Por meio da milagrosa concepção do Filho de Deus no ventre da Virgem — o “grande evento”, o milagre dos milagres, que o Todo-poderoso operou nela —, Deus deu a todas as mulheres um novo começo. Refletir sobre Maria é a melhor maneira de dar sentido à observância do Dia das Mães.
“Na plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher” (Gl 4,4). Para São Paulo, estes dois aspectos são inseparáveis: o envio do Filho unigênito do Pai e o nascimento dele no tempo, segundo a natureza humana que tomou de sua Mãe. Aquele que tem apenas Pai segundo a divindade tem apenas Mãe segundo a humanidade. A pessoa de Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, tem um Pai celestial e uma Mãe terrena. Cristo traz a graça e a verdade de Deus à humanidade; na pessoa de Maria, aquela que primeiro acreditou, o gênero humano o recebe e lhe responde com um retumbante sim! Faça-se em mim; que a vossa vontade seja feita assim na terra (em Belém, no Egito, em Nazaré…) como no céu, na gloriosa comunhão do Filho com o Pai no Espírito Santo.
Quem segue a Cristo está dando o próprio e solene fiat de Maria, eco de outro fiat pronunciado milhares de anos antes: o Fiat lux de Deus, “Faça-se a luz”, no primeiro dia da criação. Foi no início dos tempos que Deus disse Fiat lux, e então, “na plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho”; e como Ele o enviou? Como Deus, por cuja palavra o mundo inteiro veio a ser do nada, quis recriar o mundo na graça? “Deus enviou seu Filho, nascido de mulher.” O sol da justiça, o alvorecer da redenção, é precedido pela estrela da manhã de Israel, Miriam de Nazaré.
Não há redenção do homem sem a maternidade de Maria, e isso significa também que a imagem divina no homem, manchada pelo pecado, só é restaurada à pureza original por meio das mãos maternais de Maria, devendo assemelhar-se a ela no rosto e no coração, na fé e na oração, no amor, nos sofrimentos e nas alegrias. Quando nos tornamos mais semelhantes a Cristo, fazemo-nos também mais semelhantes a Maria. O Filho não deve ser separado da Mãe ou do Pai; somente se sua natureza humana pudesse separar-se da divindade e ser entregue ao esquecimento poderia acontecer de Maria deixar de desempenhar seu papel singular na economia da salvação. Assim como Ele sempre foi e sempre será o Filho único que repousa no seio do Pai, a partir da Encarnação Ele passou a ser o Filho da Virgem para todo o sempre, e ela a mulher “cheia de graça”.
Na Anunciação, Maria acolhe o Filho não só como uma mulher em particular, mas também como representante da humanidade, como lembra Santo Tomás (cf. STh III 30, 1). Seu Ecce ancilla Domini (“Eis a escrava do Senhor”) é a resposta definitiva ao orgulhoso Non serviam (“Não servirei”) que os tempos ecoam desde a queda de Lúcifer e de Adão.
Quando o Pai enviou o Filho à humilde serva, confiou o sublime mistério da Trindade, o segredo há muito escondido de seu ser divino, ao Imaculado Coração. Quando Gabriel explica como a concepção se dará, o mistério do Três em Um é abertamente revelado pela primeira vez. Em sua simplicidade, uma humildade nascida da sede de Deus e da consciência da grandeza dele, Maria está pronta para beber do conhecimento do ser divino e receber o amor abundante que é sua vida interior. Deus se revela a Maria como Amor, tanto em si mesmo — na comunhão eterna de Pai, Filho e Espírito Santo — como na relação com o mundo, ad extra: amor em três pessoas, Uma das quais é enviada para salvar o mundo do sofrimento eterno.
O siga-me de Cristo é um chamado a livrar-se dos grilhões da morte, a participar da vida divina do Amor, a alcançar a união da amizade com Deus, na qual se encontra a dignidade do homem e fora da qual nada é bom, nada é santo. Esse chamado, e o mandamento de amar como Cristo amou, são exclusivos do cristianismo: “Nisto conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros”. É o fiat de Maria que dá à humanidade caída a oportunidade de participar de todas essas graças, de beber abundantemente do “vinho novo” dado por Cristo “na plenitude dos tempos” (cf. Jo 2,1-11).
Além disso, “Maria, a mulher da Bíblia, é a mais perfeita expressão dessa dignidade e vocação” de seguir a Cristo e trazê-lo dentro de um coração amoroso (João Paulo II, Carta Apostólica Mulieris Dignitatem [MD], n. 6). Maria é de modo preeminente “bendita entre as mulheres”, não só no privilégio singular de sua divina maternidade, mas também em seu singular e perfeito seguimento do Filho. Ela é modelo de discípulo, aquele que segue e aprende. Assim como o Verbo é a Imagem perfeita do Pai, Maria é a imagem perfeita do Filho; e como Jesus dá à humanidade acesso ao Pai, também Maria nos guia sempre e unicamente ao Filho, a quem ama com um ardor que deixa maravilhados até os serafins.
É verdade que Deus enviou o Filho ao mundo todo (cf. Jo 3,16), mas Cristo foi dado primeiro e mais intimamente na irrepetível relação entre Ele e sua Mãe. “Não se trata apenas de palavras de Deus reveladas através dos profetas, mas da resposta [o fiat de Maria] pela qual o Verbo realmente se faz carne. Maria alcança assim uma tal união com Deus, que supera todas as expectativas do espírito humano” (MD 3). Esse dom é único e foi concedido à única mulher que é verdadeiramente Mãe de Jesus e, consequentemente, Mãe de Deus (Theotókos). Contudo, esse dom repercute em toda a humanidade feminina. Uma vez que as mulheres podem seguir Maria, ou como virgens consagradas ou como mães dedicadas, elas participam da glória com que Deus abençoou tais estados, em sua perfeição, na Virgem Maria.
O Filho de Deus poderia ter vindo a nós de muitas maneiras, pois o poder de Deus não é menos infinito que sua criatividade. Ele poderia ter formado um corpo para si a partir do barro, como fez ao criar Adão. Ele poderia ter simplesmente ordenado que um corpo já desenvolvido viesse ex nihilo à existência. Mas Ele escolheu, em sua sabedoria e amor, tornar-se homem passando pelo caminho do nascimento humano; Ele escolheu ser Filho de Maria, Filius Mariae.
Não se trata, porém, de uma concepção e de um nascimento ordinários, mas de acontecimentos milagrosos que se realizaram em e a partir de uma virgem. Em Maria, maternidade e virgindade estão unidas, cada uma em sua glória completa, indicando assim a convergência dessas duas formas exemplares de serviço feminino (cf. MD 17). Cada uma dessas vocações é essencialmente tanto um dom de si quanto um confiar outros aos cuidados da mulher, por meio da maternidade física ou espiritual (ou ambas). Maria, como mulher arquetípica, mostra-nos o verdadeiro sentido da vocação de dar à luz, alimentar e proteger a vida.
Maria, a Mãe de Deus, trouxe Cristo ao mundo: foi ela quem o deu a nós. Trazer Cristo ao mundo é a vocação de todo cristão dentro de sua vocação particular; para as mulheres, no entanto, ela assume a especialidade de conceber, dar à luz, nutrir e proteger a vida, e interceder pelos outros, lutando por trazer-lhes à tona “o ornato oculto do coração” (1Pd 3,4).
Seja-nos permitido dizer que esse mistério e milagre da vinda de Cristo ao mundo reflete-se remotamente em cada vida nova criada por Deus; em cada nascimento, seja ele físico ou espiritual; em cada lição aprendida na infância ou na oração de intercessão de uma mãe. Pois cada alma não só é confiada a uma mãe, que então replica o amor de Maria (e expressa assim o amor de Deus pela criança), como também traz consigo, em ato ou em potência, uma semelhança a Cristo. “Todo o que receber um destes meninos em meu nome, a mim é que recebe” (Mc 9,37).
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