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Cristo sabia que era Deus?

O Magistério o ensina com palavra infalível e as Escrituras o atestam sem margem a dúvidas: Cristo não só declarou sê-lo como também se comportou como Deus, não apenas fazendo milagres, mas, acima de tudo, perdoando pecados.

Texto do episódio
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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 5, 17-26)

Um dia Jesus estava ensinando. À sua volta estavam sentados fariseus e doutores da Lei, vindos de todas as aldeias da Galileia, da Judeia e de Jerusalém. E a virtude do Senhor o levava a curar. Uns homens traziam um paralítico num leito e procuravam fazê-lo entrar para apresentá-lo. Mas, não achando por onde introduzi-lo, devido à multidão, subiram ao telhado e por entre as telhas o desceram com o leito no meio da assembleia diante de Jesus. Vendo-lhes a fé, ele disse: “Homem, teus pecados estão perdoados”.

Os escribas e fariseus começaram a murmurar, dizendo: “Quem é este que assim blasfema? Quem pode perdoar os pecados senão Deus?” Conhecendo-lhes os pensamentos, Jesus respondeu, dizendo: “Por que murmurais em vossos corações? O que é mais fácil dizer: ‘teus pecados estão perdoados’, ou dizer: ‘levanta-te e anda’? Pois, para que saibais que o Filho do homem tem na terra poder de perdoar pecados — disse ao paralítico — eu te digo: levanta-te, pega o leito e vai para casa”. Imediatamente, diante deles, ele se levantou, tomou o leito e foi para casa, louvando a Deus. Todos ficaram fora de si, glorificavam a Deus e cheios de temor diziam: “Hoje vimos coisas maravilhosas!”

O Evangelho de hoje nos relata o tocante episódio em que Jesus perdoa os pecados e restitui a saúde a um paralítico, descido pelo teto por um grupo de amigos cheios de fé. Contemplar esta cena tão cheia de significado adquire uma especial relevância no tempo do Advento, pois constitui uma oportunidade propícia para nos desfazermos de um erro muito comum, estendido hoje entre não poucos católicos, mas cuja origem se remonta a uma heresia protestante do séc. XIX segundo a qual, após a Encarnação, Cristo teria de algum modo perdido a consciência de ser o Filho natural de Deus. Para autores como Renan, Harnack, Stapfer e Weiss, v.gr., Jesus não se considerava nada mais do que um homem superior aos outros, unido ao Pai por um vínculo especial de dependência e amor, mas nunca o Filho natural de Deus [1]. Sabemos, porém, que essa doutrina não só não corresponde à fé que a Igreja sempre professou como também se opõe, de modo flagrante, ao testemunho das SS. Escrituras. O Magistério da Igreja, com efeito, afirmou solenemente no Concílio de Calcedônia, celebrado em 451, que é “um só e o mesmo Filho, Nosso Senhor Jesus Cristo, perfeito na sua divindade e perfeito na sua humanidade, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, composto de alma racional e de corpo, consubstancial ao Pai segundo a divindade e consubstancial a nós segundo a humanidade, semelhante em tudo a nós, menos no pecado (cf. Hb 4, 15), gerado do Pai antes dos séculos segundo a divindade e, nestes últimos dias, em prol de nós e de nossa salvação, gerado de Maria Virgem, a Deípara, segundo a humanidade” (DH 301).

Também consta claramente nas Escrituras que Jesus declarou inúmeras vezes ser o Filho de Deus, condição da qual, portanto, não podia ser “inconsciente”. Assim, v.gr., o vemos afirmar sua superioridade sobre reis como Davi (cf. Mt 22, 43ss), sábios como Salomão (cf. Mt 12, 42), profetas como Jonas, ascetas como João Batista (cf. Mt 11, 11) e inclusive sobre todos os anjos (cf. Mt 13, 41; 16, 27), rebaixados à condição de servos seus (cf. Mt 4, 11; Mc 1, 13). Afirmou estar acima tanto do Templo de Jerusalém, de cujos impostos estava isento justamente por ser Filho do Senhor do Templo (cf. Mt 12, 6; 17, 24-27), quanto da própria Lei mosaica e dos seus preceitos mais sagrados, como o do descanso sabático (cf. Mt 12, 8). Além disso, são constantes as declarações em que Ele se atribui a si mesmo poderes e atributos exclusivos de Deus: a) o seu poder legislativo se estende à totalidade da Lei, que Ele faz questão de aperfeiçoar (cf. Mt 5, 21.27.31.33 etc.); b) o seu poder judicial se funda em sua prerrogativa de Juiz de vivos e mortos (cf. Mt 7, 22s; 13, 37-42; 16, 27; Lc 12, 35-40; 13, 26s etc.); c) o seu poder santificador, enfim, abrange explicitamente a faculdade de perdoar pecados (cf. Mt 6, 9; Lc 7, 48 etc.), coisa que, como reconhecem escandalizados os próprios fariseus, é exclusiva de Deus: “Quem pode perdoar os pecados senão Deus?” [2].

Diante de tão claros e evidentes testemunhos, abalizados pelo Magistério infalível da Igreja Católica, preparemo-nos neste Advento para a vinda daquele que, muito mais do que um simples “fundador” de um movimento religioso, “já antes do princípio do mundo”, como Deus de infinita majestade, “nos abraçou no seu infinito conhecimento e eterno amor; Amor que Ele demonstrou palpavelmente e de modo verdadeiramente assombroso assumindo a nossa natureza em unidade hipostática; donde segue, como ingenuamente nota Máximo de Turim, que ‘em Cristo nos ama a nossa carne’” [3], carne que, unida à divina Pessoa do Verbo, queremos neste próximo Natal adorar com todo o coração, com toda a mente, com todas as forças, com a particular intenção de reparar as gravíssimas injúrias, blasfêmias e irrisões com que ano após ano, nesta data santa, tantos homens o desprezam, ridicularizam e escarnecem, cegos para a verdade de que só Ele pode e tanto deseja, se se converterem, dizer-lhes: “Teus pecados estão perdoados”.

Referências

  1. Cf. F. Vizmanos e I. Ruidor, Teología fundamental para seglares. Madrid: BAC, 1963, p. 359, n. 590.
  2. Cf. Id., pp. 362-364, nn. 594-596.
  3. Pio XII, Encíclica “Mystici Corporis”, de 29 jun. 1943, n. 74 (AAS 35 [1943] 229-230).
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