois, devotos da Cruz, isto é, de Jesus Cristo, que nela morreu por nós. Com isso, somos exortados a meditar meia hora por dia sobre a Paixão de Jesus Cristo. Se alguém sofre por ti insultos, pancadas e feridas, e tu não queres sequer pensar nisso, que dor não sentiria aquele que por ti tanto sofreu? Ao contrário, quanta consolação há de sentir, sabendo que pensas sempre nisso, que falas sempre disso aos outros e que a Ele te mostras agradecido?

Mas voltemos a São Miguel. Tenhamos-lhe grande devoção, na esperança de que um dia ele nos há de introduzir na pátria bem-aventurada, e peçamos à divina Mãe que a ele nos recomende. Escreve São Boaventura que, quando a Santíssima Virgem impõe a São Miguel o cuidado de algumas almas, o Santo Arcanjo se empenha de modo especial em guardá-las, chegando inclusive a chamar outros anjos que o ajudem a defendê-las na hora da morte e a levá-las para o Céu. Se estiverem livres de toda mancha, mas ainda necessitadas de purificação, o próprio São Miguel, com sua intercessão, alcançará de Deus que se lhes abrevie o Purgatório, e, no momento de serem purificadas, cuidará que os seus devotos ainda vivos na terra lhes mandem sufrágios por meio de orações e de outras obras piedosas. Diz São Boaventura em colóquio com a Virgem: “Miguel, chefe e príncipe da milícia celeste, com todos os espíritos auxiliares, obedece, ó Virgem, às vossas ordens para defender, unidas ao corpo, e acolher, dele separadas, as almas dos fiéis que a vós especialmente se encomendam”.

Conta o Pe. [Henrik] Engelgrave que Fernando, príncipe de Portugal, era um jovem muito devoto a São Miguel. Ia-o visitar todos os dias a um altar e, em todas as suas festas, venerava-o jejuando e recebendo a Sagrada Comunhão, o que o Santo Arcanjo soube muito bem recompensar. Apareceu-lhe um dia em gesto de súplica à Mãe de Deus para que livrasse logo a Fernando dos perigos do mundo e lhe obtivesse a graça de, apenas saído do mundo, ir para o Céu. No dia predito pela Virgem, passou ele felizmente desta vida aos dezessete anos, assistido e acompanhado ao Céu por São Miguel, como piedosamente se crê.

→ Rezem-se nove Pai-Nossos, nove Ave-Marias e nove Glórias.

Oremos. Ó Deus, que dispondes de modo tão admirável o ministério dos anjos e dos homens, fazei, por vossa misericórdia, que sejamos defendidos na terra por aqueles que sem cessar vos servem e assistem no Céu. Pelo mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

DIA 9

“O Grande São Miguel”, por Rafael Sanzio.

Logo, será São Miguel, como dito ontem, quem, acabado o Juízo Final, há de introduzir no Paraíso todas as almas salvas e as há de apresentar juntamente ao trono de Deus, para que o Senhor as abençoe e lhes conceda gozar eternamente da gloriosa bem-aventurança. Escreve um autor a este respeito que os devotos de São Miguel levam um sinal especial de predestinação ao Paraíso, e a razão é que, tendo tanto amor à salvação de seus devotos, não há de permitir São Miguel que uma alma que lhe tenha particular devoção caia em desgraça aos olhos de Deus; antes, há de lhe dar forças contra os assaltos do Inferno, e se por desgraça houver tal alma caído outrora em alguma falta grave, mas se encomendar a Miguel, este facilmente lhe alcançará a graça do perdão e da perseverança. A Santa Igreja atesta que honrar São Miguel é ter parte nos benefícios e nas orações que faz o Arcanjo por seus devotos a fim de os conduzir ao reino celeste: “Cuja honra é para os povos fonte de favores e cuja oração conduz ao reino dos céus”.

Atente-se bem às palavras: “Cuja oração conduz ao reino dos céus”. Quando encomenda uma alma a Deus, obtém-lhe São Miguel a salvação eterna. Eis por que São Lourenço Justiniano exorta todos a se colocarem sob os cuidados de Miguel, com orações e outros devotos obséquios, a fim de que o Santo Arcanjo os socorra em todas as necessidades da alma. São Miguel, com efeito, não despreza as orações de quem reza a ele, nem deixa de proteger os que confiam na sua intercessão e o amam: “Por esta razão, reconheçam todos o seu protetor, abracem-no em desejo, obriguem-no por devoção. […] De fato, não poderá ele desprezar os que oram, repelir os que confiam, rejeitar os que amam”.

Quisera por fim assinalar quais obséquios podem ser feitos para alcançar a proteção de São Miguel. Em primeiro lugar, fazer todos os anos a sua novena, recitando durante nove dias nove Pai-Nossos, Ave-Marias e Glória em honra do Santo Arcanjo, e jejuar na véspera da sua festa. Segundo: ter em casa uma imagem de São Miguel e saudá-la todas as manhãs, ao levantar-se, e todas as noites, antes de deitar-se, com a oração da Igreja: “Príncipe gloriosíssimo, São Miguel Arcanjo, defendei-nos no combate para que não pereçamos no tremendo juízo”. Terceiro: nos momentos de tentação, recorrer prontamente a São Miguel, pedindo-lhe ajuda, e fazer-lhe todos os dias uma oração especial, para que o santo nos proteja na vida e sobretudo na hora da morte.

→ Rezem-se nove Pai-Nossos, nove Ave-Marias e nove Glórias.

Oremos. Ó Deus, que dispondes de modo tão admirável o ministério dos anjos e dos homens, fazei, por vossa misericórdia, que sejamos defendidos na terra por aqueles que sem cessar vos servem e assistem no Céu. Pelo mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que convosco vive e reina na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

Notas

  1. Aqui, escrevendo a sacerdotes, Santo Afonso dá-lhes uma dica de tema para sermão: “Neste segundo dia [de novena], pode-se falar da oração, discutindo primeiro a sua necessidade; segundo, a sua eficácia; e, terceiro, o modo como se deve rezar, isto é, com humildade, confiança e perseverança.” Os leigos podem aproveitar a recomendação para ler o que ensina o próprio Santo Afonso sobre estes temas, em sua Escola da Perfeição Cristã (org. Pe. Saint-Omer), p. IV, c. I, “Da prece”. (N.T.)
  2. Antes da reforma litúrgica que se seguiu ao Concílio Vaticano II, a confissão dos pecados no Confiteor (“Confesso a Deus todo-poderoso”) era feita também à beata sempre Virgem Maria, aos beatos Miguel Arcanjo, São João Batista, São Pedro e São Paulo e todos os santos: Confiteor Deo omnipotenti, beatæ Mariæ semper Virgini, beato Michaëli Archangelo, beato Iohanni Baptistae, sanctis Apostolis Petro et Paulo, omnibus sanctis, et tibi, Pater, quia peccavi etc.
  3. A tradução do Pe. Matos Soares diz: “A sua benevolência dura toda a vida”. Mas na Vulgata se lê: “Vita in voluntate eius”; ou seja, segundo a interpretação de Santo Afonso: “A vida [está] em [fazer] a vontade dele”.
  4. Falando ainda a sacerdotes, Santo Afonso diz aqui: “Esses pontos devem ser desenvolvidos no sermão, mostrando como são atormentadoras as três maiores ansiedades dos moribundos, a saber: primeiro, memória dos pecados cometidos; segundo, medo da condenação eterna; terceiro, os assaltos do Inferno.” Pode-se aproveitar a recomendação para ler o que ensina o próprio Santo Afonso sobre estes temas, em sua Preparação para a Morte, consideração VI, “Morte do pecador”. (N.T.)

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